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DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

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Academic year: 2018

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GISELI PAIM COSTA

CONSCIÊNCIA POLÍTICA E CIDADANIA MEDIADAS

PELA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA: UM ESTUDO DE CASO

EM PORTO ALEGRE

DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

São Paulo

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GISELI PAIM COSTA

CONSCIÊNCIA POLÍTICA E CIDADANIA MEDIADAS

PELA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA: UM ESTUDO DE CASO

EM PORTO ALEGRE

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutora em Psicologia Social sob orientação do Prof. Dr. Salvador Antonio Mireles Sandoval.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

São Paulo

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BANCA EXAMINADORA

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É chegada a hora de agradecer...

Agradecer, no momento de finalização de uma tese de Doutorado, é expressar o carinho, o afeto, a importância que cada pessoa teve na nossa vida durante esse percurso. As palavras, certamente, tem um alcance infinitamente menor do que o reconhecimento que temos pelo apoio que familiares, amigos e colegas deram e que, direta ou indiretamente, foram importantes para a realização e conclusão da tese. Nesse sentido, manifesto meus agradecimentos a todas as pessoas que, de alguma forma, contribuíram nessa trajetória:

A Salvador Sandoval, meu orientador, pelas suas contribuições preciosas que deram qualidade teórica e metodológica para a minha vida acadêmica e profissional.

Aos professores do Programa de Psicologia Social da PUC-SP, pelas interlocuções e reflexões realizadas, principalmente, através das disciplinas acadêmicas.

Aos colegas do Núcleo de Psicologia Política da PUC-SP, pelas discussões acadêmicas que permitiram o aprimoramento de muitas reflexões acerca do meu trabalho.

A Betânia, Alessandro e Marquinhos, companheiros de curso, interlocutores nessa trajetória de Doutorado e parceiros nas viagens acadêmicas – e de lazer - a Congressos.

A Soraia que, mais que uma companheira de curso, é uma amiga, sempre presente, com seu carinho, afeto e apoio, a quem agradeço especialmente suas interlocuções teóricas que ajudaram imensamente na minha tese.

Ao professor Enrique Laraña, que me acolheu na Universidad Complutense de Madrid (UCM), acompanhou meu trabalho e contribuiu muito para meu amadurecimento acadêmico durante meu estágio no exterior.

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importantes, mas também momentos de lazer, de descontração, de intercâmbio cultural, que me permitiram uma estada em Madrid muito agradável.

A Cristina, Raúl e Flor, meus amigos espanhóis, que me acolheram com muito afeto e amizade, que foram – e são - a minha família na Espanha.

A Corina Michelon Dotti, na pessoa de quem agradeço também à Instituição com a qual tenho vínculo profissional, pela sua compreensão e apoio irrestrito em relação à realização do Doutorado.

Aos meus amigos e também colegas de trabalho, Chris, Lu, Sônia, Rita, Nilda, Marinilson, Sandro, Márcia, com quem sempre pude compartilhar as angústias e conquistas referentes ao Doutorado.

Aos meus amigos Miriam, Gilson, Fernando, Márcia, Anins, Agomar, Carmem, Zuleika, Jaqueline, Ângela, Janaína,... amigos que, perto ou longe, acompanharam minha trajetória acadêmica, se alegraram com as conquistas, souberam entender as ausências e me apoiaram sempre.

Aos meus tios e meus primos, pelas suas palavras de apoio, pelo seu carinho e incentivo, pela compreensão das ausências necessárias em função da tese, agradeço por fazerem parte da minha vida e estarem presentes nesse momento.

A Tereza, Isolde e Jair, minha sogra e meus cunhados, que também fazem parte da minha família, pelas palavras de apoio, pelo incentivo a continuar superando as dificuldades, pelo carinho e compreensão do stress inevitável que o percurso do Doutorado nos apresenta.

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escrita da tese. Sempre foram o meu porto seguro capazes de agüentar meus momentos de mais puro stress, angústia e impaciência. Agradeço em especial a minha irmã, Gislaine, e ao meu marido Cláudio, pelo irrestrito apoio, dedicação e cuidado comigo e com o texto acadêmico, principalmente nos momentos finais das eternas revisões e ajustes para que a tese ficasse “impecável”.

Aos entrevistados – moradores e trabalhadores das Unidades de Reciclagem de Lixo e aos técnicos, que me forneceram a “matéria-prima” para essa pesquisa.

Aos professores Antonio da Costa Ciampa, Maria Palmira da Silva e Maria Lúcia Carvalho da Silva pelas importantes contribuições dadas no exame de Qualificação que, indubitavelmente, qualificaram meu trabalho acadêmico.

Às professoras Neuza Maria de Fátima Guareschi, Maria Palmira da Silva, Maria Lúcia Carvalho da Silva e ao professor Antonio da Costa Ciampa, que aceitaram o convite para participar da banca de defesa.

À Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pelo apoio financeiro durante a vigência de meu estágio no Exterior.

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RESUMO

O presente trabalho apresenta um estudo sobre a formação da consciência política, viabilizada pela participação política. Esse estudo foi desenvolvido com moradores e trabalhadores de Unidades de Reciclagem de Lixo, em algumas comunidades, na cidade de Porto Alegre.

Realizamos questionários e entrevistas semi-estruturadas com moradores e trabalhadores das Unidades de Reciclagem de Lixo, dentre os quais contemplamos lideranças comunitárias, assim como técnicos de diferentes Secretarias ou Departamentos Municipais, que trabalham junto às comunidades nas quais se encontram as Unidades de Reciclagem. Além disso, fizemos uma pesquisa documental para a coleta de informação sobre a realidade pesquisada.

Com base nos discursos de nossos entrevistados e nos referenciais teóricos de Sandoval (1989, 1994, 2001) e Melucci (1989, 1994, 2001, 2004), analisamos as relações entre consciência política e participação política, inferindo que o exercício da cidadania, viabilizado pela participação política, compõe um cenário importante para a formação da consciência política.

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ABSTRACT

This paper presents a study on the formation of political awareness, made possible through political participation. The study was developed with the inhabitants and workers at Garbage Recycling Units in some communities in the city of Porto Alegre.

We conducted questionnaires and semi-structured interviews with inhabitants and workers at Garbage Recycling Units, among which were community leaders. Also involved were technicians from different City Departments and Offices who work alongside the communities where the Garbage Recycling Units are located. In addition, we carried out document research in order to collect data on the environment studied.

Based on what interviewees said and on the theoretical references by Sandoval (1989, 1994, 2001) and Melucci (1989, 1994, 2001, 2004), we analyzed the correlation between political awareness and political participation, inferring that the exercise of citizenship, made possible through political participation, generates an important backdrop for the formation of political awareness.

We have established that participative forums, among which the Participative Budget stands out, become important dialogue channels, not to mention that they are decisive for the configuration of society values allowing individuals to become stronger as social and political subjects as well as to collectively engage in initiatives that further the exercise of citizenship, emancipation and quality of life.

We understand that public policies have an impact on individuals' lives; however, it is necessary to consider the psycho-political influences interfering on their political behavior in order to understand the complexity of political participation.

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SUMÁRIO

Introdução ... 13

Capítulo I. Cenários da pesquisa e Contexto metodológico ... 20

1. Um pouco de história ... 20

1.1. Um tempo mais recente ... 24

2. A Porto Alegre pesquisada ... 26

3. Caminhos metodológicos: os instrumentos da investigação ... 49

3.1. Os atores sociais da pesquisa ... 61

3.2. Perfil dos entrevistados ... 62

3.2.1 Moradores e trabalhadores ... 62

3.2.2 Técnicos ... 65

Capítulo II. Orçamento Participativo: um capítulo à parte ... 67

1. Histórico do Orçamento Participativo ... 67

2. Funcionamento Geral ... 73

2.1 Base de Discussão do Orçamento Participativo ... 75

2.2 Ciclo do Orçamento Participativo ... 76

2.3 Prioridades Temáticas das Regiões ... 76

2.4 Prioridades das Plenárias Temáticas ... 79

2.5 Critérios Gerais para Distribuição de Recursos entre Regiões e Temáticas ... 80

2.5.1 A escolha das Prioridades Temáticas das 16 Regiões... 80

2.6 Regras para apresentação das demandas ... 81

2.6.1 Gerais ... 81

2.6.2 Regionais ... 81

2.6.3 Temáticas ... 82

2.6.4 Os três critérios gerais ... 82

2.7 Alguns dados do Orçamento Participativo ... 82

2.7.1 Prioridades Temáticas – Período: 1992 a 2004 ... 82

2.7.2 Qualidade de vida via Orçamento Participativo... 84

2.7.2.1 Pavimentação ... 84

2.7.2.2 Rede de Água e Esgoto ... 84

2.7.2.3 Transporte Público ... 85

2.7.2.4 Saúde ... 86

2.7.2.5 Educação ... 87

2.7.2.6 Meio Ambiente ... 88

2.7.2.7 Assistência Social ... 89

2.7.2.8 Política Habitacional: habitação como prioridade... 91

2.7.2.9 Cultura ... 93

2.7.2.10 Trabalho e Renda ... 94

2.7.2.11 Tecnologia ... 95

Capítulo III. Administração Municipal Participativa no Brasil: Revisitando a Literatura ... 96

(11)

participação política... 104

3. Definindo a participação política a partir do referencial da Psicologia Política ... 112

4. Identidade social ou coletiva? O que é definidor na participação política .... 119

Capítulo IV. Situando Teoricamente os Referenciais da Pesquisa ... 125

1. Participação política: as muitas maneiras de abordar o conceito ... 125

2. Algumas Considerações sobre o “estigma”... 132

3. Identidade social e identidade coletiva: diferenciações necessárias para o entendimento da participação política... 141

4. Atores sociais construindo cidadania ... 147

5. Alguns elementos para definir consciência política ... 156

Capítulo V. Participação política e cidadania: alguns entrelaçamentos... 175

1. O “ser cidadão” através da participação política – dando voz aos moradores e trabalhadores ... 182

2. O “exercício da cidadania” através da participação política – dando voz aos moradores e trabalhadores ... 189

3. A relação com Porto Alegre e com a comunidade... falando das vivências dos entrevistados ... 204

3.1. Porto Alegre pelos olhos dos moradores e trabalhadores ... 205

3.2. A comunidade pelos olhos dos moradores e trabalhadores ... 214

3.3. A relação entre as comunidades e as Secretarias Municipais ... 217

3.4. Viver na comunidade ... 220

4. O cotidiano e as perspectivas de vida em termos de realizações pessoais .... 228

5. O cotidiano e as perspectivas de vida em termos de trabalho ... 232

5.1. Para os trabalhadores das Unidades ... 232

5.2. Para os Moradores ... 234

6. A participação política fortalecendo as relações comunitárias ... 234

7. Participação política e consciência política: algumas análises iniciais ... 239

7.1. A participação política tem a ver com o exercício da cidadania ... 241

7.2. A participação política tem a ver com a relação com a cidade ... 248

7.3. A participação política fortalece as relações comunitárias ... 253

Capítulo VI. Políticas públicas incidindo na participação política dos moradores e trabalhadores das Unidades de Reciclagem de Lixo ... 263

1. Políticas públicas sendo viabilizadas no OP: a repercussão dessa vivência para a vida dos cidadãos ... 270 1.1. A vivência do Orçamento Participativo em Porto Alegre – o que dizem os moradores e trabalhadores ... 271

2. Escola e comunidade: uma parceria ideal ou real? ... 285

3. A relação com o Conselho Tutelar: quase sempre uma relação conflituosa . 295 4. A comunidade e a resolução de problemas ... 301

5. Construção e importância das Unidades de Reciclagem ... 309

5.1. A construção das Unidades de Reciclagem de Lixo ... 310

5.2. A importância das Unidades de Reciclagem de Lixo ... 314

6. Repercussão dos movimentos dos moradores para as políticas públicas ... 323

6.1. A percepção dos técnicos ... 323

(12)

Capítulo VII. Participação política e consciência política: uma

abordagem psicopolítica ... 342

1. A relação entre a participação política e a questão partidária ... 348

1.1. A preferência político-partidária e a participação política – a inter- relação a partir da percepção dos moradores e trabalhadores das Unidades de Reciclagem 349 2. A comunidade em busca de melhorias ... 362

3. As diferentes percepções sobre a comunidade ... 367

3.1. Percepção do entorno – pelos moradores e trabalhadores ... 368

3.2. Percepção de si mesmos – pelos moradores e trabalhadores ... 372

3.3. Percepção da comunidade – pelos técnicos ... 377

4. Participação política e consciência política: análises finais ... 381

4.1. Mudança no comportamento político: alguns indicativos da consciência política ... 383

4.2. Participação política e estigma: algumas interrelações ... 387

Capítulo VIII. O impacto das políticas públicas no comportamento político dos indivíduos: algumas considerações finais ... 398

Bibliografia ... 408

Anexos ... 416

Anexo I ... 417

Anexo II ... 418

Anexo III ... 419

Anexo IV ... 420

Anexo V ... 421

Anexo VI ... 422

(13)

INTRODUÇÃO

Essa tese visa compreender a complexidade da participação política de moradores e trabalhadores de Unidades de Reciclagem de Lixo, em algumas comunidades, na cidade de Porto Alegre. As questões que abordamos estão relacionadas a aspectos estudados durante a realização do Mestrado, em uma das comunidades examinadas nessa pesquisa.

Na nossa pesquisa de Mestrado1 estudamos a repercussão da violência social no contexto escolar. Acompanhamos o cotidiano dos nossos entrevistados, à época, e percebemos que haviam discursos antagônicos para explicar a falta de participação no Orçamento Participativo, que inviabilizava as melhorias na comunidade e, por sua vez, era percebida pelos moradores como uma violência social.

Esse era um contexto onde prevalecia, de um lado, um discurso assistencialista e, de outro, um discurso emancipatório. À época, essa comunidade fazia parte de um projeto de reassentamento da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. A proposta da Administração Municipal, com a implantação do Orçamento Participativo, em 1989, buscou, junto às populações marginalizadas, o desenvolvimento do sentimento de pertença em relação à cidade, através da participação da população e do suprimento de condições mínimas de moradia para que fosse possível o exercício da cidadania.

O Orçamento Participativo foi um dos canais de interlocução responsáveis pelas conquistas e melhorias nas comunidades, bem como pela implantação de políticas públicas. E foi justamente esse aspecto que nos alertou para a pesquisa de Doutorado, ou seja, ampliar a compreensão acerca da participação da população no Orçamento Participativo, bem como em outros fóruns de participação popular2.

1 Costa, Giseli Paim. A repercussão da violência social no cotidiano escolar. Dissertação (Mestrado). Porto

Alegre : UFRGS, 2000.

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Na proposta da Administração Municipal, buscava-se a superação das dificuldades inerentes de comunicação e de manifestação da vontade da população de baixa renda no processo decisório das políticas públicas de âmbito municipal. Intencionava-se romper com uma lógica excludente e segregadora e estabelecer laços de solidariedade e urbanidade, e uma cultura de participação que pudesse criar raízes suficientemente profundas para garantir sua continuidade, mesmo em um contexto politicamente adverso. No entanto percebemos, que não havia uma relação direta entre a participação e uma cultura de participação, que pudesse criar raízes suficientemente profundas para garantir sua continuidade, mesmo em um contexto politicamente adverso.

Constatamos que, indubitavelmente, a ação direta exercida através do Orçamento Participativo se revelou muito positiva no desenvolvimento da consciência e da prática política dos cidadãos que se apropriam de informações e do controle sobre o Estado. Villasante e Garrido (2002) reconhecem que a experiência de Porto Alegre permite uma consciência social maior, uma vez que os cidadãos têm condições de detectar as necessidades locais mais emergentes, e decidir sobre projetos sustentáveis.

Para os autores, a Administração Pública assume um papel orientador e impulsor de desenvolvimento local, porém a característica mais significativa desta função é a possibilidade de parceria com os atores sociais, ya no se trata de que la Administración explicite um modelo global de ciudad, determine y trate de imponer los objetivos y medios

de conseguirlo, y regule y gestione la planificación (...) se impone la implantación del

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consenso y la participación como elementos básicos de la planificación estratégica

(Villasante y Garrido, 2002: 133).

Deste modo, é inerente à Administração, a implementação de procedimentos que suponham a participação - e não a representação - dos cidadãos no processo de tomada de decisões de uma comunidade: es ahí donde podemos observar lo explícito de los Presupuestos Participativos como procedimiento inclinado a contemplar uma democracia

participativa (Villasante y Garrido, 2002: 178).

No entanto, entendemos que o tema participação polítca é complexo, pois as redes de significados que os indivíduos atribuem à realidade social delineiam suas ações individuais e coletivas, nos engajamentos em movimentos sociais e no comportamento político dos indivíduos.

Considerando os fatores determinantes da participação em mobilizações coletivas, Sandoval (1989), faz uma distinção entre os fatores da esfera interna e externa, referentes à dinâmica dos agrupamentos envolvidos no movimento social, que exercem um papel de controle social.

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No transcorrer de nosso trabalho, contemplamos outros elementos que dizem respeito à percepção que nossos entrevistados têm, enquanto comunidade; como constituem sua identidade social e identidade coletiva; como percebem o estigma que lhes é atribuído e, conseqüentemente, como desenvolvem sua participação política.

Além das conseqüências destes estigmas para as relações das pessoas entre si e com a vizinhança do entorno, é possível entender que os entraves para a efetivação de uma organização comunitária são marcados, dentre outros fatores, por uma visão coletiva fragmentada e permeada pelo preconceito e discriminação.

De acordo com Norbert Elias e John Scotson (2000), há uma tendência em discutir o problema da estigmatização social, como se fosse uma simples questão de pessoas que mostram, individualmente, um desprezo acentuado por outras pessoas como indivíduos. E isso não é suficiente porque equivale discernir, somente no plano individual, algo que não pode ser entendido sem que se perceba, ao mesmo tempo, no nível de grupo.

Assim, inserimos na nossa discussão, as repercussões dessa estigmatização na vida dos indivíduos, enquanto atores sociais e políticos. Percebemos relações baseadas em um

não posso, não me autorizo, não sou reconhecido enquanto sujeito da mesma sociedade, com direito à fala, e as conseqüências deste processo vemos cotidianamente nas opções que as pessoas fazem para lidar com isso: umas optam pela sujeição, pela opressão; outras, lutam pela palavra; outras ainda, optam pela violência, manifestada em suas mais diversas formas.

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Esse contexto foi determinante na escolha de nossos entrevistados, ou seja, as comunidades que pesquisamos têm em comum uma Unidade de Reciclagem de Lixo. Este critério foi utilizado para a definição da amostra, pois se trata de comunidades estigmatizadas como vileiros, lixeiros, marginais e maloqueiros, desqualificadas enquanto atores sociais, tanto pela comunidade do entorno quanto por alguns moradores da própria comunidade. No entanto, demostravam ser grupos com um potencial de organização e com uma disponibilidade de participação popular extraordinária.

Esse foi o cenário escolhido para desenvolver teoricamente questões apresentadas nesta tese, e descritas em cada capítulo.

No primeiro capítulo, Cenários da pesquisa e Contexto metodológico, contextualizamos o cenário no qual fizemos a pesquisa. O capítulo está dividido em três momentos. Primeiro, resgatamos, brevemente, a história de Porto Alegre, desde os primeiros grupos silvícolas que habitaram a região até os imigrantes que colonizaram o município, após, remetemos à informação de um tempo mais recente, destacando o crescimento geográfico, econômico, social e político de Porto Alegre; em um segundo momento, descrevemos a cidade pesquisada, ou seja, as comunidades por onde circulamos e que constituem o cenário desta pesquisa, bem como as pessoas que conhecemos e entrevistamos, que são os protagonistas desse cenário. Por fim, apresentamos os caminhos metodológicos que percorremos para a concretização de nossas intenções de pesquisa; explicitamos os procedimentos, os instrumentos usados na investigação, o perfil dos entrevistados e a escolha metodológica, a qual fundamenta nossa análise.

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apresentação das demandas, os critérios para a distribuição de recursos, e dados sobre a qualidade de vida conquistada via OP.

No terceiro capítulo, Administração Municipal Participativa no Brasil: Revisitando a Literatura, detalhamos os referenciais teóricos relacionados ao tema da pesquisa. Mencionamos autores, principalmente, da sociologia, psicologia social e psicologia política, que auxiliam na compreensão da construção da cidadania em administrações democráticas, outrossim, apresentamos o contexto específico do Orçamento Participativo como um instrumento de mediação de conflitos entre a gestão pública e a sociedade civil organizada.

No quarto capítulo, Situando teoricamente os referenciais da pesquisa, explicitamos, de uma maneira mais prolongada, os referenciais teóricos sobre as categorias utilizadas na análise dos dados. Tratamos das diferentes maneiras de entender a participação política e a cidadania; algumas considerações sobre o estigma; as diferenciações necessárias sobre identidade social e coletiva, e o modelo de consciência política de Sandoval (2001), a partir do qual compreendemos a complexidade da participação política.

No quinto capítulo, Participação política e cidadania: alguns entrelaçamentos, iniciamos as análises das entrevistas realizadas, procurando evidenciar como a participação política vem sendo construída pelos moradores e trabalhadores de Unidades de Reciclagem de Lixo em Porto Alegre, bem como as repercussões que esta participação tem, tanto para a vida das pessoas, como para as políticas públicas da cidade. Discorreremos sobre o quanto a participação política interfere no exercício da cidadania.

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trabalhadores de Unidades de Reciclagem de Lixo em Porto Alegre, e de que forma nossos entrevistados interagem com essas políticas, efetivamente, seja na relação com as entidades/instituições que trabalham nestas comunidades, seja pelos fóruns de participação popular.

No sétimo capítulo, Participação política e consciência política: uma abordagem psicopolítica, investigamos a relação entre participação política e consciência política. Analisamos a relação entre a participação política e a preferência político-partidária de nossos entrevistados com o intuito de entender a relação entre a preferência partidária e os níveis de participação os cidadãos. Buscamos relacionar também a definição de participação política que os entrevistados têm e o movimento por busca de melhorias para a sua comunidade; se, nessa relação, predomina um movimento mais emancipatório ou assistencialista.

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CAPÍTULO I

Cenários da pesquisa e contexto metodológico

A pesquisa foi realizada em Porto Alegre, em algumas comunidades da capital. Neste capítulo, descrevemos o cenário da pesquisa, iniciando por uma breve história da cidade e, posteriormente, apresentando o contexto específico onde foi feito o levantamento dos dados.

Porto Alegre é a capital do Estado do Rio Grande do Sul, Estado que faz fronteira com Argentina e Uruguai. E é, de acordo com pesquisas3, uma das melhores cidades do Brasil para se viver, com uma população de 1.360.590 habitantes, de acordo com o Censo do ano 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

Porto Alegre é, para quem tem a oportunidade de viver seu cotidiano, uma cidade dinâmica, pelas oportunidades que oferece tanto no âmbito educacional, cultural como profissional; poética, a exemplo da formação cultural de grandes e renomados escritores, músicos, profissionais das mais diversas artes; acolhedora, a exemplo da diversidade cultural, étnica e, sobretudo política, dos seus cidadãos.

1- Um pouco de história4

Os grupos silvícolas que habitaram a região onde surgiria Porto Alegre pertenciam ao grande grupo indígena Guarani. Ao sul, pelas margens do rio Guaybe havia grupos da tribo Guarani. Ao norte, pelas margens do rio Gravataí, localizavam-se os Tapi-mirim (moradores da pequena aldeia), adversários dos Tapi-guaçú (moradores da grande aldeia), residentes na outra margem do Rio Gravataí.

3 Fontes: Pesquisa Exame/Revisan, 1996; Pesquisa Sinduscon-RS, 2003.

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A primeira tentativa dos jesuítas espanhóis de estabelecerem missões na margem oriental do rio Uruguai ocorreu em 1627, ano em que foram expulsos da região pelos portugueses. Como forma de contrabalançar a presença espanhola no Rio Prata, os portugueses fundaram, em 1680, a Colônia de Sacramento, estrategicamente situada na margem oposta à cidade de Buenos Aires. Como resposta imediata à fundação de Sacramento, os jesuítas espanhóis estabeleceram novos povoados na região, os chamados Sete Povos das Missões Orientais.

No século XVII, o Rio Grande do Sul era grande produtor de gado. Por isso, tropeiros vinham de São Paulo, em busca dessa riqueza. Em suas andanças pelo Rio Grande usavam certas localidades para seus pousos que, paulatinamente, transformavam-se em povoados. Porto Alegre nasceu dessa forma.

Um tropeiro chamado Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, originário da Ilha da Madeira, casado com Lucrécia Leme Barbosa, instalou-se, por volta de 1732, nos Campos de Viamão, às margens da Lagoa de Viamão (Guaybe, na linguagem indígena). Assim o fazendo, Jerônimo de Ornelas conquistou direitos sobre essas terras, recebeu a carta de sesmaria em 5 de novembro de 1740 e trouxe, assim, seus parentes e agregados, firmando uma comunidade de aproximadamente 100 pessoas.

Em 1737, os portugueses deram início à colonização das terras próximas às Missões Jesuíticas, o que estimulou, em 1740, a fundação de um vilarejo com funções defensivas e portuárias batizado com o nome de Porto de Viamão (também conhecido como Porto dos Dornelles). Com a chegada dos casais açorianos, na primeira leva de imigrantes, o vilarejo passou a chamar-se Porto dos Casais.

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do Sul, todavia, não foi beneficiado, pois aqui ainda ocorriam lutas entre luso-brasileiros e espanhóis. Somente mais tarde, após a celebração do Tratado de Madrid, o Governo Metropolitano de Lisboa ordenou ao novo governador de Santa Catarina, Manoel Escudeiro de Souza, que enviasse ao povoado da Lagoa de Viamão alguns casais que estavam por chegar ao Brasil. No entanto, Manoel Escudeiro mandou casais já radicados em Santa Catarina, no que foi censurado pelo rei.

Foi então que um grupo de açorianos deixou a Vila do Desterro (hoje Florianópolis, capital de Santa Catarina) em meados de abril de 1751, chegando no porto do Rio Grande, espalhando-se pelo interior.

No final de 1751, chegou ao Desterro novo grupo de açorianos. O Governador Manoel Escudeiro selecionou, então, sessenta casais que, com seus filhos, formava um grupo de aproximadamente 300 pessoas, os quais, no início do ano seguinte, seguiram para o Rio Grande do Sul.

Em 1752, começaram a chegar ao Rio Grande do Sul, os primeiros casais vindos das Ilhas dos Açores. O governo português pretendia, ao incentivar a imigração desses casais, resolver dois problemas: o primeiro era o das Ilhas dos Açores - que estavam superpovoadas, e o segundo era o da ocupação do solo na extremidade sul do território brasileiro, uma zona considerada vital por se tratar do ponto de encontro entre os domínios portugueses e espanhóis na América do Sul.

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José Marcelino determinou que o Tenente Coronel Antônio da Veiga de Andrada passasse a tratar da urbanização do Porto dos Casais. O Capitão Engenheiro Alexandre José Montanha ficou encarregado dessa tarefa.

Segundo o historiador Walter Spalding, Porto dos Casais passou a se denominar Porto Alegre por inspiração patriótica portuguesa e religiosa, nome escolhido por Dom Frei Antônio do Desterro, que assinou o ato de criação da Freguesia.

Na época, a cidade de Portoalegre, localizada no Alto Alantejo, em Portugal, notabilizava-se pela luta entre portugueses e espanhóis pelas fronteiras desses países. Por isso, seu nome teria sido lembrado para a nova freguesia.

Há historiadores que afirmam, entretanto, que a origem do nome está na bela localização à margem do rio Guaíba, e na beleza e no encantamento dos morros que cercam a cidade.

Em 1772, com o crescimento da vila, o local tornou-se município e ganhou o nome de Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre, tornando-se sede do governo provincial. A cidade de Porto Alegre tem o dia 26 de março de 1772 como data oficial de sua fundação. Foco de constantes disputas entre portugueses e espanhóis, a região foi incorporada ao Brasil em 1801 e, em 1807, foi elevada à condição de capitania.

A partir de 1824, chegaram os imigrantes alemães e italianos que instalaram pequenas propriedades rurais na região de Porto Alegre. A economia gaúcha, até então inteiramente assentada no latifúndio (estâncias) e na criação de gado de corte para produção de charque, ganhou maior diversificação com a vinda dos imigrantes europeus. A produção passou a abastecer todo o Estado e foi exportada para as regiões vizinhas.

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permanecendo sempre no centro dos acontecimentos políticos e sociais do Estado e do país. Exemplos disto foram a ascensão de Getúlio Vargas, político gaúcho que se tornou um marco da história nacional, e o Movimento da Legalidade, mantido pelo governo Brizola no início dos acontecimentos que conduziram ao Golpe Militar de 1964.

A cidade de Porto Alegre apresenta-se como cidade cosmopolita, sem perder o charme de província. A cidade oferece uma ampla gama de opções culturais, gastronômicas, de serviços, de compras, caracterizadas sempre pela beleza de sua arquitetura e pelo alto índice de qualidade de vida de seus habitantes. Nessa fase de integração regional, Porto Alegre assume aspectos estratégicos importantes, por situar-se no ponto eqüidistante entre o eixo Rio de Janeiro/São Paulo e as capitais platinas de Buenos Aires e Montevidéu.

1.1- Um tempo mais recente

A industrialização do Estado teve sua origem na metrópole gaúcha. No entanto, entre os anos 60 e 90, mudou sua vocação econômica fabril, transformando-se em um grande centro de serviços e comércio. Até começos dos anos 80, o município experimentou um acelerado crescimento populacional, processo este que, combinado com uma forte concentração de renda existente, gerou graves desequilíbrios e deixou um terço de sua população à margem de uma infra-estrutura urbana. Estas populações foram historicamente esquecidas por administrações municipais.

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instituição governamental, totalmente centralizada e antidemocrática, era um obstáculo muito difícil para uma relação transparente com a sociedade.

Porto Alegre foi administrada pelo Partido dos Trabalhadores por 16 anos, de 1989 a 2004. A proposta da Administração Municipal, durante as suas gestões, buscou, junto às populações marginalizadas, o desenvolvimento do sentimento de pertença à cidade, através da participação dos cidadãos, para que fosse possível o exercício da cidadania.

Porto Alegre é uma cidade que oferece muitas oportunidades de lazer, muitas atividades culturais e esportivas, e isso é possível perceber através dos depoimentos dos entrevistados. Com isso, percebemos uma relação dinâmica com a cidade, ou seja, as pessoas aproveitam seu tempo livre para participarem de atividades gratuitas que a cidade oferece e, mesmo aqueles que não aproveitam, reconhecem que a cidade tem uma preocupação com aspectos de lazer por considerar, de uma certa forma, que isso é importante para a socialização das pessoas.

Além disso, Porto Alegre é uma cidade com muitos parques e praças, onde costumeiramente há shows, festas e outras programações culturais e/ou esportivas, organizados pela Prefeitura Municipal ou pelas próprias comunidades, através de Centros Comunitários, Associações de Bairro ou outras Instituições que atuam na comunidade. Desta forma, a população tem opções de aproveitar, gratuitamente, o que a cidade oferece e, mesmo quando as pessoas não aproveitam estes espaços urbanos, não deixam de reconhecer que há o que fazer na cidade para incrementar a socialização, o sentimento de pertencimento ou, simplesmente, aproveitar o tempo livre.

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prioridades, no entanto, só foi possível, porque a população decidiu engajar-se na idéia participativa.

2- A Porto Alegre pesquisada

É por esta cidade que circulamos, por suas diferentes regiões, em seus diferentes bairros6, passando por peculiares experiências, experimentando distintos sentimentos em nossa trajetória de pesquisadora.

A primeira comunidade com a qual fizemos contato foi a Vila Dique. A Vila Dique é formada por moradores oriundos do interior do Estado, estabelecidos, há muitos anos, nesta região da cidade. É uma comunidade precária no que diz respeito às condições mínimas de sobrevivência, como moradia e trabalho. É um local onde prevalece um discurso assistencialista, sustentado pelas inúmeras doações de roupas, brinquedos e alimentos que pessoas de diferentes partes da cidade fazem. A maioria dos moradores da Vila Dique vive da reciclagem do papel.

A Vila Dique, na cidade de Porto Alegre, principalmente entre os moradores da zona norte - onde está situada - é conhecida por ser uma vila de marginais e muito perigosa por causa dos assaltos a quem não é morador ou trabalhador da vila.

Geograficamente, a Vila Dique está situada ao final da pista de pouso e decolagem do Aeroporto Internacional Salgado Filho. Esta área foi invadida pelos seus primeiros moradores quando esses vieram do interior do Estado para a capital. Há um processo de retirada da Vila Dique, que está em tramitação há muitos anos, que envolve ações da Prefeitura Municipal, Governo do Estado e Infraero. A Infraero necessita da área para aumentar a pista do aeroporto. A Prefeitura é responsável pela construção de novas casas para os moradores, mas o dinheiro para a indenização é por conta do Governo do Estado,

6 O mapa da cidade de Porto Alegre, com a indicação da localização das comunidades pesquisadas,

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que alega não ter verbas. Isso reflete diretamente na participação no Orçamento Participativo, uma vez que os moradores da Vila Dique não podem demandar moradia, saneamento, pavimentação, apenas serviços, pois afinal, a vila pode sair dali a qualquer momento.

Entre as casas, há uma rua, a única que há na Vila. Esta rua é considerada um atalho, pois dá acesso a uma avenida de grande movimento da zona norte, a avenida Sertório, e uma avenida que passa pelo aeroporto, a avenida das Indústrias, a qual dá acesso a BR 116, que conecta Porto Alegre com a região metropolitana. Uma das contradições é que, mesmo considerando a vila muito perigosa, o movimento de carros por ali é intenso. Ao longo desta rua, além das casas, estão as entidades/instituições que existem na comunidade: Clube de Mães, Unidade de Reciclagem de Lixo, Posto de Saúde, Creche, Igreja, além do comércio local.

Nos fundos das casas, dos dois lados da rua, há valos de esgoto a céu aberto, ou seja, as casas estão construídas entre o valo e a rua. Como a maioria dos moradores trabalha com reciclagem de papel em suas casas, o valo serve também como depósito do lixo que não é comercializado. Torna-se desnecessário lembrar que, com as chuvas, os valos transbordam - porque também encontramos neles, restos de móveis, animais mortos, além do lixo oriundo da reciclagem – e as casas, muitas vezes, são inundadas por esta água contaminada, acentuando o nível de doenças entre os moradores da comunidade.

Na maioria dos terrenos, há o pátio na frente e a construção da casa ao fundo. Com isso, as pessoas que reciclam, os carrinheiros ou carroceiros7, depositam o lixo a ser separado na frente da casa. Para ter acesso à casa, é preciso, muitas vezes, passar entre o lixo. Mesmo tendo a Unidade de Reciclagem de Lixo a poucos metros de suas casas, as pessoas não têm a iniciativa de levar o lixo até a Unidade. Há uma concorrência pelo lixo

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entre carroceiros, carrinheiros e Prefeitura Municipal. Devido a essa concorrência, a Prefeitura se obrigou a tomar providências no que tange à coleta de lixo seletivo na área urbana da cidade. Por estas características na sua história, a Vila Dique não tem uma Associação de Moradores e um Clube de Mães cujos dirigentes trabalhem em prol da comunidade. Os grupos que coordenam estas entidades são sobremaneira assistencialistas e corporativistas, o que dificulta a relação com a comunidade e a participação das pessoas na vida da cidade. Os moradores não querem discutir, querem receber. Exemplo evidente é que a participação dos moradores da Vila Dique, nas reuniões do Orçamento Participativo, se dá, na sua grande maioria, pelas famílias que recebem bolsa-auxílio da Prefeitura Municipal. Estas pessoas participam porque, se faltarem às reuniões do Orçamento Participativo, não recebem a bolsa-auxílio.

Na Vila Dique conhecemos algumas pessoas que traduzem movimentos diferentes de participação em relação à vida da comunidade e da cidade. Eva é a atual coordenadora da Unidade de Reciclagem de Lixo. É casada com Fernando. Os dois trabalham na Unidade. Eva morava em Santa Rosa, e seus pais em Porto Alegre, na Vila Dique. Em uma de tantas visitas que fez a seus pais, um dia conheceu Fernando, que já morava na comunidade. Casaram-se e passaram a viver na Vila Dique. Os dois freqüentam as reuniões do OP quando precisam demandar algo para a Unidade de Reciclagem, caso contrário, não participam. Eva não fez referência de trabalhos de parceria entre a Unidade de Reciclagem e a comunidade ou com Instituições que trabalham com a comunidade. Quando não estão trabalhando, costumam ficar em casa ou freqüentam a Igreja.

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Tratava-se de um movimento de algumas mulheres, dentre as quais, nossas entrevistadas, que estavam insatisfeitas com a Administração da Associação de Bairros, a qual, de acordo com elas, não administrava de uma maneira coletiva, e sim, de modo a atender aos interesses de alguns “amigos” e deles próprios.

Vitória estuda no MOVA, é recicladora e trabalha no pátio de sua própria casa. Não quis se envolver na chapa da oposição, mas estava apoiando o grupo de mulheres. Acredita também que as pessoas têm que participar, e não venderia seu voto. Diz que as pessoas precisam diferenciar entre os políticos e as lideranças comunitárias que fazem alguma coisa em prol da comunidade e os que só querem tirar “vantagens do pobre”.

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uma vaga para Patrícia terminar seus estudos em uma escola particular perto da Vila Dique.

Na semana em que entrevistamos Patrícia, ela estava se formando no Ensino Médio. Nos contou que seu sonho é trabalhar na comunidade, se filiar a um partido político e ser vereadora. É admiradora da vereadora, já falecida, Nega Diaba, moradora de uma comunidade estigmatizada de Porto Alegre.

Patrícia conta também que ela, junto com outras mulheres, pressionaram as técnicas das reuniões de grupo no Centro Comunitário, para que o recebimento da bolsa-auxílio estivesse condicionado à participação nas reuniões do OP, por que as mulheres estavam sempre dispostas a irem, “com sol ou chuva”, buscar o dinheiro da bolsa, mas nunca podiam ir às reuniões do OP. Esse fato incomodava muito as mulheres que acreditavam que é pela participação que se consegue melhorias para a comunidade. Com isso, a participação dos moradores no OP aumentou, mas não garantiu o processo de consciência política destas pessoas.

Os processos excludentes na Vila Dique são muito significativos e são reforçados pela comunidade do entorno que estigmatizam estes indivíduos como sendo inferiores, marginais e perigosos, e pela atitude preconceituosa de muitas pessoas que fazem doações, porque os moradores da Vila Dique são pobres, carentes e precisam de ajuda. O estigma impede a manifestação das potencialidades destes moradores, as possibilidades de organização comunitária, de lideranças que não descobriram por onde se manifestar e como garantir elementos que viabilizem o exercício da cidadania.

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O acesso ao Aterro é feito a pé ou de carro, pois o transporte público mais próximo passa na Avenida Sertório, que está aproximadamente a 40 minutos, a pé, do Aterro. Caminhando, desde a avenida Sertório em direção ao Aterro, passamos pelo Hipermercado BIG, uma grande rede do grupo SONAE no Estado, além de algumas Indústrias e Transportadoras instaladas nesta região. Depois do término da pavimentação, onde termina também esta área industrial, temos um trecho grande de estrada de chão.

Neste local, há alguns anos atrás, havia o Lixão da Zona Norte, ou seja, antes de Porto Alegre iniciar o processo de coleta seletiva, a maioria do lixo recolhido pelos caminhões de coleta era levado para este Lixão. Nesta época, muitas pessoas viviam do lixo, não só buscando alimentos para sua sobrevivência como também buscando coisas que pudessem vender ou usar. A incidência de doenças era alta, assim como a de mortes, não apenas causadas por doenças, infecções provenientes do contato desorganizado com o lixo, mas também, como relata algumas pessoas que trabalharam nesta época e nestas condições, por brigas que se originavam pela disputa de algo de valor que era encontrado.

A partir do momento em que a Prefeitura Municipal introduz a coleta seletiva, o Lixão é extinto/ é organizado, junto a estas pessoas, o trabalho na Unidade de Reciclagem.

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Bárbara relata que seu filho mais novo era muito discriminado na escola. Conta que, quando seu filho vestia roupas ou tênis novos, seus colegas ficavam comentando que era coisa que a mãe tinha achado no lixo ou que havia roubado; pois não era possível comprar coisas boas e novas trabalhando com o lixo. Assim, ela decidiu, junto ao grupo da Unidade de Reciclagem, fazer uma parceria com a escola, para mudar a concepção que as pessoas tinham do trabalho com Reciclagem, para diminuir o preconceito e aumentar a consciência ecológica dos alunos.

Hoje, depois de muitas visitas dos trabalhadores da Unidade de Reciclagem na escola, bem como dos alunos e professores na Unidade, a reciclagem é tratada com mais responsabilidade por parte da comunidade escolar, e o filho de Bárbara é um dos coordenadores de atividades de divulgação do trabalho da reciclagem na escola. Uma das atividades de lazer que Bárbara gosta de praticar é a pescaria, atividade também preferida por Hélio.

Hélio tem 71 anos e mora na Vila Dique. Apesar de ter uma Unidade de Reciclagem de Lixo na sua comunidade, prefere trabalhar no Aterro, pois ele fazia parte do grupo que trabalhava no Lixão e foi um dos responsáveis por negociar com a Prefeitura Municipal melhores condições de trabalho, o que resultou na construção da Unidade de Reciclagem Aterro da Zona Norte.

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Ainda circulando pela zona norte da cidade, visitamos outro bairro, chamado Rubem Berta, que está localizado no extremo norte da cidade, quase divisa com Alvorada, uma cidade da região metropolitana de Porto Alegre.

O Rubem Berta é considerado, pela maioria da população da cidade, um bairro onde vivem pessoas pobres, de classe baixaque, normalmente, têm sua renda proveniente de atividades desempenhadas no comércio e na informalidade.

Em parte, esta idéia se consolidou a partir da história de invasões de um Conjunto Habitacional que há no bairro. No final da década de 80 havia, em Porto Alegre, várias construções populares que estavam com suas obras paradas. Diante do problema habitacional que a cidade enfrentava, inúmeras famílias ocuparam, no Ruben Berta, ao longo de 1987, estas construções que, àquela época, era o limite do bairro.

Desde a ocupação, os moradores se organizaram e buscaram melhorias, e desde 1997, a situação das ocupações está regularizada. A comunidade conta com Associação de Moradores, Clube de Mães, Creches, transporte público, Posto de Saúde, Escolas, enfim, o bairro possui boa infra-estrutura.

Na época das ocupações, o limite do Rubem Berta era estes edifícios, atrás dos edifícios só havia mato. Hoje, para circular por toda a extensão do bairro, é preciso descer no final da linha do ônibus - que trafega desde o centro de Porto Alegre até o bairro - e pegar outro ônibus que se chama alimentadora; ou seja, é um ônibus da mesma empresa, mas que faz o trajeto na continuidade do bairro que ainda está em processo de melhorias no sentido de pavimentação e moradia. Não é cobrada a passagem, pois, na verdade, este ônibus é uma extensão da Linha.

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Ruben Berta onde vivem os entrevistados desta comunidade, pessoas como Silvio, Cléia e Robson.

Silvio vive na comunidade há sete anos. A atividade que mais gosta de praticar nas suas horas de lazer é tocar violão com amigos. Silvio também destaca a importância do trabalho de reciclagem para a preservação da vida na Terra, e considera o trabalho do reciclador de extrema importância para o desenvolvimento de uma necessária consciência ecológica. Porém, Silvio destaca que, na própria Unidade de Reciclagem, nem todos os trabalhadores percebem o trabalho desta forma. Muitos ainda atribuem a importância da Reciclagem ao fato de terem uma fonte de renda.

Cléia, colega de Silvio na reciclagem, compartilha de sua opinião. Pensa que muitos ainda não têm uma consciência ecológica, porém, ela acredita que o trabalho é muito importante. Reconhece também o quanto melhorou de vida, adquiriu coisas, aprendeu com o trabalho na reciclagem.

Robson é um trabalhador que traduz, de certa forma, o que Cléia e Silvio comentam sobre a falta de uma consciência ecológica em relação ao trabalho com a reciclagem. Para Robson, um senhor de 60 anos, a reciclagem é importante pela possibilidade de trabalho e renda pois, na idade que em está, de acordo com ele mesmo, dificilmente conseguiria outro trabalho.

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ganhou, via Orçamento Participativo, uma Unidade de Reciclagem de Lixo, além de Moradia, Escola, Creche e Centro Comunitário. A Unidade de Reciclagem de Lixo, no entanto, já está funcionando provisoriamente em outro local – próximo da Vila – em função do incêndio, em março de 2004, que destruiu mais de 70% dos casebres. A Unidade de Reciclagem, nesta situação específica, teve como objetivo principal, dar condições de trabalho para as famílias que perderam todos os seus bens.

A Vila dos Papeleiros está situada ao longo de uma parte da Avenida Voluntários da Pátria, que é uma das avenidas de acesso ao centro da cidade. Foi decidido, através do Orçamento Participativo, que a Vila permanecerá no mesmo local em que está, porém, para que seja possível a construção das novas casas, as famílias foram transferidas para casas de passagem até que tivessem a infra-estrutura de retornar ao seu local de moradia.

A Vila dos Papeleiros também é estigmatizada pela comunidade do entorno. As pessoas se referem a eles como os marginais, os maloqueiros, os responsáveis pelo aumento do tráfico de drogas, da prostituição, e da proliferação de ratos e baratas na

região.

A Vila dos Papeleiros conta com algumas lideranças importantes, dentre as quais destacamos Augusto, presidente da Associação de Moradores e dos Recicladores da Vila dos Papeleiros, e que, através da sua luta, conseguiu a mobilização da comunidade e as melhorias conquistadas no Orçamento Participativo. Augusto, assim como Paulo, José e Guilhermina fazem parte deste cenário.

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Reconhece que, depois do incêndio na Vila dos Papeleiros, a reciclagem passou a significar muito mais do que consciência ecológica e renda. Passou a significar o elo com a realidade, a possibilidade de recuperar a dignidade e a condição de sujeitos de direitos e deveres.

Paulo também é casado, mas sua esposa não trabalha na Unidade. Tem 51 anos e vive há 22 em Porto Alegre. Como a maioria dos seus vizinhos na Vila dos Papeleiros, Paulo veio para a capital em busca de melhores condições de trabalho. Encontrou na reciclagem de lixo, a possibilidade de trabalho, uma vez que o contexto urbano não lhe permitia fazer o que sabia, ou seja, trabalhar na agricultura. Paulo participa das reuniões do OP e, assim como José, acredita que a participação dos moradores é muito importante como canal de interlocução entre poder público e os cidadãos.

Augusto é uma personagem emblemática neste cenário. É uma liderança na comunidade e uma referência como líder comunitário junto ao Orçamento Participativo. Augusto se descobriu líder comunitário “por acaso”, muito por iniciativa de uma religiosa que trabalhava voluntariamente com a comunidade. Augusto foi escolhido por uma ONG a fazer um depoimento em um Seminário na França sobre experiências exitosas de participação da população em Administrações Públicas, que resultou na elaboração de um livro, no qual é personagem.

Augusto é presidente da Associação de Recicladores e da Associação de Bairro, que são a mesma Associação. Considera que a comunidade é “uma grande família e ele é o pai de todos”. Augusto se intitula “dono” da comunidade mas, na verdade, é articulador e mediador de muitas conquistas que a comunidade teve através do Orçamento Participativo.

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O prédio dos Profetas da Ecologia está situado embaixo da Ponte do Guaíba, um dos principais pontos turísticos de Porto Alegre. É uma Unidade de Reciclagem de Lixo que tinha convênio com o DMLU – Departamento Municipal de Limpeza Urbana – e alguns problemas com o Irmão Roberto, que se considerava proprietário do prédio onde funcionava a Unidade de Reciclagem. Tivemos a oportunidade de presenciar as situações de conflito entre o Irmão Roberto e a coordenadora da Unidade de Reciclagem. Estes conflitos eram, em parte, pelo fato da coordenadora incentivar as mulheres trabalhadoras da Unidade, no sentido dessas serem autônomas, de participarem do processo de negociação e venda e não apenas reciclarem o lixo, de se posicionarem mais diante das questões referentes ao seu trabalho. O Irmão Roberto, no entanto, não aceitava esta postura, alegando que isso prejudicava o trabalho.

A situação se tornou a tal ponto insustentável, que o Irmão Roberto, com a justificativa de que era dono do prédio, conduziu o trabalho da sua maneira, o que resultou na rescisão do convênio com o DMLU e a transferência da coordenadora para outra Unidade de Reciclagem de Lixo. A realização da pesquisa com estas pessoas, depois de meses de tentativa, não foi permitida.

Dos Profetas da Ecologia, atravessamos a Ponte do Guaíba e chegamos na Ilha Grande dos Marinheiros. A Ilha dos Marinheiros, como é comumente chamada, é uma das muitas Ilhas habitadas de Porto Alegre, consideradas bairros da cidade, apesar de alguns moradores não se considerarem moradores de Porto Alegre.

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Nas partes mais centrais e mais habitadas das Ilhas, as condições são melhores, e há uma infra-estrutura mais adequada, com Escolas, Creches, Clube de Mães, Associação de Moradores, Unidade de Reciclagem, Posto de Saúde e transporte público.

Se visitarmos as Ilhas por via terrestre, ou seja, utilizando carro ou transporte público, o cenário que vemos é os muros altos, normalmente, com segurança protegendo as casas de luxo, e casebres mais precários, carroças cheias de lixo para reciclar disputando espaço com ônibus ou carros. Vemos a pobreza, o esquecimento, a exclusão.

Se visitarmos as Ilhas por via aquática, fazendo o conhecido e tradicional passeio turístico de barco pelo Rio Guaíba, vemos as lanchas, as casas de luxo, cujo acesso por via terrestre quase não é utilizado por seus moradores, constatamos o distanciamento que vai além do que os muros de concreto podem separar. Vemos, outrossim, escondidos entre as árvores, na outra margem do rio, os casebres mais precários das Ilhas, que se assemelham a palafitas dentro do rio. Essa população não chegou a fazer parte da pesquisa.

Os entrevistados vivem na parte inicial da Ilha dos Marinheiros. Esta parte da Ilha é mais organizada, principalmente pela influência de lideranças representativas na comunidade. A participação no Orçamento Participativo é significativa, apesar de que há lideranças na comunidade que mantém um discurso assistencialista evidente. Uma dessas lideranças é Nilda. Além dela, Doralina e Mirela também compuseram o cenário da pesquisa na Ilha dos Marinheiros.

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lhe dando uma condição de funcionária pública. Nesta mesma campanha eleitoral, Vieira da Cunha, também do PDT, aposentou seu marido. Estes favoritismos fizeram com que Nilda fizesse campanha na Ilha para Collares e, como ela mesma diz, ele ganhou aqui na Ilha graças a mim. Depois que Collares ganhou as eleições municipais, deixou de cumprir uma série de promessas que havia feito e com isso, provocou o descontentamento de Nilda. Hoje, de acordo com ela, a depender de mim, Collares não ganha nunca mais aqui na Ilha. Nilda conta um pouco da sua trajetória na comunidade, dizendo que, quando chegou para morar lá, odiava aquele lugar, pois não sabia lavar roupa no rio, não sabia viver com uma série de privações que a vida na Ilha impunha. Mas, com o tempo, aprendeu a viver lá e hoje ela ama o lugar onde vive, e trabalha para a comunidade.

Isso realmente é confirmado por Doralina e Mirela, que trabalham com a comunidade. Mirela é professora na escola estadual que atende a maioria dos alunos. Porém, tem a idéia de que a comunidade é carente, é pobre, nunca vão deixar de ser o que são, que não se interessam, que não querem fazer nada do que os professores na escola propõem. Doralina, ao contrário, trabalha com uma perspectiva emancipatória, acredita que a comunidade tem um movimento reivindicatório, muitos têm consciência de que são usados por políticos que querem se promover a partir da pobreza das comunidades, refere que é uma comunidade que está aprendendo, nesta vivência comunitária, a discernir os políticos que trabalham de uma forma mais coletiva, com projetos voltados para a comunidade e aqueles que trabalham de uma forma mais assistencialista.

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Das Ilhas, nos deslocamos ao Campo da Tuca. O Campo da Tuca está situado na zona leste de Porto Alegre. O Campo da Tuca também é considerado muito perigoso. Essa idéia é acentuada pela localização geográfica da comunidade. O Campo da Tuca está situado ao pé do Morro da Polícia, que é conhecido na cidade pelos constantes tiroteios entre bandidos e polícia, pelo fato de muitos traficantes e fugitivos do Presídio Central ali se refugiarem.

Os próprios moradores reconhecem que é preciso ter cuidado, principalmente à noite, porque o risco de ser atingido por balas perdidas é alto, no entanto, referem que isso não é uma característica só do Campo da Tuca, todos os lugares estão perigosos hoje em dia, além disso, em todos os lugares, de acordo com os moradores, há gente boa, honesta e trabalhadora, e há bandido e vagabundo.

No Campo da Tuca, as atividades comunitárias estão centralizadas na Associação Comunitária, que tem uma importante líder comunitária, que administra atividades que atendem a crianças e adolescentes e que desenvolve atividades culturais e de lazer para a comunidade em geral. Há também os times de Futebol, que são responsáveis pela mobilização esportiva e cultural da comunidade.

A localização geográfica do Campo da Tuca, bem como sua infra-estrutura, atende às necessidades de seus moradores em relação ao transporte, ao acesso a serviços públicos e opões de lazer. Os moradores possuem um bom nível de organização, de acordo com Elira, líder comunitária: quando é de interesse as pessoas participam mesmo, quando não tem muito interesse, tem que insistir muito para que participem, mas mesmo assim, a

participação é boa e a pessoas reconhecem tudo o que melhorou o Campo da Tuca, depois

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Taís é uma jovem de 20 anos, vive há onze na comunidade e gosta muito de viver no Campo da Tuca. Reconhece que é um lugar que tem muitas opções de lazer, estudou até o primeiro ano do Ensino Médio e interrompeu por causa da gravidez. Trabalha na Reciclagem e gostaria de fazer outra coisa na sua vida profissional.

Tamires é uma senhora de 50 anos, fez a primeira série do Ensino Fundamental e acredita não ter qualificação para desempenhar outra atividade além de serviços gerais e reciclagem. Voltou a estudar por causa dos filhos, mas diz que interrompeu por causa da violência na escola e da falta de professores. Como ela mesma define, vive em função dos filhos.

Lisiane interrompeu seus estudos quando estava na quinta série do Ensino Fundamental. Tem 27 anos e adora ficar em casa cuidando dos serviços da casa, dos filhos e do marido. Está em Porto Alegre há 24 anos e, como a maioria dos entrevistados, sua família veio para a capital em busca de melhores empregos e escolheram Porto Alegre por já terem um familiar morando nesta cidade.

Serlene é atendente de creche e recentemente ganhou as eleições para Conselheira Tutelar na sua região, função que já exerceu em outra ocasião. É uma pessoa bem articulada com a comunidade, participa do OP porque acredita nas melhorias que a comunidade já conquistou a partir da participação política. Iniciou o curso de Assistente Social na ULBRA – Universidade Luterana do Brasil, mas interrompeu por questões financeiras, pois não se trata de uma Universidade pública. No entanto, Serlene pretende voltar a estudar e exercer a profissão na sua comunidade.

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muitos anos como presidente da Associação de Bairros, pelo reconhecimento que a comunidade tem, das ações que Elira promove com a sua equipe de trabalho.

No Campo da Tuca conversei também com Carmem, a assistente social que trabalha com a comunidade. Carmem conta que Elira é muito respeitada em função da maneira como trabalha com a comunidade, a qual reconhece as melhorias que são feitas.

Vila Pinto: outra comunidade visitada. Outra comunidade considerada perigosa.

Outra comunidade pesquisada parcialmente8. A Vila Pinto também está situada na zona leste da cidade. É uma comunidade que está cansada de ser usada para pesquisas, ou seja, por sua característica de pobre e carente, tornou-se foco das mais diversas atividades acadêmicas, bem como aos interesses de algumas instituições religiosas que utiliza esta comunidade para fins doutrinários.

A falta de retorno ou qualquer outro tipo de devolução destas pesquisas e trabalhos para a comunidade fez com que as lideranças comunitárias passassem a exigir uma parceria, ou seja, para se fazer uma pesquisa ou trabalho universitário na comunidade, é preciso colaborar, de alguma forma, para algo que a comunidade necessita.

Na Vila Pinto, como no Campo da Tuca, o Centro Comunitário é referência para a comunidade, e a coordenação é muito presente na comunidade, no sentido de incentivar a organização e a participação dos moradores na busca de melhorias, e estas melhorias acontecem, fortalecendo, assim, a liderança comunitária. Na Vila Pinto, conhecemos Helena e Dirce. São mãe e filha e trabalham juntas na comunidade. Helena trabalhava em outra Unidade de Reciclagem, nos Profetas da Ecologia, e foi a coordenadora que teve atrito com o irmão Roberto. Ela conta que o Irmão Roberto apoiava suas ações com as mulheres trabalhadoras, mas quando percebeu que as mulheres queriam se envolver em outras decisões da Unidade, como horário de trabalho, negociação do material a ser

8 O que significa dizer que não foi possível entrevistar os trabalhadores e moradores, apenas a presidente da

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vendido e preço, Irmão Roberto começou a interferir no trabalho de Helena, de forma a impedir que as mulheres fossem autônomas na sua forma de agir. Destarte, Helena saiu da Unidade Profetas da Ecologia e foi trabalhar com Dirce, sua mãe, na Vila Pinto.

Dirce é uma mulher conhecida na cidade pelo seu trabalho na Vila Pinto, foi idealizadora da Unidade de Reciclagem de Lixo, incentivou os moradores a participar do OP, e sempre trabalhou para que se desmistificasse a idéia de que a Vila Pinto era uma vila de marginais e maloqueiros.

Da zona leste, passamos agora a zona sul da cidade, visitando outras três comunidades que fizeram parte da pesquisa.

Restinga: está situada no extremo sul de Porto Alegre. É um bairro muito populoso e, hoje em dia, é menos discriminado do que já foi em outras épocas. Por ser um bairro muito distante da zona central da cidade, e por já ter tido precárias condições de moradia, saneamento e pavimentação, a Restinga foi, por muito tempo, sinônimo de tudo que não era bom... as pessoas que assaltavam ou faziam baderna no centro da cidade, só podiam

ser da Restinga. A Restinga, aos poucos, ganhou respeitabilidade diante da cidade, muito em função das melhorias de condição de vida e do transporte público que aproximou esse bairro ao centro e a outros bairros. A Restinga, hoje, é um bairro muito organizado, com uma boa infra-estrutura, que faz com que seus moradores permaneçam no bairro, sem ter necessidade de ir a outras partes da cidade em busca de serviços ou comércio. Os atores da pesquisa da Restinga são Magda, Estela e Bruna.

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Reciclagem, agora não freqüenta, mas reconhece que a Restinga melhorou muito com a participação da população nas reuniões do OP.

Estela tem 34 anos e estava trabalhando na Unidade de Reciclagem até o dia em que, coincidentemente, fizemos a entrevista com ela. No dia em que chegamos na Unidade, as mulheres estavam decidindo a melhor forma de escolher quem sairia da Unidade de Reciclagem para trabalhar na creche. Decidiram que iam fazer um sorteio e pediram que tirássemos o papel com o nome. Estela foi sorteada. Ela disse que “não foi sorteada, foi premiada, pois isso iria mudar a sua vida, pois ela já havia trabalhado na creche e gostaria muito de exercer essa função novamente”. Estela é uma mulher que incentiva seus filhos a estudar e relata que sua filha de 12 anos canta em um grupo de rock infanto-juvenil que se formou a partir de um projeto no Centro Comunitário do bairro.

Bruna é a atual presidente da Unidade de Reciclagem. Em uma das vezes que visitamos a Unidade, os trabalhadores estavam reunidos para decidir quem iria assumir a presidência, uma vez que haviam constatado fraudes e favoritismos da ex-presidenta. Bruna foi escolhida. É uma mulher tranqüila que diz não se envolver em confusões e fofocas. Para ela, o que importa é trabalhar. Diz não participar das reuniões do OP, mas acha que o OP é importante, principalmente porque, através dele, a comunidade consegue manter a Unidade de Reciclagem e, conseqüentemente, uma renda para trabalhadores que, dificilmente, estariam empregados se não fosse a Unidade.

Entre a Restinga e o Centro, também na zona sul, está o Loteamento Cavalhada, outra comunidade estudada. O Loteamento tem uma história recente, não só em termos de construção, como também em termos de participação política e organização comunitária.

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Loteamento está situado entre a reserva ecológica do Morro do Osso e uma avenida de grande movimento da zona sul da cidade, a avenida Cavalhada.

Pelo fato de ter sido formado por diferentes vilas, a organização comunitária aconteceu tardiamente. No início, os moradores estavam se adaptando ao novo local de moradia e aos novos vizinhos. A briga pelo controle do tráfico de drogas entre as diferentes vilas que para lá foram transferidas influenciava muito nas relações interpessoais. A Associação de Moradores tinha um funcionamento muito restrito e a participação no Orçamento Participativo se dava por influência da Escola que há no Loteamento, muito mais que pela Associação de Moradores.

O Loteamento, por muitos anos, se manteve sem pavimentação, dando uma impressão de abandono por parte dos órgãos públicos, além disso, provocava problemas sérios de alagamentos em dias de chuva.

O problema da pavimentação é um dos tantos exemplos da conseqüência da pouca participação dos moradores, isso porque para demandar serviços para a comunidade é preciso participar e ter representatividade nas reuniões do Orçamento Participativo, estabelecer e votar as demandas. Para isso, também é necessária a articulação com outras comunidades.

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