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Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas

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Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas

(Eds.) Mª João Marçalo & Mª Célia Lima-Hernandes, Elisa Esteves, Mª do Céu Fonseca, Olga Gonçalves, Ana LuísaVilela, Ana Alexandra Silva © Copyright 2010 by Universidade de Évora ISBN: 978-972-99292-4-3 SLG 20 – A Língua Portuguesa e os crioulos de base lexical portuguesa.

SOBRE A (IN)EXISTÊNCIA DE ARTIGO EM CABOVERDIANO*

Wânia MIRANDA1

Márcia Santos DUARTE DE OLIVEIRA Ana Paula QUADROS GOMES

RESUMO

A existência de artigos em caboverdiano (Ccv) é controversa. Para Veiga (2002: 68), un é artigo indefinido; para Quint (2000; 188), é um adjetivo indefinido. Defendemos que

un marca individuação: tanto forma NPs denotando um só indivíduo de certa classe (um

exemplar da espécie vaca, em un báka) quanto um comparativo de igualdade, marcando a unicidade do grau de altura atribuído a pessoas distintas (cf. Nhós tem un altura, “Vocês têm a mesma altura”). A unicidade contribuída por un pode ainda vir associada a uma condição ímpar, como em uma bruta sónu (“um baita sono”), em que o grau de sonolência é único por ser excepcional. A nosso ver, os falantes do Ccv, língua que não marca sintaticamente gênero, reanalisaram a morfologia de feminino do português, fazendo de uma um intensificador, de valor expressivo, que aponta para o maior grau. Para Silva (2008: 53), kel é um determinante. Defendemos que kel não se comporta como artigo, pois não prescinde da indicação gestual, não introduz referentes novos no discurso nem pode ser usado em contextos intensionais. Defendemos que não há artigo definido ou indefinido em Ccv. Nos termos do modelo de Princípios e Parâmetros (P & P) da Teoria da Gramática, un e kel não são determinantes, e sim quantificadores.

PALAVRAS-CHAVE

caboverdiano; artigo definido; demonstrativo; intensificador

Introdução: situando o problema

* As autoras agradecem a leitura e os comentários do Prof. Dr. Nicolas Quint e assumem os possíveis erros de interpretação e análise.

1 Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas (DLCV). Av. Professor Luciano Gualberto, 403 – Cidade

Universitária – CEP: 05508-900 – São Paulo, SP – Brasil. Endereços eletrônicos:

(2)

Este trabalho aborda a variedade de Caboverdiano (doravante Ccv) de Sotavento. As análises deste trabalho são resultado de testes semânticos específicos – Miranda & Quadros Gomes (2009). Agradecemos a Francisco Lopes a checagem dos dados. Os possíveis erros de análise são de nossa total responsabilidade.

Discutimos a existência ou não de artigo em Ccv, do ponto de vista semântico, e nos moldes de Princípios e Parâmetros, doravante P & P (cf. Chomsky 1981).

A existência (ou não) de artigos em Ccv permanece controversa. As posições dos autores são vagas ou até mesmo contraditórias. Para Lucchesi (1994), o artigo definido não faz parte da gramática da língua crioula, pelo fato de as línguas de substrato não possuírem artigo. Entretanto, o autor assinala um uso, embora irregular, do pronome demonstrativo como artigo em Ccv. Segundo Lucchesi, em certos contextos fica difícil dizer se kel é demonstrativo ou artigo, dada sua referência definida. Quint (2000; 183) afirma que, apesar de o Ccv não contar com um equivalente do artigo românico, kel tem um tão vasto campo semântico que pode cobrir certas acepções do artigo do português. Já Guimarães Gomes (2001) diz taxativamente que não há artigo definido em Ccv. Manuel Veiga (2002; 67), para quem a classe gramatical artigo não existe em Ccv, analisa alguns empregos de kel como uma manifestação irregular do artigo definido. Silva (2008), para quem não há artigo definido em Ccv, analisa a partícula kel como um determinante.

Por outro lado, a existência de artigo indefinido em Ccv é praticamente uma unanimidade: Lucchesi (1994), Veiga (1995), Guimarães Gomes (2001) e Veiga (2002) estão de acordo quanto a isso. Quint (2000: 187-188) analisa un como adjetivo indefinido possuidor de dois sentidos: um valor de indefinitude e um valor de marcação de identidade. Quint (2003; 2005) aponta o valor enfático de um / uma em Ccv.

A nosso ver, os falantes do Ccv, língua que não marca sintaticamente gênero, reanalisaram a morfologia de feminino do português, fazendo de uma um intensificador, de valor expressivo, que aponta para o maior grau. Essa posição nos leva

(3)

a olhar para un de um novo ângulo. Embora seja homófono do indefinido do português, o un do Ccv pode ser visto como uma marca de individuação: ou da unicidade do grau, nos processos de intensificação, ou do referente, em dada situação. Assim, no caso de

un (Ccv), estamos diante de um modificador de graus ou de um quantificador adverbial,

e não de um determinante, como é o um do português.

Na mesma linha, parece-nos mais apropriado analisar kel como um dêitico (uma pro-forma que faz referência direta a um indivíduo na situação de fala) do que como artigo definido. Como pretendemos mostrar, kel não pressupõe unicidade, nem define a quantidade máxima presente na situação do(s) indivíduo(s) a que se refere, distanciando-se da semântica de um artigo definido. Em termos sintáticos, proporemos que kel não é um determinante, mas um quantificador-D (nominal), ou seja: kel não é o núcleo de uma projeção que toma o NP (sintagma nominal) como complemento, formando um DP (sintagma de determinante).

Em nossa análise, então, não há artigo (seja definido ou indefinido) em Ccv. Seguindo P & P, un e kel não são determinantes, e sim quantificadores.

O artigo está organizado como segue: na primeira seção, discutimos o sintagma nominal em Ccv; na segunda, apresentamos a distribuição e a semântica de un/uma; na terceira, discutimos a distribuição e a semântica de kel; por fim, apresentamos nossas conclusões.

O Sintagma Nominal (NP) em Caboverdiano

Como já apontado por muitos autores, poucos nomes em Ccv trazem morfologia de gênero. A marca de feminino só aparece em alguns nomes com o traço mais animado

(4)

(designando certos animais, como no par kabra/ bódi) ou com o traço mais humano (mininu/ menina2). Em Ccv, não há marcação de gênero nos nomes se estes denotam seres inanimados ou do reino vegetal. Além disso, há indicações de que o Ccv não reconheceu o artigo feminino no português como tal, fundindo-o ao nome e usando o amálgama para nomear o referente (p.ex., azilha é usado como o nome do português “ilhas”, por reanálise do sintagma de determinante “as ilhas”)3

.

Se o gênero é só esporadicamente marcado em Ccv, o que dizer do número? A marca de plural, em português, é a presença do sufixo _s, e a de singular é o morfema zero. Porém, nunca há sufixação da marca de número nos nomes em Ccv, mas há apenas a do elemento que o precede (cf. uns (1b)). Como exemplificado em (1b), adjetivos não recebem marca de número em Ccv, nem mesmo em posição predicativa (1c). A falta de concordância com o adjetivo em posição predicativa e com o verbo (1c) é importante argumento para que a marcação de número em Ccv não seja analisada ao par com certos dialetos do PB, que preferem “as menina bonita” a “as meninas bonitas”. Para o Ccv, não basta dizer que a marca recai apenas sobre um elemento do NP, o determinante, pois isso não explicaria (1c). Em português, a concordância entre o predicado e o sujeito não é facultativa; sentenças como (1c) são muito marginais, ao passo que a redundância na marcação de número em construções como (1b) é opcional, por ser dialetal, em PB. Se a ausência de morfologia no nome e no adjetivo em (1b) resultasse de marcação de número apenas uma vez por NP, seria de esperar que a concordância entre o sujeito e o predicado em (1c) (que é uma sentença completa) ainda fosse requerida, como ocorre em PB, o que não se observa em Ccv. O número não é marcado uma única vez por NP em Ccv, mas uma única vez por sentença. Logo, fatos

2

Em vez de menina, pode-se encontrar em Ccv a variante mininu femia, em que o nome mininu é tratado como substantivo de dois gêneros, tal como, em português, temos cobra macho / cobra fêmea.

3

Tal como aconteceu com o português: em certos empréstimos, como almofada, a cadeia sonora do sintagma de determinante completo do árabe (artigo al + nome) foi reanalisada como um nome comum.

(5)

como (1a/b) não mostram que kel e un(s) sejam núcleos de sintagmas de determinantes, ou seja, não sustentam a análise de kel e un(s) como determinantes iguais a o ou um do português.

(1) (a) kel dós tubu 4

QP dois tubo

“Estes dois tubos”

(1) (b) uns cabalo preto

QP cavalo preto

“Uns cavalos pretos”

(1) (c) uns é bom

QP ser bons

“Uns são bons”

Entretanto, os NPs do Ccv são sensíveis à oposição semântica entre contáveis e massivos5. Pedimos ao informante que considerasse uma situação em que o joelho de João sangrasse. Como sentença dita a João por um colega, (2a) soou perfeitamente natural; mas (2b), com un, causou desconforto (marcamos este fato com #). Já a construção com o cardinal e o nome de massa (2d) foi considerada inaceitável (marcada por *); o informante sentiu a necessidade de um classificador como “pingo” e ofereceu espontaneamente a correção em (2d). Compare-se (2e) a (2b): é a presença de um classificador como “certa quantidade” entre un e sangi que faz a sentença (2e) perfeita.

(2) (a) Odja Djon, sata sai sangi di bo duedju

Olha João PROG sair sangue PREP 2SG.POSS joelho

“Olhe, João, está saindo sangue do seu joelho”

4

Sobre as abreviaturas usadas nas glosas, ver a lista ao final do artigo.

5

Para nossos propósitos, basta assumir que os nomes contáveis têm átomos em sua denotação (sabemos como um indivíduo deve ser para valer por 1 unidade de “menino”; partes isoladas desse indivíduo, como 1 braço, não servem de referência para o nome “menino”); e que os nomes de massa não têm átomos em sua denotação. „Átomos‟ são unidades mínimas, cujas partes não podem servir de referência ao nome (se o conteúdo de 1 balde de 2l for “água”, partes isoladas do conteúdo desse balde, p.ex., a equivalente à capacidade de um copo de 250ml, também serão “água”). A oposição massivo x contável é marcada de maneira variada pela gramática das línguas; em inglês, p. ex., há determinantes especializados em massivos (much water, *much boys) e em contáveis (*many water, many boys). Ver Link (1983).

(6)

(2) (b) #Odja Djon, sata sai un sangi di bo duedju

Olha João PROG sair QP sangue PREP 2SG.POSS joelho

“Olhe, João, está saindo um sangue do seu joelho”

(2) (c) *Odja Djon, sata sai dos sangi di bo duedju

Olha João PROG sair dois sangue PREP 2SG.POSS joelho

“Olhe, João, estão saindo dois sangues do seu joelho”

(2) (d) Odja Djon, sata sai dos pingu sangi di bo duedju

Olha João PROG sair dois pingo sangue PREP 2SG.POSS joelho

“Olhe, João, estão saindo dois pingos de sangue do seu joelho”

(2) (e) Odja Djon, sata sai un bon bokadu di sangi

Olha João PROG sair QP bom bocado PREP sangue

di bo duedju

PREP 2SG.POSS joelho

“Olhe, João, está saindo uma certa quantidade de sangue do seu joelho”

O paradigma em (2) mostra que un só pode se aplicar diretamente a nomes contáveis (cabalo, em (1b)), ficando agramatical com massivos (sangi, em (2b)).

Ainda falando da mesma situação, João chega com o joelho sangrando; sua mãe anuncia a aplicação de um remédio ao machucado, por meio da sentença (3), (4) ou (5):

(3) N sta kaloka um ramedi na bo firida

1SG estar colocar QP remédio PREP 2SG.POSS ferida

„Vou passar un remédio na sua ferida‟

(4) N sta kaloka uma ramedi na bo firida

1SG estar colocar IntP remédio PREP 2SG.POSS ferida

„Vou passar uma remédio na sua ferida‟

(5) N sta kaloka uma baita ramedi na bo firida

1SG estar colocar IntP baita remédio PREP 2SG.POSS ferida

„Vou passar uma baita remédio na sua ferida‟

As sentenças de (3) a (5) são bem formadas e estão ordenadas em escala de intensidade. Ramedi, acima, se comporta como um tipo (Kind6): em (3), o informante entende que uma espécie de medicamento vai ser aplicada ao ferimento. Não se trata de uma porção de tamanho definido nem de unidade fixa; não há requerimento de que a quantidade de remédio seja grande; nem o falante de (3) se compromete com a qualidade do remédio. Entretanto, o informante nos previne de que dizer (4) é

6

Tipo (Kind) é a referência a uma (sub)espécie, e não a um particular, como a dos NPs “vinho tinto” (diferente de “vinho branco”) e “cachorro” (em oposição a “Totó” ou a “este cachorro”) – ver (Carlson: 1977).

(7)

apropriado apenas no caso de o remédio em questão ser muito eficaz, ou de ser aplicado em muita quantidade. A sentença (5) enfatiza ainda mais a eficácia do remédio: (5) é feliz se o remédio aplicado for ainda mais eficaz que em (4). Interessantemente, o efeito curativo é um componente desse significado intensificador de uma. Segundo o informante, uma sukri (uma açúcar) não é aceitável, mas uma ramédi sim. Isso mostra que não há como engrandecer a eficácia de um tipo de açúcar, comparada à de outro.

A expressão un arós (um arroz) é mal formada, mas un gram de arós (um grão de arroz) e un masam (uma maçã) são bem formadas. Isso sugere que un funcione como um cardinal: não se podem contar diretamente nomes de massa, como arós, sem a intermediação de um classificador (compare-se, em português, 3 maçãs a *3 ares)7. Em línguas românicas, o indefinido singular e o cardinal 1 têm a mesma forma (um, em PB); em inglês, o artigo indefinido é a e o cardinal, one. Uma hipótese comum é a de que, em línguas como o português, o indefinido tenha sido derivado a partir do numeral. A existência de uns em Ccv permite pensar que o mesmo processo, de transformação do cardinal em indefinido singular, esteja em curso8. A forma uma do Ccv certamente não tem o significado do gênero do português, mas o de uma expressão de grau, que pode se aplicar à quantidade (muito remédio) ou à qualidade (alta eficácia do remédio).

A sentença (4) já marca grau alto; a (5) tem um reforço desse grau (baita), como fazem bem/muito em PB. Determinantes, como o indefinido um/uma do português, não têm interpretação de grau como a de uma (Ccv), exemplificada em (4)9. Isso mostra que a posição sintática de uma tem de ser diferente da de um determinante. Os próprios

7

Ver nota 3. Cardinais só se aplicam diretamente a nominais com átomos em sua denotação. Cardinais só se aplicam a nomes de massa mediante recursos como classificadores, que criem unidades de medida atômicas: “3 tanques de ar” versus *“3 ares”.

8

Presentemente, em Ccv, a idéia de cardinalidade ainda está muito fortemente arraigada a un. No futuro, é possível que a idéia de indefinitude suplante a de cardinalidade. Por ora, é certo que a palavra un carrega a morfologia de número do sintagma nominal na sentença.

9

A não ser em contextos marcados pela incompletude da sentença e por prosódia muito especial, de foco, denunciado a presença de um adjetivo de grau não-pronunciado: “A Maria comprou UM carro…”

(8)

cardinais são analisados na literatura como adjetivos10. O grau máximo, expresso por superlativos, é único: só pode haver um melhor e um maior em cada conjunto de indivíduos. Logo, é defensável que o Ccv não tenha determinantes, embora o un do Ccv tenha traços semânticos em comum com determinantes: a unicidade associada ao artigo definido e ao cardinal 1. Sobre uma, nossa hipótese é a de que o vocábulo não marque gênero, mas grau. Em português, a diferença entre um/ uma é de gênero: “um dia”, “uma festa”, mas caboverdiano não tem gênero. Uma só pode ser usado em contextos em que usamos morfologia de grau em português, como mostraram os testes. Por exemplo, num contexto em que José foi à festa, mas Pedro não, para contar a Pedro que nenhuma menina na festa era mais bonita que Maria, José diz:

(6) N Ø konxi uma minina oxi!

1sg PFV conhecer IntP menina hoje!

‘Conheci UMA menina hoje!’

Para qualificar o carro de João como especial, Pedro pode dizer:

(7) Djon ten uma káru!

João ter IntP carro

„João tem uma carro!‟

Porém, se João tiver mais de um carro, (7) só será adequada caso o discurso saliente um entre os carros de João. Uma pode predicar de certo indivíduo em destaque no conjunto. Digamos que falante e ouvinte saibam que João tem 3 carros velhos, e um novo, 4X4; então a sentença (7) é adequada para falar desse único carro especial.

Mais detalhes sobre o licenciamento de Um/ Uma (Ccv)

10

Uma sentença do PB como “As 3 meninas entraram” pode ser analisada como “entraram as meninas e elas eram 3”, ao par com “As lindas meninas entraram”: “entraram as meninas e elas eram lindas”.

(9)

É importante salientar que, para empregar uma, não basta a referência a uma entidade de certa natureza existente na situação. Se houver uma dúzia de ovos na cesta, desde que um seja muito grande, e os outros, de tamanho padrão, Maria poderá dizer:

(8) Tene uma óbu na póti nhu pega!

Ter IntP ovo PREP pote POSS.2SG pegar!

„Tem UMA ovo na cesta! Pegue!‟

Porém, se nenhum ovo se sobressair, (8) não poderá ser usada. Então, para instruir a retirada de um único ovo da cesta, em lugar de (8), Maria terá de usar (9):

(9) Tene un óbu na póti Nhu pega!

Ter QP ovo PREP pote POSS.2SG pegar!

‘Tem UN ovo na cesta. Pegue!‟

Un em (9) pode ser usado quando há mais de um indivíduo da mesma natureza na

situação (diversos ovos), mesmo que nada distinga um do outro, tal como “um” em PB. O licenciamento de uma em Ccv não ocorre nessas condições (8). Mas, em português, podemos usar “uma” para falar de uma laranja qualquer de certa dúzia.

Vê-se que, em Ccv, uma não é o feminino nem a contraparte de un. Uma (Ccv) não pode modificar todos os tipos de nome que un modifica. Uma modifica qualquer contável. Massivos, apenas quando se tratar de uma quantia exorbitante. Dado que João

rotineiramente põe seu salário numa gaveta, a sentença (10) é inadequada como

resposta ao pedido da mulher por trocados para a compra do pão de todo dia:

(10) #Tene uma dineru na gaveta. Nhu pega!

Ter IntP dinheiro PREP gaveta POSS.2SG pegar!

Tem UMA dinheiro na gaveta. Pegue!‟

Porém, uma quantia inesperadamente alta viabiliza o uso de uma. Digamos que João escondeu em segredo uma soma incomum na gaveta. Sua mulher, achando tanto dinheiro ali, pode expressar sua surpresa por meio da sentença (11):

(10)

(11) Nhas prubulema dja kába! Ten uma dinheru na gaveta

1P.POSS problema ASPA acabar! Ter IntP dinheiro PREP gaveta!

‘Meus problemas terminaram! Tem UMA dinheiro na gaveta!‟

Se, com nomes de massa, uma pode expressar uma soma grande, por outro lado

uma não modifica naturalmente qualquer “substantivo abstrato”. “Uma pena”, “uma

riqueza” não são bem formados com uma em Ccv. Entretanto, é possível usar (12) ou (13), desde que a fé ou a dor do indivíduo sejam excepcionalmente desmedidas:

(12) E ten uma fé!

3SG ter IntP fé!

„Ele tem UMA fé!‟

(13) E ten.ba tene sta ku uma dor

3SG ter.PST ter estar PREP IntP dor

„Ele teve/ tem/ está com UMA dor!‟

Por outro lado, nem (14a) nem (14b) podem expressar que se trata de um grande problema; a presença de um adjetivo é necessária, como em (14c); ou é preciso que a morfologia de grau seja afixada ao nome (14d), criando a forma preferida:

(14) (a) *E ten uma prubulema ‘Ele tem um grande problema.‟ (14) (b) *E ten un prubulema

„Ele tem UM problema!‟

14) (c) E ten uma prubulema grandi

3SG ter IntP problema grande

„Ele tem UMA problema bem grande.‟

14) (d) E ten um problemona

3SG ter QP problemão

„Ele tem um problemão!‟

Observe-se que a morfologia de grau em Ccv (14c) também é veiculada por _a, em português associada à morfologia de gênero feminino. Uma (Ccv) denota intensidade: faz referência a algo excepcional; sua utilização indica intenção de distinguir o indivíduo a que se refere; a própria entonação do item uma na fala é diferente. O fato de

(11)

se poder fazer referência a um dinheirão com uma dinheru e não a um problemão com

uma prubulema sugeriria que só avaliações positivas pudessem ser veiculadas com

uma; mas uma dor não se encaixa nessa teoria. O licenciamento de uma (Ccv) parece

depender mais de uma superação da expectativa do falante. Um problema grande não é exatamente algo inesperado, embora não seja bem-vindo; uma dor grande, além de não ser bem-vinda, não faz parte da rotina. Isto é, não basta o referente ser uma soma grande; é preciso ele ser incomum, diferente, em tamanho ou em outra dimensão ou propriedade, para que o nome possa ser modificado por uma.

Uma vez que, como argumentamos, uma é um operador que marca o caráter excepcional de um referente, quanto ao grau extremado de certa qualidade ou dimensão que o destaca; e, dado que un é o cardinal, em Ccv os nomes podem ser analisados como “nus”, isto é, sem determinante vozeado, mesmo em posição argumental. Em inglês e PB, apenas NPs com determinante abertamente realizado podem ocupar a posição de sujeito de sentenças eventivas – ver (15b-c)11. Em Ccv, a posição argumental pode ser ocupada por sintagmas nominais modificados (nome nu + adjetivo), sem determinante:

(15) (a) Cidade Velha e bersu nos país

cidade velha ser berço poss país

„A Cidade Velha é o berço de nosso país‟ (O.k. sem determinantes)

(b) *Cidade velha é o berço de nosso país (agramatical sem determinantes; compare-se a: “A/ aquela/ esta/ cidade velha é o berço de nosso país”)

(c)*Old city is the crib of our country (agramatical sem determinantes; compare-se a: “The/ this old city is the crib of our country”)

11

Sentenças eventivas descrevem um evento, que até pode ser localizado em um lugar e momento. Compare-se (i) “esse ônibus passou há 10 min” a (ii)*“ônibus passou há 10 min”; a versão (ii) não é uma boa forma de descrever a passagem específica de certo veículo por certo local em dado momento. Eventivas opõem-se a estativas, que descrevem estados, às vezes, até atemporais, como “a hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos” ou “a água é líquida”.

(12)

São raras as línguas que permitem nomes nus em posição argumental, sobretudo na posição de sujeito de sentenças eventivas, como o Ccv – ver (15a). Em P & P, um determinante nulo é postulado para nomes nus que ocupam posição argumental. Assume-se que o sintagma nominal máximo sempre traz seu especificador preenchido, mesmo que o material que ocupa essa posição seja não-pronunciado, como em Ccv. A função desse determinante silencioso é ancorar o sintagma nominal para torná-lo capaz de fazer referência a entidades existentes na situação descrita pela sentença. Nas línguas em que um determinante pronunciado é exigido em nominais que ocupam a posição de sujeito de sentenças eventivas, nus podem ocupar a posição de sujeito de sentenças genéricas, como “cidades velhas costumam seguir tradições” ou “cidades velhas são chatas”. Uma vez que Ccv permite nomes nus nessa posição, é inegável que o nome nu

cidadi em “Cidadi Velha” pode fazer referência a San Lorensu; isso implica que, na

sintaxe não-visível, há um elemento ancorando o sintagma nominal na situação, e devemos entender “Cidadi Velha” em (15) como “ Cidadi Velha”. Isso significa que a posição de um/ uma/ kel tem de ser outra, distinta da de determinante, localizada acima do DP: a posição reservada por P & P a quantificadores como “every” (inglês) e “cada” (PB).

Na próxima seção, discutiremos kel.

Kel e a expressão da dêixis nominal em Ccv

Para alguns autores, kel cobre certos usos do artigo definido em Ccv. Uma unanimidade na análise do artigo definido é que ele pressupõe a unicidade e maximalidade: “a cadeira da sala” só é feliz se houver uma única cadeira na sala; “o

(13)

leite” é a maior soma de leite existente na situação, e “as cadeiras”, a maior soma de cadeiras existente na situação. A diferença entre o artigo definido e o pronome aquele em PB está no requerimento da unicidade/maximalidade: havendo um grupo de meninos na situação, e apontando para um menino em meio a outros, pode-se usar

aquele, como em “aquele menino perguntou por você”, mas não o artigo definido, como

em “o menino perguntou por você”. Entretanto, quando não se está fazendo referência a entidades presentes na situação, e sim a entidades mencionadas no discurso, o pronome demonstrativo concorda com seu antecedente em número e gênero, em português.

O PB está perdendo a oposição entre este, esse e aquele, como anáfora discursiva ou como dêitico. A oposição em PB ficou dual: este/ esse foram assimilados (para retomar o último elemento mencionado ou a entidade mais próxima do falante) e se opõem a aquele, usado para mencionar o elemento mais anterior no discurso ou a entidade mais distante do falante. Ccv também tem uma oposição dual, entre kel e es, mas a distribuição de ambos segue razões aspectuais, e não simplesmente a distância entre a referência e o falante ou a ordem de menção. Por exemplo, não se pode falar de uma viagem futura com kel viáxi; a forma que soa natural para o falante é es viáxi:

(16) (a) *Kel viáxi ta ba ser mutu bom.

„KEL viagem vai ser ótima‟

(16) (b) Es viáxi ta ba ser mutu bom

DP viagem HAB ir ser muito bom

„ES viagem vai ser ótima‟

Por se tratar de uma viagem que ainda não se realizou, o uso de kel nesse contexto é inadequado. Pela mesma razão, (17) é mal formada na opinião do falante:

(17) *Bo kré bai ku me na kel viáxi, Joana?

(14)

Entretanto, o informante acrescenta que, caso a viagem tenha sido suficientemente mencionada, se for o cerne da conversa, a aceitabilidade das sentenças (16a) e (17) melhora consideravelmente. Essa observação é importante porque a literatura semântica divide os determinantes entre aqueles que têm a função de introduzir um novo referente no discurso, como o indefinido um do português (“Um menino entrou”, “Preciso de um táxi”) e aqueles que têm a função de retomar um referente já introduzido no discurso (“Um menino e uma menina entraram. O menino se sentou.”/ “Chamou um táxi? O táxi está aqui.”) ou cuja existência já é de conhecimento comum para o falante e o ouvinte12

. Daí propormos que o Ccv é sensível à novidade do referente no discurso; mas a polarização se dá entre kel e es, não entre un e kel. Aparentemente, es é neutro quanto ao referente ser novo no discurso, ou exige qualquer grau de familiaridade, mas kel exige alta familiaridade. Um exemplo interessante: alguém, vendo a macieira carregada, pede autorização para colher uma maçã (18a), e recebe a resposta em (18b):

(18) (a) N ta podi pega um masam na árvi

1SG HAB poder pegar QP maçã PREP árvore

„Posso pegar uma maçã na árvore?‟

(18) (b) Podi si

Poder sim

Nhu Ø pega kel ki bo Ø átcha más bunitu.

POSS.2SG PFV pegar QP DP 2SG PFV achar mais bonito

„Pode, sim. Pegue KEL que você achar mais bonita‟

Observe-se que a autorização obtida é para apanhar um único fruto, à escolha da pessoa. Para escolher, um conjunto de maçãs terá de ser examinado, garantindo a familiaridade. Abaixo, há duas versões para o ditado “quem tudo quer, nada tem”:

(19) (a) Kenha ki Ø kré tudu náda ka Ø ten

Wh CP PFV querer tudo nada NEG PFV ter

„Quem quer tudo nada tem.‟

12

P.ex., um aluno para o outro, interrompendo uma conversa porque a aula vai começar: “Depois eu te conto o resto. A professora chegou.” Nesse contexto, “uma professora chegou” é inaceitável, visto que quem chegou é a encarregada da aula por começar.

(15)

(19) (b) Kel ki ta kré tudu ka ta Ø ten náda

QP CP HAB querer tudo NEG HAB PFV ter nada

„Aquele que quer tudo não tem nada‟13

A versão em (19a), um período composto, não traz kel; a referência às pessoas que tudo querem é feita pelo pronome Wh kenha. Em (19b), o sujeito da principal composto por kel (sem nome) é uma relativa. Observe-se que, em PB, uma descrição definida genérica não pode aparecer sem seu núcleo (*“a que quer tudo não tem nada”, em comparação a “a pessoa que quer tudo não tem nada”), com o sentido de (19b). Sem núcleo, o demonstrativo é natural em PB (ver a glosa de (19b)). Logo, kel não tem a distribuição de artigos definidos do português, mas a de pronomes demonstrativos. Kel também não é um pronome interrogativo, como atestam os exemplos abaixo:

(20) (a) #Kel e bo karu?

QP ser 2SG.POSS carro

„Kel é o seu carro?‟ (*Qual é o seu carro?/ o.k. para “Aquele é o seu carro?”)

(19) (b) *Kel e bo sarabedja ki bo gosta más?

QP ser 2SG.POSS cerveja CP14 3SG.POSS gostar mais

*„Kel é a sua cerveja preferida?

(19) (c) *Kel e bo mina?

QP ser 2SG.POSS menina

„Kel é sua namorada?(*Qual é a sua mina?/ o.k. para “Aquela é a sua mina?”)

Como se vê, kel não faz o mesmo que o pronome interrogativo “qual” do português; ou seja, não serve para interrogar constituintes, ainda que haja mais de um referente na situação que possa servir de resposta. Mas o resultado dos testes aponta que as perguntas em (20a) e (20c) são bem formadas como perguntas de sim/não, em que quem indaga aponta gestualmente para um entre vários carros estacionados ou para uma entre diversas meninas que estão em seu campo visual. Esses fatos levam à classificação de

kel como um pronome demonstrativo, e não como um artigo definido. As restrições à

13

Ka é uma partícula de negação em Ccv; aqui há uma dupla marcação da negação, com valor semântico de uma só negação lógica, como nos casos de concordância negativa em PB: “eu não tenho nada”.

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Assumimos „Ki‟ como uma partícula funcional; e não podemos aqui nos aprofundar nos motivos, sob pena de fugir ao escopo deste artigo.

(16)

distribuição de kel (não pode ser usado em perguntas de constituintes ou em condicionais e soa estranho na descrição de eventos que ainda não existem, como uma viagem futura, requerendo muita contextualização e detalhamento da viagem para ficar mais aceitável) o distinguem de um artigo definido. O artigo definido pode ser usado na descrição de eventos futuros/ hipotéticos, como em “a viagem que pretendemos fazer”.

Kel não pode ser usado em contextos intensionais15. Supondo que Maria tenha

sido assassinada, a sentença (21a) só será feliz se dita por quem já sabe a identidade do assassino. Kel não pode ser usado para criar a referência “o assassino de Maria, seja ele quem for” e predicar sobre ele, taxando-o de insano. Se o falante souber que o assassino foi o João, pode mostrá-lo ao ouvinte, apontando gestualmente para ele, e enunciar (21b). Sem que o falante tenha João em seu campo de visão, só (21c/d) são apropriadas.

(21) (a) Kel ómi ki Ø máta Maria é dodu

QP homem CP PFV matar Maria ser doido

„Aquele homem que matou Maria é insano' (21) (b) Djon kel ki Ø máta Maria

João QP CP PFV matar Maria

„O João [é] aquele que matou Maria‟

(21) (c) Kel dódu ki Ø máta Maria é Djon

QP doido CP PFV matar Maria ser João

„O doido que matou a Maria é o João‟

(21) (d) Djon kenha ki Ø máta Maria

João Wh CP PFV matar Maria

„O João foi quem matou Maria‟

Os exemplos mostram que a dêixis é inerente ao uso de kel. E mais: que kel só faz referência a indivíduos presentes no campo de visão do falante no momento de enunciação, com acompanhamento de indicação gestual. Ou, se tanto, kel pode predicar de referentes previamente existentes no momento de fala, mas kel não pode fazer

15

Em contextos extensionais, o que importa é o indivíduo no mundo apontado pela descrição. Nos intensionais, expressões com o mesmo referente não são permutáveis, por envolverem crenças, mundos possíveis ou tempos distintos. Há contextos em que “o atual presidente do Paraguai” e “o bispo católico” apontam para Fernando Lugo; mas, se substituirmos a primeira descrição pela segunda, na sentença “o atual presidente do Paraguai é laico”, acabaremos com uma contradição (#“O bispo católico é laico”). Isso ocorre porque Lugo é bispo numa época e é presidente em outra.

(17)

referência a entidades hipotéticas ou ainda não existentes. Daí o problema com a descrição de entidades situadas no futuro e com imperativos. Kel também não pode introduzir uma entidade nova no discurso, mesmo que seja através de descrições definidas abstratas (como em português fazemos tranquilamente, tal como em “aquele que fizer 13 pontos na loteria será milionário”). Por exemplo, se o falante acabou de descobrir a identidade do assassino de Maria, mas João não está à vista, ele não pode pronunciar (21a/b) para dividir seu conhecimento com o ouvinte. Se ainda desconhecer a identidade do criminoso, o falante terá de usar (21d) ou (21c), e esta última sentença apenas no caso de falante e ouvinte já terem estabelecido anteriormente que ambos consideram insano quem quer que seja o assassino de Maria. A sentença (21c) é licenciada pelo fato de o juízo compartilhado por ouvinte e falante a respeito do assassino já ser familiar, o que é expresso na língua pela modificação do adjetivo doido, e não de um nome por kel. A sentença é uma equativa16, e o predicado está invertido com o sujeito. No caso de se referir a um grupo de pessoas que não está avistando, o falante pode usar (22a), mas não (22b), para informar o ouvinte de que todos os membros do grupo são procedentes de Cabo Verde:

(22) (a) Tudu es é di Kabu Verdi

Todos 3P ser PREP Cabo Verde

„Todos eles são de Cabo Verde‟

(22) (b) *Tudu kel é di Kabu Verdi

Todos QP ser PREP Cabo Verde

„*Todos aqueles são de Cabo Verde‟

Para generalizar sobre a paixão brasileira por futebol, as formas (23a/b) podem ser usadas, mas (23c) não. Entretanto, se o falante se refere a uma marca ou tipo de

16

Sentenças equativas são aquelas em que o referente do sujeito é identificado com o referente do predicado verbal (p.ex.: “A estrela D‟alva é a estrela Vésper”); em PB e em inglês, usa-se a cópula ou um verbo de ligação (“ser”/ “estar” / “to be”).

(18)

vinho que já experimentou, ao encontrar outra instanciação (uma nova garrafa) desse mesmo vinho, pode usar kel, como em (24).

(23) (a) Tudu kenha é brasileru ta gosta di futibol

Tudo Wh ser brasileiro HAB gostar PREP futebol

„Tudo que é brasileiro gosta de futebol‟

(23) (b) Tudu brasileru ta gosta di futibol

Todo brasileiro HAB gostar PREP futebol

„Todo brasileiro gosta de futebol‟

(c) * Tudu kel brasileru ta gosta di futibol *„Todo aquele brasileiro gosta de futebol‟

(24) Kel vinhu franses é bon

QP vinho francês ser bom

„Aquele vinho francês é bom‟

Como vimos, os requerimentos para o licenciamento de kel o distinguem tanto do artigo definido quanto do demonstrativo do PB “aquele”. Os dois itens do português podem ser usados em contextos intensionais, em construções genéricas e sem que o referente esteja no campo visual do falante.

Comentários Finais

Os dados corroboram a inexistência de determinantes pronunciados em caboverdiano. Mostramos que a categoria número nominal só é realizada morfologicamente uma vez por sentença (e não uma vez por sintagma nominal) em Ccv. Os nomes do Ccv, sem qualquer partícula e sem kel/un/uma, podem ocorrer em posições argumentais, como discutimos nas duas primeiras seções (vide ex. 15). Isso mostra que (i) os nomes nus do Ccv são sintagmas nominais plenos; (ii) a utilização de

kel/un/uma pelos falantes de Ccv é guiada por razões discursivas, e não sintáticas; (iii)

un marca individuação e unicidade e só modifica diretamente nomes contáveis, assim

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nominal a uma quantidade específica, a equivalente a uma unidade (um átomo ou indivíduo); (v) uma também marca unicidade, mas de grau, fazendo intensificação. Em Ccv, a distinção feminino x masculino aparece só em (alguns) dos sintagmas nominais com os traços [+ animado] e [+ humano]. Essa língua não marca sintaticamente gênero. A morfologia de feminino do português uma foi reanalisada e é utilizada em Ccv com valor expressivo, apontando para o maior grau.

Kel não se comporta como artigo, apesar de contribuir com a especificidade, mas

como um dêitico dependente da situação ou do discurso: requer a presença do referente no campo visual do falante, requer indicação gestual e não pode ser usado para generalizar, ou para criar ou introduzir um novo referente, funções triviais de artigos definidos. Nos termos de P & P, um, uma e kel não são determinantes, e sim quantificadores, ocupando uma posição sintática mais alta que o artigo definido em PB.

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(20)

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VEIGA, M. O Caboverdiano em 45 lições. Praia: INIC, 2002.

ABREVIATURAS USADAS EM GLOSAS NESTE TRABALHO: [1SG/2SG/3SG] – 1ª./2ª./3ª. pessoa do singular;

[1P/2P/3P] – 1ª./2ª./3ª. pessoa do plural; [ASPA] – aspecto atual;

[CP] – complementizador [HAB] – aspecto habitual; [IntP] – sintagma intensificador; [NEG] – partícula de negação; [PFV] – perfectivo

[PREP] – preposição; [POSS] – possessivo;

[PROG] – progressivo (aspecto); [PST] – passado

[QP] – sintagma quantificador; [RELPRON] – pronome relativo; [Wh] – pronome interrogativo.

Seguimos: BICKEL, B.,COMRIE, B., HASPELMATH, M. The Leipzig Glossing

Rules: Conventions for interlinear morpheme-by-morpheme glosses.

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