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FATORES HUMANOS NA AVIAÇÃO CIVIL: UM PANORAMA DO CAMPO DE ESTUDOS

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FATORES HUMANOS NA AVIAÇÃO CIVIL: UM PANORAMA DO CAMPO DE ESTUDOS

Mayara Vieira Henriques mayaravhenriques@gmail.com Alexandre de Carvalho Castro o.aken@uol.com.br LUIZ PHILLIPE MOTA PESSANHA luizmpessanha@gmail.com Raquel Figueira Lopes Cançado Andrade raquel.cancado.andrade@gmail.com Rayana Ferreira Vinagre rayanavinagre@gmail.com

No +ómbito operacional da avia+º+úo civil, os Fatores Humanos s+úo os maiores ativos e a maior fonte de risco na execu+º+úo da atividade diante de toda a tecnologia e automa+º+úo presente no setor. O objetivo da pesquisa +® apresentar um panorama dos estudos sobre Fatores Humanos, seu aporte para o desenvolvimento da avia+º+úo civil e para promo+º+úo da seguran+ºa operacional. A metodologia consiste em uma pesquisa explorat+¦ria que aborda as principais discuss+Áes que fomentaram o setor ao longo dos anos.

Exp+Áe uma s+¡ntese da evolu+º+úo dos estudos sobre o impacto do Fator Humano nas opera+º+Áes a+®reas, tendo em vista a multidisciplinaridade caracter+¡stica desta tem+ítica e a not+¦ria contribui+º+úo nas ocorr+¬ncias aeron+íuticas. Como resultado, o artigo proporciona uma vis+úo abrangente da tem+ítica e evidencia a relev+óncia dos Fatores Humanos em contraste com o momento que a confiabilidade do setor est+í diretamente associada +á automa+º+úo.

Palavras-chave: Fatores Humanos. Avia+º+úo Civil. Seguran+ºa Operacional.

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1. Introdução

A natureza dinâmica do sistema aéreo exige a integração e qualificação de todos os profissionais que o compõem para garantir a qualidade efetiva das operações. A alta gerência, os pilotos, comissários de bordo, operadores aeroportuários, supervisores e inspetores, equipes de manutenção aeronáutica, controladores de tráfego aéreo, entre outros, são exemplos dos Fatores Humanos responsáveis por parte das atividades que constitui a cadeia de suprimentos de serviços deste setor.

Na aviação civil, o Fator Humano como objeto de estudo visa, majoritariamente, melhorar a segurança e a eficiência do sistema, sendo o mesmo uma coleção de componentes humanos, procedimentos e máquinas projetadas para alcançar os requisitos desejáveis na realização do serviço (MORIARTY, 2015).

O desempenho do Fator Humano é essencial para a segurança operacional na aviação e não deve ser considerado isoladamente (ICAO, 2016), dado que é uma variável do complexo setor aeronáutico que inclui a relação singular entre o homem, a máquina e o ambiente (LIMA e SILVA, 2016). Esta visão se alicerça na premissa dos indivíduos trabalhando de maneira sinérgica em equipes, operando dispositivos e agregando os princípios da ergonomia em prol da segurança operacional (BOÂS, 2014).

Os temas relativos aos Fatores Humanos englobam: o bem-estar do indivíduo, considerando principalmente a fadiga (física e mental), alterações no ritmo circadiano e o sono; saúde e desempenho; stress; uso de álcool ou outras drogas; trabalho em equipe; liderança;

comunicação; motivação; tratamento de informações; personalidade, atitudes e crenças; além dos aspectos ergonômicos de construção dos postos de trabalho. Podem-se destacar, também, a cultura e o clima organizacional das empresas como aspectos fortemente influentes no desempenho humano em um ambiente de trabalho (NASCIMENTO et al, 2016).

Nesta pesquisa, os Fatores Humanos serão compreendidos como campo de estudo multidisciplinar centrado no homem. Direcionado ao entendimento de sua perspectiva individual que compreende sua natureza como ser humano e as suas condições psicofisiológicas; assim como seu aspecto coletivo, contemplando sua interação com o trabalho, meio ambiente e seus semelhantes.

À vista disso, o objetivo deste trabalho é apresentar um panorama sobre os estudos dos Fatores Humanos na aviação civil e expor as principais perspectivas que fomentaram o

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Há na literatura uma ampla discussão acerca do tema. Com base nisso, a metodologia consiste em uma pesquisa exploratória desenvolvida com o propósito de fornecer uma visão geral acerca da temática explicitada nos objetivos. Foi realizado o levantamento bibliográfico utilizando como base de dados as principais revistas científicas, autores e instituições da aviação civil.

Para atender ao objetivo proposto, o artigo está organizado em seis seções. A segunda seção aborda a evolução histórica dos estudos sobre Fatores Humanos e as contribuições para a promoção da segurança operacional. Em seguida, na terceira seção, é exposta a multidisciplinaridade característica do campo de pesquisa. A quarta seção explora a contribuição do Fator Humano nas investigações dos acidentes e incidentes do setor. As considerações finais são apresentadas na quinta seção e por último são exibidas as referências utilizadas no desenvolvimento do trabalho.

2. Evolução dos estudos sobre fatores humanos na aviação

A aplicação do entendimento sobre os Fatores Humanos foi praticada na aviação por mais de 50 anos antes de receber tal título (ADAMS, 2006). Enquanto a aviação tinha nascido a partir de iniciativas civis, com os desdobramentos das Guerras Mundiais, as aeronaves começaram a ser utilizadas como veículo militar e armas de guerra (HAWKINS, 2016).

Interessados em reduzir o número de perdas de aeronaves e tripulação em combate, cuja justificativa era baseada principalmente nas “deficiências individuais” dos seus pilotos, se deu à luz a prática da investigação de fatores humanos em acidentes (ADAMS, 2006), reconhecendo a variabilidade existente entre os seres humanos e seu desempenho (HAWKINS, 2016).

Desde o seu comedido início no caos da Segunda Guerra Mundial, os estudos dos Fatores Humanos desempenharam um papel substancial na aviação (WISE et al, 2013), e suas raízes encontram-se firmemente no domínio do setor aéreo com o trabalho empreendido no Reino Unido e na América do Norte (HARRIS, 2011). A complexidade dos equipamentos ultrapassava a capacidade humana para operá-los com a máxima eficácia, proporcionando assim maior estímulo ao progresso dos estudos sobre os Fatores Humanos no setor (ICAO, 1998).

Um marco no primeiro século das pesquisas sobre Fatores Humanos foi o estudo desenvolvido na Experiência de Hawthorne, conduzida por Elton Mayo nos EUA no período de 1924 a 1930, cujo objetivo era verificar a influência das condições físicas do trabalho na

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eficiência dos operadores. Nesta ocasião, foi determinado que a eficácia das atividades poderia ser influenciada por fatores psicológicos não diretamente relacionadas com o trabalho em si, criando um novo conceito da importância da motivação no trabalho, conhecido como o 'Efeito Hawthorne' (HAWKINS, 2016).

A institucionalização dos Fatores Humanos como um campo de pesquisa por si só ocorreu com a fundação de várias organizações, como a Ergonomics Society Research, em 1949 no Reino Unido, seguido em 1959 pela formação da International Ergonomiscs Association (IEA) (ICAO, 1998; HAWKINS, 2016).

O reconhecimento de que a educação básica em Fatores Humanos era necessária para toda a indústria aeronáutica pode ser vista como um novo marco histórico. Em 1971, cursos foram estabelecidos com o foco nos Fatores Humanos nas operações do transporte aéreo e se difundiram pelo Reino Unido e nos EUA. Ainda assim, em 1977, uma série de deficiências acerca dos Fatores Humanos resultou no acidente com mais vítimas da história da aviação ocorrido na Espanha, na ilha Tenerife, salientando a necessidade de uma ação eficaz e urgente (HAWKINS, 2016).

À vista disso, os Fatores Humanos receberam uma maior aceitação no setor como parte essencial do ciclo de pesquisa, desenvolvimento, teste e avaliação. Essa aceitação resulta do papel crítico que os indivíduos, especialmente os pilotos, desempenham nesses sistemas homem-máquina-ambiente, os problemas e desafios singulares que esses mecanismos representam na percepção, na fisiologia e cognição humana, e as possíveis graves consequências do erro humano nesses arranjos organizacionais (MAURINO, 2010).

Em 1998, a International Civil Aviation Organization (ICAO), instituição responsável pelo fomento global ao desenvolvimento de estratégias e práticas viáveis que assegurem a execução eficiente, segura e sustentável do transporte aéreo, publicou o Human Factors Training Manual, documento que difundia a expansão da conscientização dos Fatores Humanos à comunidade internacional de aviação como oportunidade significativa para tornar a aviação mais segura.

Contudo, pode-se perceber que o interesse renovado na temática dos Fatores Humanos aplicado à segurança operacional da aviação foi uma resposta reativa às limitações tecnológicas prevalecentes na época e a partir disso buscou-se estender ao máximo as capacidades humanas através do conhecimento dos Fatores Humanos (ICAO, 1998).

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Fatores Humanos é um campo de estudo em constante construção e a expansão do conhecimento desta temática ao longo das últimas décadas conferiu maior especialização e fragmentação da área em subdisciplinas com foco no homem como a seleção, formação e simulação, gestão organizacional, saúde e segurança (HARRIS, 2011).

3. A multidisciplinaridade do fator humano

O campo dos Fatores Humanos é tão variado e diverso como o próprio sujeito humano (WISE e HOPKIN, 2009). É um assunto multifacetado, com suas bases na psicologia, sociologia, fisiologia, medicina, engenharia e gestão (HARRIS, 2011). A multidisciplinaridade nas pesquisas centradas em Fatores Humanos, se justifica devido as capacidades, limitações e habilidades não técnicas que incorporam o conjunto de esforços cognitivos e físicos dos indivíduos (DAVIES, 2014) e que são elementares nas operações de aviação civil.

Até o momento, porém, as pesquisas sobre o Fator Humano no sistema aeronáutico têm sido orientadas predominantemente para a garantia da segurança (HARRIS, 2011), requisito básico de qualidade do setor. Wise e Hopkin (2009) evidenciam a facilitação da segurança e eficiência do ambiente de trabalho como sua aplicação mais importante no domínio da aviação, viabilizado através da incorporação de paradigmas conhecidos sobre os seres humanos e sua relação como operador de máquinas e sistemas.

Por ter se tornado uma expressão de uso abrangente para o senso comum, o termo “Fator Humano” tende a significar qualquer aspecto relacionado com seres humanos. Cabe ressaltar que em estudos no referido campo da aviação, o termo deve ser operacionalmente definido, evitando-se diferentes entendimentos e possíveis entraves na condução da pesquisa (MARTINS, 2006).

A Federal Aviation Administration (FAA), agência de aviação civil dos EUA, transparece a multidisciplinaridade do Fator Humano ao defini-lo como:

um esforço multidisciplinar para gerar e compilar informações sobre as capacidades e limitações humanas e aplicar essas informações para equipamentos, sistemas, instalações, procedimentos, empregos, ambientes, treinamento, pessoal e gerência para o desempenho humano seguro, confortável, eficaz “Texto Traduzido”

(FEDERAL AVIATION ADMINISTRATION, 1993, p. 2, tradução nossa).

O Human Factors Training Manual (1998) sustenta a definição anterior considerando os Fatores Humanos como disciplina que trata das pessoas em suas situações de vida e de

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trabalho, cuja preocupação é aprimorar a relação entre as pessoas e suas atividades, pela aplicação sistemática das ciências humanas, integradas no âmbito da engenharia de sistemas.

Isto posto, o escopo dos estudos dos Fatores Humanos o torna um campo de pesquisa difícil de designar por meio de um conceito preciso. Há inúmeras definições diferentes, contudo, compartilham um elemento-chave: É uma ciência multidisciplinar (MORIARTY, 2015).

Dejours (2005) ressalta a dicotomia existente nas perspectivas dos estudos do Fator Humano.

Compreende, em um primeiro momento, o Fator Humano como um ponto de falha, cuja orientação normativa é baseada no controle, monitoramento e segurança. Em oposição, a segunda abordagem considera o Fator Humano como recurso, destacando a complexidade das relações do indivíduo com a organização.

Com o desenvolvimento do setor, uma gama ampla de questões de ciências humanas foi introduzida nos estudos sobre o componente humano e ampliou seu foco de indivíduos a organizações e sistemas inteiros. A preocupação expandiu-se a todos os níveis e funções dentro das organizações em que pessoas operam sistemas complexos (ADAMS, 2006).

Por vezes, os Fatores Humanos são aludidos apenas ao termo “ergonomia” (ergos: trabalho;

nomos: lei natural). Embora haja muitas similaridades entre os campos de pesquisa, cabe ressaltar que quando utilizam o termo “Ergonomia”, considerando majoritariamente a Ergonomia Física, busca-se fazer referência à interação do homem com aspectos físicos do seu ambiente de trabalho, enquanto o estudo dos Fatores Humanos é uma análise mais abrangente (TISSOT, 2010).

Essa amplitude se deve principalmente às características culturais e intrínsecas de cada ser, e ao complexo meio em que o individuo está inserido durante a operação aérea. Por sua natureza, o ambiente é um sistema tão imponente e relevante que engloba não só as questões físicas, mas, também, as normas e as instituições que se apropriaram da aviação (LIMA e SILVA, 2016).

É útil compreender o Fator Humano como um jogo de interações do coletivo de trabalho, cujas condutas são mutáveis e as atividades exigem além das habilidades técnicas, englobando o conhecimento tácito, astúcia e criatividade (DEJOURS, 2005). Nessa conjuntura, a perspectiva da ergologia possui maior aderência com a contribuição dos Fatores Humanos na aviação.

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O estudo da ergologia considera o princípio de pensar e ver toda atividade como consequência de certa abordagem da atividade humana, formalização de um modo particular de produção de conhecimentos que assenta no diálogo entre os saberes elaborados pelas disciplinas acadêmicas tradicionais e os saberes que os diversos protagonistas das atividades humanas põem em prática na execução da sua atividade (DI RUZZA et al, 2018).

No domínio da aviação, os saberes acadêmicos estão atrelados à prescrição de procedimentos que são fundamentais para criação de barreiras de segurança em toda cadeia. No entanto, as atividades não se tornam imunes a certo grau de imprevisibilidade. Landman et al (2017) destaca que na prática operacional a mera formação teórica pode ser insuficiente durante um evento inesperado, sendo necessário o reenquadramento das habilidades para lidar com tais situações.

Em tal caso, a conscientização da pluralidade característica dos estudos sobre Fatores Humanos, por parte de todas as instituições que compreendem o setor, é determinante para prescrição de métodos preventivos que corroborem com a segurança operacional e reduza os índices de ocorrências aeronáuticas – todo incidente ou acidente envolvendo aeronaves - resultantes da contribuição humana.

4. Fator humano como contribuinte nas ocorrências aeronáuticas

O elemento humano é a parte mais flexível no segmento da aviação, nesse sentido, torna-se a parte mais vulnerável às influências que podem afetar seu desempenho (BESSI, 2018). Não obstante ao incremento na formação técnica, da crescente automação dos procedimentos e da evolução tecnológica das aeronaves, os acidentes continuam a ocorrer, atribuindo, por consequência, maior relevância ao Fator Humano em comparação a confiabilidade dos equipamentos (WEIGMANN et al, 2007; THATCHER e KILINGAR, 2012; BOÂS, 2014;

WOODS et al, 2016;), tornando-os a última linha de defesa do sistema diante das falhas mecânicas.

É importante, no âmbito dos Fatores Humanos, respeitar a necessidade de haver um equilíbrio entre segurança e eficiência e que, ao tentar maximizar a segurança com mais prescrições, a eficiência do sistema não seja comprometida na medida em que não atende completamente todas as interfaces (MORIARTY, 2015). Kanki et al (2010) ressaltam que um ser humano no ato de executar uma atividade, operar equipamentos, não importa quão bem selecionado,

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treinado ou aplicado, o indivíduo está sujeito a limitações que impactam no desempenho do sistema.

Dentre as limitações biológicas do Fator Humano, certas condições patológicas, como ataques cardíacos e distúrbios gastrointestinais, que causam incapacitação repentina e brusca do indivíduo, raramente contribui para ocorrências aeronáuticas. Já a incapacitação total é detectada com frequência e rapidez por outros membros da equipe, enquanto a redução parcial da capacidade - produzido por conjunturas psicológicas e fisiológicas como fadiga, estresse, sono, distúrbios do ritmo, medicação e certas condições patológicas leves - podem passar despercebidas mesmo pelo indivíduo afetado (ICAO, 1998), sendo esta última uma condição de risco potencial durante a execução das operações.

Uma estatística comumente usada é que cerca de 70% dos acidentes de aviação mundial possuem contribuição do Fator Humano (MORIARTY, 2015; ERJAVAC et al, 2018; CHEN e YU, 2018). Dados do Accident Classification Technical Group (ACTG), grupo pertencente ao Safety Group (SG) da International Air Transport Association (IATA) e responsáveis pela analise dos acidentes mundiais, sugerem que o manuseio do piloto e as entradas incorretas de controle de voo representam 34% dos acidentes aéreos da Aviação Civil Comercial ocorridos entre os anos de 2013 e 2017. Como condições latentes, a Supervisão Regulamentar é o principal contribuinte em 33%; seguidos da Gestão da Segurança, 27%; e Operações do voo, 18% das ocorrências (IATA, 2018).

No Brasil, dados resultantes das análises do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA, 2019), autoridade de investigação de acidentes no país, revela que o Brasil mantém um número significativo de acidentes e incidentes na última década (Gráfico 1). No que se refere à análise dos fatores contribuintes, 34% das ocorrências aeronáuticas possuem como área de investigação o Fator Humano; 65% são atribuídas ao Fator Operacional; e apenas 1% corresponde ao Fator Material.

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Gráfico 1 - Ocorrências Aeronáuticas no Brasil nos últimos 10 anos

Fonte: CENIPA (2019)

Cabe explicitar que ambas as abordagens de investigação - Humano e Operacional - envolvem a avaliação do desempenho humano e os aspectos biológicos dos indivíduos durante as análises. O CENIPA apresenta suas áreas de investigação conforme o Quadro 1.

Quadro 1 - Áreas de Investigação do CENIPA

Área de Investigação Descrição

Fator Humano

Refere-se ao complexo biológico do ser humano, nos aspectos fisiológicos e psicológicos que possam ter refletido nas ações da tripulação e demais

pessoas envolvidas no acidente.

Fator Operacional

Refere-se ao desempenho do ser humano na atividade relacionada com o Voo. Inclui as seguintes áreas: meteorologia, infraestrutura, instrução, manutenção, aplicação dos comandos da aeronave, entre outros aspectos.

Fator Material Refere-se à aeronave nos seus aspectos de projeto, fabricação e de manuseio de material.

Fonte: Adaptado do CENIPA (2019)

Dentre os fatores contribuintes, presente em mais de 200 casos investigados nos últimos seis anos, o julgamento de pilotagem lidera as estatísticas. É notável na análise dos dados que os 10 principais contribuintes correspondem a ações que envolvem algum tipo de habilidade e/ou capacidade humana (Figura 1).

É válido considerar, frente aos dados de contribuição do Fator Material nas ocorrências, que os equipamentos não falham sozinhos e observando toda cadeia do setor, como as etapas de

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concepção de tecnologia, desenvolvimento de projetos, manuseio de matérias e produção, o trabalho humano ainda assim pode estar envolvido em algum processo.

Figura 1 - Fatores Contribuintes nas ocorrências Aeronáuticas no Brasil

Fonte: CENIPA (2019)

No tocante ao elevado número de ocorrências aeronáuticas que apresentam condutas humanas como principal contribuinte, as abordagens centradas nos Fatores Humanos buscam minimizar os erros e atos inseguros através do gerenciamento estruturado baseado em estratégias por parte das organizações, ciente de que os Fatores Humanos compreendem a organização e a cultura de segurança além das relações do erro humano individual e a interface operacional homem-máquina (HSU e LIU, 2012; CHEN et al, 2017; CHEN e YU 2018).

Ao encontro dos autores citados acima, Kanki et al (2010) defendem que o erro humano não é a causa de problemas em um sistema que seria seguro, trata-se, na verdade, de um sintoma. É o subproduto de indivíduos que trabalham em equipe tentando obter sucesso em um sistema imperfeito, restrito e com recursos limitados.

Diante do cenário que revela a significativa contribuição do Fator Humano nas ocorrências aeronáuticas (WIEGMANN et al, 2007; KHAROUFAHA et al, 2018; ERJAVAC et al, 2018), a garantia do presente nível de segurança necessita de um maduro gerenciamento de recursos que incidem no adequado compartilhamento de informações entre os profissionais envolvidos nas operações (MARTINS, 2016).

Análises da International Air Transport Association (IATA, 2018) indentificaram que contramedidas sistêmicas e internas à operação, quando adotadas pelos operadores aéreos e normatizadas, seriam eficazes em cerca de 30% das ocorrêcias aéreas que se sucederam entre os anos de 2013 e 2017. Sistemas de gerenciamento da segurança operacional (SGSO),

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Regulamentações, Fiscalização entre outros cuidados, são formas de mitigar a imprevisibilidade inerente ao Fator Humano através da identificação de riscos, monitoramento e avaliação contínua, normatizações e investigações.

5. Considerações finais

Sistemas complexos com múltiplos ativos e recursos que trabalham em conjunto, como a aviação civil, requerem análises que promovam uma visão integrada dos múltiplos fatores que impactam no desempenho eficaz do serviço.

O Fator Humano é uma das variáveis mais sensíveis do sistema, o que é comprovado pelas estatísticas de ocorrências aeronáuticas, onde, apenas no Brasil, o Fator Humano – em sua condição biológica - é contribuinte em 34% dos casos das ocorrências aéreas.

A visão histórica apresentada revela que a aviação é um segmento fundamental para os setores econômico e social dos países, visto que os estudos acerca do indivíduo se destacaram a partir da busca pelo domínio militar durante as Guerras Mundiais. No entanto, ao longo dos anos, o Fator Humano se mostrou imprescindível para a garantia da segurança operacional, requisito básico do setor.

As contribuições de múltiplas áreas do conhecimento são fatores de destaque para o progresso significativo do campo de estudos dos Fatores Humanos na aviação, visto que sua complexidade não se justifica apenas pela natureza do ser, mas pelas condições as quais o indivíduo está exposto.

A otimização do papel das pessoas neste sistema complexo envolve todos os aspectos do desempenho humano, assim como as normativas e estratégias organizacionais. Cabe salientar que, como outros elementos da aviação, é considerável que os Fatores Humanos sejam estudados e/ou adaptados ao país de aplicação em atenção às características ambientais e culturais que são particulares em cada localidade.

A pesquisa contribuiu para evidenciar o papel significativo do homem na aviação civil, fortalecendo a relevância dos estudos sobre os Fatores Humanos, dado o momento em que a automação é considerada o principal recurso para promoção da segurança operacional. A sua ampliação trará a possibilidade de aprofundar o conhecimento sobre os aspectos psicofisiológicos que acometem o Fator Humano devido à natureza da atividade aérea, assim como as medidas que estão sendo desenvolvidas para mitigação dos riscos de falha humana.

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O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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Referências

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