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Palavras-chave: Convenção Consciente, espaço cênico, espaço meyerholdiano.

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O Espaço Meyerholdiano em “O Corno Magnífico” Rebeka Caroça Seixas

Professora do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – Campus João Câmara Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas – UFRN

Orientadora: Profª. Dr. Maria Helena Braga e Vaz da Costa Resumo:

Este artigo investiga a produção e a construção do espaço cênico no espetáculo O Corno Magnífico levado à cena por Meyerhold em 1922 no contexto da discussão sobre sua proposta do Teatro da Convenção Consciente. A pesquisa se desenvolve a partir da idéia da existência de um espaço de representação característico das encenações de Meyerhold que denominamos de “espaço meyerholdiano” e que possuem e desenvolvem elementos fundamentais à sua concepção como: “espaço vivo”, “imaginação criativa”, “máquina ferramenta”, teatralidade, estilização, “inteligência física”, “espaço gestual”, “performance visual” e “performance visceral”.

Palavras-chave: Convenção Consciente, espaço cênico, espaço meyerholdiano.

Texto Completo:

O espaço Meyerholdiano pode ser pensado e compreendido como sendo estruturado pelos seguintes elementos: “espaço vivo”, “imaginação criativa”, “máquina ferramenta”, teatralidade, estilização, “inteligência física”, espaço gestual, performance “visual” e “visceral”. Dito isto, verificaremos de que forma estes elementos estão presentes nos espetáculos dirigidos por Meyerhold ao longo de seu trabalho como encenador. A discussão se dará a partir do eixo gerado pelas imagens do espetáculo O Corno Magnífico, de Fernand Crommelinck, dirigido por Meyerhold em 1922. A escolha da referida peça se deve à relevância da montagem para o período, principalmente no que se refere à cenografia.

No texto denominado Cómo se Montó ‘El cornudo magnífico’ datado de 28 de setembro de 1926, Meyerhold descreve o processo de trabalho durante a montagem do espetáculo.

(…) nos quedamos sin la sala teatral y empezamos a pensar en un espectáculo sin escenario.

El trabajo de preparación influyó de forma decisiva sobre el carácter del espectáculo que estábamos organizando poco a poco. Siempre habíamos tenido poco dinero, pero en aquel momento no teníamos nada. Toda la puesta en escena de El cornudo magnífico vino a costar en moneda actual unos 200 rublos (…).

El espectáculo debía sentar las bases de una nueva técnica de interpretación en un nuevo ambiente escénico, rompiendo definitivamente con los bastidores y los decorados con puertas. Desde el primer momento, este nuevo principio tenía que dejar al desnudo todas las líneas de la construcción y llevar la esquematización a sus últimas consecuencias. Lo logramos plenamente. El éxito de este espectáculo era el éxito de la nueva

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concepción teatral que le había dado vida: hoy podemos decir que todo el “teatro de izquierdas”, no sólo empezó a desarrollarse a partir de este espectáculo, sino que aún conserva numerosos rasgos de su influencia (MEYERHOLD, 1992: 430-431).

Neste texto, percebe-se que Meyerhold se deparava não só com dificuldades financeiras para realizar a montagem do espetáculo, mas principalmente com a ausência de um espaço específico para a montagem de um cenário. Fica claro também que Meyerhold buscava com esta peça, revolucionar o teatro da época tanto no que se refere à interpretação dos atores, como na concepção cenográfica, na exploração do espaço.

A concepção do cenário de O Corno Magnífico foi de Liubov Popova, que criou uma estrutura adaptável a diferentes espaços: seja um espaço teatral tradicional, ou mesmo à rua, ou à praça.

Figura 01: Maquete para o cenário de O Corno Magnífico1

Como podemos observar na Figura 01 a estrutura cênica é composta por uma arquitetura de circunferências, linhas retas e diagonais, escadas que se configuram como elementos constantes nos cenários criados para as encenações dirigidas por Meyerhold nesse período. As escadas, por exemplo, compondo linhas diagonais acentuadas, exigiam do ator um equilíbrio para circular por essas estruturas. A máquina, tão utilizada nas fábricas pelos operários, ganhou a cena e passou a ser manipulada pelos atores com sua movimentação extracotidiana.

O espaço cênico criado por Meyerhold é um “espaço vivo”, usando a expressão de Appia, que seria “a vitória das formas corporais sobre as formas inanimadas”. O espaço meyerholdiano é um “espaço vivo” porque Meyerhold cria essas estruturas cenográficas não para um mero preenchimento do espaço ou um sentido decorativo, mas como uma estrutura que, ainda livre da presença do ator, produz uma sensação de movimento por suas figuras e

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Disponível em: www.digischool.nl/ckv2/moderne/moderne/inleiding_files/meyerhold.jpg - Acessado em 02/02/2009.

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elementos geométricos, que de certa maneira antecipam a expectativa de um movimento que só se concretiza enquanto tal a partir da interferência do ator no cenário.

Como o próprio nome explicita a “máquina ferramenta” de Meyerhold tem em seu nome um princípio de trabalho: as máquinas industriais, que apesar de serem criadas para o trabalho e de serem eficientes, não são autônomas, só entram em movimento a partir da intervenção do operário. No caso da “máquina ferramenta” meyerholdiana e do espaço meyerholdiano criado a partir de sua presença e função, esse operário é o ator, responsável por colocar em movimento a estrutura cênica criada e, portanto, por dar vida ao texto e aos elementos que são colocados em cena. Podemos afirmar então que o espaço cênico proposto por Meyerhold é um “espaço vivo”.

Não parece precipitado concluir, portanto, que um dos objetivos de Meyerhold seria despertar a “imaginação criativa” dos seus espectadores e para isso o encenador não “ilustrou” seus espetáculos com cenários naturalistas que oferecessem de forma direta o significado dos seus elementos, mas buscou ao contrário, “simbolizar”, “sintetizar”, “estilizar”, diversos significados através da criação de cenários que produzissem um espaço inovador, um espaço que, por suas características individuais e particulares, aqui se denominou de “espaço meyerholdiano”.

Para colocar em ação a “maquina ferramenta”, Meyerhold propõe ao ator um treinamento com a Biomecânica. O ator biomecânico, que é visto por Meyerhold como um “atleta da cena”, está preparado para, através de sua “inteligência física”, atuar no espaço, colocando em movimento essas estruturas e tornando simbólico o espaço concreto, ou seja, o ator, por meio da movimentação biomecânica, é levado a uma tomada de consciência de seu corpo e a partir disso, criam-se as condições para que o ator interaja de forma precisa com a estrutura cênica e, por conseguinte, influenciando e dinamizando essa mesma estrutura. O espaço proposto por Meyerhold, por ser sintético e estilizado, livra a cena de excessos e proporciona uma encenação mais aberta à circulação dos atores. Esse espaço, que se coloca a serviço do ator, tem como principal foco o seu corpo, criando também um “espaço gestual” que segundo Pavis (2005) é o espaço desenhado pela movimentação do ator.

O figurino criado para a encenação construtivista de Meyerhold vem reforçar a ideia de que se tem em cena uma “máquina” e que os personagens são operários que darão vida a essa estrutura. Os elementos cênicos utilizados tinham por objetivo sustentar uma renovação necessária à sociedade da época, assim pensava o encenador, e para tal precisava encontrar na arte uma linguagem que fosse capaz de expor os problemas sociais, e os posicionamentos críticos diante dos regimes políticos que dominavam a Rússia no período, e colocando em discussão os caminhos da sociedade e da cultura.

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No capítulo As potencialidades do espaço, do livro Espaço e Teatro: do Edifício Teatral à Cidade como Palco, escrito por Oddey e White (2008), os autores apontam para a visão do espaço como “performance visual”, citando O Corno Magnífico de Meyerhold, e sua cenografia como conclusiva. Segundo os autores:

O ponto de mudança do realismo convencional para o simbolismo e para outras tendências modernistas foi ainda mais enfatizado a partir da produção das cenas estilizadas por Meyerhold e Tairov, que mais tarde seriam chamados de construtivistas. Estas experiências exploraram a natureza do espaço cênico como performance visual e visceral, a partir dos talentos das cenógrafas Liubov Popova e Varvara Stepanova (Catalogue, 1979) (2008: 146-147).

A utilização do espaço cênico proposto pelas cenógrafas, Popova e Stepanova, deveria, como especificado anteriormente, criar uma estrutura que pudesse funcionar em qualquer espaço, inclusive nos espaços urbanos. A “performance visual” e “visceral”, produzida por esse tipo de estrutura, pode ser definida a partir da experiência do público ao entrar em contato com o espaço vivenciando-o – no caso proposto pelo espetáculo de Meyerhold, sentir-se parte dele –, estando também em contato mais direto e próximo aos atores, de maneira a aflorar os seus sentidos.

A máquina cênica de Meyerhold ganha ainda proporções novas através do emprego da luz sobre a estrutura, ampliando desta forma não só o cenário como a própria figura do ator e criando novos e suplementares efeitos de luz e sombra no palco e, por conseguinte, um novo efeito no que toca ao movimento do ator, da cena, do cenário.

A teatralidade proposta por Meyerhold ganha a cena a partir de sua inovadora visão do espaço e dos elementos que são levados à cena. O encenador russo usou das tecnologias da cena para criar uma teatralidade inspirada no teatro antigo, e as suas estruturas cênicas tornam o espaço cênico meyerholdiano um espaço teatralizado, composto por elementos de ruptura para sua época. Nisso consiste a grande contribuição das pesquisas de Meyerhold: levar à cena uma nova visão de mundo dentro da perspectiva da industrialização, criar uma arquitetura cênica, uma “maquina ferramenta” capaz de fazer com que a platéia juntamente com o ator trabalhe sua imaginação.

Pode-se concluir que o “espaço vivo”, a “imaginação criativa”, a “máquina ferramenta”, a teatralidade, a estilização, a “inteligência física”, o “espaço gestual”, a performance “visual” e “visceral”, são componentes primordiais e atuantes na composição e construção do espaço meyerholdiano que se constitui enquanto espaço de representação. Ao pensar sobre o trabalho de Meyerhold e analisar os elementos elencados percebe-se que eles não se referem somente à prática do ator ou do diretor, mas se relacionam com todos os elementos que constituem a prática teatral. As inovações que Meyerhold traz para

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a cena vão exercer assim influências definitivas no teatro contemporâneo, fazendo com que cada vez mais o espetáculo seja pensado como um processo que inclui diferentes níveis de compreensão e percepção.

REFERÊNCIAS

BOGATYREV, Petr. “Os signos do teatro” (p.71/91). In: GUINSBURG, J. COELHO NETO, J. Teixeira & CARDOSO, Reni Chaves (Orgs). Semiologia do Teatro: São Paulo: Perspectiva, 2006.

CARDOSO, Ricardo José Brügger. Espaço e teatro: do edifício teatral à cidade como palco. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2008.

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CAVALIERE, Arlete; VÁSSINA, Elena; SILVA, Noé (Org.). Tipologia do simbolismo nas culturas russa e ocidental. São Paulo: Humanitas, 2005.

COSTA, Maria Helena B. V. “Imagens e narrativas contemporâneas: a questão da espetacularidade no cinema” (p. 98/114). Cultura visual. EBA – UFBA, n°. 06, 2005.

GOMES, Máximo José. Espaço cênico: representação simbólica e pós-modernidade. Dissertação de Mestrado. Universidade do Estado de Santa Catarina. Santa Catarina, 2004. ______. Stanislávski, Meyerhold & Cia. São Paulo: Perspectiva, 2001.

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PAVIS, Patrice. A análise dos espetáculos: teatro, mímica, dança, dança-teatro, cinema. São Paulo: Perspectiva, 2005.

PICON-VALLIN, Béatrice. A arte do teatro: entre tradição e vanguarda. Rio de Janeiro: Teatro do Pequeno Gesto, 2006.

______. A cena em ensaios. Seleção e organização Béatrice Picon-Vallin e Fátima Saadi. Tradução Fátima Saadi, Cláudia Fares e Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, 2008.

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