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Da fotografia pictorialista aos primeiros ensaios de uma fotografia moderna no Paraná 1

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Da fotografia pictorialista aos primeiros ensaios

de uma fotografia moderna no Paraná

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PEGORARO, Éverly (Mestre)2

Universidade Estadual do Centro-Oeste - UNICENTRO/Paraná

Resumo: A fotografia adequou-se às novas formas de pensar e às novas necessidades de visibilidade potencializadas pela racionalidade moderna. As várias práticas fotográficas, como o pictorialismo e a fotografia moderna, são formas de o homem se relacionar com o dispositivo fotográfico e, ao mesmo tempo, reflexos de como entende a nova técnica. Este artigo apresenta dois fotógrafos paranaenses que, em seus contextos histórico-culturais específicos, estavam em consonância com o que então se pensava e se produzia em fotografia. Pode-se dizer que Arthur Wischral (1894-1982) e Domingos Foggiatto (1887-1970) deram alguns primeiros ensaios na prática de uma fotografia moderna voltada para a imprensa no Paraná.

Palavras-chave: Fotografia; História; Paraná; Arthur Wischral; Domingos Foggiatto.

Um pesado tripé, uma câmera de formato grande, chapas de vidro. Era com esse aparato técnico que Arthur Wischral (1894-1982), um dos fotógrafos paranaenses pioneiros, se posicionava nas suas andanças pelo Paraná e por Santa Catarina, a registrar desde cidades em desenvolvimento até a construção de estradas de ferro. Diante de uma época marcada pelos discursos de modernidade, esse personagem foi apresentado ainda adolescente à prática fotográfica, quando ganhou do pai uma máquina portátil, por volta de 1910 (BOLETIM, 2007). Quem lhe propiciou os primeiros ensinamentos foi o alemão Germano Fleury, fotógrafo e comerciante de artigos fotográficos em Curitiba (KOSSOY, 2002, p. 141). Foi nesse ambiente que Wischral se familiarizou com a técnica fotográfica e as inúmeras possibilidades dela decorrentes.

Assim como outros fotógrafos atuantes no Paraná nesse período, Wischral seduziu-se pelo registro do inusitado, solidificando uma das características da experiência fotográfica moderna, sobretudo a voltada para a imprensa. Em 1913, ao ouvir a explosão de armazéns de uma rede ferroviária, ele relata qual foi sua atitude:

!!!"#$"%&#'$#(")*"#+"%(+,"-.,"#/(0(%,1234"#"5#/("6/*")(%#.1,7"#$"8$#9(,"5,::,9"5,9,";(9,9"$+,:"%&,5,:<!" Então vi todas as máquinas de escrever, estavam todas no chão, os armários e tudo. Tirei uma [foto] do público, todos olhando animais machucados e uma porção de coisas (BOLETIM, 2007, p. 15).

1 Trabalho apresentado no GT de História da Mídia Audiovisual e Visual, integrante do VIII Encontro Nacional de História da Mídia, 2010.

2 Professora do Departamento de Comunicação da Universidade Estadual do Centro-Oeste - UNICENTRO. Mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense e doutoranda em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: everlyp@yahoo.com.br .

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Imagens como essa interessavam à imprensa. Wischral transforma, então, a paixão que o pai ajudou a despertar ainda na adolescência em trabalho. Nesse período, ainda eram poucos veículos de comunicação no Paraná que publicavam imagens, consequentemente, eram poucos fotógrafos que enveredavam por esse ramo. Wischral foi um dos pioneiros, ao trabalhar no jornal A República3 e na revista A Bomba4. Esse tipo de trabalho lhe rendeu a carteira de repórter fotográfico, legitimidade simbólica que lhe abriu várias portas, principalmente em sua estada na Alemanha da Primeira Guerra Mundial.

Mas além de adentrar pelas práticas fotográficas conceituadas como modernas, Wischral foi fotógrafo adepto do pictorialismo, um dos períodos iniciais da fotografia no Brasil. Utilizando-se de técnicas próprias do movimento, ele ajudou a consolidar essa fase estético-fotográfica no Paraná.

Helouise Costa e Renato Rodrigues da Silva (2004) definem três momentos relevantes para a história da fotografia no Brasil. O primeiro refere-se à prática fotográfica documental do século XIX, com suas experimentações e apostas na modernização, mas ao mesmo tempo criticando os rumos tomados por esta. A segunda fase tem o pictorialismo como principal método, quando os fotógrafos tentam adaptar ao meio as concepções clássicas de arte. O terceiro momento enquadra-se na experiência moderna propriamente dita. Pode-se dizer que o trabalho de Wischral oscila entre o segundo e terceiro períodos.

O pictorialismo é considerado um movimento de reação conservadora à industrialização e à massificação da fotografia. Por isso mesmo, seus ideais ajustavam-se perfeitamente aos desejos dos fotógrafos que se reuniam em associações fotoclubísticas. Foi principalmente nesse ambiente que, no Brasil, o pictorialismo ganhou força.

Os pictorialistas objetivavam um estatuto distinto para a fotografia, que não a caracterizasse apenas como pura técnica (resultado de um automatismo da câmera e produto de uma objetividade), mas que fosse permeada pela subjetividade do fotógrafo, o que aconteceria através de uma série de intervenções na cópia fotográfica sob orientação de variados processos.

Para que a imagem revele a relação do fotógrafo com o real, os pictorialistas lançam mão de uma série de recursos que, além de refletirem uma recusa do real, questionam a própria natureza da câmara. Com a utilização de novos processos surgidos com o desenvolvimento da técnica fotográfica = como a goma bicromatada e o bromóleo =, eles podem controlar as tonalidades, introduzir luzes e sombras e remover detalhes que parecem muito descritivos. Muitos desses efeitos são acompanhados da utilização de pincéis, escovas, raspadeiras e até dos próprios dedos, com o objetivo de alterar as

3 O jornal A República tinha como chefe de redação Romário Martins, conhecido por ser quem idealizou o Paranismo,

movimento que buscava $+,"(/#.;(/,/#"9#'(3.,)">'#.$?.,@7"demonstrando o Paraná em pleno progresso. Pregava a exaltação de valores locais e o desenvolvimento de uma simbologia baseada em elementos nativos, como o pinhão e o pinheiro do Paraná.

4 A revista humorística A Bomba, de Marcelino Bittencourt, era conhecida por ironizar acontecimentos da época, no

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formas. (MELLO, 1998, p. 38)

Mesmo com a relutância dos profissionais alemães, de acordo com o relato de Wischral, o tempo de aperfeiçoamento na Europa, centro nevrálgico do pictorialismo, lhe possibilitou desenvolver técnicas fotográficas que, posteriormente, trouxe para o Paraná.

... eu aplico na gelatina do negativo um retoquezinho com um pincel fino, não pontudo demais, com uma tinta metálica. E tendo uma boa luz a gente dilui em uma travessa de porcelana um pouquinho daquela tinta com um pouquinho de água. Eu copiei isso com um velho fotógrafo de Wurzburg. Sabe, lá eles não gostavam de ensinar. (...) O retoque eu aprendi vendo com ele fazia. A gente só usa luz vermelha porque a luz branca estraga o negativo na revelação (BOLETIM, 2007, p. 16)

A manipulação e o retoque nas superfícies da emulsão da chapa de vidro citados pelo fotógrafo correspondem ao interesse de eliminar possíveis imperfeições do seu ponto de vista estético, atribuindo sua autoria sobre todo o processo.

Para imprimir sua marca sobre a obra, o fotógrafo artista deve controlar todas as etapas de produção da imagem. Para isso, ele intervém com ampla liberdade na escolha dos diversos elementos constitutivos da fotografia: tema, composição, iluminação, tipo de material, ponto de vista, revelação e impressão. O caráter artístico da fotografia também é assegurado pela geração de uma prova única, obtida mediante o emprego de processos de pigmentação, como o bromóleo e a goma bicromatada, que possibilitam múltiplas intervenções sobre o negativo e a cópia, seja com a introdução de novos elementos, a supressão de detalhes excessivos, a correção de pequenas falhas, a modificação de tons ou o realce de determinado aspecto. (MELLO, 1998, p. 69)

André Rouillé (2009) explica que a singularidade do pictorialismo está justamente na aliança singular entre dois elementos heterogêneos: a máquina fotográfica e a mão do fotógrafo artista. A subjetividade do processo fotográfico estaria, então, atrelada à interpretação que seria o resultado estético do processo de intervenção.

Suas intervenções extrafotográficas, manuais ou não, produzem a interpretação, criando uma distância subjetiva entre o real e a imagem. Mas o discurso pictorialista acerca da interpretação enquanto traço artístico finge acreditar que a fotografia documentária restitui o real tal e qual, esquecendo que fotografar é, agora e sempre, interpretar. Essa cegueira diante da prática documental serve ao pictorialismo para elevar a fotografia ao patamar de uma arte de interpretação, para desvalorizar a coisa representada em benefício de ações estéticas operadas sobre a imagem. (ROUILLÉ, 2009, p. 257)

Seguindo a conceituação do mesmo autor, pode-se dizer que Wischral se enquadra na prática da arte dos fotógrafos, ou seja, que ele desenvolveu e defendeu a prática de um procedimento artístico interno ao campo fotográfico. Para esta pesquisa, não foi possível identificar um interesse ou uma preocupação direta do fotógrafo nas discussões então vigentes sobre fotografia como

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técnica ou arte5.

Percebe-se, em suas temáticas fotográficas, temas caros à pintura, como paisagens e retratos posados. A preocupação com o equilíbrio dos diversos elementos da composição da imagem, como linhas, formas, tons, luz e sombra, são sinais claros da influência pictorialista em seu trabalho (Figura 1).

Figura 1 - Estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá

Arthur Wischral (s/d)

5 As relações entre fotografia e arte, sobretudo na prática pictorialista, podem ser conferidas no livro de Maria Teresa

Bandeira de Mello, Arte e Fotografia: o movimento pictorialista no Brasil (1998). A autora aponta as discussões que envolveram fotografia e pictorialismo e marcaram muitas páginas da revista Photogramma, promovida pelo Foto Club Brasileiro, do Rio de Janeiro, fundado em 1926. O mérito de seu livro está em analisar a relação entre a produção do fotoclubismo com a produção artística do período e de outras manifestações culturais, não se restringindo apenas ao fotográfico.

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A ânsia de ver e ser visto

Wischral, assim como muitos outros fotógrafos do Paraná, presenciou o momento de euforia da inserção da fotografia nas relações cotidianas de uma sociedade que passava por profundas transformações. A fotografia cristaliza-se como o dispositivo inaugural dessas mudanças, que acontecem sobretudo no campo da subjetividade, quando as relações entre homem e técnica estão em processo de diferenciação. (FATORELLI, 2003)

As tecnologias imagéticas instauraram novas formas de visualidade e percepção. Cada época e cada lugar possuem maneiras específicas e contextuais de representar o mundo visível, que variam de acordo com diferentes regimes de visualidade. Estes contribuem para a legitimação de conceitos e valores, para a acomodação de visões de mundo, para a compreensão de conhecimentos, para o estabelecimento de comportamentos.

... la visión no puede separarse de las cuestiones históricas sobre la construcción de la subjetividad. Sobre todo dentro de la modernidad del siglo XX. Lo que hoy constituye el dominio de lo visual es un efecto de otro tipo de fuerzas y relaciones de poder, y no un hecho de carácter perceptivo. (HERNANDEZ, 2006, p. 30)

Regimes de visualidade se estabelecem a partir da experiência empírica associada a regras sociais para a formação, reconhecimento e legitimação de imagens. As relações que se estabelecem entre homens e imagens acontecem a partir da circulação de significados da época e com os 9#5#9;A9(3:" :(+BA)(%3:" /#" %,/," $+7" 39(#.;,/3:" 5#),:" >9#'9,:@" /#::#:" 9#'(+#:" /#" C(:$,)(/,/#!" Foucault fala em um sistema de elementos que estabelec#+","39/#+"/,"%3+59##.:23!">D:"%A/('3:" fundamentais de uma cultura = aqueles que regem sua linguagem, seus esquemas perceptivos, suas trocas, suas técnicas, seus valores, a hierarquia de suas práticas = fixam, logo de entrada, para cada homem, as ordens em5?9(%,:" %3+" ,:" 8$,(:" ;#9*" /#" )(/,9" #" .,:" 8$,(:" :#" &*" /#" #.%3.;9,9@" (FOUCAULT, 1999, p. XVI)

A experiência visual é um processo dinâmico, mais complexo, demorado e abrangente que a experiência de ver, permeado por processos de constituição de visualidades, e que influi diretamente nas manifestações da cultura visual.

Nesse processo de compreensão que se desenvolve a partir de imagens, as visualidades ganham sentido como representações que transitam e emergem de repertórios visuais criando associações, acionando referências e evocando contextos. Desse modo, podemos dizer que as representações visuais são moldadas por práticas subjetivas e culturais que as transformam em visualidades. (MARTINS, 2009, p. 35)

Raimundo Martins explica que as visualidades envolvem processos de sedução, rejeição e cooptação, desenvolvidos a partir de imagens. Tais processos originam-se na experiência visual, que

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sugere e gera links a3"9#5#9;A9(3":(+BA)(%3"/#"%,/,"$+!">A experiência visual e seus repertórios são responsáveis por sinapses entre conhecimentos objetivos e subjetivos configurados por referências culturais que, de alguma maneira, influenciam os modos e as práticas de ver dos indivíduos.@" (MARTINS, 2009, p. 34).

As práticas midiáticas cada vez mais reconfiguram as relações de um sujeito observador e dos modos de representação. Além de ser um dos componentes das práticas midiáticas, a fotografia também é uma das opções de mediação do regime de visualidade do século XX, que procurava legitimar um discurso de modernidade. Ser fotografado e compartilhar o hábito de fotografar faziam parte do conjunto de elementos que definia o que era ser moderno em consonância com o imaginário da época. Essa visualidade, formada por discursos e práticas estéticas, contribuiu para a construção de distintas formas históricas da experiência visual ao longo do século XX.

A necessidade de ver e ser visto fundamenta-se na própria ânsia moderna de se apropriar do mundo através do olhar, à crescente vontade de dominar o invisível, desejos que a fotografia, desde o século XIX, vem saciar, pois ela representa o mundo visível e, simultaneamente, torna-o visível.

Rouillé (2009) comenta que a fotografia surge e potencializa-se a partir de um contexto social de profunda crise pela verdade, que atingiu os modos de representação em vigor. Assim, ela vem para renovar a crença na imitação e na representação, legitimando-se com possíveis funções documentais. Este é um dos motivos que levaram à perpetuação, durante o século XX, da prática e das características do que ele conceitua como fotografia-documento. Esta define-se como algo preexistente, cuja finalidade é reproduzir fielmente a aparência, baseada tanto nas capacidades analógicas do sistema ótico quanto na lógica de impressão do dispositivo químico, ocasionando uma ética da exatidão e a uma estética da transparência. (ROUILLÉ, 2009, p. 62)

Entretanto, o mesmo autor lembra que a fotografia não nasceu intrinsecamente moderna, mas servia como uma ferramenta que respondia às novas necessidades de imagens da nova sociedade em suas negociações e transformações com a modernidade.

Se a fotografia produz visibilidades modernas, é porque a iluminação que ela dissemina sobre as coisas e sobre o mundo entra em ressonância com alguns dos grandes princípios modernos; é por ajudar a redefinir, em uma direção moderna, as condições do ver: seus modos e seus desafios, suas razões, seus modelos, e seu plano = a imanência. (ROUILLÉ, 2009, p. 39)

À medida que o tempo começa a adquirir importância fundamental na sociedade moderna e as atividades sociais se intensificam, dinamizando e instabilizando a realidade, o instantâneo impõe-se como elemento central na prática fotográfica. O próprio aprimoramento técnico alavancou o instantâneo, com a redução do tempo de pose. Esses elementos fortaleceram e desenvolveram a essência documentária da fotografia.

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e cotidianos. O visível torna-se cada vez mais fragmentado e serializado pelas fotografias, o mundo dos acontecimentos urbanos e comuns abre-se para as lentes da máquina fotográfica, trazendo novas perspectivas e características para o fazer fotográfico.

Wischral, mesmo com suas pinceladas de retoque que o assinalavam como pictorialista, já se deixava seduzir pelas características da fotografia moderna. Algumas de suas produções primam pelo registro do cotidiano, por situações em que, supostamente, não há intervenções do fotógrafo na formação da cena ou nas ações dos personagens (Figura 2).

Figura 2 ! Cena de urbanização do centro de Curitiba

Arthur Wischral (1958)

Por trás das lentes

A fotografia se insere historicamente em circuitos sociais dos quais também interagem os fotógrafos. Como explica Peter Burke (2004), representações da sociedade nos dizem sobre a relação entre o realizador da representação e a pessoa representada. Esta pode ser vista com maior ou menor distância, em diferentes enfoques. Assim, o que se vê é uma visão de sociedade, num sentido ideológico, mas também visual. Fotógrafos e personagens dessas representações sabem que fazem parte da representação e, simultaneamente, as vêem na condição de espectadores.

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O fotógrafo é o mediador do processo, que atua mediante o recurso a uma série de regras sociais e que envolvem, inclusive, o domínio de um saber de ordem técnica. Nesse momento, ele é o sujeito social que detém técnicas e escolhe, entre uma série de possibilidades (subjetivas, estéticas e contextuais), aquelas que mais se adéquam aos objetivos da produção fotográfica.

Vale a pena lembrar os conceitos de Pierre Bourdieu (1982), que explica que o indivíduo se insere e se relaciona em múltiplos campos sociais. Neles, os agentes se comunicam, efetuam trocas simbólicas e se posicionam socialmente. Essas ações são resultado, também, de um habitus, que para Bourdieu é o sistema de disposições socialmente constituídas, internalizadas pelo indivíduo ao longo de suas experiências. Dessa forma, entende-se que os fotógrafos, com seus conceitos, suas opiniões e seu aparato técnico, constituíram grupos de atores que instauraram regimes estéticos. Suas ações são entendidas como embates que acontecem no mundo social, como resultado da busca dos agentes sociais por posições nos campos em que se localizam.

Domingos Foggiatto (1887-1970) é outro paranaense que aventurou incursões na experiência fotográfica moderna. Ele é conhecido como um dos primeiros fotógrafos de imprensa no Paraná, enfatizando cenas das transformações urbanas de Curitiba. A partir de 1930, os aprimoramentos da técnica fotográfica já lhe permitiam registros mais dinâmicos e instantâneos, sobretudo nos esportes, seu assunto fotográfico predileto.

Suas experiências no mundo da imprensa iniciam em 1910, quando começa a trabalhar na tipografia do jornal A República. No ano seguinte, já possuía sua própria tipografia na Praça Tiradentes, centro da cidade. É nessa época que surgem seus primeiros trabalhos fotográficos. Em 1930, graças aos seus conhecimentos gráficos, foi convidado a chefiar as oficinas do jornal O Dia. Desde o começo de 1930, era visto fotografando jogos de futebol e demais esportes (Figura 3), fornecendo suas fotografias para a imprensa da capital, até se tonar em 1936 repórter fotográfico do Diário da Tarde. Em 1937, é contratado pelo diário Gazeta do Povo para trabalhar na paginação.

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Figura 3 - Competição de natação no Tanque do Bacacheri (Curitiba)

Domingos Foggiatto (1939)

Curiosamente, na prática fotográfica, esse personagem ocupava um lugar triplo. Além de fotógrafo de imprensa, seu nome consta no rol de membros fundadores da pioneira associação fotoclubística de Curitiba: a Sociedade Paranaense de Foto Amadores6, primeira denominação da longa trajetória do Fotoclube do Paraná. Ainda uma terceira faceta pode ser percebida nesse personagem, além de fotoclubista e fotógrafo de imprensa. Em 1940, a convite do interventor Manoel Ribas, Foggiatto foi nomeado fotógrafo oficial do Estado no DEIP (Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda), cargo em que seria nomeado oficialmente onze anos depois. (FOTÓGRAFOS, s/d)

Os trabalhos de Wischral, assim como o de Foggiatto, são exemplos que marcam características comuns da prática fotográfica no Paraná, sobretudo a da fotografia-documento, conceituada por Rouillé (2009), mesmo que em diferentes épocas. Cabe salientar que os dois fotógrafos apresentados aqui trabalharam na imprensa e, por isso, trouxeram suas experiências, seus habitus, para dentro das redações, o que nos sugere que as opções estéticas deles instauraram formas de fotografar na imprensa paranaense.

6 Fundada em 1938, a Sociedade Paranaense de Foto Amadores se torna Foto Clube do Paraná em 1942. Em 1950,

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Considerações finais

As transformações na forma de ver e ser visto potencializadas pelas tecnologias imagéticas, das quais a fotografia pode ser entendida como dispositivo inaugural, não são as únicas determinantes de projetos estéticos. Essas transformações são motivadas também pelas necessidades de expressão de uma determinada época. A fotografia adequou-se às novas formas de pensar e às novas necessidades de visibilidade potencializadas pela racionalidade moderna.

As várias práticas fotográficas, como o pictorialismo e a fotografia dita moderna, são formas de o homem se relacionar com o dispositivo fotográfico e, ao mesmo tempo, reflexos de como entende a nova técnica e o relacionamento que deve ter com ela. Trata-se de diferentes compreensões e etapas de se perceber e se relacionar com o mundo, onde cada vez mais se faz sentir a relação homem e máquina.

Entretanto, é importante não cair no perigo de supervalorizar o meio em detrimento da mediação. O papel do fotógrafo e sua maneira de interpretar a prática fotográfica são imprescindíveis. Assim, as trajetórias de Wischral e de Foggiatto, com suas peculiaridades, são importantes para procurar compreender o lugar da fotografia na sociedade paranaense. Pode-se dizer que ambos, em seus contextos histórico-culturais específicos, estavam em consonância com o que então se pensava e se produzia em fotografia. Ainda é possível arriscar que os dois deram alguns primeiros ensaios na prática de uma fotografia moderna voltada para a imprensa. Isso se deu através da aproximação de temas cotidianos, da libertação das poses e dos enquadramentos pictorialistas e do registro do instantâneo. Além disso, o valor testemunhal e documental da imagem, definição que delineia toda a trajetória da fotografia de imprensa, está presente no trabalho dos dois fotógrafos escolhidos para esta breve análise.

Gradativamente, a fotografia assume o papel de uma das transmissoras de uma ordem visual. >6E(9('(9"3"3)&3<";39.3$-se inseparável da designação e prevaleceu sobre a representação, e mesmo :3B9#"3";#:;#+$.&3@7".3:"/(F"G3$())H"IJKKL7"5!"MNOP!"Q),";39.,-se mediadora de relações sociais e contribui para a produção de sentidos, para a conformação de valores e comportamentos, para a acomodação de visões de mundo. Compreender o lugar simbólico ocupado por fotógrafos e pelo próprio processo fotográfico nessas ações é buscar compreender os processos de comunicação que se engendram nesses espaços, pois eles contribuem para a constituição das próprias narrativas históricas.

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Referências

BOLETIM CASA ROMÁRIO MARTINS. O Acervo Wischral: documentos de um olhar. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, v. 31, n.134, abr.2007.

BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1982. BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. São Paulo: Edusc, 2004.

COSTA, Helouise. DA SILVA, Renato Rodrigues. A Fotografia Moderna no Brasil. São Paulo: CosacNaify, 2004.

FATORELLI, Antonio. Fotografia e viagem: entre a natureza e o ofício. Rio de Janeiro: Relume Dumará: FAPERJ, 2003.

FOTÓGRAFOS PIONEIROS DO PARANÁ - IV. Domingos Foggiatto. O repórter fotográfico. Curitiba: Galeria Funarte, s/d.

FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 8ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

HERNÁNDEZ, Fernando. Elementos para una génesis de un campo de estudio de las prácticas culturales de la mirada y la representación. Visualidades = Revista do Programa de Mestrado em Cultura Visual. Goiânia, Vol. 4, n.1 e 2: Jan-Dez/2006, pp.13-62.

KOSSOY, Boris. Dicionário histórico-fotográfico brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002.

MARTINS, Raimundo. Narrativas visuais: imagens, visualidades e experiência educativa. In: Vis. Revista do Programa de Pós-graduação em Arte. Brasília, janeiro/junho de 2009, v. 8 nº 1, pp. 33-39.

MELLO, Maria Teresa Villela Bandeira de. Arte e fotografia: o movimento pictorialista no Brasil. Rio de Janeiro: Funarte, 1998.

ROUILLÉ, André. A fotografia: entre documento e arte contemporânea. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2009.

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