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Consumo alimentar e estado nutricional de crianças das Comunidades quilombolas de Alagoas

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FACULDADE DE NUTRIÇÃO MESTRADO EM NUTRIÇÃO

FERNANDA MARIA DE BANNEUX LEITE

CONSUMO ALIMENTAR E ESTADO NUTRICIONAL DE CRIANÇAS DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE ALAGOAS

Maceió - Alagoas 2010

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CONSUMO ALIMENTAR E ESTADO NUTRICIONAL DE CRIANÇAS DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE ALAGOAS

Dissertação apresentada à Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Alagoas como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Nutrição.

Orientador: Prof. Dr. Haroldo da Silva Ferreira

Maceió - Alagoas 2010

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Catalogação na fonte

Universidade Federal de Alagoas

Biblioteca Central

Divisão de Tratamento Técnico Bibliotecária

Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale

L533c Leite, Fernanda Maria de Banneux.

Consumo alimentar e estado nutricional de crianças das comunidades quilom- bolas de Alagoas / Fernanda Maria de Banneux Leite. – 2010.

120f. : il. color.

Orientador: Haroldo da Silva Ferreira.

Dissertação (mestrado em Nutrição) – Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Nutrição, Maceió, 2010.

Bibliografia: f. [101]-109. Apêndices: f. [110]-115. Anexos: f. [116]-119.

1. Criança – Nutrição – Alagoas. 2. Comunidade quilombola. 3. Consumo

alimentar. 4. Estado nutricional. 5. Criança – Pré-escolares. I. Título.

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Primeiramente a Deus, por permitir esse grande passo em minha vida.

A minha mãe, uma das maiores responsáveis por essa conquista, que sempre me ajudou a superar todos os obstáculos, que me apóia em todas as decisões, que acredita no meu potencial e responsabilidade e que me ama acima de tudo.

À Fundação de Amparo e Pesquisa do estado de Alagoas (FAPEAL) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por terem dado apoio financeiro.

Ao Prof Dr Haroldo da Silva Ferreira, pela oportunidade, confiança, incentivo e orientação segura e eficiente.

A minha família, que sempre acreditou em mim e que também é responsável por esse momento.

Àqueles que, infelizmente, não estão mais presentes entre nós, em especial ao meu pai, minha avó e meu avô, que não puderam acompanhar mais de perto a minha jornada, mas que enquanto vivos sempre me incentivaram muito e me deram muito amor.

A todas as minhas amigas e amigos, que são a família que Deus me permitiu escolher, que sempre acreditaram em mim.

Aos Estagiários do Laboratório de Nutrição Básica e Aplicada pelo companheirismo e ajuda nas etapas do trabalho.

A todos os moradores das comunidades quilombolas de Alagoas, sem a colaboração deles esse trabalho não seria possível.

E a todos, que de uma forma direta ou indireta, colaboraram com o meu trabalho e com o meu conhecimento durante toda a minha vida.

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“Depois de um tempo... você aprende que realmente pode suportar, que realmente é forte e que pode ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais. E que realmente a vida tem valor e que você tem um valor diante da vida. Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar se não fosse o medo de tentar.”

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Avaliar o consumo alimentar e o estado nutricional de crianças pré-escolares das comunidades quilombolas de Alagoas. Por meio de estudo transversal foram estudadas as crianças de 13 a 59 meses das 39 comunidades quilombolas do estado de Alagoas. O consumo alimentar foi avaliado por meio de inquérito recordatório de 24 horas. Na análise dos dados utilizaram-se as Ingestões Dietéticas de Referência (DRIs), conforme as recomendações propostas pelo Institute of Medicine. Para avaliar o estado nutricional foram usados os índices antropométricos peso-para-idade, altura-para-idade e peso-para-altura, adotando-se o ponto de corte de ± 2 desvios-padrão, em relação à mediana do padrão OMS-2006, para caracterizar a condição de déficit ou excesso. O diagnóstico de anemia foi assumido quando o nível de hemoglobina era menor que 11 g/dL. Para isso, utilizou-se uma gota de sangue obtida por punção da polpa digital para leitura em hemoglobinômentro portátil (Hemocue). Para melhor caracterização das famílias, foram também coletados dados socioeconômicos e demográficos. A análise estatística foi realizada com o auxilio dos pacotes Epi-info e SPSS, utilizando-se testes de inferência paramétricos ou não paramétricos, conforme as características das variáveis obtidas. Foram estudadas 724 crianças (49,4% meninos). A concentração média de hemoglobina foi de 11,0 ± 1,6 g/dL e a prevalência de anemia foi de 48,0%. Os desvios antropométricos de maior relevância foram o déficit de altura-para-idade (9,7%), indicativo de desnutrição crônica, e o excesso de peso-para-altura (6,0%), sugestivo de obesidade. As crianças consumiam uma alimentação com pouca variedade de alimentos, caracterizada pela presença constante de leite e derivados de cereais, elevada ingestão de carnes e baixo consumo de legumes, verduras, tubérculos e raízes. Com base no percentual de energia fornecido pelos carboidratos, observou-se que uma grande proporção de crianças (85,9%), apresentava consumo adequado. Com relação à adequação da ingestão de carboidratos de acordo com a EAR, 24,8% das crianças apresentavam consumo abaixo do recomendado. A proporção de crianças que tiveram um consumo de lipídios abaixo do limite mínimo da Faixa de Distribuição Aceitável de Macronutrientes (Acceptable Macronutrient Distribution Range - AMDR) foi elevada (57,4%). O consumo de energia proveniente da ingestão de proteínas, na maior parte dos casos, encontrava-se dentro dos limites recomendados da AMDR, assim como sua adequação pela EAR em relação a g/kg/dia. Observou-se uma considerável prevalência de inadequação no consumo da maioria das vitaminas e minerais, incluindo-se zinco (17,0%), vitaminas A (29,7%) e C (34,3%), folato (18,1%) e ferro (20,2%). A análise da ingestão dietética segundo a classe econômica (B, C, D e E) das famílias revelou que aquelas da classe E, a de menor poder aquisitivo, apresentaram consumo médio inferior aos observados nas demais classes, para a maioria dos nutrientes analisados. As prevalências de desnutrição crônica e de anemia foram muito semelhantes às observadas para as demais crianças do estado de Alagoas, esta última atingindo patamares representativos de grave problema de saúde pública, condição que não pode ser explicada, apenas, pela inadequação no consumo de ferro. A interação com outras carências nutricionais, aliada à precariedade das condições de saneamento ambiental observada, explicaria parte dessa determinação. Pertencer às classes econômicas de menor poder aquisitivo representou um fator de risco para um consumo dietético inadequado. Recomendam-se maiores investimentos na infraestrutura de serviços públicos e em educação nutricional, de modo a contribuir para a realização do direito humano à alimentação adequada e para um melhor padrão de nutrição da população estudada.

Palavras-chave: Comunidades remanescentes quilombolas; consumo alimentar; estado nutricional; crianças pré-escolares.

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To assess dietary intake and nutritional status of preschool children of quilombolas communities from Alagoas. By an across sectional study of children who were 13 to 59 months of 39 quilombolas communities from Alagoas. Dietary intake was assessed by recall of 24 hours. In analyzing of the data it was used the Dietary Reference Intakes (DRIs) as the recommendations proposed by the Institute of Medicine. To assess the nutritional status were used anthropometric indices of weight-for-age, height-for-age and weight-for-height, by adopting a cutoff of ± 2 standard deviations from the median of the standard WHO-2006 to characterize the condition of deficit or excessive. The diagnosis of anemia was made when the hemoglobin level was less than 11 g / dL. For this, it was used a drop of blood obtained by puncturing the finger for reading on portable portable Hemoglobin-meter (HemoCue). To better characterize the families, it was also collected socioeconomic and demographic data. Statistical analysis was performed with the aid packages Epi-info, version 3.5.1, and SPSS, version 16.0, using tests of parametric or nonparametric inference according to the characteristics of the variables obtained. It was studied 724 children (49.4% boys and 50.6% girls). The mean hemoglobin concentration was 11.0 ± 1.6 g / dL and the prevalence of anemia was 48.0%. The nutritional problem of greater significance was the low height-for-age, affecting 9.7% of children, but 6.0% of preschool children were overweight or obese. The children presented a low-variety of food, characterized by the constant presence of milk and cereal products, high intake of meat and low consumption of vegetables, tubers and roots. Based on the percentage of energy provided by carbohydrates, it was observed that a large proportion of the children surveyed, 85.9%, had adequate intake. However, regarding appropriateness of carbohydrate intake according to the EAR, 24.8% of preschool children showed a prevalence lower than recommended. The proportion of children who had a lipid intake below the lower limit of Acceptable Macronutrient Distribution Range – AMDR was high, 57.4%. Regarding consumption of energy from protein intake, most of the children was within the recommended limits of AMDR, as well as their suitability for the EAR for g /kg /day. According to the intake of micronutrients, there was a considerable prevalence of inadequacy for most vitamins and minerals, including zinc (17.0%), vitamins A (29.7%) and C (34.3%) and iron (20.2%). The analysis of dietary intake, according to economic class families (Classes B, C, D and E) revealed that children in the class E, the lower purchasing power, had lower average intake of those observed in other classes for most nutrients. The prevalence of malnutrition observed was similar to that prevailing for other children from Alagoas. The same was observed in relation to anemia, which often reached levels constituting a serious public health problem, a condition that can not be explained only by the inadequate intake of iron. The interaction with other nutritional deficiencies, coupled with the precarious conditions of environmental sanitation may explain another part of that determination. The results of this study support the hypothesis that belong to the less privileged economic class affects on the formation of habits and therefore the choice of food, reflecting on the nutritional status of children. It is recommend increased investment in infrastructure and public services in nutrition education, to contribute to the achievement of the human right to adequate food and a better standard of nutrition and health.

Keywords: Quilombolas communities, food consumption, nutritional status, preschool children.

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Figura 1 – Modelo para os valores de referência de ingestão de nutrientes propostos pelo Institute of Medicine (IOM) ... 32

Figura 2 – Curva de risco da ingestão de nutrientes ... 36

Figura 3 – Diferença entre a distribuição de nutrientes ajustados e não ajustados ... 55

Figura 4 – Distribuição dos escores z da estatura-para-idade de crianças de 13 a 59 meses das comunidades quilombolas do estado de Alagoas, em comparação à respectiva distribuição no padrão antropométrico de referência WHO/2006 ... 68

Figura 5 – Frequência de consumo dos diferentes grupos alimentares por crianças das comunidades quilombolas de Alagoas (2009) ... 71

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Tabela 1 – Valores diários de UL, EAR e AI ou RDA para minerais ... 37 Tabela 2 – Valores diários de UL, EAR e AI ou RDA para vitaminas ... 41 Tabela 3 Valores de ingestão dietética de referência para energia para

indivíduos ativos ... 45 Tabela 4 – Valores diários de UL, EAR e AI ou RDA para macronutrientes .... 46 Tabela 5 – Valores diários de UL, EAR e AI ou RDA para aminoácidos

essenciais ... 48 Tabela 6 – Perfil aminoacídico para crianças > 1 ano de idade e todas as

outras idades ... 50 Tabela 7 – Valores diários de UL, EAR e AI ou RDA para água e eletrólitos... 51 Tabela 8 – Perfil antropométrico de acordo com os índices peso-para-idade,

altura-para-idade e peso-para-altura em crianças quilombolas

(Alagoas, 2009) ... 69 Tabela 9 – Caracterização do estado nutricional em crianças menores de 5

anos das comunidades remanescentes dos quilombos do estado de

Alagoas (2009), segundo diferentes classes econômicas ... 70 Tabela 10 – Necessidade energética estimada (EER) e adequação do consumo

de energia em crianças das comunidades remanescentes dos

quilombos de Alagoas (2009) ... 72 Tabela 11 – Adequação do consumo de macronutrientes em crianças das

comunidades remanescentes quilombolas de Alagoas (2009) por

faixa etária ... 73 Tabela 12 – Faixa de distribuição aceitável dos macronutrientes, de acordo com

faixa etária ... 73 Tabela 13 – Consumo habitual de energia, macro e micronutrientes em crianças

das comunidades remanescentes quilombolas de Alagoas (2009),

de acordo com a faixa etária ... 76 Tabela 14 – Consumo habitual de energia, macro e micronutrientes em crianças

das comunidades remanescentes quilombolas de Alagoas (2009),

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Quadro 1 – Publicações das Ingestões Dietéticas de Referência (Dietary

Reference Intakes – DRIs). Fonte: IOM, 2006 ... 32 Quadro 2 – Comunidades remanescentes de quilombos em Alagoas, segundo

localização e condição legal ...

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AMDR - Acceptable Macronutrient Distribution Range CDC - Centro de Prevenção e Controle de Doenças CV – Coeficiente de variação

DP – Desvio-padrão

DRI – Dietary Reference Intakes EAR – Estimated Average Requirement FNB – Food and Nutrition Board Hb – Hemoglobina

IMC – Índice de massa corporal IOM – Institute of Medicine

NAS – National Academy of Sciences

NCHS – National Center for Health Statistics NRC – National Research Council

OMS – Organização Mundial de Saúde PBF – Programa Bolsa Família

PNDS – Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher POF – Pesquisa de Orçamento Familiar

QFA – Questionário de frequência alimentar

QSFA – Questionário semiquantitativo de frequência alimentar RDA – Recommended Dietary Allowance

RNI – Recommended Nutrient Intakes R24h – Recordatório de 24 horas UL – Tolerable Upper Intake Level

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1 INTRODUÇÃO... 14 1.1 Problematização ... 14 1.2 Problema ... 16 1.3 Hipótese ... 16 1.4 Justificativa ... 17 1.5 Objetivos ... 17 1.5.1 Geral ... 17 1.5.2 Específicos ... 18 2 REVISÃO DA LITERATURA ... 20 2.1 Comunidades Quilombolas ... 20

2.2 Consumo Alimentar e Instrumentos de Avaliação ... 24

2.3 Recomendações Dietéticas ... 28

2.3.1 Histórico ... 28

2.3.2 Definições das DRIs ... 31

2.3.3 Aplicação das DRIs ... 53

3 MÉTODOS ... 58

3.1 Tipo de estudo e casuística... 58

3.2 Coleta de dados... 58

3.3 Critérios de inclusão e exclusão ... 59

3.4 Padrão alimentar das crianças pré-escolares ... 60

3.5 Avaliação antropométrica... 62 3.6 Prevalência de anemia... 63 3.7 Nível socioeconômico... 63 3.8 Análise estatística... 64 3.9 Aspectos éticos... 65 4 RESULTADOS ... 67 5 DISCUSSÃO ... 80 6 CONCLUSÕES ... 100 REFERÊNCIAS... 103 APÊNDICES

Apêndice A – Formulário semi-estruturado utilizado na coleta de dados Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ANEXOS

Anexo A – Comunidades remanescentes de quilombos em Alagoas, segundo localização e condição de reconhecimento legal

Anexo B – Critério de Classificação Econômica do Brasil

Anexo C – Termo de aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Problematização

Os quilombos são uma organização social, formada por afro-descendentes trazidos ao Brasil na época colonial, que se localizavam em áreas com relativo grau de isolamento geográfico, com o intuito de fugir das condições desumanas e de trabalho forçado ao qual eram submetidos (OLIVEIRA E SILVA et al., 2008; BRASIL, 2010a). Atualmente, esse território continua sendo habitado por descendentes de negros escravizados e de negros livres (SILVA, 2007).

O decreto nº 4887/2003 em seu artigo 2º define os remanescentes das comunidades quilombolas como “os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida” (BRASIL, 2003).

Essas comunidades estão submetidas, desde sua origem, a um processo de exclusão social e condições precárias de sobrevivência e insegurança alimentar, quadro que influencia de forma direta no processo saúde-doença e, consequentemente, na expectativa de vida dessas minorias (GUERRERO et al., 2007).

A falta de reconhecimento da existência dessas comunidades intensificou ainda mais esse processo de desigualdade, iniciado desde a época da escravidão. Após a abolição da escravatura, não foram formuladas políticas para inserir os indivíduos remanescentes dos quilombos na sociedade, de modo que, sem assistência do Estado, desenvolveram mecanismos próprios em busca de sua sobrevivência (BRASIL, 2008a).

Apenas em 1988, através dos artigos 215 e 216 da Constituição Brasileira e do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, tornou-se pública a responsabilidade

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do Estado brasileiro sobre essas comunidades (BRASIL, 2001). Entretanto, ainda existe muito a se fazer para melhorar as condições de vida dessa população.

Aliada a essa realidade, é preocupante a situação em que as crianças quilombolas se encontram, especialmente as que estão em idade pré-escolar, uma vez que apresentam grande vulnerabilidade biológica, tornando-as susceptíveis a diversos agravos nutricionais, tais como a desnutrição energético-protéica e a anemia (CASTRO et al., 2005; FALCÃO-GOMES et al., 2006). Tais agravos são decorrentes de fatores multicausais, com destaque para aqueles que se relacionam à falta de acesso aos bens e serviços básicos, como atenção à saúde, saneamento, educação e alimentação adequada (CASTRO et al., 2005).

Esta última constitui-se um dos aspectos essenciais para a saúde da criança, em especial nas fases mais precoces da vida, uma vez que os primeiros anos são marcados por um período de rápido crescimento, altamente dependente de um adequado fornecimento de energia e nutrientes (LONDRINA, 2006). Esse estágio de vida é de importância fundamental para o adequado crescimento e desenvolvimento, os quais são altamente influenciados pelo meio ambiente no qual a criança está inserida. Alterações nessa fase da vida podem ocasionar danos irreversíveis ao desenvolvimento de uma criança, a exemplo do retardo de crescimento consequente à má nutrição crônica (WHO, 2009).

Dentro desse contexto, os inquéritos dietéticos tornam-se instrumentos importantes para a avaliação do estado nutricional, uma vez que a investigação do consumo alimentar permite estimar a prevalência da deficiência no consumo de macro e micronutrientes, assim como conhecer hábitos alimentares de indivíduos e populações (CASTRO et al., 2005). Um dos objetivos desse recurso é tentar esclarecer a associação entre alimentação e saúde do indivíduo ou população, especialmente no que se refere à compreensão dos fatores associados aos agravos nutricionais (FALCÃO-GOMES et al., 2006).

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Adicionalmente, os estudos dietéticos contribuem para o fornecimento de subsídios necessários à promoção de mudanças no comportamento alimentar e, consequentemente, à melhoria da qualidade de vida, contribuindo com riscos mais reduzidos de contrair doenças (MARCHIONI et al., 2004), especialmente em crianças com elevada vulnerabilidade biológica e social, característica da população remanescente quilombola. Entretanto, apesar de sua importância, é grande a escassez de estudos no país que avaliem a situação alimentar e nutricional de populações nos diferentes espaços geográficos e segmentos sociais (MENEZES & OSÓRIO, 2007).

A falta de estudos e, consequentemente, de informações sobre o perfil de saúde de populações remanescentes de quilombos, evidencia a importância de pesquisas que forneçam indicadores epidemiológicos que contribuam para o planejamento, implantação e avaliação de políticas públicas que busquem uma melhor assistência à saúde para esse contingente populacional (GUERRERO et al., 2007), razão pela qual realizou-se a presente investigação.

1.2 Problema

Quais são as condições de alimentação e nutrição das crianças pré-escolares residentes nas comunidades remanescentes de quilombos do estado de Alagoas?

1.3 Hipótese

As crianças pré-escolares residentes nas comunidades remanescentes de quilombos do estado de Alagoas estão submetidas a uma alimentação inadequada, do ponto de vista energético e de micronutrientes, condição esta associada a uma prevalência de agravos nutricionais acima da frequência esperada para uma população saudável.

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1.4 Justificativa

A falta de estudos e, consequentemente, de informações sobre o perfil alimentar e nutricional de populações quilombolas de um modo geral e, em especial, do estado de Alagoas mostra a importância de se pesquisar essas comunidades e identificar suas necessidades e grau de precariedade para traçar medidas específicas de atenção, que respeitem suas características culturais, como forma de promover melhores condições de vida para esses indivíduos.

A avaliação do consumo alimentar em crianças é de fundamental importância, uma vez que hábitos alimentares inadequados estão entre os fatores determinantes que mais interferem sobre o seu estado nutricional, especialmente nas classes de menor nível econômico (CAVALCANTE et al., 2006). Além disso, os estudos dietéticos auxiliam no fornecimento de subsídios necessários à promoção de mudanças no comportamento alimentar e, consequentemente, à melhoria da qualidade de vida, contribuindo com a redução de riscos de contrair doenças (MARCHIONI et al., 2004), especialmente em crianças com elevada vulnerabilidade biológica e social, característica da população estudada.

Em adição, o presente estudo pretende fornecer o primeiro banco de informações específicas sobre as comunidades remanescentes dos quilombos alagoanos, propiciando, dessa forma, subsídios para um melhor planejamento de políticas direcionadas a essa população.

1.5 Objetivos 1.5.1 Objetivo geral

Avaliar o consumo alimentar e o estado nutricional de crianças pré-escolares das comunidades remanescentes de quilombos do estado de Alagoas.

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1.5.2 Objetivos específicos

 Caracterizar a população, no que diz respeito às condições ambientais, demográficas e

socioeconômicas;

 Caracterizar os hábitos alimentares das crianças;

 Estimar a prevalência de inadequação no consumo de energia, macro e

micronutrientes;

 Caracterizar o perfil antropométrico, identificando a prevalência de extremos

indicativos de agravos nutricionais;

 Averiguar possíveis associações entre o perfil antropométrico e o consumo alimentar;  Determinar a prevalência de anemia;

 Investigar associações entre a anemia e a ingestão de vitaminas e minerais

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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Comunidades Quilombolas

O Brasil é um país altamente miscigenado, no qual a maior parte da sua população é descendente de americanos, europeus e africanos. Estes últimos foram introduzidos no país por meio de comerciantes de escravos. Contudo, diante das condições desumanas de vida e de trabalho forçado a que eram submetidos, muitos fugiram de fazendas ou minas de ouro e estabeleceram-se em vales distantes, denominados quilombos (MOTTA-CASTRO et al., 2009).

Os quilombos, que em sua etimologia bantu significa acampamento guerreiro na floresta (LEITE, 2008), são refúgios populacionais, localizados em áreas com relativo grau de isolamento social, formados por escravos fugidos (OLIVEIRA E SILVA et al., 2008; BRASIL, 2010a). Esses núcleos comunitários, também conhecidos como “mocambos”, “comunidades negras rurais” e “terras de preto”, eram caracterizados por sua resistência e luta por liberdade, assim como a manutenção dos costumes, crenças e tradições africanos (BRASIL, 2008a). Desses, o que mais se destacou foi o Quilombo dos Palmares, no estado de Alagoas, por representar uma organização que se manifestava contra a administração colonial por quase dois séculos (LEITE, 2008).

Os primeiros africanos foram trazidos ao Brasil em meados do século XVI. Após a ocorrência de várias epidemias que culminaram com a morte de um número considerável de escravos índios, o tráfico negreiro foi intensificado a partir da década de 1570. No período de quarenta anos, compreendido entre a vinda da família real para o Brasil, em 1808, e o fim do tráfico, em 1850, foram introduzidos mais de 1,4 milhões de escravos negros no país, aproximadamente 40% de todos os africanos importados para trabalhos forçados, em três séculos de história da escravidão brasileira (MARQUESE, 2006).

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Em 1888, a Lei Áurea encerrou o período escravocrata brasileiro e iniciou um processo de mudanças nas relações inter-raciais (SANTOS & CHAVES, 2007). Entretanto, após a abolição, não foram criadas políticas para inserir os escravos e remanescentes de quilombos na sociedade, de modo que, sem assistência do Estado, desenvolveram mecanismos próprios em busca de sua sobrevivência (BRASIL, 2008a).

Atualmente, essas comunidades quilombolas continuam habitadas por seus descendentes (SILVA, 2007), sendo essas áreas resultantes de terras livres de difícil acesso, assim como de heranças, de fazendas falidas, de prestação de serviços de escravos em guerras, de permanência na terra em que cultivavam, bem como da compra de terras durante a escravidão ou após a abolição (SCHIMITT et al., 2002; BRASIL, 2008).

A resistência das comunidades nessas áreas intensificou o processo de invisibilidade social que está associado à marginalidade econômica e a sua localização em territórios distantes dos centros econômicos (OLIVEIRA E SILVA et al., 2008). Atualmente, as principais preocupações associadas a essas comunidades estão voltadas à atenção primária à saúde, ao saneamento e à manutenção da identidade cultural, por meio de uma educação adequada voltada às características dessa população (BRASIL, 2008a). Esses núcleos populacionais vivem em condições de desigualdades sociais e de saúde consequentes do processo de escravidão e abolição, submetendo seus habitantes a situações precárias de vida e insegurança alimentar (GUERRERO et al., 2007; OLIVEIRA E SILVA et al., 2008).

Desde a abolição dos escravos, o quilombo está associado à luta contra o racismo e às políticas de reconhecimento da população afro-brasileira, recebendo apoio governamental e da sociedade civil. Essas iniciativas tem sido desenvolvidas nas comunidades, com o intuito de reparar os agravos históricos a partir de ações que forneçam benefícios aos habitantes, com destaque para a segurança alimentar e nutricional (LEITE, 2008; OLIVEIRA E SILVA et al., 2008).

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Apenas em 1988, através dos artigos 215 e 216 da Constituição Brasileira e do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, tornou-se pública a responsabilidade do Estado brasileiro diante dessas comunidades (BRASIL, 2001). Desde então, algumas comunidades no país passaram por um processo de reconhecimento e titulação (VILAS, 2005).

A Constituição de 1988, no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, define que “aos remanescentes de quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida sua propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos definitivos” (BRASIL, 2001).

O acesso à terra revelou a necessidade de redimensionar o conceito de quilombolas (SCHIMITT et al., 2002). O decreto nº 4.487/2003 em seu artigo segundo define os remanescentes dessas comunidades como “os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida” (BRASIL, 2003).

Com o reconhecimento legal dessas comunidades pelo Estado brasileiro, iniciou-se uma série de políticas públicas que pretendem garantir os direitos relacionados aos remanescentes quilombolas (LEITE, 2008). O Governo Federal tem como objetivo assegurar a posse de terra e o desenvolvimento dessas comunidades, além de apresentar projetos relacionados à construção de escolas, educação, saúde, moradia, saneamento básico, emprego e energia (BRASIL, 2010a).

Além de instituições oficiais responsáveis por essas comunidades, o Governo criou programas para administrar as políticas públicas, como o Brasil Quilombola, que tem como objetivo melhorar a qualidade de vida dessas comunidades (BRASIL, 2008a; LEITE, 2008).

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Essas iniciativas foram formuladas com a intenção de reverter o quadro de injustiça e desigualdade sociais atribuídos aos remanescentes das comunidades. O que se almeja é a criação de ações afirmativas, visando combater a discriminação atual, assim como amenizar as consequências do passado (DOMINGUES, 2005).

Apesar dessas ações, é recente a presença do Estado nas comunidades. Além disso, a estrutura do Estado não foi desenvolvida para comportar as comunidades quilombolas, não apenas do ponto de vista numérico, mas da sua existência. Essa situação pode ser comprovada pelo fato de, atualmente, se trabalhar com números aproximados dessas comunidades, não existindo um consenso sobre o seu número real no Brasil. De acordo com dados de 2008 (BRASIL, 2008a), estima-se um número entre 724 a 3.524 comunidades em todo o país, incluindo quilombos urbanos e rurais. Acredita-se que esse território ocupe cerca de 30 milhões de hectares, com uma população de dois milhões de pessoas (NERY, 2004).

Um dos prováveis motivos para essa falta de precisão está associado aos diversos critérios necessários para o seu reconhecimento, uma vez que envolve questões como posse territorial, levando a um processo lento e litigioso (BRASIL, 2008a; OLIVEIRA E SILVA et al., 2008). De acordo com a Fundação Cultural Palmares (BRASIL, 2010a), atualmente foram certificados no território nacional 1.408 comunidades, das quais a maioria se concentra na Bahia e no Maranhão.

A Fundação Cultural Palmares foi criada para tratar temas essenciais, com a intenção de incluir a população negra na sociedade brasileira por intermédio da cultura. Seus objetivos são os de resgatar e consolidar o patrimônio histórico afro-brasileiro, fomentar o desenvolvimento humano das comunidades negras e remanescentes de quilombos no Brasil e impulsionar e apoiar as lideranças comunitárias negras (BRASIL, 2009).

Como consequência do histórico de desigualdade e exclusão social das comunidades quilombolas, percebe-se um quadro socioeconômico bastante diferenciado em relação à

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população brasileira, de um modo geral. O Estado deve, portanto, contribuir para o estabelecimento da igualdade social, contudo, para isso é necessário atingir a universalização, sendo este um dos maiores desafios das políticas públicas. Para reverter essa situação, é preciso o reconhecimento dos direitos e necessidades específicas das comunidades quilombolas (BRASIL, 2008a).

O Estado brasileiro tem como responsabilidade resgatar uma dívida histórica econômica, social e política com a população negra brasileira, possibilitando melhores condições de vida e o pleno exercício de seus direitos, de forma justa e igualitária (BRASIL, 2008a).

2.2 Consumo alimentar e instrumentos de avaliação

O estado nutricional de um indivíduo pode ser pesquisado por diversos métodos. Contudo, o único que é capaz de detectar a deficiência em seu estágio inicial é a avaliação dietética (LOPES et al., 2003). Entretanto, deve-se ressaltar que esse procedimento não pode ser usado isoladamente para avaliar o estado nutricional de indivíduos, sendo recomendadas avaliações clínicas ou bioquímicas para confirmar o diagnóstico nutricional (MARCHIONI et al., 2004).

O inquérito dietético, quando analisado de forma qualitativa e quantitativa, permite fornecer informações necessárias para promover mudanças no comportamento alimentar, melhorando a qualidade de vida de indivíduos e populações, uma vez que essas modificações colaboram com riscos mais reduzidos para adoecer (MARCHIONI et al., 2004).

Dados de consumo alimentar vem sendo coletados por uma grande variedade de razões, tais como estimar a proporção de pessoas com inadequação dietética, ajudar a planejar ações de saúde, avaliar a eficácia de programas assistenciais de alimentos, assim como esclarecer as inter-relações entre saúde e dieta (GUENTHER et al., 1997; MORIMOTO et al., 2006).

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Para estabelecer a ingestão de nutrientes devem ser utilizados métodos de inquérito alimentar. A escolha da ferramenta ideal dependerá das características do estudo, da população alvo e do tipo de informação dietética que se deseja obter, assim como dos recursos disponíveis para a sua realização (CAVALCANTE et al., 2004; MARCHIONI et al., 2004; ANJOS et al., 2009).

Os instrumentos de avaliação do consumo alimentar podem ser classificados em dois grupos. O primeiro é relacionado à investigação do consumo atual, a exemplo do recordatório de 24 horas (R24h), recordatório alimentar auto-administrado e do registro alimentar, enquanto que o segundo é utilizado para avaliar o consumo retrospectivo, a exemplo do questionário de frequência alimentar (QFA), que pode ser entrevistado ou auto-administrado, do questionário semiquantitativo de frequência alimentar (QSFA) e da história dietética (GUENTHER et al., 1997; MARCHIONI et al., 2004; BARBOSA & MONTEIRO, 2006; ANJOS et al., 2009). Outra terminologia empregada em estudos que avaliam o consumo alimentar diz respeito à dieta atual e habitual. A primeira refere-se à média do consumo alimentar em um curto período de tempo corrente, enquanto que a segunda é definida como a média do consumo de alimentos em um longo período (WILLETT, 1998).

O R24h consiste de uma entrevista na qual o entrevistador pede para o entrevistado relatar todos os alimentos e bebidas consumidos por ele no período de 24 horas, que pode ser representado pelo dia anterior à entrevista ou às últimas 24 horas (BARBOSA & MONTEIRO, 2006; ANJOS et al., 2009). Geralmente, as informações são obtidas em medidas caseiras e convertidas, posteriormente, em peso (g) e volumes (mL) (BARBOSA & MONTEIRO, 2006).

Esse método tem como vantagem a facilidade de sua aplicação, baixo custo, rapidez, não exigir um elevado nível de instrução do entrevistado e depender da memória recente do indivíduo. Além disso, não interfere no perfil alimentar da população, quando aplicado pela

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primeira vez, ao contrário de outros métodos como o Registro Alimentar, além de ser baseado em respostas abertas, permitindo informações mais detalhadas sobre o consumo alimentar. Entretanto, pelo fato do R24h avaliar a ingestão de um dia, é necessário que esse dia seja típico da alimentação do indivíduo (SLATER et al., 2004; ANJOS et al., 2009).

Contudo, para que haja confiabilidade dos dados, é necessária uma boa memória do entrevistado, sua paciência e cooperação em fornecer informações corretas, assim como de sua compreensão sobre o tamanho de porções, visando estimar de forma mais adequada a quantidade do que foi consumido. Além disso, o entrevistador também interfere na precisão dos dados coletados, uma vez que ele deve ser persistente para obter o máximo de detalhes sobre alimentos, preparações e quantidades ingeridos (GUENTHER et al., 1997; BARBOSA & MONTEIRO, 2006).

O QFA fornece uma lista de alimentos e grupos de alimentos no qual os entrevistados são perguntados sobre a frequência que esses itens são consumidos durante um período de tempo pré-determinado. Dessa forma, é possível obter dados qualitativos da dieta habitual (WILLETT, 1998; SLATER et al., 2004; BARBOSA & MONTEIRO, 2006).

Diversos autores afirmam que o QFA é o método mais adequado para identificar e descrever o perfil alimentar em estudos epidemiológicos (WILLETT, 1998), assim como para verificar a relação saúde-doença. Entretanto, pelo fato de não investigar a quantidade ingerida de alimentos, raramente tem precisão suficiente para ser usado para avaliar a adequação da ingestão de nutrientes (SLATER et al., 2004).

O desempenho de um QFA depende, basicamente, da memória e da colaboração do entrevistado e da adequação da lista de alimentos à população em estudo (WILLETT, 1998). Em alguns casos, essa listagem pré-estabelecida não contempla todos os alimentos consumidos, reduzindo sua validação (SLATER et al., 2004).

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É possível estimar dados quantitativos em um QFA contanto que nesses questionários sejam incorporadas questões sobre tamanho das porções. Nesse caso, refere-se ao QSFA (BARBOSA & MONTEIRO, 2006).

Autores afirmam que o QSFA é o melhor método de avaliação dietética para estudos epidemiológicos, uma vez que engloba períodos longos de tempo, além de sua confiabilidade e validade relativas. Entretanto, por ser um questionário fechado, no qual os alimentos são definidos previamente, sua validade pode ser comprometida por listas incompletas ou excessivas de alimentos, assim como o QFA, devendo ser validado ou calibrado de acordo com cada população. Além disso, está sujeito à variabilidade e erros de medida, assim como todos os métodos de investigação dietética, o que pode prejudicar a sua precisão (LOPES et al., 2003).

Portanto, não existem métodos que avaliem a ingestão dietética com exatidão, ou seja, livres de erros. Os erros de medida são classificados em aleatórios e sistemáticos, podendo ser intra ou entre indivíduos. O erro aleatório intra-indivíduo ocorre devido à variação diária da ingestão de alimentos (WILLETT, 1998).

Uma vez que as pessoas não consomem diariamente, semanalmente ou em cada estação as mesmas opções alimentares, a variação intra-individual nas ingestões dietéticas representa um difícil problema (GUENTHER et al., 1997). Não considerar essa variação do consumo alimentar pode levar à subestimação ou à superestimação da porcentagem de indivíduos com inadequação de nutrientes (MARCHIONI et al., 2004).

Como forma de reduzir esse erro de medida, recomenda-se o ajuste das distribuições de ingestões. Para isso, é necessário um segundo dia de ingestão de, pelo menos, uma amostra representativa do grupo (MURPHY et al., 2006). Lopes et al. (2003) afirmaram que para reduzir ou eliminar esse erro é recomendado o uso do QSFA ou de múltiplos R24h. Se apenas

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um dia de recordatório for coletado, a distribuição da ingestão habitual não pode ser definida. Nesse caso, trabalha-se apenas com a ingestão atual (JAHNS et al., 2005).

Um estudo realizado com o objetivo de estimar a distribuição do consumo alimentar a partir de medidas repetidas de curto prazo, como o uso de múltiplos R24h, concluiu que apenas 2 medidas de repetição são necessárias para reduzir a variabilidade intra-individual. Contudo, é necessário que a amostra dos dias repetidos inclua todas as estações do ano e dias da semana (HOFFMANN et al., 2002).

Independente do método escolhido para avaliar o consumo alimentar, obter dados confiáveis e válidos é extremamente difícil, uma vez que não existe uma ferramenta de avaliação dietética considerada “padrão ouro” para determinar de forma mais segura a ingestão de nutrientes. Além disso, todos os métodos são passíveis de variações e erros de medida (WILLETT, 1998; LOPES et al., 2003; BARBOSA & MONTEIRO, 2006).

2.3 Recomendações dietéticas

2.3.1 Histórico

Por mais de meio século, as recomendações dietéticas de referência (Recommended Dietary Allowance – RDA) dos Estados Unidos e as Ingestões Recomendadas de Nutrientes (Recommended Nutrient Intakes – RNI) do Canadá foram utilizadas nesses países com o objetivo de avaliar as necessidades nutricionais de pessoas saudáveis na América do Norte (IOM, 2006).

Inicialmente, quando as RDAs e RNIs foram formuladas, a meta era de que essas recomendações fossem utilizadas para o planejamento dietético de grupos. Entretanto, como esses valores eram as únicas ferramentas disponíveis, elas foram estendidas para planejar e avaliar dietas de indivíduos e grupos, promover educação nutricional e servir como um padrão para rotulagem e fortificação nutricional. Contudo, suas últimas revisões não foram bem

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desenvolvidas para essas finalidades, surgindo à necessidade da criação de novos valores de referência (IOM, 2006).

As RDAs foram publicadas desde 1941 pela Food and Nutrition Board (FNB) do Institute of Medicine (IOM) da National Academy of Sciences (NAS) (YATES et al., 1998; IOM, 2000a). Em 1941, o Conselho Nacional de Pesquisa (National Research Council – NRC), antecessor do FNB, publicou o primeiro grupo de RDAs para vitaminas, minerais, proteína e energia. Por volta de 1989, elas tinham sido revisadas nove vezes e expandidas de oito para vinte e sete nutrientes (NRC, 1989; IOM, 2000a; IOM, 2006).

Em 1938, o Conselho Canadense de Nutrição (Canadian Council on Nutrition) formulou o primeiro padrão dietético planejado para o Canadá, o Dietary Standard for Canada, que foi revisado em 1950, 1963, 1975 e 1983 e publicado pelo Health Canada e seus antecessores. Em 1983, a revisão dessas publicações foi renomeada para Ingestões Recomendadas de Nutrientes, as RNIs. No final da década de 80, foram incorporadas na revisão das RNIs considerações sobre a prevenção de doenças crônicas, bem como de deficiências nutricionais (IOM, 2006).

Ainda no Canadá, em 1990, o documento Recomendações Nutricionais: A Publicação do Comitê Científico de Revisão (Nutrition Recommendations: The Report of the Scientific on Review Comitee) foi divulgado, trazendo atualizações das RNIs e recomendações que suprissem as necessidades de todos os nutrientes essenciais e, adicionalmente, reduzissem o risco de doenças crônicas (IOM, 2006).

Em 1989, foi publicada a décima e última edição das RDAs. Nesse mesmo ano, o NRC publicou o Diet and Health que era focado nos nutrientes e padrões dietéticos, tais como os relacionados à redução do risco do desenvolvimento de doenças crônicas. Pouco depois, no início da década de 1990, o FNB listou uma série de considerações relacionadas ao estabelecimento das necessidades e recomendações de nutrientes, que associavam novas

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informações sobre componentes alimentares que não eram identificados como nutrientes, a exemplo da fibra e dos carotenóides, assim como a função dos nutrientes na proteção contra doenças crônicas. Além disso, a aplicação das RDAs, em algumas situações, era considerada inapropriada (IOM, 2000b).

No início de 1994, o FNB, com o auxílio do governo dos Estados Unidos e do Canadá, iniciou o desenvolvimento e a implantação de um novo paradigma para estabelecer as ingestões recomendadas de nutrientes, que substituíram e expandiram as RDAs e RNIs; esses valores são conhecidos, em conjunto, como Ingestões Dietéticas de Referência (Dietary Reference Intakes – DRIs). Ao contrário da criação das RDAs e RNIs, que estabeleciam um único valor para cada nutriente ajustado para idade, sexo e condição fisiológica, as DRIs tem quatro valores de referência. Desses, apenas a RDA é familiar, entretanto, o método pelo qual ela é derivada modificou. As DRIs são um grupo comum de valores de referência para o Canadá e os EUA e são baseadas em relações cientificamente fundamentadas entre ingestões de nutrientes e indicadores de adequação, assim como a prevenção de doenças crônicas, em populações aparentemente saudáveis (IOM, 2006).

Esses novos valores de referência foram estabelecidos não apenas com a intenção de ajudar os indivíduos a melhorar a saúde e prevenir doenças, mas, também, para evitar o consumo excessivo de nutrientes (IOM, 1998). O uso de alimentos fortificados e enriquecidos e o consumo aumentado de nutrientes na forma pura, isoladamente ou em combinação com outros componentes, fora do contexto de alimento, despertavam o interesse de uma investigação mais profunda dos potenciais efeitos do excesso da ingestão de nutrientes (IOM, 2006).

Entre 1997 e 2005, o IOM publicou uma série de seis documentos das DRIs, englobando um total de 45 nutrientes, energia e outros componentes alimentares. Além desses, foram lançadas duas publicações descrevendo como usar os valores apropriados para

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avaliar e planejar dietas de grupos e indivíduos, e quatro publicações relacionadas ou derivadas (Quadro 1) (IOM, 2007).

2.3.2 Definições das DRIs

As DRIs são formadas por um conjunto de quatro valores de referência de ingestão de nutrientes, a saber: Necessidade Média Estimada (Estimated Average Requirement – EAR), RDA, Ingestão Adequada (Adequate Intake – AI) e Nível de Ingestão Máxima Tolerável (Tolerable Upper Intake Level – UL) (Figura 1) (IOM, 1998).

Além dessas referências, as DRIs trazem a nova Faixa de Distribuição Aceitável de Macronutrientes (Acceptable Macronutrient Distribution Range – AMDR) e novas equações para estimar as necessidades de energia, conhecidas como Necessidade Média Estimada (Estimated Energy Requirement - EER) (IOM, 2002; IOM, 2006).

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Quadro 1 – Publicações das Ingestões Dietéticas de Referência (Dietary Reference Intakes – DRIs).  Publicação específica de nutrientes:

o DRIs for Calcium, Phosphorus, Magnesium, Vitamina D and Fluoride (1997)

o DRIs for Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin B12, Pantothenic Acid, Biotin, and Choline (1998).

o DRIs for Vitamin C, Vitamine E, Selenium, and Carotenoids (2000).

o DRIs for Vitamin A, Vitamin K, Arsenic, Boron, Chromium, Copper, Iodine, Iron, Manganese, Molybdenum, Nickel, Silicon, Vanadium, and Zinc (2001).

o DRIs for energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Colesterol, Protein, and Amino Acids (2002/2005).

 Publicações que explicam os usos apropriados:

o DRIs: Applications in Dietary Assessment (2000). o DRIs: Applications in Dietary Planning (2003).  Publicações relacionadas ou derivadas:

o DRIs: Proposed Definitions and Plan for Review of Dietary Antioxidants and Related Compounds (1998).

o DRIs: A Risk Assessment Model for Establishing Upper Intake Levels for Nutriente (1998).

o DRIs: Proposed Definitions of Dietary Fiber (2001).

o DRIs: Guiding Principles for Nutrition Labeling and Fortification (2003). Fonte: (IOM, 2006).

Curva de distribuição de necessidades de nutrientes Fonte: (Marchioni et al., 2004).

Nota: EAR: Necessidade Média Estimada; RDA: Requerimento Dietético Recomendado; AI: Ingestão Adequada; UL: Nível de Ingestão Máxima Tolerável. DP: desvio-padrão.

Figura 1 – Modelo para os valores de referência de ingestão de nutrientes propostos pelo Institute of Medicine (IOM).

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o Valores de referência

 EAR:

É o nível de ingestão diária de um nutriente que se estima atender às necessidades de metade dos indivíduos saudáveis em um grupo particular de estágio de vida e gênero. Apesar do termo “média” ser usado, a EAR representa uma estimativa da mediana das necessidades. Dessa forma, ela excede as necessidades da metade de um grupo e está abaixo dos requerimentos da outra metade (IOM, 1998).

A EAR é formulada a partir de uma revisão cuidadosa da literatura e baseada em um critério específico de adequação, que considera a redução do risco de doenças por deficiência ou excesso, assim como outros parâmetros de saúde (MARCHIONI et al., 2004). As necessidades são assumidas como normalmente distribuídas para todas as vitaminas e minerais, exceto o ferro, uma vez que suas necessidades são distorcidas, especialmente em mulheres em idade fértil. O desvio-padrão (DP) é, geralmente, considerado como 10% da EAR, mas é maior para niacina, 15%, e vitamina A, 20% (MURPHY et al., 2006).

A respeito das necessidades de energia, uma EER é estimada. Esse requerimento é a média de ingestão de calorias que é sugerida manter o balanço energético de um adulto saudável de uma definida idade, gênero, peso, altura e nível de atividade física compatível com uma boa saúde. Em crianças, gestantes e lactantes, a EER inclui as necessidades associadas com os tecidos de depósito ou a secreção de leite em níveis consistentes com uma saúde adequada (IOM, 2006). Nesse caso, se o consumo médio calórico for acima da EER, a tendência é que os indivíduos ganhem peso, enquanto que se for abaixo, espera-se que ocorra redução dessa medida (MURPHY et al., 2006).

 RDA:

É uma estimativa da ingestão dietética média diária que satisfaz os requerimentos de praticamente todos (97 – 98%) os membros saudáveis de um grupo particular de estágio de

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vida e gênero. Dessa forma, a RDA excede as necessidades de aproximadamente todas as pessoas de um grupo. Por esta razão, a ingestão abaixo da RDA não pode ser avaliada como inadequada em indivíduos e grupos (IOM, 1998).

Para os nutrientes que tem uma distribuição estatisticamente normal das necessidades, a RDA é derivada matematicamente a partir da EAR e de seu DP. Ela é determinada pela adição de dois DP acima da EAR (IOM, 2001; MARCHIONI et al., 2004):

RDA = EAR + 2DPEAR

Se não houver dados suficientes da variabilidade das necessidades para calcular o DP ou se o DP relatado na literatura for inconsistente, assume-se um coeficiente de variação (CV) teórico de 10% para a maioria dos nutrientes. A equação resultante para RDA, nessa situação, é a seguinte (IOM, 1997; IOM, 2001):

RDA = 1,2 X EAR

Se o CV estimado é de 15%, como ocorre com a niacina, a fórmula é a seguinte (YATES et al., 1998):

RDA = 1,3 X EAR

 AI:

Na ausência de evidências científicas suficientes ou adequadas para estabelecer uma EAR e, consequentemente, uma RDA, uma AI é normalmente derivada para o nutriente em questão. A AI representa uma ingestão, não uma necessidade. É uma recomendação média diária dos níveis de ingestão de nutrientes por um grupo ou grupos de pessoas aparentemente saudáveis que se assume manter um estado nutricional adequado (IOM, 2006).

Esse valor, provavelmente, excede as necessidades reais de quase todos os indivíduos em um estágio de vida e gênero, devendo ultrapassar a RDA, caso fosse possível o seu cálculo (IOM, 2006).

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 UL:

Em alguns casos, existe a compreensão errada de que se um nutriente faz bem em pequena quantidade, uma grande quantidade traria, proporcionalmente, mais benefícios. Muitos nutrientes podem trazer prejuízos à saúde humana quando consumidos em doses que, às vezes, são apenas um pouco superiores aos valores da recomendação (MURPHY et al., 2002).

A UL é definida como o nível mais elevado de ingestão de nutrientes que, provavelmente, não oferece risco de efeitos adversos para quase todos os indivíduos de uma população geral. À medida que a ingestão aumenta muito acima desse ponto, o risco potencial de efeitos adversos deve aumentar (Figura 2) (IOM, 1997). Quando um nutriente não apresenta uma UL, não significa dizer que não ofereça risco em qualquer nível de ingestão, mas, apenas, que o nível seguro ainda não foi estabelecido (IOM, 2006).

Cada valor de referência é compatível com a média diária da ingestão de nutrientes. Algum desvio em torno desses valores médios é esperado por um número de dias sem efeito de doença (IOM, 2006).

As Tabelas 1 a 7 contêm os valores de referência das quatro categorias publicadas entre 1997 e 2005. Foram reunidos os valores de EAR e RDA ou AI, além dos valores de UL.

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Fonte: (IOM, 2006).

Nota: Essa figura mostra que a EAR (Estimated Average Requirement – EAR) é a ingestão na qual o risco de inadequação é de 0,5 (50%) para um indivíduo. A RDA (Recommended Dietary Allowance – RDA) é a ingestão na qual o risco de inadequação é muito pequeno, apenas 0,02 a 0,03 (2 a 3%). A AI (Adequate Intake – AI) não tem uma relação consistente com a EAR ou a RDA porque é desenvolvida sem a estimativa da necessidade. Ingestões entre a RDA e a UL (Tolerable Upper

Intake Level – UL), o risco de inadequação e de excesso é próximo de zero. Ingestões acima da UL, o

risco de efeitos adversos deve crescer.

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Além dessas referências, as DRIs trazem o AMDR, que é a nova faixa de distribuição de energia fornecida pelos macronutrientes (IOM, 2006).

 AMDR

O déficit ou excesso de energia, conhecido como desbalanço de macronutrientes, e as quantidades relativas de gordura e carboidratos podem aumentar o risco de diversas doenças crônicas. Com base nessas evidências, o AMDR foi estimado para indivíduos. Essa faixa de distribuição é um intervalo de ingestão de energia fornecida pelos macronutrientes, que é associado com um risco reduzido de desenvolvimento de doença crônica, possuindo um limite menor e outro maior (IOM, 2006).

Se a ingestão for abaixo ou acima desse intervalo aumenta o risco potencial do desenvolvimento de doenças crônicas. Além disso, o consumo fora desse intervalo também aumenta a probabilidade de ingestão inadequada de nutrientes essenciais, portanto, essa faixa de recomendação também pode fornecer quantidades adequadas de nutrientes essenciais (IOM, 2006).

Apesar de ser uma ferramenta bastante útil na avaliação e no planejamento dietético, as DRIs apresentam algumas limitações que devem ser levadas em consideração no momento de interpretar dados sobre o consumo alimentar (IOM, 2006), a saber:

 A EAR é estimada a partir de dados de um limitado número de indivíduos;  Para a maioria dos nutrientes, a variação exata de suas necessidades não é

conhecida, mas aproximada;

 Na ausência de evidência contrária, a variação nas necessidades individuais é assumida seguir uma distribuição normal;

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 A EAR é frequentemente extrapolada de um grupo populacional para outro devido as informações serem limitadas, a exemplo das recomendações de crianças e adolescentes, que apresentam dados extrapolados de adultos.

2.3.3 Aplicação das DRIs

As DRIs tem como usos principais a avaliação das ingestões de indivíduos e grupos da população. Essas recomendações e suas aplicações são baseadas no conceito estatístico de uma distribuição normal, tanto das necessidades quanto das ingestões. Devido a isso, a probabilidade ou prevalência de adequação ou inadequação pode ser estimada. O termo probabilidade é referido ao se trabalhar com indivíduos, enquanto que prevalência é relativo a grupos (IOM, 2006).

o Avaliação da ingestão de grupos e indivíduos

Quando se trabalha com indivíduos, o DP do consumo de nutrientes é levado em consideração nas fórmulas usadas para avaliação, enquanto que, com grupos, os procedimentos estatísticos devem ser usados para ajustar a distribuição das ingestões. O consumo ajustado reflete, de forma mais próxima, uma distribuição da ingestão habitual (IOM, 2000b).

É praticamente impossível medir com precisão a ingestão habitual de nutrientes por uma longa duração devido à variação nas ingestões do dia-a-dia, assim como às medidas de erro e aos problemas relacionados ao tempo e custos (NUSSER et al., 1996; IOM, 2000b). Dessa forma, a média observada de ingestões por, no mínimo, dois dias não consecutivos ou três dias consecutivos é usada para estimar a ingestão habitual (IOM, 2000b).

A avaliação da adequação dietética de um indivíduo é difícil, mesmo utilizando as aproximações estatísticas sugeridas pelos documentos das DRIs, devido à imprecisão

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envolvida nessa estimativa, uma vez que tanto a ingestão habitual quanto as necessidades de um indivíduo são estimadas (IOM, 2000b).

Para avaliar a ingestão de um indivíduo, a RDA não pode ser usada. Neste caso, utiliza-se a EAR. Para aqueles nutrientes sem a EAR definida, recomenda-se utilizar os valores da AI como um guia de ingestão (IOM, 2000b). Contudo, por ser baseada em poucos dados, seu uso é muito limitado nesse tipo de avaliação (IOM, 2006).

Assim como na avaliação da ingestão de indivíduos, os valores da EAR são utilizados para avaliar o consumo alimentar de grupos. Entretanto, os métodos para essa avaliação são diferentes, fazendo uso da abordagem probabilística ou de sua derivação simplificada, o método da EAR como ponto de corte. Na ausência da EAR estabelecida, também se utilizam os valores da AI (IOM, 2000b).

Da mesma forma que ocorre na avaliação de indivíduos, ao utilizar a AI na avaliação da ingestão de grupos apenas é possível determinar quantitativamente se a ingestão habitual está acima de seus valores, com determinado nível de segurança. Entretanto, nenhuma conclusão pode ser feita se a ingestão habitual estiver abaixo dessa referência (IOM, 2000b).

A RDA não é apropriada para avaliar a ingestão de nutrientes em grupos, uma vez que excede as necessidades de uma larga proporção de indivíduos de uma população, o que superestimaria a prevalência real de inadequação (IOM, 2000b).

Da mesma forma que ocorre na avaliação dietética de indivíduos, para obter uma distribuição da ingestão habitual de um grupo, a distribuição da ingestão observada deve ser ajustada para remover os efeitos da variabilidade intrapessoal. Quando o ajuste é feito, a distribuição da ingestão diminui, ou seja, as caudas da curva de distribuição se aproximam do centro, reduzindo-se o DP. Se as distribuições não forem ajustadas de forma correta, a prevalência de inadequação do nutriente será incorretamente estimada e, frequentemente, superestimada (Figura 3) (IOM, 2000b). Aplicar o médoto da EAR como ponto de corte em

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dados não ajustados resultará em grande viés da prevalência de inadequação (JAHNS et al., 2005). Entretanto, não é necessário fazer o ajuste ao avaliar as ingestões de nutrientes com AI, uma vez que apenas a média de ingestão do grupo é considerada (MURPHY et al., 2006).

O método da EAR como ponto de corte apresenta as seguintes premissas (IOM, 2000b):

 As ingestões e necessidades não devem ser correlacionadas;  A distribuição das necessidades deve ser simétrica;

 A distribuição das ingestões deve apresentar um DP maior que o das necessidades.

Fonte: (Murphy et al., 2006).

Nota: A diferença entre uma distribuição de ingestão de um nutriente com observação de 1 dia em um grupo hipotético e a distribuição de ingestão de um nutriente medida durante vários dias (ingestão habitual) para o mesmo grupo. A prevalência de ingestões inadequadas do nutriente (área à esquerda da Necessidade Média Estimada - EAR) é menor na distribuição da ingestão habitual.

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o Planejamento dietético de grupos e indivíduos

Para o planejamento dietético de indivíduos é recomendado o uso da RDA, uma vez que em nutrientes com EAR e RDA definidas, a probabilidade de inadequação é de 50% na EAR e 2 a 3% na RDA. Se a RDA não estiver disponível, a AI pode ser usada como um guia para esse planejamento (IOM, 2003), oferecendo baixa probabilidade de inadequação para quem possui ingestão habitual igual ou superior aos seus valores (IOM, 1998).

Contudo, ao planejar dietas para grupos não é recomendado o uso da RDA, uma vez que ela ultrapassa as necessidades da maioria da população. Para isso, deve-se usar os valores da EAR, na qual a meta de ingestão de nutrientes é que a média planejada seja igual à EAR (IOM, 2003).

Por fim, conhecer o consumo alimentar de uma população é essencial para o planejamento de ações de saúde, havendo a necessidade de interpretar os dados de ingestão de nutrientes de acordo com as novas referências. As DRIs permitem uma análise mais adequada, assegurando um melhor diagnóstico para a formulação de políticas públicas (MENEZES & OSÓRIO, 2007).

Entretanto, tendo em vista os fatores de erro associados aos métodos de inquérito alimentar, é interessante ressaltar que a avaliação dietética não deve ser utilizada isoladamente no diagnóstico do estado nutricional de grupos populacionais (FISBERG et al., 2009).

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3 MÉTODOS

3.1 Tipo de estudo e casuística

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (BRASIL, 2008a), atualmente não existe no Brasil um consenso em relação ao número de comunidades quilombolas, que varia de 724 a 3524 comunidades em todo o país, incluindo quilombos urbanos e rurais. Um dos prováveis motivos para essa falta de precisão está associado aos diversos critérios necessários para o seu reconhecimento. De acordo com informações da Fundação Cultural Palmares (BRASIL, 2010a), atualmente foram certificadas no território nacional 1408 comunidades, das quais 50 localizam-se no estado de Alagoas.

Em face da ausência de informação precisa quanto ao número real de habitantes nas comunidades quilombolas e diante da impossibilidade de realização de um censo, optou-se estudar, por meio de um delineamento transversal, o universo de famílias com crianças menores de cinco anos das comunidades cadastradas pela gerência de programas Afro-quilombolas da Secretaria da Mulher, da Cidadania e dos Direitos Humanos do Governo de Alagoas (Anexo A).

No início do estudo, constavam nesse cadastro 42 comunidades (4338 famílias no total), das quais 35 já tinham sido reconhecidas pelo Governo Federal, 3 estavam em processo de reconhecimento e as outras 4 ainda estavam sendo estudadas. Entretanto, dessas comunidades, apenas 39 foram consideradas no presente estudo, uma vez que uma dessas não se enquadrava no critério de auto-atribuição de ancestralidade com comunidades quilombolas, enquanto que outras quatro haviam se fundido em duas.

3.2 Coleta de dados

A coleta dos dados teve início em julho de 2007 e foi concluída em janeiro de 2009. Foi empregado um formulário previamente testado em estudo piloto (Apêndice A). Os

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entrevistadores, alunos da graduação e do mestrado em nutrição, foram treinados em relação à condução da entrevista, aplicação do inquérito dietético, coleta das medidas antropométricas e a dosagem de hemoglobina.

Os dados foram coletados por meio de sistema de mutirão, após contato com os líderes comunitários e agentes de saúde da localidade, os quais mobilizavam e reuniam as famílias num espaço físico dentro da própria comunidade (escolas, centros comunitários, postos de saúde, dentre outros). Com relação às famílias que não aderiram a esse primeiro momento da coleta de dados, era realizada uma busca ativa, de modo que a entrevista era realizada a partir de visitas domiciliares. Tal procedimento garantia a cobertura de toda a população elegível (famílias com crianças de 13 a 59 meses) da respectiva comunidade.

O formulário aplicado ao entrevistado abrangia questões específicas, tais como a alimentação da criança, número de refeições, alimentos, preparações e quantidades consumidas, aspectos socioeconômicos da família, medidas antropométricas e aspectos de saúde da criança (Apêndice A).

Após a entrevista, foram realizadas as avaliações antropométricas e bioquímica (dosagem de hemoglobina) das crianças.

3.3 Critérios de inclusão e exclusão

O presente estudo teve como critério de inclusão uma criança na faixa de 13 a 59 meses, escolhida aleatoriamente em cada família participante. Optou-se investigar o consumo alimentar de apenas uma criança de cada família devido às características das comunidades com relação à alimentação, uma vez que o mesmo tipo de refeição é, geralmente, consumido por todas as crianças habitantes da mesma residência.

Quanto aos critérios de exclusão, não participaram do estudo as crianças cujos responsáveis não acompanharam sua alimentação no dia anterior ou aqueles que não tiveram

Referências

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