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Competências e habilidades de leitura no Ensino Fundamental II: um estudo sobre a multimodalidade na Prova Brasil.

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

Homero Lourenço Gomes

COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE LEITURA NO ENSINO FUNDAMENTAL II: UM ESTUDO SOBRE A MULTIMODALIDADE NA PROVA BRASIL

Mariana 2019

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Homero Lourenço Gomes

Competências e habilidades de leitura no Ensino Fundamental II: um estudo sobre a multimodalidade na Prova Brasil

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação, Mestrado em Educação, do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação.

Linha de Pesquisa: Práticas Educativas, Metodologias de Ensino e Tecnologias da Educação.

Orientador: Prof. Dr. Hércules Tolêdo Corrêa

Mariana

Universidade Federal de Ouro Preto 2019

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Célia e Antônio pelo afeto e pela vida. Às minhas irmãs Lili e Carol pelo cuidado e carinho que sempre tiveram comigo. À minha amada sobrinha Emília. Às minhas tias Apparecida, Carminha e Rosa pelo zelo e pelo carinho tão materno. Ao Luiz pelo cuidado comigo, com toda a minha família. Ao Thiago pela paciência. Aos professores do Colégio de Aplicação João XXIII e aos grandes amigos feitos lá que estão comigo até hoje. Aos meus amigos de infância que conheci no Granbery. À Mari, minha amiga e companheira de faculdade. Aos olhares cuidadosos de Lorena, Pri e Andreza. Ao Hércules, meu orientador, pela acolhida, generosidade, confiança, constante bom humor, principalmente por ser responsável pelo constante crescimento de meu letramento acadêmico. À banca examinadora por aceitar a contribuir com este trabalho: Suzana, que me acolheu e indicou com muito cuidado importantes leituras para o crescimento do meu projeto de pesquisa; e Prazeres, que fez parte da minha formação como professor e orientador na graduação e me ensinou muito a respeito da docência e da leitura. À Érika, minha primeira orientadora de pesquisapelos apoios e incentivo constantes enquanto eu era apenas um adolescente do C. A. João XXIII. À Universidade Federal de Ouro Preto, à secretaria, aos professores e aos colegas de turma do programa de Pós-graduação em Educação pela formação e pelo apoio. À FAPEMIG, pela concessão da bolsa.

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RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivoanalisar as competências e habilidades de leiturade textos multimodais de alunos do Ensino Fundamental II de uma escola da rede pública municipal da Região dos Inconfidentes-MG. Analisamos, a partir de um estudo dos itens de Língua Portuguesa da avaliação em larga escala Prova Brasil, os seguintes objetivos específicos: a influência dos conteúdos verbais e não verbais na compreensão dos textos que apresentam dois modos de linguagem; a influência do modo de apresentação (reprodução) dos itens (cor, preto e branco, negritos, itálicos etc.), sobretudo na compreensão dos itens; e, por fim, as estratégias utilizadas poralunos da rede municipal de ensino da cidade de Itabirito para responder os itens mais marcadamente multimodais. A abordagem qualitativa deu-se pela possibilidade de se utilizar mais de um método para a coleta de dados como a pesquisa documental, a fundamentação teórica e o contato entre pesquisador e objeto, por meio da pesquisa de campo. Como referenciais teóricos, fundamentamo-nos nos conceitos: competências e habilidades de leitura a partir de Perrenoud (1986), Allessandrini (2002), Mello (2003), Ronca (2003), Sacristán (2011); análises multimodais a partir deKoch (1996), Leal e Melo (2002), Kress (2003), Kleiman (2004), Jewitt (2005), Street (2009); multiletramentos e leitura a partir deTfouni (1995),Marcuschi (2003), Goulart (2006), Cope eKalantzis (2008), Corrêa (2008), Rojo (2009), Soares (2009), Elias e Koch (2011),Coscarelli (2012), Street (2014), entre outros também relevantes para o estudo. Como resultado, no que tange à multimodalidade, o nível da prova é variável e não é condicionado pelas imagens ou pelos textos não verbais, mas pelo que é explorado tanto nas imagens como no texto verbal. Os itens não extrapolam os textos apresentados na prova e possibilitam poucas reflexões. Com isso, conclui-se que o estudo serviu para confirmar a necessidade de uma abordagem pedagógica nova, inclusiva e que, sobretudo, ofereça ao ser em letramento um instrumento que o capacite a compreender a si e o mundo, de forma a tentar equilibrar uma hierarquia educacional que impera socialmente e só reforça o elitismo na sociedade. Este estudo perpassa por estudos que contemplem os contextos cognitivos, linguísticos e sociais envolvidos no ato de compreensão dos significados e no estabelecimento de um caminho que procure aliar a teoria à realidade das escolas brasileiras. A pesquisa realizada com alunos de de 9º ano permitiu verificar algumas estratégias utilizadas para responder aos itens e traçar alguns contornos da realidade escolar brasileira. Além disso, o estudo traz abordagens que entram em contato com a escola, o aluno, a estrutura, sendo capaz de dialogar também com a educação pública brasileira e seus desafios frente a antigas práticas de ensino, mantenedoras de estruturas já observadas na realidade fora das escolas.

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RÉSUMÉ

La présente recherche a pour but d'analyser les compétences et les habiletés en lecture de textes multimodaux des élèves de l’ Ensino Fundamental II d’une école publique de la région des Inconfidentes-MG. Nous avons analisé, d'après une étude des items de langue portugaise de l'évaluation en grande échelle Prova Brasil, les objectifs suivants: l'influence des contenus verbaux et non verbaux dans la compréhension de textes qui présentent deux modes de langage; l'influence des formes de présentation (réproduction) des items (colorés, noir et blanc, italiques, gras etc.) dans la compréhension des items et, enfin, les stratégies utilisées par les élèves du réseau d'enseignement de la ville Itabirito pour répondre aux items marqués de façon multimodale. L'approche qualitative a été possible grâce à la possibilité d'utilisation de plus d'une méthode de collecte de données comme la recherche documentaire, la fondamentation théorique et le contact entre le chercheur et l'objet à travers la recherche sur le terrrain. Comme référenciation théorique nous avons été embasés sur les concepts: compétences et habiletés en lecture de Perrenoud (1986), Allessandrini (2002), Mello (2003), Ronca (2003), Sacristán (2011); analyses multimodales de Koch (1996), Leal e Melo (2002), Kress (2003), Kleiman (2004), Jewitt (2005), Street (2009); "alphabétisation" et lecture de Tfouni (1995), Marcuschi (2003), Goulart (2006), Cope e Kalantzis (2008), Corrêa (2008), Rojo (2009), Soares (2009), Elias e Koch (2011), Coscarelli (2012), Street (2014), parmi d'autres auteurs aussi pertinents pour l'étude. Comme résultat, par rapport à la multimodalité, le niveau de l'examen est variable et non conditionné par les images ou par les textes non verbaux mais il est conditionné par ce qui est exploré dans les images et le texte verbaux. Ainsi, on a conclu que l'étude confirme le besoin d'une approche pédagogique nouvelle, inclusive et qui offre les outils de formation pour la compréhension de soi-même et du monde, de façon a équilibrer une hiérarchie éducative qui domine la societé et renforce l'élitisme. Cette étude passe a travers les études qui contemplent les contextes cognitifs, linguistiques et sociaux impliqués dans l'acte de la compréhension des significations et dans l'établissement d'un chemin qui cherche allier la théorie à la réalité des écoles brésiliennes. La recherche réalisée auprès des élèves d'un même niveau a permis vérifier certaines stratégies utilisées par eux pour répondre aux questions et décrire quelques aspects de la réalité éducative brésilienne. En plus, l'étude apporte des approches qui ont un lien avec l'école, l'élève, la structure et qui sont capables de dialoguer avec l'éducation publique brésilienne et ses défis par rapport aux anciennes pratiques d'enseignement qui gardent des structures observées dans la réalité hors des écoles.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Constituição da Competência ... 20

Figura 2 - Processamento Linguístico. ... 30

Figura 3: Item 1 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 84

Figura 4: Itens 2 e 3 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 85

Figura 5: Item 3 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 86

Figura 6: Item 4 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 87

Figura 7: Item 5 e 6 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 88

Figura 8: Itens 7, 8 e 9 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I)... 89

Figura 9: Item 10 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 90

Figura 10: Item 11 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 91

Figura 11: Item 12 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 91

Figura 12: Item 13 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco I) ... 92

Figura 13: Item 1 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 93

Figura 14: Item 2 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 93

Figura 15: Item 3 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 94

Figura 16: Item 4 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 95

Figura 17: Itens 5, 6 e 7 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 96

Figura 18: Item 6 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 97

Figura 19: Item 7 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 97

Figura 20: Item 8 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 98

Figura 21: Item 9 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 98

Figura 22: Item 10 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 99

Figura 23: Item 11 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 100

Figura 24: Item 12 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 101

Figura 25: Item 13 Prova Brasil Língua Portuguesa (Bloco II) ... 102

Figura 26: Gênero, tipo textual e abordagem dos itens ... 108

Figura 27: Respostas dos alunos referentes ao item 11 ... 111

Figura 28: Gráfico item 11 – Grau de dificuldade... 114

Figura 29: Respostas dos alunos referentes ao item 12 ... 114

Figura 30: Gráfico item 12 – Grau de dificuldade... 115

Figura 31: Item 12 – Alternativas marcadas ... 115

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Figura 33: Respostas dos alunos referentes ao item 13 ... 118 Figura 34: Gráfico item 13 - Grau de dificuldade ... 119

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Tópico I. Procedimentos de Leitura ... 70

Quadro 2: Tópico II. Implicações do Suporte, Gênero e/ou Enunciador na Compreensão do Texto ... 70

Quadro 3: Tópico III. Relação entre Textos ... 70

Quadro 4: Tópico IV. Coerência e Coesão no Processamento do Texto ... 70

Quadro 5: Tópico V. Relações entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido ... 71

Quadro 6: Tópico VI. Variação Linguística ... 71

Quadro 7: Tipologia de Marcuschi (2008) ... 71

Quadro 8: Tipo de perguntas da Prova Brasil ... 109

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LISTA DE SIGLAS

ANRESC - Avaliação Nacional de Rendimento Escolar BNCC - Base Nacional Comum Curricular

CEP – Comitê de Ética em Pesquisa

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

FAPEMIG – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira LP – Língua Portuguesa

OCDE - Organização para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais em Língua Portuguesa

PNE – Plano Nacional de Educação

PNLD - Programa Nacional do Livro Didático SAEB– Sistema de Avaliação da Educação Básica SEMED - Secretaria Municipal de Educação de Itabirito TALE - Termo de Assentimento Livre e Esclarecido TCLR - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TDIC - Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação TICs - Tecnologia da Informação e da Comunicação

UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 13

CAPÍTULO 1 – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE LEITURA DE TEXTOS MULTIMODAIS E MODELOS DE LEITURA ... 18

1.1 Competências e habilidades de leitura ... 18

1.2 Perspectivas de leitura... 26

1.2.1 Leitura nas perspectivas psicolinguística e cognitiva ... 26

1.2.2 Leitura na perspectiva educacional: da alfabetização aos letramentos e dos letramentos aos multiletramentos ... 40

1.3 A multimodalidade ... 48

1.4 Competências e habilidades de leitura de textos multimodais: levantamento de pesquisas realizadas no período 2007-2017 ... 56

CAPÍTULO 2 - METODOLOGIA DA PESQUISA ... 65

2.1 A pesquisa qualitativa ... 65

2.2 A pesquisa documental ... 67

2.3 A Prova Brasil ... 69

2.4 Categorização da Matriz de referência por descritores ... 69

2.5 Categorização das perguntas de compreensão de textos ... 71

2.6 A escola ... 73

2.7 Os alunos ... 74

2.8 Coleta de dados ... 74

2.9 Questões éticas ... 75

CAPÍTULO 3 –PROVA BRASIL – 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL II- ANÁLISE DOS ITENS DE LÍNGUA PORTUGUESA NO USO DA MULTIMODALIDADE ... 76

3.1 Apresentação da Prova Brasil 2011 ... 83

3.1.1 O primeiro bloco ... 84

3.1.2 O segundo bloco ... 93

3.1.3 Descrição analítica da Prova Brasil 2011 ... 102

3.2 Análise dos itens mais marcadamente multimodais da Prova Brasil sob a perspectiva de estudantes da rede pública da Região dos Inconfidentes ... 110

3.2.1 O teste com o item 11 ... 111

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3.2.3 O teste com o item 13 ... 118

3.2.4 Uma visão geral acerca dos resultados da pesquisa ... 120

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 124

REFERÊNCIAS ... 129

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13 INTRODUÇÃO

Os Parâmetros Curriculares Nacionais em Língua Portuguesa - PCN (BRASIL, 1998) trabalham com a perspectiva sociointeracionista discursiva (VYGOTSKY, 1998), tratando o ensino de língua materna na perspectiva do letramento e de maneira mais abrangente que o ensino tradicional voltado para os manuais, livros didáticos, gramática etc. A necessidade em se ter novas práticas para o ensino de leitura, sobretudo para o letramento, tem sua demanda e, apesar de a conceituação ser nova, pesquisas na área de letramento estão crescendo.

Nas partes do documento que discorrem sobre as habilidades a serem trabalhadas com os alunos de Língua Portuguesa, afirma-se que:

O domínio da linguagem, como atividade discursiva e cognitiva, e o domínio da língua, como sistema simbólico utilizado por uma comunidade linguística, são condições de possibilidade de plena participação social. [...] Essa responsabilidade é tanto maior quanto menor for o grau de letramento das comunidades em que vivem os alunos. Considerando os diferentes níveis de conhecimento prévio, cabe à escola promover sua ampliação de forma que, progressivamente, cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações (BRASIL, 2000, p. 19).

A importância e o valor dos usos da linguagem são determinados historicamente segundo as demandas sociais de cada momento. Atualmente, exigem-se níveis de leitura e de escrita diferentes dos que satisfizeram as demandas sociais até há bem pouco tempo e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. A necessidade de atender a essa demanda, obriga à revisão substantiva dos métodos de ensino e à constituição de práticas que possibilitem ao aluno ampliar sua competência discursiva na interlocução (BRASIL, 2000, p. 23).

Dessa maneira, o letramento deve ser trabalhado na construção de sentido e os PCN, portanto, indicam que os alunos devem ter a possibilidade de ter postura mais reflexiva em relação às suas práticas sociais e quais significados possíveis ela pode ter. O documento assume uma visão ampla de significação porque propõe que a aula de Língua Portuguesa seja feita com base em textos dos mais variados gêneros, sendo eles a unidade de ensino mais eficaz.

Diante disso, os alunos podem depreender de enunciados presentes num texto, seja impresso ou digital, diversos significados possíveis por terem em suas mãos o que antes o ensino não obtinha: o contexto situacional nos mais diversos meios sociais. De acordo com o PCN+ (BRASIL, 2002, p. 65), “Na vida social, e não somente na sala de aula, o aluno deve ser capaz de reconhecer como a linguagem foi organizada para produzir determinados efeitos de sentido”, o que nos leva à questão de que a aula de Língua Portuguesa não se deve reduzira notas ou textos de ambientação escolar, mas sim de inserir reais práticas sociais atuais de uso

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14 da leitura. É necessário que o significado da linguagem seja dado por cada sujeito em textos de diversas áreas de circulação real.

As possibilidades de novas práticas de letramento, legitimadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN, torna a aula mais dinâmica, dando ao aluno a possibilidade de ser protagonista do seu conhecimento, ou seja, possibilita que, a partir do rompimento da aula como projeção unidirecional, o aluno atribua valores relacionados a seu espaço social e construa algo juntamente com o professor de maneira prazerosa, reconhecendo os objetivos da aula e a contribuição do conhecimento para sua vida.

O Programa Nacional do Livro Didático - PNLD é responsável pelo subsídio de livros didáticos nas escolas brasileiras. Seu documento é de grande importância e deve ser seguido durante a elaboração de livros didáticos. Vale destacar que a proposta do PNLD assemelha-se à dos PCN, tendo em vista que ambos os documentos mostram-se favoráveis à perspectiva interacionista de linguagem. O documento explicita algumas das maiores capacidades a serem desenvolvidas no Ensino:

O ensino de Língua Portuguesa nos quatro anos finais do ensino fundamental apresenta características próprias, devidas tanto ao perfil escolar do alunado desse nível quanto às demandas sociais que a ele se apresentam ao final do período. Portanto, cabe ao ensino de língua materna, nesse nível de ensino-aprendizagem, aprofundar o processo de inserção qualificada do aluno na cultura da escrita: aperfeiçoando sua formação como leitor e produtor de textos escritos; desenvolvendo as competências e as habilidades de leitura e escrita requeridas por esses novos níveis e tipos de letramento; ampliando sua capacidade de reflexão sobre as propriedades e o funcionamento da língua e da linguagem (BRASIL, 2013, p.15).

Desta forma, o PNLD assevera que não somente o ensino, mas atividades contidas nele devem visar conter um repertório textual que favoreça experiências reais de leitura e escrita, envolvendo variados contextos de uso, abordando aspectos de ordem textual, permitindo o desenvolvimento das competências e habilidades discursivas, enunciativas, morfossintáticas e de leitura.

As práticas que visam ao letramento devem ser proporcionadas na formação dos sujeitos, inclusive na fase em que é mais preciso trabalhar o seu desenvolvimento, na fase da educação básica.

O trabalho nessa perspectiva é, portanto, um dos fatores que mais podem contribuir para uma reforma do cenário educacional do país e atua principalmente como um poderoso instrumento de socialização e formação do sujeito político e social. Se há pretensão de se modernizar e repensar as salas de aula, essa modernização deverá, também, ater-se à compreensão da importância de trabalhar para o letramento.

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15 Esta pesquisa pretende analisar as habilidades e competências de leiturade textos multimodais de alunos do Ensino Fundamental II de uma escola da rede pública municipal da Região dos Inconfidentes-MG. Para atingir esse objetivo principal, analisaremos, a partir de um estudo dos itens de Língua Portuguesa da avaliação em larga escala Prova Brasil, os seguintes objetivos específicos: 1) a influência dos conteúdos verbais na compreensão dos textos que apresentam dois modos de linguagem (verbal e não verbal); 2) a influência dos conteúdos não verbais na compreensão dos textos que apresentam os dois modos de linguagem; 3) a influência do modo de apresentação (reprodução) dos itens (coloridos, preto e branco, negritos, itálicos etc.), sobretudo na compreensão dos itens; 4) as estratégias utilizadas por sujeitos (alunos da rede municipal de ensino) para responder os itens da Prova Brasil.

A universidade, enquanto instituição, relaciona-se com os mais variados aspectos culturais, sociais, políticos e econômicos. Tem-se um vasto campo a ser explorado, posto que há muitas contradições e limitações, especialmente no que toca à acessibilidade da população do entorno da instituição, à influência que a universidade exerce no meio onde se insere, sua missão, os valores, autonomia, políticas de ensino, forças sociais paralelas, dimensões coletivas, autonomia, erudição, vínculos com a própria democratização do saber, estrutura do ensino, da pesquisa e da extensão, dentre tanto outros fatores. Todos os elementos se imbricam e exigem uma percepção conjuntural que considere as múltiplas dimensões de estudantes, docentes, corpo de funcionários, as finalidades básicas da universidade na sociedade, a saber, ensino, pesquisa e extensão, e, ademais, sua dinâmica como aparelho ideológico e no processo de desenvolvimento da ciência (WANDERLEY, 2010). A escolha do campo de pesquisa deu-se a partir da importância de se contribuir com pesquisas que privilegiem o entorno na Universidade Federal de Ouro Preto, estendendo os pilares ensino, pesquisa e extensão. O conhecimento, como aponta Lampert (2008), é dinâmico e se constitui um produto próprio da construção social. Pode-se desenvolver o pensamento, a inteligência e a criatividade propondo-se soluções baseadas na inovação, mediante a consolidação da pesquisa e da extensão nas universidades.

Este estudo tem relevância científica e social, uma vez que contribui com os estudos, críticas e reflexões acerca dos modelos e perspectivas de leitura, dos (multi) letramentos, da multimodalidade e ainda traz análises de como essas práticas contribuem para a emancipação dos sujeitos. Desta forma, acredita-se que os resultados da pesquisa contribuirão para a região, para a instituição e, sobretudo, para o campo de pesquisa.

Percebe-se que muito do que se usa em termos de linguagem não corresponde às práticas sociais, visto que os alunos estão em constante contato com recursos tecnológicos, redes sociais digitais e instrumentos que exigem uma série de mudanças nas práticas de

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16 letramento para que se perceba as linguagens de modo também diferenciado e possam utilizá-las.

Com base nos resultados da Prova Brasil 2015, há a possibilidade de se calcular e verificar a proporção do aprendizado em Língua Portuguesa de alunos de todas as regiões do

Brasil. Segundo os resultados disponíveis no endereço eletrônico

http://www.qedu.org.br/sobre, plataforma idealizada para apresentar dados relacionados à educação brasileira, o município de Itabirito – MG, campoda pesquisa, obteve resultados abaixo do esperado na última avaliação. A proporção de alunos que aprenderam o considerado adequado na competência de leitura e interpretação de textos até o nono ano do Ensino Fundamental II foi de 56%, abaixo do valor de referência previsto pelo Programa Todos Pela Educação, que é de 70%.

O Programa Todos pela Educação foi planejado através de cinco metas com a finalidade de propiciar condições de acesso, alfabetização e sucesso escolar, ampliação de recursos e melhoria em relação à gestão até o ano de 2022. A terceira meta desse plano é que até este ano todos os alunos tenham aprendizado adequado ao seu ano escolar, o que significa ter competência de leitura e interpretação de textos.

Ainda com base nos resultados da Prova Brasil, podemos verificar e comparar os dados com outros estados. Tomemos como exemplo os dados de uma cidade do estado do Ceará (CE) chamada Sobral que, segundo a lista de municípios do Brasil por IDEB, é a cidade que possui a melhor educação básica do país. A competência de leitura e interpretação de textos dos alunos dessa região, também do nono ano do Ensino Fundamental II no mesmo ano de 2015, chegou a 69%. Diante desses dados surge a indagação sobre as estratégias leitura de alunos do Ensino Fundamental II em relação aos textos multimodais.

Esta pesquisa possui abordagem qualitativa e o referencial teórico discute os termos: competências e habilidades de leitura a partir de Perrenoud (1986), Allessandrini (2002), Mello (2003), Ronca (2003), Sacristán (2011); análises multimodais a partir deKoch (1996), Leal e Melo (2002), Kress (2003), Kleiman (2004), Jewitt (2005), Street (2009); multiletramentos e leitura a partir deTfouni (1995),Marcuschi (2003), Goulart (2006), Cope eKalantzis (2008), Corrêa (2008),Rojo (2009), Soares (2009), Elias e Koch (2011),Coscarelli(2012), Street (2014), entre outros autores também relevantes para o estudo.

Esta dissertação está estruturada da seguinte forma: na Introdução abordamos sobre alguns documentos oficiais e as habilidades que estão inseridas neles, em relação ao letramento, considerando como o sujeito pode se tornar autônomo na leitura ao letrar-se. Saindo de uma

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17 perspectiva geral para uma mais específica, apresentamos o município a ser estudado, apontando a importância do papel da universidade no seu entorno e trazendo a visão da Prova Brasil e do Programa Todos pela Educação em relação aos dados que identificam os resultados da avaliação de Língua Portuguesa do município. O primeiro capítulo está dividido em quatro seções que apresentam a fundamentação teórica que, além de discutir pesquisas que tratam do estado do conhecimento sobre a nossa temática, traz, sobretudo, os conceitos e as teorias que são bases para a pesquisa. O segundo capítulo está dividido em nove seções que descrevem os aspectos teóricos metodológicos que conduziram a realização da pesquisa e apresentam as categorias de análises, assim como o campo de estudo e a reação ética. O terceiro capítulo está dividido em duas grandes seções: a primeira traz a apresentação, descrição e análise dos itens de Língua Portuguesa e do uso da multimodalidade na Prova Brasil e a segunda traz a análise pormenorizada dos itens mais marcadamente multimodais presentes na avaliação sob a perspectiva de estudantes da rede pública municipal de Itabirito – Minas gerais, campo de pesquisa. As considerações finais retomam de forma sucinta os caminhos e os resultados apresentados na pesquisa e as contribuições deste estudo para a área.

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18 CAPÍTULO 1 – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DE TEXTOS MULTIMODAIS E MODELOS DE LEITURA

1.1Habilidades e competências de leitura

Delors (2010, p. 5) define o que é educação, apontando-a “a serviço de um desenvolvimento humano mais harmonioso e autêntico, de modo a contribuir para a diminuição da pobreza, da exclusão social, das incompreensões, das opressões, das guerras (...)”. Trata-se de uma definição que nos leva a inúmeras reflexões acerca do processo de aprendizagem e da finalidade envolvida por trás da busca pelos avanços na cultura, na ciência, na educação em si, e em todos os aspectos que nos envolvem cotidianamente. A educação é uma ferramenta na busca de uma sociedade melhor, na busca de referências pelas quais se deve lutar, na busca de compreensão do todo. E, assim, partindo da compreensão do conjunto, do mundo e das suas infinitas realidades, o homem pode modificar-se, transformar-se, para transformar o entorno. A aprendizagem parte do individual para se alcançar o coletivo, e a educação é um dispositivo utilizado nessa trajetória.

Todas as transformações sociais vividas nas últimas décadas impõem que o conhecimento sistematizado aconteça ao longo da vida, e não somente durante os anos escolares, o que força mudanças no sistema educacional mundial, que, agora, deve ensinar não apenas conteúdos programáticos fechados e isentos da necessidade de capacidade crítica, pautados na assimilação por repetição, mas também deve perceber a necessidade de transmitir ao discente que, para além dessa assimilação mecanizada de conteúdos, ele deve aprender a aprender, posto que sua aprendizagem se dará por toda a vida, e, a partir de um determinado momento, sem o direcionamento de um professor.

Novos pilares da educação mundial são forjados a partir desse discernimento que contrasta os moldes atuais de vida com aqueles anteriores à Segunda Guerra Mundial, e às sucessivas revoluções tecnológicas. A percepção de interdependência e da análise compartilhada de riscos futuros, segundo Delors (2010), deve conduzir à realização de projetos comuns, que apaziguarão os conflitos e os desafios do futuro. Talvez seja um pensamento ideológico, mas é esse pensamento a sustentação para a proposta das bases da nova educação apresentada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 1996, a saber, aprender a conviver, a partir dos três pilares aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a ser. E é diante disso, que “o desenvolvimento da educação ao longo da vida implica o estudo de novas formas de obtenção das certificações que levem em

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19 consideração o conjunto das competências adquiridas” (DELORS, 2010, p. 34).

Segundo Perrenoud (1999), a escola tem o dever de oportunizar situações que beneficiem a formação de esquemas de ações e de interações, que têm a possibilidade de serem utilizadas em diversas situações também semelhantes fora do espaço escolar e, principalmente, após o término da escolarização. Sendo assim, a partir do momento em que a escola assume que os conteúdos devem ser focados nos alunos, naquilo que faz sentido para eles, a competência começa a ser atingida. Treinar as habilidades de leitura, portanto, significa exercitar variadas interpretações relacionadas às práticas sociais já trazidas, vistas no dia a dia, ou que estão no arcabouço textual já trabalhado.

Dentro desse percurso, o respeito e a comunhão com o conhecimento prévio trazido pelo aluno devem ser incorporados ao processo de aprendizagem, sem limitar as possibilidades de raciocínio, mas guiando para que o educando substitua, conforme orienta Freire (1996), uma concepção ingênua, por outra mais crítica, uma forma mais apurada de inteligir o mundo, a partir daquilo que já se carrega. Trata-se de uma postura a ser adotada, baseada na pedagogia da autonomia, que leva a aprendizagem para outro patamar, além da apreensão do conteúdo, para a formação humana dentro de uma dimensão social.

Não se pode, contudo, cair no engano, como apontou Perrenoud (1999a), de desvincular a transmissão do conhecimento do desenvolvimento das competências. O autor alega que “quanto mais complexas, abstratas, mediatizadas por tecnologias, apoiadas em modelos sistêmicos da realidade forem consideradas as ações, mais conhecimentos aprofundados, avançados, organizados e confiáveis elas exigem” (1999, p. 6). Assim, educadores se encontram diante do dilema de distribuir o tempo entre o necessário para se ministrar o conhecimento e se explorar as competências. Se a competência se materializa a partir de um conhecimento prévio, que pode ser mais ou menos específico, a transmissão de conhecimentos não pode ser em nenhuma hipótese ignorada. Vários recursos cognitivos operam nesse processamento, e o conhecimento é um deles, e é relevante, na medida em que configura a representação construída da realidade, e, portanto, uma condição necessária para o exercício da competência. Por outro lado, incutir conhecimento específico tão pouco é o suficiente para a boa evolução da formação, posto que um agrupamento de informações, por maior que seja, não é o bastante para a resolução de determinadas situações que se apresentam na prática, já que essas situações mobilizam uma gama de recursos cognitivos.

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20 Figura 1 - Constituição da Competência

Fonte: Elaborado pelo próprio autor a partir de Perrenoud (1999)

O processo de execução da competência envolve diversos aspectos, segundo Perrenoud (1999a), como se pode observadar na figura. Considera-se haver três tipos diferentes de conhecimento, que, contudo, não são para o autor, suficientes para a execução da competência. O conhecimento declarativo age na descrição da realidade, dos fatos, das leis, das constantes e das regularidades. O conhecimento procedimental descreve quais dispositivos serão aplicados para o alcance de um determinado resultado. Estaria compreendido no campo da metodologia. O conhecimento condicional determina quais são as condições válidas do conhecimento procedimental. Esses três tipos de conhecimentos foram determinados pelas ciências cognitivas, mas eles podem sugerir que a competência se reduz ao conhecimento. Perrenoud (1999) considera que esses conhecimentos, diante de uma situação inédita e complexa, e da necessidade de se resolver em tempo real e com a eficácia esperada, gerem a execução ativa, a partir de um alto grau de abstração. É necessário desenvolver estratégias eficazes e rápidas, mobilizando o conhecimento com discernimento. A perícia se dá quando acontece o encontro da formação com a prática, levando-se em consideração as mais diversas atitudes mentais. E, assim, a competência se realiza na união do conhecimento, do discernimento, da realidade proposta e da ação. Para o autor,

O sujeito não pode tampouco construí-los por simples interiorização de um conhecimento procedimental. Os esquemas constroem-se ao sabor de um treinamento, de experiências renovadas, ao mesmo tempo redundantes e estruturantes, treinamento esse tanto mais eficaz quando associado a uma postura reflexiva (1999, p. 9). Em termos de estruturação do que vem a ser a competência, Perrenoud (1999)

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21 declara que há três versões acerca do conceito, que não acrescentam muito à questão do problema envolvido na aplicação de uma abordagem por competência no processo de ensino/aprendizagem. Uma primeira que estabelece a competência em relação com os objetivos do ensino, voltando-se especialmente para condutas que são observáveis e avaliadas. Esse tipo de pedagogia, que se pauta em objetivos, também se pauta na verificação, o que leva mais ao estudo fundamentado no conhecimento. Uma segunda versão do conceito está aliada à relação entre competência e desempenho. Nesse caso, o desempenho observado indicaria a conquista de uma determinada competência. O problema é que essa relação também se fundamenta numa verificação restrita, e não se estende às mais variadas situações. O que se imagina é que se o educando consegue transpor aquela situação específica, transporá outras; e isso reduz a abrangência da competência. A terceira visão é a chomskiana, de que a competência é uma potencialidade de qualquer mente humana. Como na teoria linguística, a partir de um número limitado de informações da gramática interna pode-se produzir um número infinito de construções, tende-se a pensar que o mesmo acontece com as outras competências além da linguística. Entendia-se que a partir de uma determinada capacidade de resolução de problemas, pode-se resolver qualquer problema; ou, a partir da demonstração de uma competência em uma condição particular, pode-se alcançar a competência em qualquer condição. Essas visões desconsideram a necessidade de adaptação a ambientes variados e a situações adversas daquelas ensinadas. É como acreditar que o saber fazer operaria de uma forma universal a partir de um modelo aprendido.

Nesse contexto, a língua é um instrumento necessário para atuar na sociedade, que está cada vez mais globalizada e tecnológica; e o domínio da leitura como prática social muda o olhar sobre como agir nas práticas do dia a dia. A escola tem como objetivo ensinar, e, nessa perspectiva, os documentos oficiais que orientam educadores assumem os termos "Habilidades e Competências" para designar aquilo que deve ser transmitido aos alunos.

Segundo os documentos, como o Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Matriz de Referência para a Prova Brasil, vale definir capacidades como objetivos educacionais, porque, assim que elas se desenvolvem, expressam-se numa variabilidade de comportamentos. O papel do professor é crucial nesse desenvolvimento, visto que detém a possibilidade de atender à diversidade presente dentro da sala de aula, e é dever dele apresentar conteúdos e atividades de aprendizagem, que mostrem o porquê daquilo que está sendo ensinado. Considerando que cada um aprende de uma maneira, e para que todos possam participar do processo de aprender, o ensino por competências e habilidades permite que um conteúdo não seja visto como uma finalidade, mas como um meio

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22 de treino que desenvolva as habilidades que compreende a competência (BRASIL, 1999).

Analisando os termos separadamente, temos habilidade como capacidade de inteligência e aptidão; e competência como qualidade de quem é capaz de apreciar e resolver assuntos, possibilidade de realizar tarefas, considerando uma hierarquia ou a necessidade de qualificação, poder ou autoridade daí recorrente, ambas no sentido denotativo do dicionário Caldas Aulete Digital (2010).

Perrenoud (1999a) utiliza os dois termos conjuntamente para explicá-los: competência é a faculdade de mobilização de um conjunto de recursos cognitivos como saberes, habilidades e informações para solucionar com pertinência e eficácia uma série de situações. A reflexão encontra-se no interior das competências mais aplaudidas, e é o que permite a abstração, a comparação, a conceitualização, o julgamento, a crítica, etc.. A tendência é se considerar que, na medida em que as ações acontecem sem a necessidade de reflexão, elas se tornam habilidades, ou hábitos. Perrenoud (1999a) acredita que seria paradoxal pensar que, a partir do momento em que se alcança o máximo grau de competência, ela deixasse de existir, e, portanto, o hábito e a habilidade seriam partes da competência, estariam nela contidos. Ele chama as habilidades de inteligência capitalizada, uma sequência de modos de operação heurística, que acaba se tornando um esquema mental. Do desenvolvimento das habilidades se dá a competência plena. Esse conjunto de saberes, Tanguy (2011) aponta que habilita para discussões, decisões, que concernem um ofício a partir de conhecimentos, fundamentados, e acompanhados de habilidades que permitem executar decisões.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), ao compreender os termos em discussão, interpreta competência como modalidades estruturais da inteligência, ações e operações utilizadas a fim de estabelecer relações entre objetos, situações, pessoas e fenômenos que se deseja conhecer. As habilidades sucedem de competências adquiridas e dizem respeito ao plano imediato do saber fazer; elas se aperfeiçoam e se articulam a partir de ações e operações que possibilitam uma nova reorganização das competências (INEP, 1999, p. 9).

Cardoso e Hora (2013) afirmam que diante de tantas transformações vividas na sociedade, torna-se necessário repensar os moldes da educação; e, de fato, essas discussões em torno da abordagem do ensino por meio da perspectiva de competências e habilidades vêm tomando espaço nos meios acadêmicos e escolares há alguns anos. As mudanças saíram das discussões em pequenos círculos e se expandiram, agora para as tentativas de se entender melhor o que realmente seria vir a trabalhar a educação sob esses novos moldes. As autoras declaram que

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23 Será necessário para atuar na sociedade cada vez mais urbanizada e tecnológica do século XXI um domínio cada vez maior da leitura e da escrita como prática social, não somente ler por ler ou para obter certa informação, mas ler o mundo através de palavras, imagens, fatos, números, códigos e outras linguagens (CARDOSO e HORA, 2013, p. 3).

Para Delors (1996) os sistemas educativos são responsáveis por responder a esses desafios, enriquecendo continuamente o saber, e para isso é preciso “fornecer referências e grades de leitura a fim de reforçar as capacidades de compreensão e discernimento”; é preciso fornecer tanto a crianças quanto a adultos em processo de aprendizagem escolar “as bases culturais que lhes permitam decifrar, na medida do possível, as mudanças em curso. O que supõe a capacidade de operar uma triagem na massa de informações, a fim de melhor interpretá-las” (1996, p. 68).

Dentro dessas concepções, o ensino da leitura torna-se cada vez mais importante, e ele não está somente voltado para as leituras de letras e palavras, mas para a apreensão da leitura conjunta de múltiplos gêneros textuais, que se baseiam também em múltiplos signos. As habilidades e competências exigidas atualmente envolvem muito mais que apenas a decodificação de determinados signos, mas impõe a obrigatoriedade de conseguir estabelecer interrelação entre informações vindas de meios diferentes e estruturadas de maneiras também diversas. Daí a importância do uso de mídias diversificadas no ensino. As aulas meramente expositivas já não conseguem abarcar essa pluralidade de informações existentes no mundo e na concepção de mundo dos estudantes. A variabilidade da didática e de metodologia tendem a fazer evoluir essa compreensão leitora, a partir da reivindicação de uma postura mais crítica que envolva outras tecnologias, explorando o aperfeiçoamento dos processos cognitivos a partir da construção criteriosa de novas leituras de mundo. Assim,

a educação deve transmitir, de fato, de forma maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber-fazer evolutivos, adaptados à civilização cognitiva, pois são as bases das competências do futuro. Simultaneamente, compete-lhe encontrar e assinalar as referências que impeçam as pessoas de ficar submergidas nas ondas de informações, mais ou menos efêmeras, que invadem os espaços públicos e privados (DELORS, 1996, p. 89).

Perrenoud afirma que “a abordagem por competências acentua ainda mais a necessidade de uma diferenciação do ensino, de uma individualização dos percursos de formação e de uma ruptura com a segmentação do currículo em programas anuais” (1999a, p. 91). Isso significa que seria necessário para se desenvolver plenamente as habilidades e competências uma reestruturação, partindo da construção de grades curriculares voltadas

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24 também para conteúdos, mas não primordialmente para eles. Tudo o que foi aqui exposto, incluindo a Matriz de competências e habilidades do INEP não desvinculam, em absoluto, o peso conteudista da educação. Como apresentamos anteriormente, as diretrizes nacionais da educação estão pautadas nos objetivos – e, inclusive, assim foi postulado por Rangel, Mocarzel e Pimenta (2016) – e nas condutas observáveis. Segundo Perrenoud (1999a), esse tipo de pedagogia também se pauta na verificação, ou, no final das contas, no conteúdo apreendido pelo estudante. Igualmente, valoriza-se nesse perfil brasileiro instaurado a relação da competência com o desempenho do aluno. Trata-se fundamentalmente de um processo educativo que considera que, se o estudante é capaz de inferir algo em uma determinada situação e consegue chegar a uma resolução satisfatória, ele conseguirá, por analogia, superar outros obstáculos semelhantes em forma, ignorando-se o contexto. Esse modelo de educação leva, fatalmente também à visão chomskiana da potencialidade, considerando a competência da mesma forma que se considera a capacidade linguística, e, portanto, ignorando que a capacidade linguística está inserida na competência e é uma das suas constituintes, não a própria competência. A potencialidade do indivíduo somente pode se transformar em competência, se ele passar pelo processo de aprendizagem. A capacidade inata existe, mas ela está também subjugada, por exemplo, à maturação do sistema nervoso, e, igualmente, à estrutura fornecida pelo entorno para que essa capacidade alcance o patamar de competência, e, diante disso, os sujeitos não apreendem as informações da mesma forma e no mesmo tempo. As competências, ainda segundo Perrenoud (1999a), são aprendizados construídos ao longo da vida, aquisições, e não apenas uma virtualidade presente na espécie. Da mesma forma, existe sempre a confusão em torno do que é competência, o que é habilidade, quando começa uma e termina outra. As teorias se confundem muitas vezes e caem na suposição de a habilidade estar acima da competência, partindo-se do pressuposto de que a integralização da habilidade dispensa a própria competência, na medida em que não se necessita mais do processamento cognitivo para a realização do processo.

O tema é demasiado complexo. Perrenoud (1999b, p. 17) afirma que “é mais fecundo descrever e organizar a diversidade das competências do que debater para estabelecer uma distinção entre habilidadese competências”. Independente do nível de abstração necessária, ou especialização, independente da dificuldade de acesso ou de alcance de uma determinada competência, é ela que permite que se afronte de forma regular e adequada um conjunto de tarefas e situações, a partir de noções, procedimentos, metodologias, e até mesmo de outras competências. Assim,

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25 Se a competência manifesta-se na ação, não é inventada na hora :

- se faltam os recursos a mobilizar, não há competência;

- se os recursos estão presentes, mas não são mobilizados em tempo útil e conscientemente, então, na prática, é como se eles não existissem (PERRENOUD, 1999b, p. 17).

Finalmente, há que se considerar alguns pontos levantados por Perrenoud (199b) acerca da abordagem do ensino por competências. Muitos conhecimentos transferidos nas escolas não são utilizados pelos estudantes durante suas vidas, e, de fato, parecem inúteis para muitos. Contudo, há que se considerar que a escola não proporciona a prática da aprendizagem. Isso somente acontecerá na vida laboral, na vivência e na necessidade real de se tomar decisões a partir dos conhecimentos adquiridos nas instituições. O autor faz uma analogia com a divisão do trabalho. A escola oferece recursos, a vida e o trabalho oferecem o desenvolvimento pleno da competência. Sempre foi objetivo das escolas ensinar algo que fosse verdadeiramente útil para a vida dos estudantes. Não se pode entender que essa utilidade virá naquele momento, por que a competência somente pode se aperfeiçoar na prática, na realidade, não em situações de suposição.

A competência, segundo Silva e Felicetti (2014, p. 18) relaciona-se “à aptidão do indivíduo ao executar as atividades propostas de forma exitosa”, enquanto a habilidade se constitui de procedimentos mentais que levam a uma tomada de decisão. Zabala e Arnau (2010, p. 11), por sua parte, afirmam que “a competência consistirá na intervenção eficaz nos diferentes âmbitos da vida”, na busca pela superação das dicotomias memorizar/compreender, conhecimentos/habilidades e teoria/prática. Assim, essa educação para a vida comporta algo mais que o recebimento e a assimilação das informações, imbuindo um caráter de formação plena para o estudante.

Por outro lado, Sacristán (2011) aborda a volatilidade da linguagem em função dos interesses dos dirigentes e da manutenção de privilégios, o que demonstra dependência, fraqueza e submissão da população ao sistema. Para o autor, a educação por competência possui várias vertentes interpretativas, mas se consolida como um movimento modista, uma doutrina que gera apóstolos, fundamentada em tecnicismos e com consequências contraditórias, na medida em que seus próprios conceitos são confusos, apresentando uma eficácia duvidosa, dentro de uma perspectiva de educação utilitarista, cuja funcionalidade é sua única meta, já que o que se pretende é, exclusivamente, o desenvolvimento e a manutenção do sistema econômico capitalista. A utilização desses termos, segundo Sacristán (2011, p. 61) é “apenas uma nova linguagem, um jargão, [...] uma ideologia fácil de lançar raízes”. A questão principal é: “A que mundo nos leva essa forma de educar por competências? (SACRISTÁN, 2011, p. 8).

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26 As análises de Silva e Felicetti (2014) e de Zabala e Arnau (2010), embora instrutivas e perspicazes, não apresentam qualquer abordagem em torno do que significa a educação por competências no contexto social e ignoram a formação de mão-de-obra, propagando o que Sacristán (2011) classificaria como uma visão onírica da mudança no sistema. Pode-se perceber que a ótica de Sacristán (2011) é crítica e, a partir de uma análise histórica, fundamenta-se nas mudanças estruturais pelas quais a educação sempre passa, não apenas na busca por evolução, mas como uma ferramenta institucionalizada que pretende, intrinsecamente, manter as conformações dualistas na educação e na sociedade. É a eternização da divisão do trabalho e da separação de classes.

Torna-se bastante evidente que não basta que sejam alteradas as matrizes curriculares, colocando-se as competências como pano de fundo dos conteúdos aserem ministrados. É necessário que haja uma mudança mais profunda, mais voltada para a solidificação das competências e das habilidades. A partir das palavras de Perrenoud (1999b, p. 19) “a trilogia das habilidades – ler, escrever, contar – que fundou a escolaridade obrigatória no século XIX não está mais à altura das exigências de nossa época. A abordagem por competências busca simplesmente atualizá-la”.

1.2 Perspectivas de Leitura

1.2.1 Leitura na perspectiva psicolinguística e cognitiva

Para se abordar a leitura na perspectiva cognitiva e psicolinguística, é necessário compreender como se deu o avanço das muitas teorias que começaram com a exploração de processos mais profundos na construção da linguagem, especialmente com a derrocada do behaviorismo, que considerava a aquisição da linguagem a partir de uma concepção empirista e associacionista, entendendo que qualquer conhecimento existia somente na relação com alguma experiência prévia, e ignorando os processos mentais internos. A caracterização mais comum que se dá ao behaviorismo é a da tábula rasa, na qual o ambiente dispara alguma informação, mas a mente não tem profundidade para processamento autônomo sem tais estímulos.

Concomitante a essa concepção behaviorista, o linguista Sausure explorava a linguagem em uma investigação acentuada, estabelecendo relação entre múltiplas áreas para os processos de linguagem, a partir da ideia de que tudo o que existe é fruto da relação externa do significante, com a interna, significado, baseando-se nos signos, que viriam a ser as línguas

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27 propriamente ditas, ou melhor, a relação de atribuição do significado, a partir de um significante, consolidado em uma palavra, ou um conjunto fonético. A análise linguística de Sausure era o mais amplo que existia na época, e foi a base do Estruturalismo, considerando-se, sobretudo, que a capacidade linguística estaria ancorada em situações concretas do uso da língua, mas estabelecendo conexões internas, necessitando delas.

Os estudos acerca da linguagem se dividiam entre linguistas e psicólogos. E, se por um lado, as discussões se prolongavam entre linguistas behavioristas, estruturalistas e inatistas, por outro, no campo da psicologia, sobressai-se a Psicologia Humanista, posicionando-se também contra o behaviorismo e contra a psicanálise freudiana, entendendo que ambas as correntes restringem o comportamento humano a um impulso externo, e, no caso da psicanálise, extremamente fatalista.

A aforia do behaviorismo e os avanços acerca da inteligência artificial impulsionaram o cognitivismo. Essas são as bases da revolução da Psicologia Cognitivista, com a epistemologia genética e o interacionismo de Piaget, para quem a organização interna da aprendizagem acontece simultaneamente à adaptação ao meio externo, podendo-se inferir a natureza dessa aprendizagem, a partir da sua relação entre sujeito e objeto do conhecimento. Ausubel, por seu turno, afirma que a aquisição e retenção de conhecimento são processos constantes, e a mente tem a capacidade de armazenamento de qualquer impulso externo, estabelecendo prioridades para retenção de informações.

Quando Chomsky, em 1959, publicou uma crítica contra o livro Comportamento Verbal, do mais famoso psicólogo behaviorista da época, Skinner, todo o foco dos estudos da linguagem é alterado. A estrutura mentalista e dualista, baseada na ontologia, é sobreposta pelo gerativismo, pela ideia inatista de competência natural relacionada à performance, considerando-se o caráter não empirista da linguagem. Para Chomsky todo ser humano tem capacidade nata de desenvolvimento da linguagem, que ao nascer ainda não alcançou maturidade suficiente, tal como acontece com outros órgãos. Ele afirma haver uma gramática universal na mente humana, capaz de proporcionar o processamento linguístico, sendo que mesmo com a capacidade nata e biológica, a interação social interfere no processo, numa contínua construção.

Essa teoria construtivista também é apoiada por Vygotsky, importante teórico que declara estar o pensamento em um plano ainda mais profundo da mente, sendo capaz de se realizar a partir do discurso e da palavra. Para que a linguagem e o pensamento funcionem de fato com autonomia, um complexo trabalho psicológico entra em ação. Contudo, os pensamentos não seriam ainda o ponto mais profundo no processo de aprendizagem, pois,

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28 abaixo dele se encontrariam outros fatores psicológicos, como emoção, motivação, interesse, necessidade, que refletem nas formas do próprio pensamento.

Considerando-se, portanto, esse processo inicial das teorias que culminaram com a consolidação da psicolinguística, partindo das características consideradas mais importantes atualmente na linguagem e no processamento da aprendizagem – como a dinâmica, a organização padronizada, a capacidade comunicativa, o gerativismo estruturado em níveis diversos de morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, fonética – e entendendo, ainda, que a aprendizagem somente evolui a partir da aquisição primária da linguagem, após o período preverbal, cabe ressaltar o fato de que a aprendizagem é o sujeito e não apenas o conteúdo que se lhe apresenta (PIAGET, 1985).

Conforme Carston (1998 apud Correa, 1999), a partir dos estudos de Chomsky a linguística e a Psicologia Cognitiva constituem-se como área interdisciplinar estabelecendo a Psicolinguística. Essa concepção de estudo estabelecida divide a leitura em alguns processos que tratam linguística e cognição em forma de domínios diferentes que requerem também diferentes habilidades.

Pode-se considerar que a leitura é entendida hoje sob a perspectiva de Piaget, cognitivista; de Vygotsky, sociointeracionista; e de Wallon, afetividade; e pode-se considerar também que são cognitivistas em seu perfil mais profundo, posto que relacionam os processos mentais biológicos com a interação do meio externo. Nenhuma delas despreza a relação mental, interna, com a externa, o meio. Spinillo (2013) fala da natureza “complexa e multifacetada” do processo de compreensão leitora, baseada nas dimensões social, linguística e cognitiva, que somente podem ser analisadas separadamente a título de pesquisa, posto que agem de forma indissociável. O contexto social, nessa perspectiva, age sobre a informação ou memória de longo prazo, o que denota um caráter circunstancial do processo de compreensão. Além disso, o autor afirma que “o propósito com que se lê um texto pode gerar diferenças na compreensão” (2013, p. 173), o que vai de encontro com a teoria de Vygotsky, de que há processos ainda mais profundo que o pensamento, que interferem na assimilação de novas informações. Spinillo diz que “a compreensão também é influenciada pela expectativa” (2013, p. 173), devido aos fatores intratextuais (título, estrutura organizacional, subtítulos) que direcionam a compreensão.

King, por seu turno, assevera haver diferentes níveis de compreensão, segundo a coerência na representação mental, e que esses níveis de compreensão são referidos como literal e pela compreensão inferencial, ou nível superficial de compreensão versus nível profundo (2007, p. 267). O autor declara a constatação de Kintsch (1974, 1988apud King, 2007) de que a compreensão rasa ou superficial se baseia nas perguntas o que, quem, onde e quando, a partir

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29 do texto; enquanto a compreensão profunda se pauta no porquê. King completa o raciocínio afirmando que é importante também levantar as causas desse porquê, o que levaria, baseando-se na afirmação de outros teóricos por ele citados1 que a compreensão pode ser aprendida, a partir de alguns dispositivos impulsionadores. Assim, o autor estabelece como estratégia de promoção da compreensão e da leitura crítica a necessidade de incluir, e realiza pesquisa acerca do desenvolvimento leitor utilizando essa ferramenta, a pergunta “por que?” e outras perguntas provocadoras nas atividades escolares, posto que as perguntas induzem ao esforço cognitivo e metacognitivo no processamento do texto (KING, 2007).

Para além dos aspectos de processamento biológicos ou sociais, o conhecimento que o leitor tem da língua influencia a forma como vai compreender o que está escrito, pois o texto existe mediante alguma materialidade, apoiado em palavras, sentenças e uma série de estruturas que compõe a língua. É nesse momento que a inferência se torna fundamental. Inferir é entender que o texto não tem todas as informações para o seu processamento interno, que é necessário ir além da decodificação de palavras, a fim de preencher lacunas deixadas pelo texto, por meio do conhecimento prévio de mundo, criando-se a representação mental necessária para a compreensão plena. Essa inferência somente se processa a partir, portanto, do conhecimento de mundo, ou, da habilidade de se acessar a memória de longo prazo, relacionando-a ao momento da leitura de um novo texto, apoiado na materialidade linguística. Assim, a construção dos significados do texto se dá além dos elementos intratextuais.

Uma vez que se estabelece a inferência textual a partir desse processo cognitivo completo, não é mais possível para um leitor eficiente desconectar as informações intratextuais das extratextuais. Spinillo afirma que “as inferências estabelecidas durante ou após a leitura passam a fazer parte da representação mental do texto de tal forma que o leitor não consegue mais distinguir a informação contida no texto daquela que foi inferida a partir dele” (2013, p. 180).

Coscarelli (2002a) também coaduna com a concepção de que leitores proficientes são hábeis em alcançar conhecimentos individualmente, descortinando-se um processo de aprendizagem constante. A autora sinaliza a decodificação como um processo de transformação em sons a partir dos signos gráficos; enquanto decifrar estaria no âmbito da geração de reflexões, questionamentos, que se relacionarão com o conhecimento de mundo do leitor, e podem não modificar, segundo seu nível de conhecimento prévio e outros fatores sociais, suas perspectivas a respeito do que foi lido. Divide-se, assim, a leitura em uma parte que decodifica,

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30 de caráter linguístico, e outra que influi no significado e no sentido. A partir dessa bipartição, há outras subdivisões. O processamento linguístico subdivide-se em outras duas partes, uma primeira, que envolve o aspecto lexical, relacionado à morfologia, à fonética, à fonologia, e também à sintaxe e semântica; e a segunda, que constrói relação entre as palavras, a partir da identificação inicial. O processamento do significado relaciona-se com a construção de sentido, e subdivide-se em coerência local, espaço onde se processa uma primeira análise do significado das frases e das relações que estabelecem entre si; coerência temática, que parte para a construção de sentido no macrotexto; e coerência externa, que, por fim, processa a integração dessas informações com o conhecimento prévio, tornando possível a leitura crítica. No processamento sintático, o leitor estrutura os elementos lexicais identificados e constrói rapidamente uma sentença sintática, salvo quando ocorre uma ambiguidade (COSCARELLI, 2012). Segundo Corrêa (1999), quando ocorre a ambiguidade o leitor abandona uma hipótese baseando-se nos seus contextos e conhecimentos prévios.

No processamento lexical, Coscarelli (2012) postula que o alfabetizado ao ver uma palavra a lê mesmo sem intenção. As palavras são identificadas através de ativação das informações fonológicas, fonéticas, morfológicas, sintáticas e semânticas (FOSS, 1988, apud COSCARELLI, 2012). Corrêa (1999) parte desse mesmo princípio e corrobora que vários tipos de informações, sejam elas como a grafia, forma fonológica e significado, são ativadas ao se reconhecer uma palavra.

Figura 2 - Processamento Linguístico.

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31 A memória de trabalho está conectada com a compreensão linguística e auxilia na correção da incompreensão, levando o leitor a adotar mecanismos que o ajudem na compreensão, como ler mais devagar, buscar outras fontes de informação, reler alguma passagem do texto. Por outro lado, a memória de longo prazo é menos explorada pelos pesquisadores, mas entendemos que é ela que fornece ao leitor a capacidade crítica, mais que a interpretativa, haja vista que só se pode estabelecer crítica em contraposição a outros conhecimentos prévios. Essa capacidade analítica da própria compreensão do texto lido está relacionada com a capacidade metacognitiva do leitor.

Acercada apreensão de informações novas e a correlação com as antigas, Ausubel propõe que conhecimentos prévios servem de âncora para os novos. Os conhecimentos preexistentes são denominados subsunçores, e as novas informações modificam-nos e são por eles modificadas, a partir da seleção feita pelo leitor, ou pelo receptor do conhecimento, ligada a fatores pessoais relativos aos seus interesses. O processo de aquisição de novos conhecimentos é ininterrupto. Quando não há um conhecimento prévio relacionado com o novo objeto, a aprendizagem se torna mecânica, como acontece quando crianças aprendem a ler, realizar os primeiros cálculos, etc., e se o aprendiz não retorna ao que foi transferido a ele por meio da repetição, a informação se perde. Esses novos conhecimentos geralmente se encaixam dentro do princípio da arbitrariedade proposto por Sausure. Quando esses novos conhecimentos estão bastante sólidos, tornam-se subsunções, relacionando-se com novas informações e modificando-se constantemente, num procedimento de diferenciação progressiva. Igualmente, subsunçores podem se modificar e gerar novos conceitos; ou seja, informações apreendidas se modificam, num processo chamado de reconciliação integrativa. A aprendizagem resulta desses dois processos, e, ademais, outro ponto importante dessa teoria, as informações novas ficam em repouso durante um tempo. Dependendo do uso que lhes é conferido, podem permanecer e se fortalecer, ou serem apagadas para liberação de espaço na memória. Isso mostra a relação da ciência cognitiva com a revolução tecnológica. A necessidade de novas máquinas computacionais foi, e ainda é, um campo fértil para os estudos do processamento cognitivo de aprendizagem.

Coscarelli (2003) reafirma as múltiplas operações cognitivas decorridas do processamento da leitura e apresenta as duas correntes teóricas acerca do tema, nas quais se denota a distinção entre a defesa de um processamento linear e outro paralelo em torno dos domínios da computação da linguagem. Ressalte-se a presença de um sistema modular interno, que recebe estímulos e os transforma em representação mental, e um processador cognitivo,

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32 alimentado pelo modular, e no qual se dá o estabelecimento de relações internas e externas. O sistema modular interno, então, estaria para a linguística e a decodificação, assim como o processador cognitivo estaria para o significado e o sentido.

A partir do momento que a aprendizagem é assimilada, ela se torna natural, espontânea, e o aprendiz, ou o leitor, realiza todos os processos mentais sem ao menos perceber que o faz, a não ser que encontre algum obstáculo, alguma interferência que o impeça de prosseguir e o obrigue a ativar novos sistemas. Ou seja, todos os processos de decodificação e significado podem sofrer interferências que dificultam a computação da leitura proficiente, e quando alguma dessas interferências acontece, o processamento passa a ser “realizado sob o controle consciente do leitor, deixando, assim, de ser automático” (COSCARELI, 2002, p. 13). Scliar coaduna com essa postura, e declara que o leitor “leigo tem a impressão de que passa diretamente à significação básica, porque o processamento é tão rápido que ele não “escuta” a imagem acústica que acompanha o reconhecimento da forma escrita” (2008, p. 31).

Essas interferências vão desde uma maior complexidade silábica, uma palavra maior que a estrutura canônica da língua, e o mesmo acontece com relação à construção sintática, as probabilidades que o leitor determina de encontrar certas palavras em contextos específicos, e vários outros, que podem abarcar os domínios da compreensão textual no que tange à relação com o conhecimento prévio de mundo, envolvendo a coerência e a coesão micro e macrotextual. No processo semântico, para Coscarelli (2012), o leitor analisa as frases e as relações que há entre elas para ter como resultado as inferências – um processamento semântico construído a partir do texto e dos conhecimentos prévios que possui. Assim como a linguista, para Corrêa (1999) as inferências ocorrem a partir do momento em que o leitor busca saberes da sua experiência e preenche no texto lacunas.

Na escola, portanto, é possível trabalhar cada processo separadamente e desenvolver habilidades relacionadas à leitura permite melhorá-la como um todo. Desta forma, é possível se pensar e criar novas formas e práticas pedagógicas para se trabalhar com o texto (COSCARELLI, 2012; CORRÊA, 1999).

As práticas de leitura são sempre situadas em contextos sociais, culturais históricos e econômicos. Fazemos combinação de sons, de imagens, de escrita e de outros sentidos desde os tempos primitivos para produzir textos e hoje com as Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação esse arranjo evidencia uma continuidade da relação entre o verbal e o não verbal. Kenner(2004, apud JEWITT, 2005) confirma isso ao apontar que a leitura, assim como a escrita, são práticas situadas que sempre foram, sobretudo, multimodais, visto que requisitam a ativação de conhecimento e interpretação de marcas não somente visuais, mas cada vez mais

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33 de outros modos de representação. A multimodalidade se constitui como o arranjo entre vários modos de representação que possibilita ao leitor diferentes entendimentos e pressupostos para a construção do sentido, possibilitando diversas leituras de variados textos.

Entender que a linguagem é um processo de representação interna da realidade, utilizando-se de algum meio de comunicação que seja compartilhado, que é arbitrária, que utiliza signos através de mecanismos psicofisiológicos sociais, físicos, e, de acordo com Sausure (1975), é um elemento, ademais de comunicativo, de expressão do pensamento, que é uma faculdade abstrata e inata do ser humano; leva-nos a compreender melhor a intuição linguística do leitor, relacionando todas essas características com o acesso ao conhecimento internalizado. Leva-nos a compreender que a língua é uma atividade tão dinâmica quanto cognitiva. Chega-se aí ao mentalismo que aproximou a linguística da psicologia, voltando-se para esses aspectos cognitivos. Os comportamentos e procedimentos durante a aprendizagem e a leitura devem servir de instrumentos para se fornecer mais elementos acerca das capacidades humanas. A perspectiva cognitiva, portanto, “vê o comportamento e seus produtos não como objetos de investigação, mas como dados que podem fornecer evidências sobre os mecanismos internos da mente e os modos como esses mecanismos operam ao executar ações e interpretar a experiência” (CHOMSKY, 1998, p. 21).

A investigação de todos os processos cognitivos que geram dados mostra as capacidades subjacentes com relação ao uso da língua e dos conhecimentos já armazenados. Nessa perspectiva, Scliar (1997) afirma que os avanços da tecnologia e da ciência proporcionam ferramentas cada vez mais inovadoras com refinadas calibrações e recortes dos objetos de estudo. Assim, o desenvolvimento interdisciplinar das ciências cognitivas, da neurociência, da neurologia comportamental e da neurociência computacional testa com alto grau de precisão e confiabilidade muitas hipóteses acerca do processamento da recepção e da produção linguística. No contexto de evolução, já se sabe ao certo que o processamento da palavra escrita, segundo Scliar (2008, p. 24), “é precedido por um processamento menos específico nas áreas visuais primárias da região occipital”. Em seguida, o processamento se dá na “região occípito-temporal ventral do hemisfério esquerdo” (2008, p. 25), região comprovadamente responsável por reconhecer o valor específico das palavras escritas. Ressonância magnética, eletroencefalogramas e magnetoencefalografias comprovam esses dados. Nos primeiros 50 milisegundos o cérebro não diferencia rostos de palavras, isso acontece por que o estímulo visual se desmembra em muitos fragmentos para depois se recompor. O autor afirma que “somente a parte mais central da retina, que ocupa 15º, denominada fóvea, por ser rica em células foto-receptoras, de resolução muito alta, chamadas cones, é apta a processar as letras”

Referências

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