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Santo Estêvão de Briteiros
Guimarães — Inquérito paroquial de 1842
Revista de Guimarães, n.º 108, 1998, pp. 131-137
1º Esta freguesia é plana, um pouco inclinada do Norte a Sul de forma que de qualquer parte dela se divisam casas de todos os lugares, ou povoações dela, bem como as Serras de Gerês, e Citânia ao Norte, as Serras da Cabreira, e de Vilarinho ao Nascente, as Serras de Prazins, Senhora do Monte, e Carneiro ao Sul, as Serras de Outinho, Falperra, e de Sabroso ao Poente. Fica distante da cidade de Braga duas léguas, e de Guimarães légua e meia. Não está situada em monte algum, contudo tem dentro de seus limites, três montes, que lhe ficam aos lados, que são o monte de Real ao Sul, é plano; o monte da Ribeira ao Este é plano e o monte de Ribas ao Norte, tem alguns altos e baixos.
2º O clima nesta freguesia é temperado, isto é participando da
natureza dos climas quentes, e dos climas frios, porém nunca igual ao
das zonas glaciares, nem ao calor da zona tórrida, mas sim uma e
outra temperatura é sofrível, a qual tem a sua mudança, segundo a
revolução das estações do ano. Geralmente os maiores calores são nos
meses de Junho, Julho, Agosto, e parte de Setembro e os maiores frios
nos meses de Novembro, Dezembro, Janeiro e parte de Fevereiro. Os
ventos mais reinantes são o Norte, Sul, Este, e Oeste. O Norte é aqui
muito frequente na primeira e nas duas últimas estações do ano e é
sempre muito frio, e produz quase sempre manhãs de geada. O vento
Sul costuma soprar nos meses de Outubro e Novembro e em alguns
dias dos mais meses do ano e é frio, trazendo com ele bastantes
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chuvas. O vento Este é frequentemente na Primavera, Estio e princípio do Outono, e é quente, e seco produzindo sempre grandes calores contudo nos meses frios, é friíssimo, em razão de perder grande parte do seu calórico quando passa pelas Serras da Cabreira e Silvares nesse tempo cobertas de neve. O vento Oeste é frequente nos meses do Inverno e fins do Outono, e é húmido e quente produzindo sempre chuvas em abundância, e nevoeiros. As trovoadas frequentam os meses de Maio, Junho e Setembro produzem bastantes chuvas, e poucas vezes saraivas, ou pedra porém quando aparecem nos meses de Inverno, o mais que trazem é saraiva e pedra. Os nevoeiros são frequentes nos meses de Julho e Agosto, e parte de Setembro, havendo nesse tempo muito orvalho. A neve poucas vezes aqui aparece mas sim a geada, que é quase contínua nos meses das estações frias, principalmente estando o tempo de sol, e soprando o vento Norte, porém em todo este tempo desaparece logo que o sol nasce. Todos estes fenómenos nunca aqui produziram estragos notáveis. Enfim o aspecto geral das quadras é de serem o Outono, Inverno e a Primavera ventosas húmidas e frias e o Estio quente e seco, porém tudo moderado e sofrível.
3º Esta freguesia é quase quadrada, terá em circunferência pouco mais ou menos, meia légua.
4º Confronta pelo Norte com a freguesia do Salvador de Donim, pelo Sul com a freguesia de S. Claúdio do Barco, pelo Este com o Rio Ave, e pelo Oeste com o Rio de Febras, e parte da freguesia do Salvador de Briteiros.
5º Esta freguesia tem oito lugares, que são o Assento, o Forno, a Ribas, Vila Chã, Real, Ribeira, Linhares, e Bouça da Laje; quanto às suas etimologias não há tradição por onde se saiba porque lhe foram dados estes nomes, menos o do Assento por ser aí o local da igreja matriz.
6º A povoação geral desta freguesia consta de trezentos e
quarenta e sete indivíduos de ambos os sexos, que habitam em
noventa e cinco fogos, sendo mais notável o lugar de Real, por ser
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mais populoso, bem que os melhores edifícios existem no lugar do Assento e no de Ribas.
7º Os animais desta freguesia constam de quadrúpedes domésticos e bravos, os primeiros são bois, mulas, éguas, jumentos, porcos, galos, cabras, ovelhas, cães e gatos, os quais servem para diferentes usos da cultura, andar jornadas, dar senhas, extinguir ratos das casas; e os segundos são raposas, ratos, doninhas, ratazanas dos ribeiros, e gatos bravos os quais só servem para produzirem estragos em diferentes coisas. Há também outros animais como são cobras, lagartos e sardões.
Há insectos como são moscas, grilos, zangões, abelhas, besouros, e vespas.
Há também muitas aves domésticas e bravas, os primeiros são galinhas, perus, parrecos e patos, as segundas são gaios, melros, pardais, pintassilgos, rouxinóis, verdilhões, carriços e muitos outros.
Há peixes como são barbos, escalos, bogas e enguias e trutas que habitam no Rio Ave que corre ao Nascente desta freguesia e no de Febras que corre ao Poente da mesma o qual abunda mais em trutas que o de Ave.
As plantas desta freguesia constam de couves, alfaces, nabiças, ervilhas, feijões, e batatas que servem de comer.
As árvores são castanheiros, carvalhos, salgueiros, pereiras, macieiras, laranjeiras, limoeiros, pessegueiros, vides, oliveiras, sobreiros, pinheiros, etc., quase todas produzem frutos que se comem dão lenhas para queimar, e madeiras para construir edifícios.
As flores são rosas vermelhas, brancas, e amarelas, e cravos de
diferentes cores, açucenas, cravelinas, papoilas vermelhas, girassóis,
tulipas, etc., das quais se verá para assear os templos nas
festividades. As ervas há muitas que servem para o uso médico, como
são macela, fragaria, gilbarbeira, aipo, salsa, hortense, hortelã
pimenta, e da vulgar, mostarda, alecrim, alfazema, arruda, bordana,
escropulária, sinaglora, há também as ervas que servem de sustento
dos gados, como são a molar e castelhana.
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Os géneros de consumo são milho grosso amarelo, e branco, o qual abunda mais nesta freguesia, centeio, milho alvo, feijões de diferentes qualidades, como são amarelos, brancos, rajados, vermelhos, e dos pequenos. O vinho é abundante nesta freguesia sendo verde, porém de boa qualidade. O alimento ordinário desta freguesia é pão de milho grosso com algum centeio, caldo de feijões e couves e toucinho.
O vestuário é de pano de linho, e de lã nacional, e estrangeiro com mais, ou menos luxo segundo as posses de cada um dos moradores. A produção da freguesia supre enquanto ao mantimento, enquanto ao vestuário apenas há o linho. Não há privilégio algum respeito à caça. Não há minas metálicas; há pedreiras donde se tira pedra para edifícios, e para moer grão, e centeio, a sua qualidade é de pedra fina e de galho.
8º Esta freguesia foi sempre sujeita ao poder civil da vila de Guimarães; no militar foi pertença do Regimento de Milícias de Basto até pouco antes da guerra dos franceses, que nesse tempo passou a ser pertença do Regimento de Milícias de Braga que continuou a ser até à extinção dos ditos corpos, e no eclesiástico foi sempre sujeita ao arcebispado primaz. Paga imposições municipais, e outras, lançadas civilmente.
9º Não há professor algum de ensino público.
10º Há uma estrada que atravessa da Póvoa de Lanhoso para as Caldas das Taipas, sitas em S. Tomé de Caldelas. Há um pontilhão feito de padieiras no Rio Ave, que só serve de passar gente a pé desta freguesia para a do Salvador do Mosteiro de Souto, e umas passadeiras de pedra no Rio de Febras na estrada que atravessa da Póvoa de Lanhoso para as Caldas das Taipas. Há dois pequenos pinhais, um no lugar da Ribeira e outro no lugar de Ribas. O terreno desta freguesia é quase todo cultivado, excepto os três montes que tem, e algumas bouças que servem para roço. Há poucas águas de rega, e poucas lenhas.
11º Há o Rio Ave que cerca todo o lado do Sueste, desta
freguesia em comprimento quase de um quarto de légua, tem em si
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poços mais fundos que outros, sendo o mais notável o Poço das Bestas, tem nesta direcção bastantes levadas, com Azenhas, e muitos moinhos. Há também o Rio de Febras que corre pelo lado do Poente desta freguesia também tem levadas, e moinhos.
12º Há dois tempos em que se cultivam as terras nesta freguesia: um em Abril, Maio e Junho quando se semeia o milhão, feijões e milho alvo, e o outro em Novembro e Dezembro quando se semeia o centeio cuja fábrica se faz com o arado de mão, ou de charrua, puxados a bois, em mais ou menos número segundo a qualidade da terra, sendo esta primeiramente estrumada com estrumes artificiais na primeira cultura para milhão, e na segunda se estruma depois de lavrada e agradada, e depois se cobre com arado chamado de cobrir, ficando a terra às margens de três a quatro palmos de largo. A natureza da terra é seca e fria de cor loura, e amarela em alguns sítios, e o que melhor produz é milhão, e centeio; os trabalhadores em qualquer tempo ganham sessenta réis por dia e de comer, e a seco ganham cento e quarenta réis.
13º Não há feira alguma nesta freguesia.
14º Há um sapateiro, três alfaiates, um pedreiro, um boticário, um cirurgião, um estanqueiro, sacerdote só o pároco, dois carpinteiros, trinta e um proprietários de prédios rústicos, e urbanos, e vinte e oito caseiros também de prédios rústicos e urbanos.
15º Está no adro da igreja desta freguesia uma pedra redonda de quinze a dezasseis palmos de largo, com muitos lavores antigos, cuja pedra foi conduzida da Serra da Citânia, que antigamente foi cidade, por Afonso Magalhães, Chantre na Sé Primaz, e padroeiro desta freguesia há mais de duzentos anos. Segundo consta, consta por tradição, que esta pedra servia de frontispício na Mesquita dos Mouros.
Esta freguesia é vigararia Adnutum, os costumes são religiosos;
frequentam as romarias da Senhora da Abadia em distância de três
léguas, a da Senhora do Porto de Ave e distância de légua e meia a da
Senhora do Monte e Bom Jesus em distância de uma légua a de Santa
Marta em distância de uma légua, a da Senhora do Alívio em distância
de três léguas, e as de S. Mateus, e de S. Torcato ambas em distância
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de uma légua. A maior parte do povo da freguesia é pobre, e vive do seu trabalho, e a sua duração de vida regula por sessenta, setenta, a oitenta anos.
16º A igreja intitulava-se antigamente S. Estêvão da Silva Escura, há muitos anos tomou o nome de S. Estêvão de Briteiros.
Esteve colocada no sítio dos Bacelos, hoje porém está colocada há mais de trezentos no lugar do Assento; foi sempre apresentado do Chantre da Sé Primaz, porém agora por vacatura deste é apresentada pelo capitular do arcebispado do Primaz. O pároco tinha de côngrua cinquenta mil réis, e o rendimento dos dízimos, quando se pagavam, era de duzentos mil réis.
E nada mais tenho a responder aos dezasseis artigos.
Santo Estêvão de Briteiros, 6 de Dezembro de 1842
O pároco Manoel Joze Gomes Pereira Velozo
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