29637
__
entrechãos
O Rio de Janeiro conheceu o caso emblemático do Palácio Monroe,
desmontado pelos interesses políticos e econômicos de ocupar um valioso espaço da cidade. A mesma lógica promove a demolição ou a construção.
Se a cidade for usada para especulação, ela vai produzir vazios.
No Rio pós-demolição, um chafariz sem água é símbolo do vazio político.
No Buritis em cada construção, uma estrutura aparente é símbolo do vazio criativo do mercado imobiliário.
“Não me espanta a construção ou a demolição, mas que se perca essa consciência.” Margareth da Silva Pereira, em Crônica da DemoliçãoZ
__
entrechãos
__
3
29637
Como os arquitetos se posicionam no espaço do desperdício?
Acreditamos que o projeto é o nosso exercício crítico de construção da nossa própria humanidade
É uma ferramenta prática para perturbar o silêncio desse espaço “enterrado” debaixo do chão do condomínio.
O edifício construído na Rua Fidelis Martins 173 não esconde suas raízes.
Há um intervalo entre o edifício anterior e ele. De lá é possível imaginar como surgiu esta construção.
Havia um chão irregular e a possibilidade de se construir.
Edificações em encostas tem suas próprias qualidades espaciais a serem exploradas mas a demanda de rapidez criou a falta de tempo e investimento para uma outra solução. Resolveu-se rapidamente o problema do terreno, não da cidade.
Ficou um vazio entre o explorado e o não-explorado.
posicionamento
terreno
Palafita Esbelta, a palafita escolhida para a intervenção.
Propomos um acesso às bases do prédio,
onde a instalação convida à caminhada pelas sombras do chão do prédio e por entre a estrutura.
Aos lados deste caminho existem planos de tecido que criam um aspecto fantasmagórico em toda a estrutura onde acontecem as projeções. Essas projeções apresentarão
imagens demonstrando todas as possibilidades daquele espaço agora em descobrimento.
De longe essa instalação também é muito bem vista. Primeiramente pela posição privilegiada da palafita e
também pelo brilho das projeções e a cor vibrante da passarela e mirante. As pessoas podem subir até a base do prédio por essa rampa.
Em certo ponto é possível ver que ela dá acesso a um elevador que sobe até o mirante.
__
entrechãos
__
5
29637
Há projeções em tempo real da vista do mirante e de diversos modos de se fazer cidade.
Queremos aguçar a posição crítica do observador. Este, que veio pelo caminho de forma despretensiosa no desejo de uma ocupação criativa de um espaço que antes era vazio.
Ao acercar-se da palafita, descobre-se que as projeções são mais que uma luminosidade que chamam atenção. É também um suporte crítico ao modo de se fazer cidade no Brasil contemporâneo.
Ao longo do caminho, depois de as projeções estimularem o pensamento crítico, acontece uma quebra de continuidade. Esta continuidade para onde pode-se
observar, posicionar, sentir, pensar - não pôde ser feita ali.
Não nos espanta que haja impedimentos para esse caminho, mas que se desista de continuar a caminhada.
As pessoas vão poder subir até a base do prédio por uma rampa.
De longe é possível ver que essa rampa dá acesso a um elevador que sobe até a um mirante.
De longe essa instalação também é muito bem vista. Primeiramente pela posição privilegiada da palafita e também pelo brilho das projeções e a cor vibrante da passarela e mirante.
Vista da cidade de Belo Horizonte através do espaço entre a palafita escolhida e seu prédio vizinho
Imagens exemplo das projeções que se alternarão pelos tecidos instalados. A demolição do Palácio Monroe, mazelas da desigualdade social pelo mundo, movimentos sociais de auto gestão ou auto construção, realidade diária de trabalhadores da construção civil e exemplos reais de palafitas e formas de ocupação com pouco impacto natural (em sequência).
valor unit. Item r$118,00 r$1000,00 r$3540,00 r$5000,00 sobra de obras 30 5 r$500,00 1 r$500,00 r$12,00 16 r$192,00 r$200,00 8 r$1200,00 r$6000,00 1 r$6000,00 r$3000,00 r$3000,00 r$19832,00 1 quantidade total Acompanhamento de obra Mão de Obra Tinta Vermelha Vigotas
Parafusos, pregos e cordas Entulho Aluguel de projetores Tapume Tecido VALOR TOTAL: sobra de obras Há um monte de entulho de obras no meio do caminho. Deslocado do seu lugar e uso comuns, se torna um suporte instável para a continuação do deslocamento. Estes entulhos representam restos
de projetos que aconteceram, que não aconteceram, que podiam acontecer.
Não nos espanta o que aconteceu com esses projetos, mas que se perca a consciência de que também se faz cidade a partir de cada projeto.
O entulho está colocado na escada que leva ao elevador e impede o percurso, porém não interrompe ali a caminhada empírica do observador,.
Acreditamos que sua caminhada crítica
tenha sido aguçada pela intervenção e seja continuada no seu atravessamento pela cidade.
Não nos espanta não poder subir no elevador e ver a cidade pelo mirante, mas que se perca essa vontade de ver a cidade.
__
entrechãos
__
7
29637
Por fim, a intervenção interrompe o caminhante numa área de sombras. No entrechão do edifício e a natureza. Quem chega até ali ousa transitar por elas e participa da nossa investigação das sombras. Segundo Agambem,
“(...) contemporâneo é aquele que mantém fixo o olhar no seu tempo, para nele perceber não as luzes, mas o escuro. Todos os tempos são, para quem deles experimenta contemporaneidade, obscuros. Contemporâneo é, justamente, aquele que sabe ver essa obscuridade, que é capaz de escrever mergulhando a pena nas trevas do presente.”
Imagens exemplo da instalação ao longo do tempo.
Alternância de imagens projetadas
Ou seja, contemporâneo é, ainda segundo Agambem, como mergulhar nas trevas do presente e não se deixar cegar ou ficar perplexo com as luzes do progresso - ou da funcionalidade, como em Buritis.
Essas trevas são como zonas obscuras que não estão iluminadas pelo progresso e estas nos interpelam. Aqui, nossa resposta
são luzes das projeções que vêm das sombras. Nessa intervenção, mergulhamos nas sombras para nos colocar não apenas no espaço mas no presente.
__
entrechãos
__
9
29637
“E talvez nossa vida ainda seja comandada por um certo número de oposições nas quais não se pode tocar, as quais a instituição e a prática ainda não ousaram atacar: oposições que admitimos como inteiramente dadas; por exemplo,
entre o espaço privado e o espaço público, entre o espaço da familia e o espaço social, entre o espaço cultural e o espaço útil, entre o espaço de lazer e o de trabalho, [entre um chão e outro chão];
todos são ainda movidos por uma secreta sacralização.”
O habitante/visitante dessa intervenção pode ser como um arqueólogo.
Queremos possibilitar que o habitante escave seu caminho por entre essa estrutura metaforicamente enterrada debaixo do chão do prédio. Assim, enfatizar a escavação do que é possível no presente e, dessa maneira, fazer com que tanto o passado como o futuro,
tanto fragmentos como ruínas, possibilidades como perdas, ganhos como desperdícios possam ser trazidos para dar novos sentidos. O habitante pode escavar múltiplos tempos e espaços, e assim habitar e dessacralizar esse espaço,
trazendo-o para nosso tempo e espaço, para o contemporâneo.
Esse é um espaço em processo, que não queremos completar mas queremos continuar o seu processo e jogá-lo de volta para debate. Quantos “entres” nos interpelam para continuarmos seu processo?
Mais uma vez, não nos espanta esse espaço incompleto, mas que ele não seja alvo de debate e um lugar que afete nossos sentidos da maneira mais sensível ou inteligente.