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PROCEDIMENTO ESP.DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL Nº /SC AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ACUSADO: UBALDO CESAR BALTHAZAR

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PROCEDIMENTO ESP.DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL Nº 5015425-34.2018.4.04.7200/SC

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ACUSADO: UBALDO CESAR BALTHAZAR ACUSADO: AUREO MAFRA DE MORAES DESPACHO/DECISÃO

I - RELATÓRIO

Procedimento Especial do Juizado Especial Criminal. O Representante Ministerial entendeu pelo não oferecimento da transação penal, procedendo de imediato ao oferecimento de

denúncia em face de Ubaldo Cesar Balthazar e de Áureo Mafra de Moraes pela prática, em tese, do delito tipificado no art. 140 c/c 141, incisos II e III, do Código Penal.

Narra, em resumo, que o Reitor pro tempore da UFSC, Ubaldo, teria, em 18/12/2017 e no Hall da Reitoria, conduzido cerimônia em homenagem ao ex-reitor Cancellier quando manifestantes teriam ofendido a honra funcional da representante, delegada de polícia federal Érika Mialik Marena, faltando com o dever de polícia e, em razão da omissão, assumindo a autoria da injúria em tese perpetrada.

Áureo Mafra de Moraes, por sua vez, na condição de chefe de gabinete do reitor, teria deixado-se fotografar/filmar em frente à faixa dita injuriosa conferindo caráter oficial à manifestação. Ambos, cientes da divulgação por meio de canal televisivo e no Youtube, teriam assumido o risco do efeito multiplicador do resultado. Requereu, ao final, condenação em R$ 15.000,00 por dano civil, bem como o recebimento da denúncia e o

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prosseguimento do feito até sua conclusão com a condenação dos acusados. Não arrolou testemunhas.

Condição de procedibilidade. Representação da Delegada de

Polícia Federal Érika Mialik Marena constante no evento 1, evento 1, PORT_INST_IPL1, fl. 3, dos autos do Inquérito Policial nº

50041517320184047200, em conformidade com o art. 145 do Código Penal.

II - DECISÃO

Diante da recusa a priori do Parquet quanto ao oferecimento de transação penal, passo diretamente à análise da denúncia em lugar de designar a audiência preliminar prevista no art. 72 da Lei nº 9.099/1995.

1. Delito de injúria (art. 140 do Código Penal)

Inicialmente, importa tecer algumas considerações acerca do delito de injúria, tipificado no art. 140 do Código Penal nos seguintes termos:

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Trata-se de dispositivo penal que tangencia o previsto no art. 186 do Código Civil, que define como ato ilício a ação ou omissão voluntária que cause dano a outrem, ainda que exclusivamente moral:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

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Nada obstante, o dispositivo penal ultrapassa a condenação do ofensor da esfera patrimonial, para punir-lhe também com a própria liberdade.

Embora jamais revogado do Código Penal, sua aplicabilidade deve ser vista com parcimônia, mediante uma imersão constitucional à Carta promulgada em 1988, tendo-se em consideração o papel de ultima ratio que exerce o direito penal no Estado Democrático de Direito. Nessa direção, o Brasil vem adotando normativas que buscam afastar as penas corpóreas sempre que possível, tal como ocorre com a previsão da substituição da pena privativa de

liberdade para condenações cuja pena não ultrapasse 4 anos ou mesmo o instituto da transação penal a ser aplicado às infrações de menor potencial ofensivo, trazido pela Lei dos Juizados Especiais. Com esse olhar, especialmente delitos como o da injúria devem ser lidos pela lente do princípio constitucional da liberdade de expressão, tendo-se o cuidado para não se criminalizar qualquer conduta que por vezes possa significar simplesmente a

reivindicação de alguém - ou de um coletivo de pessoas - contra atitudes que, ainda que legais, não contem exatamente a aprovação de todos.

Vale mencionar que, como já manifestou o ilustre Ministro Roberto Barroso, "conflitos entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade são paradigmáticos na doutrina

constitucional" (Rcl 23364, Relat. Min. Roberto Barroso, j. em 24/05/2018, DJe-103, divulg 25/05/2018, public. 28/05/2018), sendo evidente, portanto, que com o advento da Constituição Federal de 1988, um novo e cuidadoso olhar deva ser emprestado aos chamados crimes contra a honra, que leve em conta a

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ponderação com os valores democráticos tão caramente adotados a partir de então.

É de se ter em conta, ainda, que a redação do art. 140 do Código Penal veio com a promulgação do diploma, em dezembro de 1940, quando no Brasil ainda não se falava em reconhecimento dos danos morais na esfera cível. Na mesma esteira, pontue-se que o Código Civil de 1916, embora tenha trazido inovações

importantes para a época, era essencialmente patrimonialista e não abarcava a proteção da dignidade da pessoa humana, que só veio a ser um norte com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Desde então, de forma vagarosa - a se considerar a necessidade de mudança cultural para os operadores do direito e a sociedade em geral - grandes avanços se sucederam, tendo seu ápice na

promulgação do Código Civil de 2002.

Atualmente, o Brasil conta com um sistema bastante eficiente de proteção da dignidade humana na esfera cível, impondo que o âmbito penal seja efetivamente visto, repiso, como ultima ratio, afastando-se de situações cuja resolução seja possível por esferas mais amenas.

Em síntese, tenho que a leitura dos delitos contra a honra deve, necessariamente, passar por uma imersão constitucional, de modo que, de um lado, os direitos de personalidade que visariam a

proteger devem sempre, em cada caso concreto, serem cotejados com o princípio da liberdade de expressão e, de outro, deve

sempre ter prevalência a solução menos gravosa, no campo civil (vale dizer, o direito penal como última ratio, reservado para as situações extremas).

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Cuida-se de previsão legal por meio da qual tutela-se a honra subjetiva do ofendido. Por honra - dignidade e decoro - pode-se entender a autoestima, o amor próprio, a respeitabilidade ou a correção moral/compostura de alguém. Assim, não é qualquer insulto que será protegido pelo direito penal, mas somente aquele que efetivamente atinge essa honra que reflete a forma como a pessoa se vê - e não a forma como seria vista por outrem. Não se trata, portanto, de se imputar algum fato determinado a alguém, mas de se formular juízos de valor e exteriorizar qualidades

negativas ou defeitos que importem ultraje ou vilipêndio a alguém (STJ, APn 813-DF, Corte Especial, rel. Felix Fischer, 02/03/2016, DJe 12/04/2016).

Majoritariamente, exige-se para a punição a presença do elemento subjetivo do dolo específico: a especial intenção de ofender,

magoar, macular a honra alheia. Assim, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci:

É possível que uma pessoa ofenda outra, embora assim esteja agindo com 'animus criticandi' ou até 'animus corrigendi', ou seja, existe a especial vontade de criticar uma conduta errônea para que o agente não torne a fazê-la. Embora muitas vezes quem corrige ou critica não tenha tato para não magoar outra pessoa, não se pode dizer tenha havido injúria. O preenchimento do tipo

aparentemente pode haver (o dolo existiu), mas não a específica vontade de macular a honra alheia.

Acerca do dolo específico, ressalte-se ainda o cuidado em analisá-lo quando eventual injúria venha a ser proferida no caanalisá-lor de

discussão, pois muitas vezes será o caso de estar ausente a especial vontade de magoar e ofender, dado que pessoas magoadas muitas

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vezes proferem palavras sem maior controle, arrependendo-se posteriormente daquilo que manifestaram quando se acalmam. Outrossim, no que tange ao retro mencionado conflito entre liberdade de expressão e direito de personalidade - que muitas vezes pode verificar-se concretamente no âmbito desse tipo penal - o juízo de ponderação deveria, como sugere o Ministro Barroso, levar em conta critérios como a personalidade pública ou privada do agente ofendido e mesmo o interesse na divulgação de fatos relacionados com a atuação de órgãos públicos deveriam ser considerados (Rcl 23364, Relat. Min. Roberto Barroso, j. em 24/05/2018, DJe-103, divulg 25/05/2018, public. 28/05/2018). Trilhando justamente essa senda, o Supremo Tribunal Federal registra julgados em que, no tocante aos crimes contra a honra, reconhece que a pessoa pública transitaria para uma ampliação "do que a doutrina italiana costuma chamar a zona di iluminabilit, resignando-se a uma maior exposição de sua vida e de sua personalidade aos comentários e à valoração do público, em particular, dos seus adversários", circustância que poderia

conduzir à atipicidade, na seara penal, das condutas supostamente ofensivas (HC 78.426-6-SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1 ª Turma, DJ de 7.5.1999; Inq 3546, Rel. Min Rosa Weber, 1ª Turma, j. em 15/09/2015, DJe-196, divulg. 30-09-2015, public. 01-10-2015).

2. Caso concreto

As investigações constam do Inquérito Policial nº

50041517320184047200, vinculado ao presente procedimento especial. Em síntese, retiram-se dos autos: (a) informação da DPF de que haveria um link no sítio eletrônico oficial da UFSC que

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levaria a um vídeo produzido em 18/12/2017, data da cerimônia objeto dos autos, pela TV UFSC, no qual apareceria a faixa com os dizeres objeto das investigações (ev. 1, PORT_INST_IPL1, fls. 5-7); (b) laudo de perícia da PF que confirma a manutenção da referida informação em 20/03/2018 (ev. 4, INQ1, fls. 3-8); (c) divulgação do evento e convite feito pelo reitor pro tempore (ev. 6, DESP1, fls. 6 e 9); e (d) indiciamento de Loreci Ribeiro pela

possível confecção da faixa, tendo ele optado pelo direito ao silêncio em sede policial (ev. 6, DESP1, fls. 16-17).

Além disso, vislumbram-se as declarações prestadas pelos acusados.

Áureo teria afirmado à Autoridade Policial, em resumo, (i)

ausência de autorização expressa para exibição de qualquer cartaz, (ii) habitualidade de manifestações nos eventos da UFSC, (iii) colocação da faixa após o início da cerimônia, com faixas por todo o Hall da Reitoria, (iv) não interferência da Administração da

UFSC ou cerceamento nas manifestações, e (v) cobertura

jornalística pela TV UFSC, sem intenção de potencializar qualquer fato ou manifestação (ev. 6, DESP1, fls. 2-3).

Já o Magnífico Reitor Ubaldo apontou, em síntese, (i) terem optado por uma cerimônia simples em razão do período de luto pela morte do ex-Reitor Cancellier; (ii) ter sido colocada a faixa "por trás" e após o início da cerimônia; (iii) não ter lido a faixa, apenas visto as fotografias; (iv) ser o espaço do Hall da Reitoria democrático e aberto para toda manifestação política; e (v) acaso houvesse dizeres racistas ou discriminatórios, "teria que analisar depois quais as providências a serem tomadas".

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Concluíra respondendo que, em seu entendimento, estar em frente à faixa quando de seu discurso não demonstraria nada, já que seria "conclusão da maior parte da comunidade acadêmica de que o suicídio do Reitor decorreu da sua prisão e proibição de acesso à Universidade" (ev. 6, DESP1, fls. 13-14).

Fotografia da faixa está bastante legível no evento 8,

PORT_INST_IPL2, fl. 3, na qual constam as seguintes frases: "Agentes Públicos que praticaram Abuso de Poder contra a UFSC e que levou ao suicídio do Reitor", "Pela apuração e

punição dos envolvidos e reparação dos malfeitos" e "As faces do Abuso de Poder". Esses dizeres estão acompanhados das imagens de 4 agentes públicos, além da DPF Érika, devidamente

identificados pela Polícia Federal (ev. 1, PORT_INST_IPL1, fl. 5): Dra. Janaina Cassol Machado (Juíza Federal Substituta nesta 1ª Vara Federal de Florianópolis), André Stefani Bertuol (Procurador da República), Rodolfo Rickel do Prado (Corregedor-Geral da UFSC) e Orlando Vieira de Castro Junior (Superintendente da CGU).

Com base nesses fatos, pede o Ministério Público Federal seja recebida a denúncia em face dos acusados pela prática do delito previsto no art. 140 c/c art. 141, II e III, ambos do Código Penal. A seu ver (ev. 1, DENUNCIA1, fl. 2):

A faixa acima reproduzida em detalhe inequivocamente ofende a honra funcional subjetiva da Representante, dando causa

injustamente a diminuição do sentimento pessoal de autoestima, eis que publicamente caracterizada pela qualidade negativa de “agente público que pratica abuso de poder” e necessita de “punição” para “reparação dos [seus] malfeitos”. A injúria

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relaciona-se também inequivocamente ao desempenho funcional da Representante, em razão de investigação denominada Operação Ouvidos Moucos, envolvendo gestores da Universidade, entre os quais o ex-Reitor Cancellier.

Entende o Parquet que competia ao então Reitor Ubaldo coibir o malferimento, com a determinação para retirar a faixa exposta na cerimônia oficial por terceiros e, em não o tendo feito, teria

assumido a autoria do fato que aponta configurar o delito de

injúria. Da mesma forma, imputa que caberia ao chefe de gabinete Áureo o cuidado de não deixar usarem sua imagem em frente à referida faixa exposta por manifestantes.

Não coaduno de seu entendimento. Vejamos.

Primeiramente, aponto que, em sua representação, a DPF Érika requer a instauração de inquérito policial para apurar eventual prática do delito de calúnia (art. 138 c/c art. 141, II, CP), dentre outros capitulados na legislação penal, "tendo em vista a

divulgação de material descrito na Informação 5113210 em evento ocorrido no interior da Universidade Federal de Santa Catarina, e, aparentemente com o aval e participação de integrantes de sua gestão, e que imputa cometimento de suposto crime à signatária e demais autoridade públicas" (ev. 1, PORT_INST_IPL1, fl. 3). Não se encontra em suas palavras qualquer menção relativa a sentimentos pessoais que reflitam o dissabor que as faixas teriam ocasionado a sua honra subjetiva, bem jurídico tutelado pelo tipo legal trazido pelo art. 140 do Código Penal. Pelo contrário, a

Autoridade Policial aponta que no material haveria a imputação a ela e às demais autoridades públicas do cometimento de crime, o que, a priori e com razão a delegada, poderia - se preenchidos os

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requisitos legais - vir a configurar o delito de calúnia, previsto no art. 138 do Código Penal.

Assim, em relação ao delito de injúria, não foi satisfeita a condição de procedibilidade exigida pelo art. 145 do Código Penal, já que, repita-se, inexiste nos autos qualquer referência da Representante quanto à ofensa a sua honra - quer fosse pessoal quer fosse funcional.

Outrossim, ainda que se viesse a entender que a representação estaria suprida pelo pedido para que se investigassem "outros (delitos) capitulados na legislação penal", tenho que o sentimento de dissabor das autoridades públicas constantes na faixa haveria que ser extremo para levar à configuração do delito de injúria. Isso porque é da essência das atribuições dos agentes públicos atuantes nas mais diversas esferas de alguma forma ligadas à Justiça (aqui incluídas aquelas afetas à investigação criminal) que suas práticas (ressalto, mesmo que absolutamente legais e corretas) muitas das vezes não sejam aplaudidas pelas maiorias e, em sendo seu papel contramajoritário, é esperado que, por vezes, uma ou mais pessoas - muitas vezes um coletivo - insurjam-se contra suas opiniões, pareceres, relatórios, investigações ou decisões.

O caso em análise, em meu sentir - dado que, repito, não há qualquer manifestação do dissabor sofrido pela autoridade -,

constitui situação adversa suportada pelas autoridades em razão de suas atribuições funcionais, mas que não refletem insulto maior do que eventual manifestação quiçá da comunidade acadêmica em face de um evento traumático.

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Independentemente de qualquer análise dos autos e dos fatos, foi notório na capital catarinense, em certos setores sociais, o

descontentamento e mesmo a revolta propiciados pelos pleitos e decisões no âmbito da denominada pela Polícia Federal Operação Ouvidos Moucos. A repercussão fugiu da esfera da instituição e ganhou força no cenário nacional, tendo sido diversas as

manifestações associando o suicídio do ex-Reitor Cancellier às investigações e procedimentos delas advindos. Simples pesquisa em saites de busca na internet permite o acesso a diversas notícias veiculadas nesse sentido.

Ao que parece, nesse contexto de revolta social é que teria sido confeccionada a faixa com dizeres tão fortes. Um olhar mais

atento, contudo, permite retirar desses dizeres a busca por suposta justiça daquele(s) que, naquele momento, sentia(m)-se

(corretamente ou não) injustiçado(s). Falo aqui de um sentimento que não se poderia exigir estivesse eivado da mais estrita

parcimônia, cometimento ou tranquilidade. O uso da faixa em ocasião em que se homenagearia justamente o falecido reitor - e mesmo junto ao campus universitário que ele administrava até o momento em que fora determinada judicialmente sua retirada - parece-me manifestação atinente à liberdade de pensamento e de expressão que se espera possível dentro de um centro acadêmico. A morte do reitor ocorreu em 02/10/2017 e teve o velório na

própria Universidade, defendido como "um ato simbólico para aquele que teria chegado pela porta da frente". Foi esse o sentido das palavras do então Chefe de Gabinete, o acusado Áureo

Moraes, um dos poucos a discursar na ocasião, como consta no sítio eletrônico da universidade

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(https://noticias.ufsc.br/2017/10/corpo-do-reitor-e-recebido-na-ufsc-em-uma-atmosfera-de-acolhimento-e-emocao/, acessado em 28/08/2018, às 22:46h).

Segundo a reportagem do Estadão, datada de 03/12/2017, o Reitor pro tempore, Ubaldo Balthazar, era amigo de Cancellier desde seus 9 anos de idade

(https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,suicidio-de-reitor-poe-pf-sob-suspeita,70002105813, acessado em 28/08/2018), e eram colegas do mesmo Centro de Ciências Jurídicas/Curso de Direito.

Era esse o contexto de comoção que vivia a UFSC e os acusados quando da promoção do evento no Hall da Reitoria, tendo por objeto a "entronização da foto do ex-Reitor Cancellier na galaria de ex-Reitores". Tenho que, após tão curto lapso temporal - apenas dois meses depois da morte prematura e repentina do reitor -,

estaria a população acadêmica ainda sob o efeito de fortes

emoções. A meu ver, caberia aqui o entendimento da ausência do dolo específico de conscientemente buscar magoar e ofender, tal como ocorrem com as injúrias eventualmente proferidas no calor de discussões. Ademais, ainda que eventualmente tenham

magoado a honra e a reputação de autoridades, podendo ocasionalmente virem a responder por um ilícito cível, suas condutas em princípio não satisfazem aos requisitos para a configuração do crime de injúria.

Diante desse cenário, em razão da ausência do requisito de procedibilidade, afasta-se a possibilidade de imputação dos

acusados pelo delito de injúria, sendo inepta a denúncia; ausente prova da materialidade e em função da ausência do elemento

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subjetivo do dolo específico, impõe-se a rejeição da exordial pelo delito de injúria.

Não obstante, como a parte defende-se dos fatos e não da

capitulação penal trazida pelo órgão acusatório, impõe-se analisar a denúncia sob o viés da calúnia, porquanto este teria sido o delito - dentre outros capitulados na legislação penal - pelo qual a

Delegada da Polícia Federal representara. 3. Delito de calúnia, art. 138 do Código Penal

Retomo a previsão legal trazida no art. 138 do Código Penal: Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

Da literalidade do teor legal, compreende-se que o delito se

consuma quando alguém afirma, de forma inverídica, que outrem teria praticado conduta prevista em um dos tipos penais vigentes. O delito requer para sua configuração a existência do dolo

específico: a de querer, intencionalmente, imputar a alguém um fato que sabidamente não teria praticado. Além disso, esse fato teria que ser definido como crime pelo sistema processual penal - ainda que o autor da calúnia não o soubesse. Em outras palavras: para ser penalizado, aquele que imputa a prática criminosa a outrem deve saber que o que diz seria falso, e que esse falso subsume a algum dos tipos penais.

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São, portanto, três as condições para a configuração do delito: (i) imputação de fato determinado, (ii) fato esse qualificado como crime, e (iii) falsidade da imputação.

4. Caso concreto

No caso em análise, repiso os dizeres trazidos na faixa objeto

deste processo: "Agentes Públicos que praticaram Abuso de Poder contra a UFSC e que levou ao suicídio do Reitor", "Pela apuração e punição dos envolvidos e reparação dos malfeitos" e "As faces do Abuso de Poder".

Pela simples leitura, depreende-se não constar nos dizeres um fato determinado imputado às autoridades cujas faces encontravam-se na faixa. Subentende-se, sim, a imputação do delito de abuso de poder em seu gênero, mas não há qualquer referência a um fato específico que se traduzisse no crime.

Não obstante, considerando-se o momento vivido, pode-se entender que a mensagem subliminar seria a de que os atos praticados no bojo das investigações da chamada "Operação

Ouvidos Moucos" por aquelas autoridades teriam sido praticados com abuso do poder. Isso porque a Lei nº 4.898/1965 traz rol do que constituiria abuso de autoridade e entre as condutas estaria o atentado à liberdade de locomoção, que, ao que parece, os

manifestantes teriam entendido ser o caso da decretação da prisão temporária ou da cautelar de afastamento das funções em face do então Reitor Cancellier.

Diante disso, supondo-se preenchidas a primeira e a segunda condições para a configuração do delito de calúnia, a terceira

condição ficaria prejudicada. Nada consta nas investigações acerca da ciência da inverdade do que, em tese e por suposição,

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estar-se-ia imputando por meio daqueles dizeres na faixa. Assim, em outras palavras, carece de demonstração a efetiva consciência dos

produtores da faixa - e dos acusados - quanto à falsidade da informação propagada. Naquele contexto, é possível que eles realmente acreditassem - quiça acreditem ainda hoje - na

ocorrência do delito de abuso de poder (ainda que erroneamente). Nesse cenário, não se pode afirmar que os responsáveis pelas

faixas - e também os acusados - teriam consciência da falsidade de suas imputações, de forma que dolosamente estariam imputando crime - não fato - ciente de sua inverdade. Impõe-se, assim,

também em relação ao delito de calúnia a rejeição da denúncia. Isso posto:

1. Rejeito a denúncia imputada a Ubaldo Cesar Balthazar e Áureo Mafra de Moraes pela prática, em tese, do delito tipificado no art. 140 c/c 141, incisos II e III, do Código Penal, por ser

manifestamente inepta e por ausência de pressuposto processual, nos termos do art. 395, incisos I e II, do Código de Processo Penal;

2. Rejeito também a denúncia imputada a Ubaldo Cesar Balthazar e Áureo Mafra de Moraes ainda que se considere a tipificação trazida na Representação do delito tipificado no art. 138 c/c 141, incisos II e III, do Código Penal, por falta de justa causa, nos termos do art. 395, incisos III, do Código de Processo Penal; 3. Preclusa a decisão, traslade-se para os autos do IPL nº

50041517320184047200 e, lá, intime-se a Autoridade Policial, inclusive para os fins do no art. 809, § 3º do CPP.

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