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As diferentes abordagens do conteúdo de Cinem ática nos livros didácticos do ensino de Ciências brasileiro ( )

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Academic year: 2021

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As dife r e n t e s a bor da ge n s do con t e ú do de Cin e m á t ica

n os livr os didá ct icos do e nsin o de Ciê n cia s br a sile ir o

( 1 8 1 0 - 1 9 3 0 )

Robe r t o B. N icioli Ju n ior1 e Cr ist ia n o Rodr igu e s de M a t t os2

I nst itut o de Física. Universidade de São Paulo. Brasil. E- m ails: robnj @if.usp.br; m attos@if.usp.br

Re su m o: Est e t rabalho t em o obj et ivo m ost rar com o o cont eúdo de

Cinem át ica foi abordado ao longo do século XI X at é a década de 1930. Destacam os t am bém que alguns livros est rangeiros t iveram grande influência no ensino de Física brasileiro, um a vez que no início do século XI X não exist iam aut ores de livros didát icos nacionais nest a disciplina. Esse fenôm eno não ocorreu apenas no Brasil, um a vez que os m esm os livros t am bém foram referência em out ros países. Salient am os m om ent os im port ant es com o no m eio do século XI X, quando aparece um a ênfase de carát er experim ental nos livros didát icos de Física, e em part icular no cont eúdo de cinem át ica. Tam bém abordarem os alguns m om ent os históricos que influenciaram o cenário educacional brasileiro e que contribuíram , principalm ente no início do século XX, para que out ros livros didát icos est rangeiros e com diferentes abordagens fossem selecionados. Dessa form a, fundam ent am os as principais m udanças ocorridas nos livros didát icos, o que nos aj uda a com preender, por exem plo, porque a Cinem át ica t eve um a abordagem reduzida no início do século XI X, assim com o, quais as m udanças sofridas por esse cont eúdo ao longo do t em po para que adquirisse a form a algebrizada e t radicional da qual apresent a t raços at é hoj e.

Pa la v r a s ch a ve : Livro didát ico física, disciplina, currículo e ensino de

ciências.

Tit le : The different approaches of kinem at ics cont ent s in t ext books of

Brazilian science t eaching ( 1810- 1930) .

Abst r a ct : The m ain obj ect ive of t his work is t o show how w ere present ed

t he cont ent s of Kinem at ics in Science t ext books in Brazil during t he 19t h cent ury unt il t he decade of 1930. We point out t hat som e foreign t ext books had great influence in t he Brazilian Physics t eaching, once in t he beginning of t he 19t h cent ury t here are no Brazilian Physics t ext books aut hors. Therefore, t his phenom enon did not happen only in Brazil, once t he sam e t ext books were references in ot her count ries. We also showed som e reasons t hat , in t he m iddle of t he 19t h cent ury, t he em phasis in t he experim ent al charact er appeared in Physics t ext books, especially in t he kinem at ics cont ent . Therefore, we based how t ext book changes happened. We will also present som e historical m om ent s t hat influenced Brazilian educat ion scenario, and

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cont ributed t o the select ion of foreign Physics text books with different approaches, m ainly in t he beginning of t he 20t h cent ury. I t helps us t o understand, for instance, why Kinem at ics has been overlooked in t he beginning of t he 19t h cent ury, and which changes it suffered along t im e t o acquire an algebrized and t radit ional form which appears unt il our days.

Ke y w or ds: Physics t ext book, discipline, curriculum , science educat ion. I n t r odu çã o

O século XI X e início do século XX foi um período m uito im portante para o ensino brasileiro, principalm ent e com relação aos livros didát icos. No Brasil, a publicação dos prim eiros livros didát icos foi com a inst alação da I m prensa Régia em 1810. Ant es disso, para o ensino elem ent ar, por exem plo, observa-se que “ o abandono em que perm aneceu a escola elem ent ar no país, do Descobrim ent o ao I m pério, e os obj et ivos ext rem am ent e m odest os dest a, lim it ada à sim ples alfabet ização e os rudim ent os da aritm ét ica, perm it em supor que, de m odo geral, o ensino elem ent ar do Brasil foi um ensino sem livro, durant e t rês séculos e m eio de hist ória” ( Pfrom m Net o, 2004, p. 169) .

A I m prensa Régia foi o m arco inicial da produção didát ica brasileira que, desde ent ão, cresceu exageradam ent e gerando discussões sobre sua im port ância econôm ica e sobre o papel do Est ado com o agent e cont rolador e consum idor dessa produção ( Bit t encourt , 2003) .

Em sua história, o livro didát ico, sem pre est eve diret am ent e ligado aos seus aut ores que, em sua grande m aioria, sem pre seguiam os program as oficiais propost os pelas polít icas educacionais. “ Os conflit os, t ensões, acordos, discrim inações, sat isfações, fazem part e da hist ória dos aut ores dos livros...” ( Bit t encourt , 2004, p. 479) .

Por exem plo, no início do século XI X o currículo nacional era predom inant em ent e hum aníst ico não dando espaço para disciplinas de carát er cient ífico. Disciplinas com o retórica, línguas, filosofias etc tinham com o função desenvolver o int electo dos indivíduos a fim de capacitá- los para o ensino superior dando ao ensino secundário um carát er propedêut ico. Disciplinas de carát er cient ífico não t inham um a função nesse processo ficando prat icam ent e excluídas do currículo. Dessa form a, o currículo t inha um enfoque “ em t ext os de longa t radição e sobre a língua necessária à com unicação, à persuasão, suport e indispensável, at é m esm o consubst ancial, do pensam ent o. A língua int egra o indivíduo em um a elite, em um a nação, em um a cult ura, que ele part ilha ao m esm o t em po com seus ancest rais e com seus cont em porâneos” ( Chervel, 1999, p. 149) .

Essa exclusividade das disciplinas hum anist as era im post a pelo sist em a de adm issão ao ensino superior no Brasil cham ado preparat ório. Esses preparatórios eram os cert ificados exigidos para o ingresso no ensino superior sendo com post o por disciplinas de carát er hum aníst ico. Vale lem brar t am bém que nessa época não era necessária a form ação de pessoas para o desenvolvim ent o t ecnológico do país, j á que a m ão- de- obra era

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exclusivam ent e escrava sendo desnecessário qualquer avanço cient ífico ( Haidar, 1972) . Livros didát icos desse período, com o verem os, apresent am um a abordagem descrit iva dos conceit os de Física baseados em exem plos hipot ét icos sem vínculos com o cot idiano.

No final do século XI X inúm eros acont ecim entos hist óricos aj udaram no desenvolvim ent o cient ífico. A abolição da escravat ura, a chegada de grande cont ingent e de im igrant es e a experiência de um novo regim e polít ico ( República) acont eceram exat am ent e na época do prim eiro surt o indust rial. “ O increm ent o da industrialização, a crescent e urbanização e a int rodução de um cont ingent e cada vez m aior de est rat os m édios e populares vão result ar na t ransform ação da dem anda social pela educação, que organizada em dist int os m ovim ent os polít icos, reclam a a organização de um sist em a nacional de ensino” ( Oliveira, 2007) .

Com o m ercado necessitando de pessoas com conhecim ent o cient ífico para as novas t ecnologias, os est udos cient íficos passaram a fazer part e da form ação do est udant e secundarist a brasileiro. Além disso, o enfoque passou da ret órica e escrita para a observação, fat o que é cont em plado no currículo científico. Verem os m ais adiante que os livros didát icos do final do século XI X apresent am um a Física baseada em experim ent os para a explicação dos fenôm enos nat urais. Carreiras com o a dos engenheiros e dos m édicos ganham ascensão e adept os ent re os est udant es. Essas m udanças são visivelm ent e observadas quando se est uda a hist ória da disciplina Física, ênfase que não será dada nest e art igo, um a vez que j á foi realizado em out ro t rabalho ( Nicioli & Mattos, 2007) .

Evident em ent e essas variações est ão relacionadas com os m om ent os históricos descrit os acim a e que influenciaram os livros didát icos, um a vez que serviam ( e servem ) com o principal instrum ent o de apoio nas salas de aula. Durant e nossa análise farem os algum as referências a esses m om ent os com o int uito de cont ext ualizar os result ados obt idos.

D e se n h o da pe squ isa

Para realizar a busca dos livros fizem os um levant am ent o no banco de dados LI VRES ( Livros Escolares) criado pelo Proj et o t em át ico “ Educação e Mem ória: Organização de acervos de livros didát icos” financiado pela Fundação de Am paro à Pesquisa ( FAPESP) .

Nosso levant am ent o se est endeu em out ros sist em as de busca, com o a base de dados DEDALUS da Universidade de São Paulo e a base de dados MI NERVA da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Todos os livros didát icos levant ados se encont ram nas seguint es bibliot ecas: Bibliot eca do Livro Didát ico da Faculdade de Educação da USP; Bibliot eca Paulo Bourroul da Faculdade de Educação da USP; Bibliot eca da Escola Polit écnica da USP; Bibliot eca do I nst ituto de Física da USP; Bibliot eca Nacional do Rio de Janeiro; Bibliot eca do Colégio Pedro I I do Rio de Janeiro; Bibliot eca da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ao t odo foram selecionados 28 livros didát icos. Para esse art igo,

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devido à quant idade de livros, se t orna inviável cit ar o cont eúdo de t odos, port ant o, selecionam os os exem plos m ais clássicos de alguns livros com o exem plos, j á que seguem , em alguns casos, o m esm o padrão na exposição dos cont eúdos.

Com o querem os caract erizar a hist ória do cont eúdo de Cinem át ica, nada m ais coerent e do que elencarm os t odas as variáveis assum idas, ident ificando os cont eúdos que exist iram e exist em , além de com o se est rut uravam e se faziam part e da Cinem át ica. Dessa form a, consideram os os seguint es cont eúdos que foram abordados pelos livros aqui analisados: Mobilidade; Fundam ent os da Cinem át ica ( Pont o Mat erial, Corpo Ext enso, Referencial, t raj et ória, Repouso e Movim ent o) ; Movim ent o Uniform e; Movim ent o Uniform em ente Variado; Cinem ática Vetorial ( hodógrafo) ; Queda livre; Movim ent o Circular; Com posição de Movim ent os; Lançam ent o de Proj ét eis.

An á lise e r e su lt a dos

Nesse t rabalho, ident ificam os quat ro m om ent os dist int os para a descrição do cont eúdo de Cinem át ica. No prim eiro, a abordagem do cont eúdo foi “ descrit iva” , baseada na Filosofia Nat ural, e os fenôm enos nat urais t inham com o responsável o “ Ent e Suprem o” . Na m et ade do século XI X t em os o segundo m om ent o no qual a descrição ainda est á present e, porém baseada em aparelhos ou aparat os físicos, ao qual nom eam os com o “ descrit iva-experim ental” . É t am bém , no segundo m om ent o, que pudem os ident ificar os “ agent es físicos” com o os regent es pelos fenôm enos nat urais. O t erceiro m om ent o é m arcado pela abordagem “ dem onst rat iva- experim ent al” , pois passa da descrição para a dem onst ração algébrica dos conceit os, porém ainda com experim ent os, est am os na virada do século. Por últ im o, nas prim eiras décadas do século XX, t em os a “ algebrização” do cont eúdo, m om ent o que são dispensados os experim entos e as figuras, sendo subst it uídos por sit uações hipot ét icas e as explicações cient íficas baseiam - se na razão. A seguir, farem os um a descrição dos quat ro m om ent os exem plificando- os por m eio dos livros didát icos.

A Física descrit iva e a Filosofia do m ovim ent o

Nos prim órdios das descrições dos fenôm enos da nat ureza as explicações sem pre est iveram apoiadas na Filosofia. É a part ir do século XVI e XVI I que acont eceram as prim eiras revoluções cient íficas. Ant es disso predom inava a visão arist ot élica que t inha com o base um a explicação divina, ou sej a, relacionada com o poder religioso. Com as novas descrições sobre os fenôm enos nat urais, se produzem um contrast e ent re o pensam ent o m edieval e o pensam ent o m oderno. I nicia- se um m ovim ento para um a descrição da nat ureza baseada na m at em át ica, o que “ para Mario Shenberg, se inicia com o desenvolvim ent o da geom et ria ( ...) “ o ram o m ais ant igo da Física” , quando at ribui às observações dos astros o pont o de part ida da Cinem át ica, ent endida com o a com binação ent re as idéias geom ét ricas e o conceit o de t em po” ( Wuo, 2003) .

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Ent re aqueles que realizaram pesquisas sobre os fenôm enos nat urais a carreira de cient ist a não exist ia at é o século XVI I , sendo cit ados com o filósofos da nat ureza. Os conceit os est avam ligados à Filosofia Nat ural quando se referiam à nat ureza com o um t odo e à Filosofia Experim ent al quando se referiam aos aspectos experim ent ais da ciência. Por exem plo, livros com o de Et ienne Barruel ( 1798) int it ulado “ La physique réeduit e en t ableaux raisonnés ou program m e du cours de physique fait à l’École Polyt echnique” t rat avam som ent e dos conceit os de Física, sem nenhum a aplicabilidade real ou relação com experim ent ação. Com post o de quarent a e t rês páginas, sendo as cinco prim eiras de apresent ação do livro e as t rint a oit o rest ant es em quadros, apresent a o cont eúdo em folhas dobradas devido ao t am anho ( Sam paio, 2004) . Esse livro foi recom endado pelo Minist ro Bernardo de Vasconcelos e t raduzido pelo Cônego Francisco Vieira Goulart ( Sam paio, 2004) .

No prefácio o aut or m ostra que m uitas part es da ciência est avam sendo desvendadas e “ dent ro da ordem m et ódica que adotei, creio que um a ciência que, em geral, tem por obj eto as propriedades dos corpos, é obrigada a criar alguns nom es que não exist em dent ro da m esm a ( …) ” ( Barruel, 1798, p. 2 apud Sam paio, 2004, p. 45) . Sobre o cont eúdo de Cinem át ica, é cit ada som ent e a definição de m obilidade. Segundo Barruel ( 1798) a m obilidade é um a das propriedades constantes e essenciais, sem as quais é im possível conceber a exist ência de algum corpo. Sendo assim , o aut or classifica a m obilidade com o “ a propriedade em virt ude da qual os corpos podem t rocar de lugar no espaço” ( Barruel, 1798, p. VI apud Sam paio, 2004, p. 23) .

Por m eio de novos conceit os as observações e as explicações da nat ureza est avam m udando drast icam ent e. Por exem plo, a lei da inércia, t eoria consolidada no século XVI I , t rocou um m undo governado por espírit os sut is, por out ro preciso, com o um m ecanism o art iculado ( Gonzáles, 2000) . Porém não abandonaram a crença a um Deus, passando de um Deus geom et ra para um Deus reloj oeiro. Ainda no século XI X vem os a necessidade de um a crença divina para a explicação dos conceit os, com o no livro didát ico “ Trat ado Elem ent ar de Physica” do Abade René J. Haüy de 1810 quando o aut or salient a que a “ Physica t em por obj et o o conhecim ent o dos phenom enos da nat ureza. Na produção dest es phenom enos, os corpos m anifest ão diversas propriedades, cuj o est udo deve part icularm ent e excit ar nossa at enção; e indagando as leis est abelecidas pelo Ent e Suprem o para regular o exercício destas m esm as propriedades, he que nos elevam os at é as t heorias que servem de ligar os factos ent re si, e de m ost rar- nos sua m ut ua dependência” ( Haüy, 1810, p. 27) .

Na verdade at é a prim eira m et ade do século XI X as explicações dos fenôm enos nat urais t inham um a alusão a Deus com o criador e proveniente do m undo, m ostrando a fort e base dessa explicação e que se dem orou a aceit ar as novas idéias. Gonzáles ( 2000) , ao t rat ar do ensino de Física na Espanha, m ostra que os livros do com eço do século XI X tam bém tinham com o referência um a m anifest ação divina na regência das leis nat urais. No caso do livro “ Trat ado de Física Com plet o y Elem ent al present ado baj o un nuevo orden com los descubrim ient os m odernos” de Libes, A. ( 1818) “ o Criador est abelecendo essas leis [ nat urais] , as cobriu com um véu im penet rável, para gozar de um

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privilégio exclusivo de conhecer a cadeia int eira do que foram os prim eiros elos. O físico sem pre prevenido cont ra os deslizes de um a im aginação exaltada, sábio e at ento respeita essa sagrada barreira” ( Libes, 1818, p. 12 apud Gonzáles, 2000, p. 61) .

As novas t eorias do século XVI e XVI I , baseadas em experim ent os e elaboradas art ificialm ent e, t inham com o int uito falsear as ant igas t eorias arist ot élicas. Dessa form a cria- se um a revolução cient ífica um a vez que o espaço ent re a t eoria para a explicação da nat ureza que exist ia e a recém descobert a era m uit o grande, “ concret am ent e os fundam ent os da Física m oderna se assent am na: revisão conceit ual dos ant igos; um a nova m et odologia; e o uso de instrum ent os de observação e m edida” ( Gonzáles, 2000, p. 56) .

Outra variável que revolucionou o conhecim ento científico foi a de tem po. Sua consideração com o variável no cálculo infinit esim al por Newt on e Leibniz int roduziu a relação de função para descrever os fenôm enos. Além da experim entação e m at em at ização out ro fat or que cont ribuiu para o desenvolvim ent o de um a revolução cient ífica foram os m odelos físicos que, favorecidos pela abstração m at em át ica, aum ent aram a possibilidade de calcular em função de hipot ét icas m anifest ações nat urais ( Gonzáles, 2000) . Por últ im o, a const rução de instrum ent os cient íficos aj udou na obj et ividade da at ividade cient ífica para que explicasse com cada vez m ais det alhes a realidade nat ural.

I sso levou os est udos para que prim eiro fossem realizados em fat os isolados para depois relacioná- los a fat os m ais gerais ( teorias globais e unit árias) . Na int rodução do livro de Haüy ( 1810) , vem os m ais claram ent e essa idéia quando o aut or dest aca que “ o fim de hum a t heoria eh ligar a hum fact o geral ou ao m enor núm ero possível de fact os geraes, t odos os factos part iculares que delles dependem . A indagação dos fact os t em sido sem pre nossos prim eiros passos das sciências” ( Haüy, 1810, p. VI I ) .

Esse livro é um a herança clara da Filosofia Nat ural, pois era onde se t entava m ost rar que a ast ronom ia e a m at em át ica t inham um valor im port ant e por m eio de t al filosofia e que “ nada m ais era do que out ra form a de designar a ‘física’” ( Valent e, 1997, p. 17) . Esses conceit os eram t rabalhados de form a descrit iva com o, por exem plo, no livro de Haüy ( 1810) no qual a Mobilidade é descrit a pela filosofia do m ovim ent o:

“ I I . Da Mobilidade ( ...)

XI I I . A m obilidade he aquela faculdade que hum corpo t em de poder ser t ransport ado de hum para out ro lugar. Est e est ado se cham a m ovim ent o suppõe a ação de hum a cauza a que se deu o nom e de força ou pot ência. Para que est a causa exista não he precizo que o corpo que ella solicit a t enha um m ovim ent o real. Dest e m odo quando dois corpos se equilibrão nas duas ext rem idades da alavanca de hum a balança, elles conservão est e est ado por m eio de forças realm ente existentes, m as que seus

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effeit os se dest roem m ut uam ent e, ou se lim it ão produzir nos corpos hum a t endência a m over- se.

XI V. O m ovim ento he uniform e, quando o m óvel corre sem pre o m esm o espaço no m esm o t em po; he acelerado ou ret ardado, quando o m óvel corre, em t em pos iguais, espaços que vão sucessivam ent e augm ent ando ou dim inuindo” . ( Haüy, 1810, p. 31 e 32)

Quando o aut or t rata dos conceit os de velocidade m ais especificam ent e ut iliza- se apenas de um a aritm ét ica sim ples:

“ Da velocidade ( ...)

Dividindo o núm ero que reprezent a o espaço pelo qual reprezent a o t em po, t em - se a velocidade de cada corpo. Suppondo- se, por exem plo, que hum dos corpos t em corrido 35 m et ros em 7 segundos, e o out ro 24 m et ros em 6 segundos a velocidade do prim eiro será 35/ 7 e a do segundo 24/ 6 ...” . ( Haüy, 1810, p. 33)

Para o m ovim ent o uniform em ent e variado o aut or t am bém ut iliza da descrição:

“ Suppondo- se agora o t riângulo s e b subdividido por m uit as linhas com prehendidas ent re segh, eil, il e kn, et c est as linhas, part indo do pont o s, represent arão as velocidades durant e os inst ant es sucessivos infinit am ent e pequenos que com põe os t em pos represent ados por sh, sl, sn, et c ( ...) Sendo assim he fácil obt er- se a razão que seguem os espaços corridos em differentes t em pos consecutivos iguais ent re si; porque se designam os o prim eiro dest es espaços pela unidade, he bem claro que os seguint es seguirão represent ados pela diferença ent re os t erm os das séries 1, 4, 9, 16, 25, et c que designão os espaços, desde a origem dos m ovim ent os. Logo os espaços corridos em t em pos iguais e consecut ivos, cont endo dest a m esm a origem , est arão ent re si com o os núm eros im pares 1, 3, 5, 7, etc ent re os quaes t odos os seguem os prim eiros dão as diferenças do que se t rat a” . ( Haüy, 1810, p. 44 e 45)

As figuras apresent adas est ão no final do livro o que, evident em ent e, se deve às lim it ações gráficas da época, sendo t odo o corpo do t ext o descrit ivo, apresent ando em alguns m om ent os exem plos num éricos com o os cit ados ant eriorm ent e. As lust rações são figuras geom ét ricas no qual o aut or ut iliza para fazer as descrições. Bit t encourt ( 2004) ainda salienta que as lim it ações nesse período eram m aiores. Por exem plo, o preço do papel e da t int a no Brasil era m uit o caro fazendo com que m uit os aut ores opt assem pela im pressão na Europa. I sso favoreceu, em especial, as m arcas editoriais francesas e port uguesas para que fossem adot adas no ensino brasileiro.

Pelas nossas análises podem os perceber que esse t ipo de descrição se est endeu por várias décadas. Por exem plo, t em os o livro “ Lições Elem ent ares de Physica” de Saturnino de Meirelles de 1856. Dr. Meirelles foi “ m édico, colaborador da Gazet a do I nst it ut o Hahneum anianno e aut or de vários t rat ados sobre m edicina hom eopát ica, gases e vapores” ( Lorenz, 1984, p. 429) . Muit o

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provavelm ent e est e livro t enha sido usado pelos alunos com o um a form a de est udo das lições, j á que foi escrit o pelo único professor de Física no Colégio Pedro I I e cit ado no program a curricular do Colégio Pedro I I com o livro adot ado ( Vechia & Lorenz, 1998) . Além disso, na sua capa encont ram os a ressalva: “ para uso de seus discípulos do Colégio Pedro I I ” ( Meirelles, 1856, p. 1 apud Sam paio, 2004, p. 58) .

De acordo com o program a do Colégio Pedro I I esse livro foi o prim eiro adot ado de um aut or brasileiro. Nesse livro o cont eúdo é t rat ado em lições que são descrições dos conceit os das part es const it uint es da Física ( Sam paio, 2004) . Out ro livro que analisam os que apresent a esse t ipo de abordagem descrit iva é “ Novos Elem ent os de Quím ica Teórica e Prát ica” de Guerin- Varry de 1840. Com o o próprio t ít ulo indica, o livro t rat a dos conceit os de Quím ica, m as “ os alunos não t endo, ordinariam ent e, nenhum a noção de Física, quando chegam aos est udos da Quím ica, eu coloquei no com eço dessa obra aqueles que são indispensáveis à com preensão dos fenôm enos quím icos” ( Guerin-Varry, 1840, p. 2) .

Na prim eira lição se percebe quais são os critérios de abrangência dos est udos da Física para o aut or. Percebem os t am bém que a explicação dos fenôm enos físicos desloca- se do “ Ent e Suprem o” cit ado por Haüy ( 1810) para os Agentes Físicos, pois “ a physica he a sciencia que tem por obj eto o estudo dos phenom enos que apresent ão os corpos, em quant o est es não experim então m udanças em sua com posição. Cham a- se Phenom enos physicos t oda alt eração produzida em hum corpo, sem m udança em sua com posição. Exem plo: A queda de hum corpo, a produção de hum som .” ( ...) As causas product oras dos phenom enos que apresent ão os corpos são os Agent es Physicos. Est es agent es são a at t racção universal, o calorico, a luz, o m agnet ism o, a elet ricidade” ( Meirelles, 1856, p. 1 apud Sam paio, 2004, p. 58) .

Out ro livro que explica os fenôm enos nat urais dessa m esm a form a é “ Noções de Physica e Chim ica” de Ayres Albuquerque Gam a de 1876. Para Ayres Albuquerque Gam a ( 1876) “ a sciencia t em por obj ect o o est udo das propriedades geraes dos corpos, e das m odificações passageiras que elles soffrem , sob a influência dos grandes agent es nat uraes. Esses agent es são: a at t racção, o calor, a elet ricidade, o m agnetism o, o som e a luz. A physica occupa- se unicam ente das propriedades exteriores e apreciáveis ( organolept icas) dos corpos; sem penetrar, com o faz a chim ica, no interior de sua constit uição m olecular” ( Gam a, 1876, p. 9) .

No livro “ Curso de Physica Elem ent ar” de Joaquim Rodrigues Guedes ( 1868) , por exem plo, podem os perceber a presença das duas figuras. Sobre o personagem divino o aut or destaca que “ o conj unt o de t odos os seres creados por Deus form a o Universo. Os principaes d’est es seres são os ast ros ( ...) e a Terra com t odos os ent es racionais e irracionais, sensíveis e insensíveis que a povoam ou ent ram na sua const it uição” ( Guedes, 1868, p.1) e sobre os agent es nat urais ressalt a que “ pondo de part e os phenom enos que se referem a vida, e que cuj o est udo pert ence à História Nat ural, as causas prim árias ou

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agent es nat uraes são apenas a gravitação ou at t ração m út ua dos different es corpos, e a origem dos phenom enos lum inosos, caloríficos, elect ricos e m agnét icos” ( Guedes, 1868, p. 4) .

Segundo Gonzáles ( 2000) houve um m ovim ento cient ífico nas décadas de 1850 e 1860 na Espanha para que as ant igas idéias que explicavam os fenôm enos nat urais por m eio de Deus fossem m odificadas para a hipót ese dos fluídos im ponderáveis, cham ados de Agent es Físicos. “ Essa versão m ecanicist a dos fenôm enos era um sint om a da m odernidade int roduzida na Espanha pela via dos program as e t ext os franceses principalm ent e” . Com o j á destacam os, o ensino brasileiro est eve fort em ent e apoiado no esquem a editorial francês, sendo reflet idas m uit as dessas m odernidades em nosso ensino.

Sobre o cont eúdo de Cinem át ica, o livro de Gam a ( 1876) t rat a dos conceit os de m ovim ent o at ravés da descrição, sem nenhum a fórm ula ou expressão m at em át ica:

“ Quer rect ilineo, quer curvilíneo, o m ovim ent o se diz uniform e ou variado, segundo percorre ou não, em t em pos iguaes, espaços t am bém iguaes. A serie de posições que o m óvel vai sucessivam ente occupando em seu m ovim ent o cosnt it ue a t raj ect oria do m óvel.

No m ovim ent o curvilíneo de um corpo exerce elle cont inuam ent e sobre a curva um a reacção que t ende a afast al- o na direção do raio; é o que se cham a de força cent rífuga, e se o corpo não est iver subm et t ido a out ra acção, essa força é direct am ent e oppost a á força cent rípet a ou product ora da inflexão da t raj ect ória” . ( Gam a, 1876, p. 15)

A part ir da segunda m et ade do século XI X os livros didát icos com eçam a apresent ar um a nova form a de expor seus cont eúdos. I sso se deve ao fat o de que na época “ a at enção est á m ais cent rada na elet ricidade, m agnet ism o, acúst ica e ót ica, cam pos que est avam “ na ordem do dia” da pesquisa e nest e sent ido os livros enfat izavam um carát er de at ualização para o ensino cient ífico da época” ( Wuo, 2003) .

Um a cit ação curiosa sobre isso foi encont rada no prefácio do livro de Guedes ( 1868) . Devido Guedes t er falecido ant es da publicação de sua obra, out ra pessoa ( não ident ificada) escreveu seu prefácio fazendo alguns com ent ários sobre o livro. Sobre a adequação do livro às inovações t ecnológicas da época com ent a- se que “ pareceu t am bém convenient e ao aut or, at t endendo ao progressivo desenvolvim ent o da physica e á applicação quot idiana que se faz dos princípios d’est a sciencia, t rat ar m ais det idam ent e de algum as m at érias cuj a im port ância est a acim a de t oda duvida, e t aes com o a barom et ria, t herm om et ria, aerom et ria, hygrom et ria e m et eorologia, e de out ras que se t êem t ornado, por assim dizer, populares, com o são, por exem plo, a phot ografia, as m achinas de vapor, a galvanoplast ia e a t elegraphia elect rica” ( Guedes, 1868, p.VI ) . As m odernidades cient íficas est avam sendo int roduzidas no cot idiano das pessoas nessa época e com preendê- las era im port ant e. I sso fez com que os livros de ciências, principalm ent e os de Física, assum issem

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esse papel adquirindo um a form a enciclopédica do conhecim ent o. No próxim o tópico farem os um a discussão dessa nova m etodologia.

As inovações nos livros didát icos de Física

A part ir da segunda m et ade do século XI X a abordagem dos livros didát icos expõe um a nova m et odologia na abordagem da ciência. Essa m udança observa- se claram ent e nos livros port ugueses e franceses que eram adot ados para com por o ensino brasileiro. Percebem os nesses livros que a Física at é ent ão descrit iva, agora cont ém fórm ulas do m ovim ent o, figuras de aparelhos e aparat os físicos.

Os livros est rangeiros est avam se adequando à nova visão posit ivista da ciência e assim , “ o cont eúdo deixa de oferecer os elem ent os filosóficos e históricos que t raduzem os em bat es em t orno dos conceit os e t eorias, e passa a analisar equipam ent os fot ográficos, fonógrafos, t elégrafos, t elefones, m icrofones, inst rum ent os de m et eorologia e clim at ologia, bom bas hidráulicas, m ot ores, geradores etc” ( Wuo, 2003) .

Dest acam os com o um dos idealizadores dessa nova abordagem experim ental os livros do aut or Adolf Ganot que foi referência no Brasil e em diversos países com o Uruguai, Espanha, México, Alem anha, Espanha ent re out ros ( Gonzáles, 2000; Parella, 2005) . Ganot foi dout or em ciências físicas, diret or de est udos do laborat ório de pesquisas físicas da escola prát ica de Haut es Ét udes e foi bacharel em m at em át ica e filosofia e professor de m at em át ica e ciências físicas e nat urais. Seu livro “ Trait é Élém ent aire de Physique” foi considerado com o um verdadeiro best seller e foi “ publicado em 1851 e t rês anos m ais t arde foi am pliado passando a incluir conceit os de m et eorologia. O novo t ext o agora int it ulado “ Trait é élém ent aire de Physique experim entale et appliqueé et de m ét éorologie” ( 1851) t eve dezoit o reedições at é o final do século. A 17ª edição foi m uito im port ant e, visto que inclui experiências prát icas e inform ações sobre os m at eriais e instrum ent os necessários para o desenvolvim ent o das m esm as...” grifos do aut or ( Lorenz, 1984, p. 431) .

Gonzáles ( 2000, p. 72) ainda com ent ando que “ se não o prim eiro, é um dos iniciadores na int ercalação de gravuras no t ext o, no acréscim o de exercícios resolvidos no final, salvo nas prim eiras edições. Sem segurança, m as apoiado em referências e im pressões de out ros colegas est rangeiros, t alvez sej a est e livro que m ais t enha influenciado na organização dos ensinos de Física na Europa e Am érica, desde que t ais ensinos t iveram carát er curricular nos est udos secundários, profissionais e, t am bém , nos prim eiros anos das Faculdades de Ciências” .

Referências

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