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Diabetes mellitus tipo 2 Novas perspectivas de tratamento. Betabloqueadores no tratamento da hipertensão arterial sistêmica

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Academic year: 2021

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(1)

Betabloqueadores no

tratamento da hipertensão

arterial sistêmica

Distúrbios respiratórios

do sono

Rinossinusite

Hepatite aguda

Como avaliar?

Transtornos de ansiedade

Diabetes mellitus tipo 2

Novas perspectivas de tratamento

Diabetes mellitus tipo 2

Novas perspectivas de tratamento

(2)

A atualização médica

continuada

editorial

m dos graves problemas do setor médico de nosso país é a manutenção do ensino continuado, pois envolve tempo, disponibilidade e alto custo.

O médico comum, com uma formação adequada, deverá cursar seis anos de graduação e no mínimo dois anos a mais para realizar uma residência médica em clínica geral. Caso deseje se especiali-zar, terá que somar aos oito anos mais dois a cinco anos, depen-dendo da área.

Longo curso, longa pós-graduação e a certeza de que deverá manter-se atualizado através de cursos, jornadas e congressos. A Medicina evolui de forma tão rápida que aquele que se forma pode já estar desatualizado em muito que aprendeu em sua graduação.

Como manter-se atualizado, como participar de eventos, por ve-zes tão caros quanto distantes? São interrogações não respondidas e pouco discutidas dentro dos órgãos responsáveis pela saúde no país.

Um congresso nacional corresponde a uma semana sem traba-lhar, gastos com transporte aéreo, hospedagem, inscrição e alimen-tação. Infelizmente, são poucas as instituições que estimulam e

am-param tais investimentos.

Preocupados com o mercado de trabalho e necessitando atuali-zar-se, os médicos convivem com conflitos, tão sérios como aceitar de terceiros o financiamento de suas carências.

Então, a ANVISA, nosso órgão de vigilância maior, estabelece uma série de normas para que nosso médico não seja envolvido pelos “lobos” da indústria farmacêutica ou pelos “leões” das segu-radoras de saúde.

Não seria mais adequado instituir normas que estimulassem de forma ética e independente o patrocínio, por órgãos do governo, para que pudéssemos nos atualizar?

Não seria um ato de responsabilidade o estímulo ao ENSINO CONTINUADO?

Como presidente de uma das mais importantes sociedades mé-dicas do Brasil, sinto-me profundamente incomodado ao perceber que muitos colegas distanciam-se progressivamente do conheci-mento por falta de condições, por falta de apoio daqueles que tan-to cobram sem a reflexão necessária do quantan-to oprimem e inibem o saber.

Existem inúmeras formas de opressão, mas uma o médico não pode sofrer: a impossibilidade de atualizar-se. Isto significa tolher seu crescimento, inibir seus sonhos e impor-lhe o rótulo de mau médico.

Com a sorte de ter participado da organização de mais de uma centena de cursos, jornadas e congressos, sinto-me com a obriga-ção de alertar sobre a riqueza destes encontros, que nos despertam a vontade de bem fazer e o estímulo para crescer.

Muitos se redimiram de anos de abandono e tristeza ao frequen-tarem um CONGRESSO, onde perceberam suas fraquezas, mas também, e principalmente, os caminhos para corrigi-las.

Dr. José Galvão-Alves Editor: José Maria de Sousa e Melo

In memoriam

Gerente Geral: Daila B. Melo Gerência Executiva: Lícia M.aS. Andrade Assistente: Thereza C. Jouan Alé

Redação

Editor Científico: Dr. José Galvão-Alves Redator-Chefe: Dr. Almir L. da Fonseca Coordenação Editorial: Sheila Guedes Revisor-Chefe: Waldyr dos Santos Dias Revisores: Joel Vasconcellos Sueli B. dos Santos Contato Médico: Jorge de Moura Bastos Assistente: Julliana P. Rodrigues Tráfego e Logística: Manassés S. Pinto

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(3)

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São Paulo Capital

Adib Jatene Flair José Carrilho José Eduardo Souza José Osmar Medina Pestana Nestor Schor

Sender Miszputen

Botucatu

Oswaldo Melo da Rocha

José Galvão-Alves

Noticiário especial

Noticiário

Hepatite aguda — Como avaliar?

Imagem em medicina interna

Coordenação: Dra. Marta Carvalho Galvão

Rabdomiossarcoma do mediastino anterior

— um tumor comum em localização rara — A

propósito de um caso

Novas perspectivas de tratamento

medicamentoso do diabetes mellitus

Desmitificando o uso de betabloqueadores no

tratamento da hipertensão arterial sistêmica

Rinossinusite

Distúrbios respiratórios do sono

Transtornos de ansiedade — Terapia com

estimulação magnética transcraniana

seções

artigos

73

74

63

58

7

15

41

27

35

Drs. João Roberto de Sá e Tiago Munhoz Vidotto

Dr. Marcelo Montera

Dr. Jair de Carvalho e Castro

Drs. Adávio de Oliveira e Silva, Raul Carlos Wahle, Evandro de Oliveira Souza, Verônica Desiree Samudio Cardozo, Maria Elizabeth Calore Neiva, Flávia Costa Cardoso, Fábio Rosa Moraes e Gerusa Máximo de Almeida

Dras. Marta Carvalho Galvão e Carolina Souza Nogueira Dr. Hisbello S. Campos

Drs. Flávia Paes, Adriana Cardoso Silva, Antonio E. Nardi, Sergio Machado e José A. Crippa

sumário

Panorama internacional

(4)

Introdução

O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é uma desordem metabólica, com aumento global de sua prevalência, e cada vez mais frequen-te em crianças e adolescenfrequen-tes. A importân-cia do bom controle glicêmico na prevenção das complicações crônicas microvasculares no DM2 foi demonstrada em vários estudos, bem como a dificuldade de manutenção de um controle aceitável. No estudo UKPDS, menos de 50% dos pacientes apresentaram A1c > 7% no seguimento em longo prazo. Já os trabalhos que tentaram correlacionar o impacto per se da glicemia na prevenção da complicação macrovascular permanecem controversos.

O objetivo desta revisão é apresentar as drogas já estabelecidas e as mais recentes para o tratamento do DM2.

Anti-hiperglicemiantes

A metformina deve ser introduzida ao diagnóstico, associada à dieta e a exercícios, salvo contraindicações (1). Leva a até 1,5% de queda na A1c e reduz em 20% a glicemia de jejum. Não gera aumento de peso e, em alguns casos, modesta redução. Pode ser as-sociada com sucesso a todos os outros trata-mentos para o DM2 (orais e insulina).

Seu mecanismo de ação ainda não está totalmente compreendido, mas parece ocor-rer através da ativação da enzima AMPK pela proteína LKB1 (2). Assim, age principalmente diminuindo a gliconeogênese hepática (3, 4). Ainda através da ativação da AMPK, inibe a via mTOR e pode suprimir a formação tumo-ral (5), assunto cada vez mais discutido. Os efeitos colaterais mais comuns são os

gas-Novas perspectivas de tratamento

medicamentoso do diabetes mellitus

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Supervisor do Programa de Residência Médica em Endocrinologia e Metabologia e assistente doutor da Disciplina de Endocrinologia e Metabologia — Escola Paulista de Medicina.

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Chefe de plantão da Disciplina de Medicina de Urgência e aluno do curso de pós-graduação da Disciplina de Endocrinologia — Escola Paulista de Medicina.

Resumo

O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) apre-senta alta prevalência, com aumento in-clusive em crianças e adolescentes. A im-portância de um estrito controle glicêmico pode ser comprovada com a redução das complicações crônicas microvasculares. Já em relação à redução da doença macrovas-cular, principal causa de mortalidade nestes pacientes, são fundamentais o controle da glicemia, bem como de outros fatores de risco cardiovasculares, tais como hipertensão arterial, dislipidemia, peso, e a manutenção de hábitos saudáveis de vida. Temos vários medicamentos para o tratamento do DM2, sendo que a metformina é ainda a droga de primeira escolha, devido ao seu baixo custo e eficácia comprovada.

endocrinologia

Summary

Type 2 diabetes mellitus (DM2) is highly prevalent and is increasing even in chil-dren and adolescents. The importance of strict glycemic control can be proven to re-duce chronic microvascular complications. Regarding the reduction of macrovascular disease, the leading cause of mortality in these patients, it is essential tight glycemic control, as well as other cardiovascular risk factors, such as arterial hypertension, dyslipi-demia, weight control, and maintaining heal-thy lifestyles. We have a lot of drugs for the treatment of DM2, and metformin is still the drug of first choice due to its low cost and proven effectiveness.

Unitermos:

Diabetes

mellitus tipo 2;

antidiabéticos orais; novos antidiabéticos orais.

Keywords:

Type 2

diabetes mellitus; oral antidiabetics; new oral antidiabetic.

(5)

Biguanidas Metformina 1,5-4,9 500-2.550mg, 2x Inibidores da Acarbose 2 25-100mg a dose, 3x α-glucosidase < 60kg: 50mg, 3x Miglitol 2 25-100mg a dose, 3x Tiazolidinedionas Pioglitazona 16-24 15-45mg, 1x Sulfonilureias Clorpropamida 24-72 250-325mg, 1x Glibenclamida 18-24 5-20mg, 2x Glipizida 16-24 10-40mg, 1x Glicazida MR 24 30-60mg, 1x Glimepirida 24 1-8mg, 1x

Meglitinidas Nateglinida 2-4 60-120mg a dose, 3x Repaglinida 1-3 1-4mg a dose, 3x IDPP4 Sitagliptina 24 25-100mg, 1x

Vildagliptina 12-24 25-100mg, 1-2x Saxagliptina 24 2,5-5mg, 1x Linagliptina 24 5mg, 1x

trointestinais, que desaparecem em cerca de 90% após um mês de uso, e menos de 5% dos pacientes necessitam abandonar o tra-tamento (1, 3). Variam desde um gosto me-tálico na boca a náuseas, cólicas e diarreia. Pode diminuir a absorção de vitamina B12 em

10% a 30% e a de ácido fólico em tratamen-to de longo prazo (6).

O risco de acidose lática com a metformi-na é baixo, mas leva a alto índice de letalidade (ao redor de 50%) (7). Assim, não se deve uti-lizar a droga na insuficiência renal moderada a grave (clearance estimado < 30 a 45 ml/min), em situações de instabilidade hemodinâmica, exames que usam contrastes iodados, proce-dimentos cirúrgicos de grande porte, insufi-ciência hepática ou cardíaca graves, sepse, desidratação e alcoolismo (1, 3, 8). Deve ser suspensa 24 a 48 horas antes de se realizar exames que utilizam contrastes iodados.

Recomenda-se iniciar essa medicação em doses baixas, elevando-se a cada sete dias, em doses divididas duas a três vezes ao

dia, às refeições (ver tabela). A dose máxima é de 2.350mg. Em pacientes com clearance estimado de 30 a 45ml/min, chega-se a até 1g ao dia, assim como em idosos (1, 8).

Inibidores da alfa-glicosidase

No Brasil dispomos da acarbose. Inibe por competição a hidrólise de carboidratos mais complexos pela alfa-amilase pancreáti-ca no lúmen intestinal e a hidrólise de oligo, tri e dissacarídeos pelas alfa-glicosidases nos enterócitos do delgado. Retardam a absorção da glicose e diminuem a amplitude da excur-são glicêmica pós-prandial (1, 9). Seus efeitos colaterais são comumente gastrointestinais e frequentes, como flatulência, dores e cólicas abdominais, diarreia, podendo levar ao aban-dono do tratamento em até 50% dos casos (10, 11). Preconiza-se iniciar o tratamento em doses baixas, de 25mg, antes da maior re-feição, elevando-se em 25mg a cada quatro semanas, atingindo lentamente a dose tera-pêutica de 50mg às refeições (ver tabela). Na dose máxima de 300mg/dia faz-se necessário

A evolução no tratamento do DM2 nos últimos

anos foi marcante, principalmente com o advento das drogas do

grupo das incretinas. Como primeira linha permanece a indicação da metformina. Anti-hiperglicemiantes Incr etinas Hipoglicemiantes orais

Classe Nome genérico Duração da Dose (mín./máx.,

ação (h) no de tomadas/dia)

(6)

Pontos-chave:

> Os inibidores da alfa-glicosidase retardam a absorção da glicose; > As tiazolidinedionas melhoram a sensibilidade à insulina;

> Cerca de 60% dos pacientes

diabéticos tipo 2 respondem bem às sulfonilureias.

monitorar TGO e TGP a cada três meses no primeiro ano de uso, e periodicamente depois (13). Diminuem em 0,5% a 1% a A1c (10-12) e, apesar de não serem hipoglicemiantes, podem retardar o tratamento de eventual hi-poglicemia se for utilizada sacarose via oral (açúcar refinado); nesses casos deve-se tratar a hipoglicemia com glicose pura. Apresentam pequena absorção, 0,5% a 1,7%. São con-traindicados em cirrose hepática, doenças inflamatórias intestinais, ulcerações ou obstru-ção intestinal, creatinina superior a 2mg/dl e sob aleitamento ou gestação (14).

Tiazolidinedionas (ou glitazonas)

Ativam os receptores nucleares PPAR-γ (peroxisome proliferators-activated receptor

gama) e alteram a transcrição de vários

ge-nes que regulam o metabolismo de lipídios e carboidratos, melhorando a sensibilidade à insulina nos tecidos adiposo, muscular e he-pático. Apenas a pioglitazona está disponível no mercado (15). Reduz a A1c de 1% a 1,5% e melhora o perfil lipêmico (1, 16). Inicia-se o tratamento com 15mg e, se necessário, aumenta-se após oito semanas (ver tabela). A pioglitazona é metabolizada no fígado e pode induzir moderadamente o CYP3A4 e inibir o CYP2C8 e 2D6; pode então diminuir os níveis de codeína e tramadol, e elevar os de tamoxifeno e nebivolol, e interferir com as várias drogas que são metabolizadas no fígado no CYP3A4 (15). Pode causar insufi-ciência cardíaca congestiva, edema e ganho de peso e, em longo prazo, fraturas. Logo, é contraindicada em pacientes com insufi-ciência cardíaca moderada a grave (15, 17), com elevação de enzimas hepáticas duas a três vezes acima do limite superior do mé-todo (15), e em pacientes com risco de os-teoporose (devendo-se monitorizar esses parâmetros periodicamente) (15, 18). Quanto ao ganho de peso, os estudos mostram que este acontece mais pelo acúmulo de gordura subcutânea, havendo diminuição da gordura marrom, e pela retenção de água.

Hipoglicemiantes

Sulfonilureias

Cerca de 60% dos pacientes diabéticos tipo 2 respondem bem às sulfonilureias (SUs), sendo que a A1c cai em média 1,5% (1, 19).

Se acrescentadas a tratamento prévio, p. ex., à metformina, devem diminuir a HbA1c em média 1%. Há várias SUs no mercado e não existe uma clara vantagem de umas sobre as outras, salvo em situações específicas, como insuficiência renal. As SUs agem nos canais de ATP-potássio da célula beta pancreática, aumentando a secreção de insulina (20). As de segunda geração são mais específicas, e interferem menos com canais de K-ATP no co-ração. Porém o risco de aumento de infartos do miocárdio com o uso crônico dessas medi-cações é controverso na literatura (21-23). Em pacientes idosos e com perda de função renal ou hepática deve-se ter cuidado: as SUs de primeira geração são proscritas, assim como a glibenclamida (por ter metabólito de pura ex-creção renal e 70% de atividade em relação ao sal original, além de alto índice de intoxicação e hipoglicemias nos pacientes com clearance estimado inferior a 50ml/min) (24, 25). A gli-mepirida é oxidada no fígado pelo CYP2C9 aos metabólitos M1 (que têm 33% de ativida-de) e M2, que são excretados na urina e nas fezes, não sendo recomendada em pacientes com clearance estimado inferior a 50ml/min (26). As mais seguras nesses casos são a glipi-zida (porém com metabólito com 5%-10% de atividade) (27) e a gliclazida (sem relatos de metabólitos ativos) (28). Mesmo assim, deve--se iniciar com a dose mínima, titulando de acordo com a resposta clínico-laboratorial.

Os efeitos colaterais mais comuns são hi-poglicemia e aumento de peso. Podem acen-tuar os efeitos adversos e tóxicos do álcool. Drogas como cimetidina, ranitidina, cloranfe-nicol, antidepressivos tricíclicos, fluconazol, ácido acetilsalicílico e quinolonas, e nutrientes como cromo e alho, podem acentuar o efei-to hipoglicemiante das SUs. Podem ocorrer alergias cruzadas entre as SUs e sulfonamidas, diuréticos tiazídicos e de alça.

Metiglinidas

São a nateglinida e a repaglinida, volta-das para o tratamento da hiperglicemia pós--prandial. São rapidamente absorvidas, me-tabolizadas no fígado e devem ser prescritas antes das refeições (ver tabela) (29, 30).

Seus efeitos colaterais mais comuns são dor de cabeça, ganho de peso, diarreia, tontura e hipoglicemias. A nateglinida é um substrato maior dos CYPs 2C9 e 3A4, e tem

(7)

metabólito de pura excreção renal, poden-do levar à intoxicação e hipoglicemias em pacientes com clearance inferior a 50ml/ min (31). A repaglinida não tem seu uso con-traindicado por vários autores em pacientes com insuficiência renal (32), porém há estudo mostrando elevação significativa de sua con-centração em pacientes com clearance de 20 a 40ml/min. Antibióticos macrolídeos (exce-to a azitromicina) podem aumentar o efei(exce-to da repaglinida. No entanto, como além da metabolização pelo CYP3A4 a repaglinida também é metabolizada pelo CYP2C8, a as-sociação com genfibrozila é contraindicada (alto risco de hipoglicemias) (31, 32).

Novas drogas e terapias

emergentes

Drogas com atuação no sistema incretina

Os êntero-hormônios, ou incretinas, são peptídeos secretados após a alimentação que promovem liberação de insulina e redu-ção do glucagon, de forma glicose-depen-dente, sendo responsáveis por até 70% da insulinemia pós-prandial. As duas principais incretinas são o GLP-1 e o GIP

(glucose-de-pendent insulinotropic peptide); apresentam

meia-vida curta, devido à inativação pela en-zima DPP-4 (dipeptidil peptidase-4). O GLP-1 (glucagon-like peptide-1), que tem sua ação e concentração reduzidas em diabéticos tipo 2, é a principal incretina, e seu efeito agudo é a liberação de insulina glicose-dependente, seguida por aumento da biossíntese e da es-timulação do gene de transcrição da insulina. Leva ainda a aumento do tempo de esvazia-mento gástrico, sensação de saciedade por mecanismo central e redução da secreção inapropriadamente elevada de glucagon, que tem importância cada vez maior na fisio-patogenia da doença.

Agonistas do receptor do GLP-1

Exenatida

Polipeptídeo sintético, com 53% de ho-mologia com o GLP-1 endógeno, aprovado para o tratamento de pacientes com DM2 (33, 34). Sua aplicação é por via subcutâ-nea, até uma hora antes do almoço ou café da manhã e jantar. Sua absorção é rápida, e cerca de 10 horas após a injeção ainda é

detectada na maioria dos pacientes. Pode ser prescrita associada à metformina, sulfo-nilureia ou glitazona. A dose inicial é de 5mg, duas vezes ao dia, e após um mês poderá ser aumentada para 10mg duas vezes ao dia (34). Provoca retardo no tempo de esvaziamento gástrico e sensação de saciedade, que con-tribuem para a redução do peso, que ocorre em aproximadamente 67% dos pacientes tratados (35, 36). Os efeitos colaterais mais frequentes são náusea e vômitos, que são tempo e dose-dependentes, e responsáveis por menos de 5% de desistência do trata-mento pelos pacientes (36). O metabolismo é por hidrólise renal e os pacientes com do-ença renal crônica avançada em geral não toleram o medicamento (37).

Liraglutida

Análogo de GLP-1 modificado para ligar--se à albumina sérica de maneira não cova-lente, retardando sua degradação e permi-tindo o uso uma vez ao dia (38). A dose inicial é de 0,6mg, subcutânea, inefetiva para con-trole glicêmico, mas reduz efeitos adversos, principalmente gastrointestinais. Titulação semanal e dose máxima de 1,8mg/dia (39). É permitido seu uso como monoterapia ou em associação a um ou mais antidiabéticos orais (metformina, sulfonilureias ou glitazo-na), embora não seja considerada tratamen-to de primeira linha. Ainda não foi liberada a associação com insulinas.

Apesar de metabolizada por peptidases endógenas e de não apresentar excreção renal, há pouca experiência em estágios mo-derados de insuficiência renal, e não deve ser utilizada em estágios avançados (40-42). Limitada informação na insuficiência hepáti-ca (41, 42). Leva à redução média da glicemia de jejum entre 30 e 40mg/dl, pós-prandial entre 32 e 50mg/dl, A1c entre 1% e 1,5% e peso entre 1 e 3,4kg, com doses de 1,2 ou 1,8mg/dia. Pequena redução da pressão ar-terial sistólica e ausência de efeito sobre a diastólica (43-48).

Os efeitos colaterais mais comuns são gastrointestinais (náuseas, vômitos e diar-reia), sendo a náusea o mais frequente, à semelhança da exenatida. Há risco pequeno de hipoglicemias, geralmente leves e quan-do associada a sulfonilureias (8%-27%) (43, 48). Como com todas as incretinas, orais

As incretinas são peptídeos secretados após alimentação que promovem liberação de insulina e redução do glucagon, de forma

glicose-dependente, sendo responsáveis por

até 70% da insulinemia pós-prandial.  A principal

incretina é o GLP-1, que tem sua ação e concentração reduzidas

(8)

ou injetáveis, há possível relação causal com pancreatite aguda, mas as informações são insuficientes para confirmar ou excluir. Considerar em casos de dor abdominal per-sistente e suspender seu uso (41, 42). Houve aumento do risco de carcinoma medular de tiroide em ratos e camundongos. Esses ani-mais apresentam densidade de receptores para GLP-1 entre 20 e 45 vezes maior do que em humanos. Apesar de não confirmado em estudos com humanos ou macacos, não é re-comendada para pacientes com antecedente pessoal ou familiar de carcinoma medular de tiroide ou neoplasia endócrina múltipla 2A ou 2B (41, 42).

Inibidores da DPP-4

Fármacos de uso oral que aumentam os níveis de GLP-1 entre 1,8 e 3 vezes, devido à inibição de sua degradação pela enzima DPP-4 (49). Neutros em relação ao peso e com baixo risco de hipoglicemia (50-52). Atuam principalmente na glicemia pós-pran-dial, com menor efeito na glicemia de jejum. Disponíveis em nosso país a sitagliptina e a vildagliptina, saxagliptina e mais recen-temente a linagliptina. Há poucos estudos pareados (head-to-head) disponíveis, e infor-mações de meta-análises sugerem eficácia semelhante, redução de A1c inferior a 1% e baixa ocorrência de efeitos colaterais. Podem ser associados à metformina, a sulfonilureias e glitazonas, mantendo sua efetividade (50-52). Podem levar a pequeno aumento do risco de IVAS, ITU e cefaleia. A monitoriza-ção de enzimas hepáticas se faz necessária no primeiro ano, devido a relatos de hepa-tite aguda (53). Todas as gliptinas devem ter a dose reduzida se houver redução do ritmo de filtração glomerular (50-52). A exceção é a linagliptina, que sofre excreção hepática, é eliminada nas fezes praticamente inalterada (84,7% da dose oral) e não necessita de ajus-te de dose, mesmo quando há doença renal crônica grau V (ClCr < 15ml/min) (51).

Análogo da amilina

Pramlintida

A amilina é polipeptídeo de 37 amino-ácidos, cossecretado com a insulina, e que provoca redução na liberação do glucagon e retardo do esvaziamento gástrico (54). A pram-

lintida é um análogo sintético da amilina, so-lúvel, que não se precipita e que tem pro-priedades farmacocinética e farmacodinâmi-ca semelhantes à amilina nativa. Sua aplifarmacodinâmi-ca- aplica-ção é subcutânea, antes das refeições, sendo liberada pela FDA para DM1 e 2 (55). Os efei-tos colaterais mais frequentes são náuseas e hipoglicemias. Devido a seu pH diferente da insulina, a mesma deve ser aplicada em inje-ções separadas.

Bromocriptina

A nova formulação de bromocriptina apresenta rápida absorção e ação (56, 57). Aumenta o tônus dopaminérgico central, frequentemente reduzido em indivíduos re-sistentes à ação da insulina, com consequen-te inibição do tônus simpático do SNC (56, 58, 59). Reduz principalmente a glicemia pós-prandial, através da supressão da pro-dução hepática de glicose (58). Ainda não é disponível no Brasil. Redução média da HbA1c entre 0,5% e 0,7%, neutra no peso e não predispõe à hipoglicemia (56, 60, 61). Em estudo para avaliar sua segurança clínica e cardiovascular, reduziu o risco relativo de desfechos cardiovasculares em 40% (HR: 0,6 [IC 95%: 0,37-0,96]) (60). Os efeitos adversos mais comuns são náuseas, fadiga, tontura, constipação, diarreia e rinite — mais frequen-tes no início do tratamento e na titulação da dose, tendem a desaparecer entre uma e duas semanas (56, 60).

Colesevelam

Pertence à segunda geração de seques-tradores de ácidos biliares, sendo a única resina aprovada pela FDA como terapia ad- juvante para o DM2 não controlado com met- formina, sulfonilureia ou insulina. Seu efeito no metabolismo da glicose ainda não está elucidado; parece agir através do aumento da colecistocinina (CCK), em ação adicional a um atraso no esvaziamento gástrico (62). Atua principalmente na glicemia pós-pran-dial e não causa hipoglicemia e nem ganho de peso (63-66). Devido ao potencial aumen-to de triglicérides (2%-19%), deve ser evita-do na hipertrigliceridemia grave (67). Pode interferir na absorção de alguns medicamen-tos, sendo recomendado ingeri-los uma hora antes ou quatro horas após o colesevelam. Os efeitos colaterais mais comuns são

gas-Pontos-chave:

> Os inibidores da DPP-4

aumentam os níveis de GLP-1 entre 1,8 e 3 vezes;

> Estão disponíveis no país

a sitaglipina, vildagliptina, saxagliptina e linagliptina;

> Todas as gliptinas devem

ter a dose reduzida se houver redução do ritmo de filtração glomerular.

(9)

trointestinais, principalmente constipação, em geral leve a moderada (63-66).

Conclusões

A evolução no tratamento do DM2 nos últimos anos foi marcante, principalmente com o advento das drogas do grupo das incretinas. Como primeira linha permanece a indicação da metformina. Entretanto, do

Referências

11. NATHAN, D.M.; BUSE, J.B. et al. — Medical management of hyperglycemia in type 2 diabetes: A consensus algorithm for the initiation and adjustment of therapy: A consensus statement of the American Diabetes Association and the European Association for the Study of Diabetes. Diabetes

Care, 32(1): 193-203, 2009.

12. SHAW, R.J.; LAMIA, K.A. et al. — The kinase LKB1 media-tes glucose homeostasis in liver and therapeutic effects of metformin. Science, 310: 1642, 2005.

13. BAILEY, C. — Biguanides and NIDDM. Diabetes Care,

15(6): 755-72, 1992.

14. DEFRONZO, R.A. & GOODMAN, A.M. — Efficacy of met- formin in patients with non-insulin-dependent diabetes mellitus. The Multicenter Metformin Study Group. N. Engl.

J. Med., 333(9): 541-9, 1995.

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Cancer Res., 69(19): 7507-11, 2009.

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BMJ, 340: c2181, 2010.

17. SALPETER, S.; GREYBER, E. et al. — Risk of fatal and non-fatal lactic acidosis with metformin use in type 2 diabetes mellitus. Cochrane Database Syst. Rev., 1: CD002967, 2006.

18. TAHRANI, A.A.; VARUGHESE, G.I. et al. — Metformin, heart failure, and lactic acidosis: Is metformin absolutely contraindicated? BMJ, 335: 508, 2007.

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Pharmacokinet., 30: 94-106, 1996.

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Cochrane Database Syst. Rev., 2: CD003639, 2005.

Endereço para correspondência: João Roberto de Sá Centro de Diabetes da Disciplina de Endocrinologia e Metabologia — Escola Paulista de Medicina/ Unifesp

Rua Estado de Israel, 639 Vila Clementino

04022-001 São Paulo-SP jrsa@uol.com.br

ponto de vista estritamente de controle gli-cêmico, o poder de redução da glicemia pela insulina é maior, e esta deverá ser indicada sempre que o paciente apresentar clínica de catabolismo e altos níveis de glicemia e de A1c. O controle glicêmico precisa ser consi-derado no contexto de redução do risco das complicações crônicas vasculares e de segu-rança e eficácia para o paciente.

Convidados internacionais

Apoio

Vicente Arroyo (Espanha) • Fernando Magro (Portugal)

Santa Casa da Misericórdia do RJ

Federação Brasileira de Gastroenterologia Sociedade de Gastroenterologia do RJSociedade Brasileira de Clínica Médica do RJ

Coordenação científica: Prof. José Galvão-Alves

Tema Central: Diagnóstico e terapêutica em Gastroenterologia

Obs.: As 57 referências restantes que compõem este artigo se

(10)

2 uma das condições clínicas mais fre-quentes e graves com que o médico se depara em sua prática diária. Para o futuro não há dúvida de que as modi-ficações nos hábitos de vida desempe-nharão importante papel preventivo no DM2; assim como o estudo genético, ao permitir a identificação de vias e alvos moleculares alternativos para a criação de novas drogas. Avanços nos estudos com células-troncos (transformando-se em células betapancreáticas) são pro-missores para o manejo do DM1.

Diretrizes para o tratamento da gota e hiperuricemia

Arthritis Care Res.

O American College of Rheuma-tology (ACR) publicou novas diretrizes para o manejo da hiperuricemia e sua principal complicação, a artrite gotosa (Khanna, D. et al. “American College of Rheumatology Guidelines for Mana-gement of Gout: Part 1 and 2”. Arthritis

Care Res. 2012; 64:1431-1461). Sobre a

conduta na hiperuricemia, hoje também reconhecida como um marcador de ris-co cardiovascular, os autores destacam que o objetivo principal do tratamento deve ser manter os valores plasmáticos de ácido úrico abaixo de 6mg/dl. Para isso, os medicamentos de primeira esco-lha são o alopurinol e o febuxostat (esse último ainda não comercializado no Bra-sil); a probenecida é descrita como se-gunda opção. A dose inicial de 100mg/ dia de alopurinol pode ser aumentada progressivamente, conforme necessá-rio, até o limite máximo de 800mg/dia. Para os pacientes que desenvolvem crise aguda de gota, além da terapia redutora de ácido úrico recomenda-se

prescrever colchicina, como primeira es-colha. Os anti-inflamatórios não esteroi-dais e os corticosteroides permanecem como opções nas crises agudas, leve e moderadas.

Manejo da taquicardia supraventricular

N. Engl. J. Med.

A partir da apresentação de um caso clínico, onde se descreve paciente do sexo feminino, 24 anos, que busca atendimento no setor de emergência referindo início abrupto de palpitações e sensação de “coração acelerado”, Link, M.S. aborda o manejo da taquicardia su-praventricular (TSV), a exemplo de fibrila-ção e flutter atrial. O artigo “Evaluation and Initial Treatment of Supraventricular Tachycardia” (N. Engl. J. Med. 2012; 367:1438-48) descreve as principais for-mas de TSV, lembrando que se trata de condições ameaçadoras à vida e que requerem intervenção médica imediata. O diagnóstico diferencial das TSVs deve focar em características da resposta ven-tricular observadas ao eletrocardiogra-ma (ECG) — amplitude e regularidade do complexo QRS, frequência cardíaca, por exemplo —, além da resposta à ad-ministração de adenosina, medicamento que promove bloqueio do nodo atrio-ventricular e pode reverter alguns tipos específicos de TSV (taquicardia reentran-te nodal, por exemplo). De acordo com as diretrizes para Suporte Avançado de Vida em Cardiologia (ACLS2010), do American College of Cardiology, o medi-camento é a droga de escolha para o tra-tamento inicial das TSVs com QRS amplo e ritmo regular. Destaca-se que a droga deve ser administrada de modo cautelo-so, sempre com o paciente devidamente monitorado, tendo-se em mãos um des-fibrilador. O artigo inclui ainda dois fluxo-gramas, que demonstram didaticamente a conduta para diagnóstico diferencial e tratamento das taquicardias de comple-xo QRS amplo ou estreito.

A evolução do diabetes ao longo dos séculos

N. Engl. J. Med.

Em janeiro do ano corrente, o re-nomado periódico The New England

Journal of Medicine completou 200

anos de publicação ininterrupta. Desde então, tem trazido em diversas de suas edições semanais artigos que revisam a evolução, ao longo desses dois séculos, no conhecimento científico de doenças comuns na prática diária, como doen-ça arterial coronária e infarto agudo do miocárdio, doenças infecciosas, asma e neoplasias malignas. O mais recente destes artigos (Polonsky, K.S. “The Past 200 Years in Diabetes”. N. Engl. J. Med. 2012; 367:1332-40) aborda os importan-tes avanços observados nesse ínterim, no que diz respeito ao reconhecimento dos mecanismos fisiopatológicos envol-vidos na gênese do diabetes mellitus e nos avanços relacionados ao tratamento da hiperglicemia e suas complicações. Assim como no passado, a doença é ainda um desafio para os médicos e se associa a reduzida expectativa de vida. Entretanto, a qualidade de vida melho-rou drasticamente: com um variado ar-senal terapêutico à disposição, hoje os pacientes podem levar uma vida ativa e produtiva por décadas após o diag-nóstico. Nos dias atuais, talvez o maior desafio seja a prevenção. De modo oposto ao ocorrido no passado — quan-do a imensa maioria quan-dos casos descritos devia-se à deficiência insulínica —, os novos casos se relacionam ao sobrepe-so ou obesidade e decorrem de resis-tência insulínica e secreção deficiente desse hormônio. A obesidade tem sido descrita nas últimas décadas como uma epidemia mundial, fazendo do DM tipo

(11)

Desmitificando o uso de betabloqueadores no

tratamento da hipertensão arterial sistêmica

M

arcelo

M

ontera

Doutor em Cardiologia pela USP. Professor de Cardiologia e Farmacologia. Coordenador do Centro de Insuficiência Cardíaca do Hospital Pró-Cardíaco. Coordenador de Pesquisa Clínica do Hospital Central do Exército.

Resumo

O uso de betabloqueadores (BBs) no tra-tamento da hipertensão arterial (HAS) tem so-frido diversas mitificações quanto ao seu real benefício. Quatro principais pontos têm sido divulgados como “verdades”: os BBs são considerados pelas diretrizes como fármacos de quarta linha; teriam uma ação hipotensora fraca em relação aos outros fármacos; trariam poucos benefícios na prática clínica sobre o prognóstico evolutivo de pacientes com HAS; e são de difícil manuseio, por apresentarem uma série de paraefeitos. Os BBs apresentam um importante papel no controle da HAS, com benefícios clínicos bem demonstrados e com paraefeitos facilmente evitáveis através do conhecimento do seu comportamento far-macológico

.

car

diologia

Unitermos:

Betabloqueadores; tratamento da hipertensão arterial; AVC e diabetes.

Keywords:

Beta-blockers; treatment of hypertension; stroke and diabetes.

Introdução

Este artigo traz uma reflexão sobre o manuseio de fármacos no tratamento da hipertensão arterial sistêmica (HAS), a par-tir de uma revisão aprofundada de estudos apresentados nos últimos anos. O principal objetivo é demonstrar, com total isenção, quais os reais benefícios e limitações no uso de betabloqueadores (BBs), comparados a outros fármacos usados no tratamento da HAS. Alguns critérios serão abordados, como o conceito do uso desses medicamentos na prática clínica, através de medicina baseada em evidências, além de uma visão do com-portamento clínico-farmacológico dos BBs.

Essa avaliação pretende questionar qua-tro importantes pontos divulgados como verdades sobre o tratamento da hipertensão arterial sistêmica e que, aqui, serão tratados como “mitos”. São afirmativas oriundas de análises incompletas de diversos estudos e

Summary

The use of beta-blockers (BBs) in the treat- ment of hypertension (HTN) has undergone several mystification regarding its real be-nefit. Four main points have been disclosed as “truths”: the BBs are considered as drugs by the guidelines of the fourth line; would have a weak hypotensive action in relation to other drugs; would bring little benefit in clinical practice on the prognostic evaluation of patients with hypertension; and are diffi-cult to handle because they present a series of side-effects. BBs have an important role in the control of hypertension, with clinical be- nefits demonstrated and well side-effects easily preventable through knowledge of their pharmacological behavior.

diretrizes, feitas em apresentações realizadas para o meio médico nos últimos 10 anos.

A primeira afirmativa sugere que os beta-bloqueadores vêm sendo considerados pelas diretrizes como fármacos de quarta linha, e não mais de primeira opção como anterior-mente se preconizava. A segunda diz que, de forma geral, o BB seria um fraco hipotensor, com uma eficácia terapêutica menor no trata-mento da HAS em relação a outros fármacos. A terceira diz que o BB traria poucos bene-fícios na prática clínica sobre o prognóstico evolutivo de pacientes com HAS, portanto haveria pouco espaço para sua utilização. E, por último, tem sido amplamente divulgado que os betabloqueadores são de difícil ma-nuseio, por apresentarem uma série de pa-raefeitos.

Em contraponto podemos observar que, coincidentemente, todos os grandes novos fármacos lançados nos últimos 10 anos, e

(12)

British Medical Society Guideline (BMS-NICE 2011)

A diretriz da British Medical Society Guide-line (originalmente publicada em 2004) (8) teve seu último sumário apresentado em agosto de 2011 pelo grupo do National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE). O fluxograma do sumário coloca como primeira opção de tratamento da HAS a utilização de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECAs), ou bloqueadores dos receptores da angiotensi-na II (BRAs). Caso a combinação não seja eficaz, é indicado o uso de antagonistas do canal de cálcio. Como terceira alternativa, deve-se mi-nistrar a combinação de diurético. O uso dos BBs é preconizado como quarta opção, em conjunto com outros fármacos.

Este fluxograma vem sendo apresentado em muitos simpósios e congressos e, com ele, justifica-se o primeiro mito de que os BBs são considerados fármacos de quarta opção. A pergunta é: isso é o que realmente diz o documento?

Em primeiro lugar devemos reportar que este documento é um sumário de atualiza-ção, 18a revisão, e não o documento original.

No texto do documento (e não no fluxogra-ma), em realidade os BBs são citados como primeira opção para pacientes jovens (prin-cipalmente jovens tolerantes a IECAs/BRAs), mulheres jovens (porque não é teratogênico e não interfere no desenvolvimento fetal) e, ainda, para pacientes com hipertensão arte-rial hiperativa simpático-dependente.

Por que não são citados os pacientes que usualmente estão indicados para o uso dos BBs na HAS?

Este sumário, como citado no texto do documento, não se aplica aos pacientes com: diabetes mellitus (DM); doença arterial coro-nariana (DAC) crônica; pós-infarto do miocár-dio; idade < 18 anos; grávidas; causas secun-dárias de HAS, entre elas nefropatias, apneia obstrutiva do sono, tumores das glândulas suprarrenais e estenose das artérias renais; crise de HAS; HAS acelerada; fibrilação atrial crônica.

Quem seriam os pacientes com perfil clínico nos quais os BBs teriam plena indicação de uso?

É um equívoco se utilizar deste fluxogra-ma como um guia para todos os subgrupos de pacientes portadores de HAS. Ou seja, a levados aos simpósios e encontros médicos,

estão principalmente relacionados ao siste-ma renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), além de bastante divulgados pela indústria farmacêutica como a única linha de trata-mento com resultados positivos para a HAS. Por sua vez, não é comum na prática cli-nica a dosagem de adrenalina ou noradrena-lina para avaliação da atividade do sistema simpático, com o objetivo de demonstrar a relação deste com a gênese da hipertensão, o que é mais fácil em relação ao S-RAA atra-vés da dosagem da renina sérica.

Apresentamos, aqui, uma investigação sobre a veracidade de todas essas informa-ções. Cada aspecto envolvido será analisado, um a um, para desmitificar o uso de betablo-queadores no tratamento da hipertensão ar-terial sistêmica.

Primeiro ponto de desmitificação:

betabloqueadores são fármacos de

quarta linha

Para desmitificar a primeira afirmativa so-bre os BBs, faremos uma revisão abrangente das principais diretrizes que normatizam em nível mundial o tratamento da hipertensão. Vamos iniciar uma análise sobre o que dizem as diretrizes quanto ao uso dos BBs no trata-mento da HAS, em termos gerais, sem abor-dar subgrupos específicos de pacientes onde o betabloqueador terá ou não benefício.

As principais diretrizes que normatizam o tratamento da HAS são:

— British Medical Society Guideline (BMS-NICE 2011) (1).

— NICE Clinical Guideline 127
Hypertension: Clinical management of primary hypertension in adults. www.nice.org.uk/guidance/CG127. — Joint National Committee (JNC 7 2003) (2). — Chobanian, A.V.; Bakris, G.L. et al. and the

National High Blood Pressure Education Pro-gram Coordinating Committee. Hyperten-sion, 42: 1206-52, 2003.

— Diretriz Brasileira de HAS da Sociedade Brasi-leira de Cardiologia (SBC 2010) (3).

— European Society of Cardiology (ESC 2007) (4). — American Heart Association (AHA 2007) (5). — ACCACCF/AHA 2011 — Expert Consensus

Document on Hypertension in the Elderly (6). — Canadian Cardiovascular Society (CCS 2010) (7).

Apresentamos, aqui, uma investigação sobre

a veracidade de todas essas informações. Cada

aspecto envolvido será analisado, um a um, para desmitificar o uso

de betabloqueadores no tratamento da hipertensão arterial

(13)

Pontos-chave:

> Na presença de patologias associadas à HAS (compelling

indication) temos indicações

específicas para o uso de cada fármaco, independente de sua ação na redução da pressão arterial;

> BBs estão indicados para hipertensos que também apresentam IC, DAC e DH tipo II;

> Nestas situações clínicas os BBs têm benefício comprovado no controle destas patologias e na redução de suas comorbidades.

conclusão correta do sumário é que nos pa-cientes hipertensos com as situações clínicas excluídas pelo documento os BBs são consi-derados como quarta opção de escolha na terapêutica.

Quando nos reportamos ao documento original, publicado em 2004, onde não hou-ve restrições quanto aos tipos de pacientes hipertensos, os BBs estão indicados como primeira opção terapêutica nos pacientes com insuficiência cardíaca sistólica e diastó-lica, doença coronariana e, com cautela, nos diabéticos e portadores de asma brônquica.

Além disso, no documento original (como também poderemos observar em todas as outras diretrizes a seguir) é citado que os BBs não são inferiores a nenhum outro fármaco na redução da pressão arterial, e que caso o

paciente esteja com a pressão arterial contro-lada pelo betabloqueador, não há a menor necessidade de suspendê-lo ou trocá-lo por outro fármaco.

Joint National Committee (JNC 7 2003)

O JNC 7 de Hipertensão da American Heart Association, publicado em 2003 no

Hypertension, é um documento de grande

importância não somente pelo seu conteúdo abrangente, mas também por sua formata-ção ter sido utilizada em todas as diretrizes subsequentes, na construção dos fluxogra-mas terapêuticos. O fluxograma terapêutico do JNC 7 preconiza que no primeiro estágio do tratamento da hipertensão não há prefe-rência na escolha dos fármacos com relação à eficácia na redução da pressão arterial. No segundo estágio do tratamento também se pode optar por várias formas de combinação entre os fármacos mais utilizados, sem pre-ferência entre eles. Ou seja, não há discri-minação para o uso de betabloqueador, em termos gerais, no tratamento da HAS.

Na presença de patologias associadas à HAS (compelling indication) temos in-dicações específicas para o uso de cada fármaco, independente de sua ação na re-dução da pressão arterial, mas para o con-trole da patologia associada. No caso dos BBs, estes estão indicados nos pacientes hipertensos que apresentem também insu-ficiência cardíaca (IC) sistólica ou diastólica, doença arterial coronariana (DAC) aguda ou crônica ou com fatores de alto risco de

desenvolvimento de DAC e com diabetes

mellitus (DM) tipo II. Nestas situações

clíni-cas os BBs têm benefício comprovado no controle destas patologias e na redução de suas comorbidades. O documento também observa que os BBs podem ser utilizados nas mulheres jovens, ou grávidas, tema que será abordado mais adiante neste artigo, quando falaremos sobre farmacocinética.

Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC 2010)

A Diretriz Brasileira de Hipertensão da SBC, publicada em 2010 nos Arquivos

Bra-sileiros de Cardiologia, segue a mesma linha

do JNC 7. Em termos gerais, a diretriz pre-coniza que na primeira etapa da terapêutica, como monoterapia, não há nenhuma dife-rença na escolha entre os fármacos para o tratamento da HAS. Assim como na terapia combinada, podemos associar os BBs a ou-tros fármacos.

Pela diretriz, os BBs estão indicados como primeira opção em várias situações clínicas: nos pacientes com idade < 60 anos de acordo com modelo fisiopatológico da HAS; nos pacientes com idade > 60 anos que apresentem associados: DAC, IC com disfun-ção diastólica, arritmias cardíacas, infarto do miocárdio, IC com disfunção sistólica; HAS secundária por hiperadrenergismo; insufici-ência renal crônica (IRC); crianças e adoles-centes; grávidas e lactantes.

Como podemos ver, os BBs são indica-dos para pacientes com menos de 60 anos de acordo com o modelo fisiopatológico que indique a associação da HAS com hiperadre-nergismo. No caso de pacientes com modelo hipoadrenérgico, como os pacientes negros ou bradicárdicos, não é indicado o uso de BBs.

Segundo a diretriz, os BBs também são indicados em casos de pacientes idosos aci-ma de 60 anos que apresentem, em associa-ção com a hipertensão, diagnóstico de doen-ça coronária, disfunção sistólica ou diastólica, IC, arritmias cardíacas como fibrilação atrial e taquicardias supraventriculares, com a fun-ção principal de controle destas patologias e não na redução da pressão arterial.

Assim como também nos pacientes com DAC (mesmo que pós-infarto), IRC, hiperten-são arterial secundária ou hiperadrenergismo

(14)

— como estenose, artéria renal e doença tireoidiana — todos necessitarão, obrigato-riamente, do uso de BBs, independente de terem HAS ou não.

Os BBs também podem, e devem ser usados em crianças e adolescentes. Isso por-que a gênese da hipertensão na maioria des-tes paciendes-tes decorre do hiperadrenergismo. Também nesta diretriz, como no Joint 7, os BBs também são indicados para o tratamen-to de HAS em grávidas e lactantes, assuntratamen-to sobre o qual discorreremos com mais deta-lhes no item que envolve farmacocinética.

Portanto, com base na Diretriz Brasileira, podemos concluir que existem vários per-fis de pacientes para os quais o uso do BB é altamente indicado, seja como redutor da pressão arterial, seja como coadjuvante de outros fármacos na prevenção de eventos cardiovasculares.

European Society of Cardiology (ESC 2007)

A diretriz da Sociedade Europeia de Car-diologia, publicada em 2007 no European

Heart Journal, segue o mesmo padrão das

diretrizes apresentadas anteriormente. Na monoterapia, em termos gerais, não há di-ferença entre os fármacos para se iniciar o tratamento da HAS. Da mesma forma, na terapia combinada existem várias situações possíveis para a utilização do BB, seja em as-sociação com diuréticos, antagonistas do ca-nal de cálcio, bloqueadores do receptor AT1 ou com a IECA.

Como revelado nas outras diretrizes, este documento evidencia que os betabloquea-dores devem estar presentes para um grupo de pacientes já mencionados antes, como doentes coronarianos, com IC, arritmias e grá-vidas. O que mostra, mais uma vez, que uma extensa categoria de pacientes deve receber os BBs associados ou não a outros fármacos, com o objetivo de baixar a pressão mas, tam-bém, de prevenir eventos cardiovasculares.

American Heart Association 2007

Esta diretriz também mantém o raciocínio das diretrizes anteriores. Os BBs são consi-derados terapia de primeira escolha nos pa-cientes com DAC crônica, angina instável, IAM (com ou sem supra), IC (aguda ou crôni-ca) ou diabetes tipo 2.

ACCACCF/AHA 2011 — Expert Consensus Document on Hypertension in the Elderly

Este documento é de extrema importân-cia para a compreensão dos pacientes ido-sos com HAS. O uso de BBs estaria indicado como terapia coadjuvante nos idosos na pre-sença de patologias associadas, como já de-finidas anteriormente pelas outras diretrizes. Sendo acrescentada a indicação da presença de aortopatias como ectasia ou aneurisma de aorta, onde o uso de BBs demonstra impac-to no prognóstico evolutivo. O documenimpac-to enfatiza que a prevalência destas comorbi-dades é muito frequente nos pacientes ido-sos hipertenido-sos, portanto sendo frequente a necessidade da associação dos BBs aos anti--hipertensivos. Na ausência destas comor-bidades os fármacos de escolha seriam os antagonistas do canal de cálcio, diuréticos, IECAs ou BRAs para o controle da HAS, como monoterapia ou terapêutica combinada.

Canadian Cardiovascular Society (CCS 2010)

Bem como as outras diretrizes, esta rea-firma o uso de BBs como monoterapia ou te-rapia combinada em pessoas abaixo dos 60 anos — principalmente nos pacientes desse grupo que apresentem IC sistólica ou diastó-lica, pós-infarto ou diabetes.

QUADRO 1: Conclusão quanto ao mito de que as diretrizes suprimiram o uso dos BBs no tratamento da HAS

• Em termos gerais, no tratamento da HAS são equivalentes a todos os outros anti-hipertensivos.

• Estão indicados como terapêutica coadjuvante, em pacientes adultos e idosos, na presença de comorbidades, onde comprovadamente apresentam benefícios na evolução prognóstica. • Estão plenamente indicados em pacientes

jovens e em grávidas (dependendo do tipo de BB).

• Estão indicados em todos os pacientes onde a gênese da HAS esteja relacionada ao aumento da atividade simpática. Portanto, não é fato que as diretrizes releguem a um papel sem importância o uso dos BBs no controle da HAS e de suas comorbidades.

Com base na Diretriz Brasileira, podemos concluir que existem vários perfis de pacientes

para os quais o uso do BB é altamente indicado,

seja como redutor da pressão arterial, seja como coadjuvante de

outros fármacos na prevenção de eventos

(15)

Pontos-chave:

> A afirmação de que os BBs são menos eficazes na redução da pressão arterial foi desmitificada na análise das diretrizes;

> Não há diferença no uso de betabloqueador no tratamento da HAS frente a outros fármacos, quando o objetivo é reduzir a pressão arterial;

> É preciso fazer uma análise do ponto de vista geral e identificar que de paciente melhor responde aos BBs.

Segundo ponto de desmitificação:

os BBs são menos eficazes na

redução da pressão arterial

Inicialmente, a afirmação de que os BBs são menos eficazes na redução da pressão ar-terial foi desmitificada na análise das diretrizes. Ficou comprovado que, em termos gerais, não há diferença no uso de betabloqueador no tratamento da HAS frente a outros fármacos, quando o objetivo é reduzir a pressão arterial. Para melhor entendermos os benefícios dos BBs, em comparação a outras linhas de trata-mento, precisamos antes fazer uma análise do ponto de vista geral e depois identificar que tipo de paciente melhor responde aos BBs.

Análise do ponto de vista geral

Uma meta-análise de 42 estudos compa-rou a monoterapia com o uso de diuréticos, BBs, IECAs ou antagonistas do canal de cál-cio, em relação à capacidade de cada um na redução da pressão arterial sistólica (PAS). Foi demonstrado que não há diferença entre eles na capacidade de redução da pressão arterial sistólica. E quando se faz a terapêuti-ca combinada entre qualquer um desses fár-macos, também não é observada nenhuma distinção, a não ser a melhor tendência do BB na redução da PAS (9).

Também observamos que o atenolol foi semelhante ao besilato de anlodipino (ASCOT-BLA) e à losartana (LIFE) na redução da pressão arterial, o que comprova a afirmativa das diretrizes anteriormente citadas de que, em termos gerais, os BBs têm a mesma ação hipotensora que os outros fármacos (10, 11).

Que tipo de paciente responde melhor aos betabloqueadores?

De uma análise geral passa-se, agora, à particularização do uso de BBs no tratamento da HAS. Para chegar à resposta de qual pa-ciente melhor responde ao tratamento com BBs é preciso seguir um fluxograma de ra-ciocínio através de quatro questionamentos, para se construir o racional do tratamento da hipertensão que se aplica a qualquer fárma-co a ser utilizado:

— Qual o modelo fisiopatológico da HAS? — Qual o tipo de paciente?

— Qual o alvo terapêutico?

— Qual o perfil farmacológico do BB que melhor se adapta ao meu paciente?

Qual o modelo fisiopatológico de hipertensão do paciente?

Basicamente devemos, inicialmente atra-vés de anamnese e exame clínico, estimar se o modelo fisiopatológico da hipertensão arterial do paciente é hiper-reninêmico + hi-peradrenérgico, ou o contrário.

Uma vez definido que a HAS é simpático--dependente (SNS), se faz necessário a com-preensão básica do funcionamento deste sistema. O sistema nervoso simpático (SNS) tem uma atuação central, chamada de pré--sináptica (cérebro e medula), e periférica, pós-sináptica (órgãos efetores). No sistema periférico temos β1 e 2-receptores e α1 e 2-receptores, que são ativados através da noradrenalina liberada pela vesícula sinápti-ca e pela ação da adrenalina circulante. Atra-vés da ativação simpática teremos atuações na gênese da hipertensão arterial, em nível periférico, através de vasoconstrição perifé-rica (α1-2-R), modulação da vasodilatação (β2-R), liberação da renina (β1-R) com ativa-ção do SRAA e aumento do débito cardíaco (β1-R). Em nível central, temos aumento do

drive simpático mediado por β estímulo e

a sua redução mediada através da ativação dos α-R; portanto, podemos mediar cen-tralmente o simpático através do bloqueio do β-R ou através de agonista do α-R como α-metildopa.

Todos os benefícios esperados em Car-diologia através dos BBs são fundamental-mente mediados pelo bloqueio do β1-R, como mostra a Figura 1 (12). Observam-se, em nível central, redução da liberação de norepinefrina, redução da renina, redução da remodelagem, vasodilatação mediada pelo β2-R, melhora da função endotelial e estabi-lização da placa aterosclerótica, por redução do estresse transmural e da inflamação.

No coração, a maioria dos benefícios clí-nicos, como melhora da função ventricular, redução da mortalidade por IC e morte sú-bita, é mediada pelas ações na fisiopatolo-gia pelo bloqueio do β1-R (12): bradicardia sinusal; atraso na condução A-V; redução do automatismo e excitabilidade; efeito agudo inotrópico negativo; efeito crônico inotrópi-co positivo; redução da hipertrofia e fibrose;

(16)

redução da apoptose; redução do cálcio no citosol; aumento do β1-R; melhora da função do β1-R; melhora do metabolismo da glicose e ácido graxo miocárdico; redução da ativa-ção do SRAA tecidual.

Por sua vez, o bloqueio do β2-R

(Figu-ra 2) está associado ao desenvolvimento de vários efeitos indesejáveis, em decorrência deste receptor estar espalhado em vários órgãos. Em nível do sistema nervoso central, o bloqueio de β2-R resulta em redução do

drive simpático, diminuição da libido sexual,

induz à insônia, pesadelos, hipotensão pos-tural e redução da ansiedade (o que pode ser favorável, ou não). Na área vascular, o bloqueio do β2-R limita a capacidade de vasodilatação durante exercícios físicos, pro-vocando cãibras e aumento da resistência periférica ao exercício; ainda estimula a pres-são de pulso central, interferindo no possível benefício de menor incidência de acidentes vasculares encefálicos. Reduz a capacidade de ereção e favorece eventos de

vasoes-pasmo periférico e coronariano. No pulmão favorece o broncoespasmo. Altera o meta-bolismo, favorecendo a resistência periférica à insulina por direcionar o estímulo simpáti-co aos α1 e 2-receptores, reduz a resposta hiperglicêmica no diabetes tipo 2, favorece a redução do HDL-colesterol e o aumento de triglicérides, e a fadiga muscular ao exer-cício, por sua ação vascular e por bloquear a absorção do ácido graxo na musculatura esquelética.

Portanto, se o betabloqueador não agre-gar as propriedades de bloqueio do β2-R não terá a série de efeitos indesejáveis. Para que o BB tenha maior eficácia clínica, é preci-so que se regionalize ao β1-R bloqueio.

Outro aspecto é a interação entre o SNS e o SRAA. A ativação do β1-R promove a li-beração de renina e a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), que por sua vez favorece o drive simpático e a liberação da norepinefrina na vesícula. Ou seja, ambos os sistemas estão

continuamen-Figura 1: Ações na fisiologia em decorrência do bloqueio do β1-R.

Bloqueio β1-R

SNC Rin Coração Vascular

• Reduz NE • Reduz renina • Bradicardia

• Reduz condução A-V • Melhora das funções sistólica e diastólica • Antirremodelagem • Modula metabolismo • Vasodilatação • Melhora endotelial • Coagulação • Estabiliza DAC

x

x

x

Bloqueio β2-R

SNC Vascular Pulmonar Metabólico

• Broncoespasmo • Fadiga muscular • Resist. insulina • Reduz HDL • Aumenta TGL • Favorece DM • Hiperpotassemia

x

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• Reduz NE • Insônia • Disf. sexual • Pesadelos • Hipotensão postural • Reduz ansiedade

Figura 2: Ações na fisiologia em decorrência do bloqueio do β2-R.

• Vasoespasmo • Câimbras • Favorece o AVC • Aumenta PPC

x

Pontos-chave:

> Para que o BB tenha maior eficácia clínica, é preciso que se regionalize ao β1-R bloqueio;

> A ativação do β1-R promove a liberação de renina;

> E também a ativação do sistema renina-angiotensina- -aldosterona (SRAA), que favorece o drive simpático e a liberação da norepinefrina na vesícula.

(17)

te interagindo. Usualmente, os pacientes que respondem bem a IECAs e BRAs na redução da pressão arterial, na prática clínica, costu-mam responder aos BBs. Também observa-mos um efeito sinérgico na melhora da remo-delagem cardíaca e vascular e na redução de eventos cardiovasculares. Assim, é incorreto afirmar que podemos atuar de forma isolada promovendo o bloqueio de um sistema sem afetar o outro com a utilização de IECAs e BRAs de forma diferenciada da ação dos BBs, já que esses sistemas não trabalham isolada-mente.

Que tipo de paciente responde aos BBs?

A hipertensão arterial sistêmica pode ser separada em três modelos clínicos relaciona-dos à ativação simpática (13):

Modelo 1: HAS sistólica do adulto jovem (17-25 anos) — Nesses pacientes, o que

do-mina é a hiperatividade simpática, por isso precisam usar BBs; também respondem bem a IECAs/BRAs que, como mostrado antes, mantêm uma relação dependente.

Modelo 2: HAS diastólica do adulto (30-50 anos) — Aqui, existe uma gênese maior de

fatores determinantes da HAS relacionados ao aumento da resistência vascular sistêmica e do débito cardíaco. Podemos ter o aumen-to da ativação do SNS, ativação do SRAA, aumento da vasorreatividade e nefroesclero-se renal com HAS sódio-dependente. Neste grupo de pacientes, de acordo com o modelo fisiopatológico predominante, teremos HAS diastólica ou sisto-diastólica, onde a definição do melhor esquema terapêutico estará na de-pendência do modelo fisiopatológico.

Modelo 3: HAS sistólica do adulto e idoso (> 55 anos) — Neste grupo o que domina é

o modelo hipoadrenérgico (75%) e apenas 25% desses pacientes são hiperadrenérgicos. No conjunto predominante, embora sejam hipoadrenérgicos, os pacientes apresentam níveis elevados de norepinefrina circulante, para compensar a denervação autonômica progressiva no coração, que ocorre com o envelhecimento. O indivíduo passa a ser mais sensível ao BB, ocorrendo bradicardia e alar-gamento do intervalo PR com baixas doses.

Estes pacientes, além de apresentarem o modelo hipoadrenérgico, onde a HAS é só-dio-sensível, também possuem uma aorta to-rácica aterosclerótica com calcificação, e con-sequente maior impedância ao esvaziamento do ventrículo esquerdo e maior tendência a elevações da pressão arterial sistólica. Dessa forma, estes pacientes se beneficiam pouco dos BBs para redução da pressão arterial, sendo mais responsivos a antagonistas do canal de cálcio, IECAs ou BRAs e diuréticos. No entanto, no subgrupo de 25% de hipera-drenérgicos — que corresponde aos idosos com taquicardia e ansiosos, por exemplo — o uso de BBs é altamente recomendado.

Seguindo este raciocínio de modelos clí-nico-fisiopatológicos, há ainda uma série de situações clínicas vinculadas à hiperatividade simpática: obesidade, apneia do sono, insu-ficiência renal crônica, insuinsu-ficiência cardíaca, estresse físico e emocional e hipertensão ar-terial primária. Estes pacientes apresentam frequência cardíaca mais elevada, hipertensão arterial postural e reativa aos exercícios físicos. Neste grupo de pacientes está indicado o uso de BBs coadjuvante à terapêutica, para o tra-tamento da condição hiperadrenérgica.

Por outro lado, há aqueles pacientes com condições clínicas que indicam a não ativação do sistema simpático: raça negra, 75% dos ido-sos, portadores de hipotireoidismo e de HAS diastólica do adulto. Estes pacientes se apre-sentam bradicárdicos e não possuem hiperten-são arterial postural ou ao exercício físico.

Qual o alvo terapêutico na HAS?

Há três alvos terapêuticos no tratamento clínico da HAS: redução da pressão arterial, órgão-proteção e endotélio-proteção. A indi-cação e o benefício esperados com o uso dos fármacos poderão abranger os três alvos, dois ou apenas um; portanto, eles poderão estar associados a diferentes linhas de tra-tamento complementares. Na análise, é im-portante definir o que se espera de benefício terapêutico com o uso do BB, para que este não seja excluído do tratamento, pois ele po-derá ter outro papel que não a redução da pressão arterial.

Por exemplo, o uso do BB estará indica-do como hipotensor nas situações clínicas de hiperadrenergismo, como vimos no item an-terior, podendo ou não agregar a função de

É importante definir o que se espera de benefício terapêutico

com o uso do BB, para que este não seja excluído do tratamento, pois ele poderá ter outro papel que não a redução

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