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De quem é a universidade? : um estudo sobre a relação de poder na interação aluno-professor

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA

Programa de Pós-graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde

DE QUEM É A UNIVERSIDADE?

UM ESTUDO SOBRE A RELAÇÃO DE PODER NA INTERAÇÃO

ALUNO-PROFESSOR

RAYANNE LINHARES AZEVEDO

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA

Programa de Pós-graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde

DE QUEM É A UNIVERSIDADE?

UM ESTUDO SOBRE A RELAÇÃO DE PODER NA INTERAÇÃO

ALUNO-PROFESSOR

RAYANNE LINHARES AZEVEDO

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE PSICOLOGIA

Programa de Pós-graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde

DE QUEM É A UNIVERSIDADE?

UM ESTUDO SOBRE A RELAÇÃO DE PODER NA INTERAÇÃO

ALUNO-PROFESSOR

Rayanne Linhares Azevedo

Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde, área de concentração Desenvolvimento Humano e Educação.

ORIENTADORA: Prof.ª Dr.ª REGINA LÚCIA SUCUPIRA PEDROZA

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AAZ994q

Azevedo, Rayanne Linhares

De quem é a Universidade? Um estudo sobre a relação de poder na interação aluno-professor / Rayanne Linhares Azevedo; orientador Regina Lucia Sucupira Pedroza. --Brasília, 2018.

152 p.

Dissertação (Mestrado - Mestrado em Processos de

Desenvolvimento Humano e Saúde) -- Universidade de Brasília, 2018.

1. Relação de poder. 2. Ensino Superior. 3. Universidade. 4. Interação aluno-professor. 5. Foucault. I. Sucupira Pedroza, Regina Lucia , orient. II. Título.

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

INSTITUTO DE PSICOLOGIA

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APROVADA PELA SEGUINTE

BANCA EXAMINADORA:

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Regina Lúcia Sucupira Pedroza – Presidente

Universidade de Brasília – Instituto de Psicologia

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino – Membro

Universidade de Brasília – Instituto de Psicologia

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Fátima Lucília Vidal Rodrigues – Membro

Universidade de Brasília – Faculdade de Educação

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Cândida Beatriz Alves – Suplente

Instituto Federal de Brasília – IFB

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Com todo meu amor,

À Deus

À Nós 3

Ao Bobs

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AGRADECIMENTOS

Os últimos dois anos me fizeram refletir toda a minha trajetória. Foram anos intensos e sou minha grata por todos que me ajudaram, apoiaram, acreditaram no meu trabalho e me incentivaram. Os meus mais sinceros agradecimentos!

Agradeço primeiramente à Deus e Nossa Senhora! Muita fé foi necessária para a realização desse trabalho.

Agradeço ao meu Porto Seguro, à nós 3, sempre juntas e nos fortalecendo. Um agradecimento todo especial à minha mãe e minha irmã. Que me apoiaram nessa caminhada e acreditaram que seria possível. Mãe, obrigada por todas as orações e por me apoiar nessa trajetória. Feia, obrigada por segurar a barra quando eu não dava conta.

Um grande e sincero agradecimento ao meu parceiro de mestrado, de caminhada e de vida. Enfrentamos juntos, mais uma vez, as angústias e prazares. Se hoje esta dissertação é possível com certeza foi com seu apoio, carinho e amor. Bobs, você é incrível!

Agradeço à minha orientadora Regina, por todas as reflexões e por me mostrar um novo olhar sobre a psicologia e a educação. Obrigada por aceitar o desafio de me orientar e por acreditar em mim.

Aos colegas do Laboratório Ágora Psyché, pelas valiosas contribuições na construção deste trabalho. E um agradecimento especial à minha amiga Clara. Que aventura!

Agradeço ainda à minha amiga Mariana, por me escutar, acalmar e tentar ajudar sempre. À minha melhor amiga Jana por torcer, rezar e acreditar em mim, sempre me incentivando em momentos cruciais. E a todos os meus amigos por entenderem minha ausência e me incentivarem!

Aos meus “tios” Valter e Vilma. Obrigada por me acolherem quando foi necessário.

À minha Psicóloga Soraia, por me acolher e me mostrar novas possibilidades. À minha recente incentivadora Maria Helena.

Agradeço ainda às professoras doutoras Lúcia Pulino, Fátima Rodrigues e Cândida Alves que avaliaram, contribuíram e compuseram a banca da defesa da dissertação. Obrigada por me mostrarem novos olharem sobre a dissertação e por me fazerem pensar além, para futuros estudos.

Por fim, agradeço ao CNPq, pelo apoio financeiro concedido para que essa dissertação fosse concretizada.

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RESUMO

O poder, estando presente em todos os setores da sociedade, é uma questão de exercício e não de posse, existindo nas práticas e em suas relações. O sistema educacional, ao refletir a sociedade, carrega suas marcas. Sendo a universidade parte desse campo educacional também envolve relações de poder em sua atuação. Mesmo que essas relações não sejam tão evidentes, as práticas pedagógicas se ajustam e se adaptam a normas e padrões de comportamento que são considerados socialmente adequados, cabendo ao professor e ao aluno seguir e também transmitir tais práticas. Visando refletir sobre as relações e práticas que ocorrem no espaço universitário, o presente estudo buscou compreender a concepção de estudantes de licenciatura e professores sobre a relação de poder na interação aluno-professor na universidade. O estudo teve caráter qualitativo, por essa visar as múltiplas dimensões de uma determinada questão e buscar aproximar a relação entre pesquisadora e sujeitos, ativos na interação dialética de produção do conhecimento. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com professores e estudantes de graduação da Universidade de Brasília. As entrevistas funcionaram como um espaço de reflexão sobre as relações de poder na interação aluno-professor, assim como o papel de cada um na relação. Para a análise das entrevistas nos baseamos no método de Análise de Conteúdo de Bardin, em que as falas foram agregadas em unidades de significação. Os resultados e discussão foram divididos em três categorias. Na primeira delas, concepções sobre a UnB, discutimos sobre as visões dos alunos e professores sobre a universidade. Os participantes sinalizaram opiniões diversas sobre de quem é a universidade e, como consequência, também quem nela manda. Nessa categoria os participantes ainda relataram sobre os três pilares principais da universidade, em que consideraram o ensino sendo muito requisitado, ao comparar com a pesquisa e a extensão. A segunda categoria analisou a interação aluno-professor em sala. Os resultados demonstraram que alguns alunos e professores já percebem que existe uma relação de poder e não um poder especificamente. Os participantes ainda expuseram que a interação em sala é distante, com raros espaços de diálogo e baixa expectativa de troca. Por outro lado, os alunos, visam não se espelhar nessas relações quando se tornarem professores. A última categoria, o futuro da educação almejados por professor e alunos, retratou um pouco dessa visão, abordando um outro caminho para as relações na universidade, com mais diálogos, troca e afetividade. Os resultados do estudo buscaram contribuir para a uma nova forma de se enxergar a relação aluno-professor, em que ambos possam desenvolver uma consciência crítica sobre essa realidade. O debate sobre o assunto pode gerar reflexões sobre algumas mudanças nas práticas de ensino e aumentar pesquisas no campo universitário voltada aos principais atores do processo.

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ABSTRACT

The power, being present in all sectors of society, is a matter of exercise and not possession, existing in practices and in their relations. The educational system, on the way of reflecting society, carries its marks. Being the university part of this educational field also involves relations of power in its action. Even if these relationships are not so obvious, pedagogical practices adjust and adapt to norms and standards of behavior that are considered socially adequate, and it is up to the professor and student to follow and also to transmit such practices. Aiming to reflect on the relationships and practices that occur in university space, the present study look for understand the conception of undergraduate students and teachers about the power relation in the student-professor interaction in the university. The study is qualitative, because it aims at the multiple dimensions of a given question and seeks to bring the relation between researcher and subjects, active in the dialectical interaction of knowledge production. Semi-structured interviews were conducted with professors and undergraduate students from the University of Brasília (UnB). The interviews functioned as a space for reflection on the power relations in the student-professor interaction, as well as the role of each one in the relation. For the analysis of the interviews we based on the Bardin Content Analysis method, in which the statements were aggregated into units of signification. The results and discussion were divided into three categories. In the first of them, conceptions about UnB, we discussed the visions of students and professors about the university. Participants signaled diverse opinions about who the university is, and as a consequence, who is in charge of it. In this category the participants still reported on the three main pillars of the university, in which they considered education being much requested, when comparing with research and extension. The second category analyzed the student-professor interaction in the classroom. The results showed that some students and professors already perceive that there is a power relation and not a power specifically. Participants also pointed out that the interaction in the classroom is distant, with rare spaces for dialogue and low expectation of exchange. On the other hand, the students aim not to mirror these relationships when they become professors. The last category, the future of education aimed at by professors and students, portrayed a little of this vision, approaching another way for relations in the university, with more dialogues, exchange and affectivity. The results of the study sought to contribute to a new way of seeing the student-professor relationship, in which both can develop a critical awareness about this reality. The debate on the subject can generate reflections on some changes in teaching practices and increase research in the university field directed to the main actors of the process.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS... vi RESUMO... vii ABSTRACT ...viii CAPÍTULOS 1 - INTRODUÇÃO ... 1 Estrutura da Dissertação ...6 2 - REVISÃO DE LITERATURA ...8 A universidade ...8

O surgimento das universidades brasileiras: uma breve história...8

Os traçados da Universidade de Brasília (UnB)...15

O papel da universidade: a teoria e a prática...34

A relação de poder no campo educacional...38

Relação de poder... 39

A configuração de poder: a disciplina ...44

A relação de poder no campo universitário ...50

O processo educativo sob outra perspectiva: utopia ou possibilidade?... 61

Um ângulo diferente sobre a educação universitária... 62

A relação aluno-professor: outra perspectiva da relação de poder... 67

O ensino, a pesquisa e a extensão: um outro olhar...73

3- OBJETIVOS...77

4 - METODOLOGIA ... 79

Participantes ... 80

Contexto da Pesquisa ... 81

Instrumentos ... 81

Procedimentos para construção das informações... 81

Procedimentos de Análise... 83

5 - RESULTADOS E DISCUSSÃO... 85

Concepções sobre a UnB...85

De quem é a Universidade?... 85

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Interação aluno/professor: uma relação de poder ...98

Poder do aluno ou do professor? Os diversos pontos de vista sobre o poder na universidade...98

A interação em sala de aula: a vontade de aprender com desejo de ensinar ou a vontade de passar com o desejo de repassar?...103

As práticas de normalização... 109

O futuro da educação almejado por alunos e professores...115

6- CONSIDERAÇÕES FINAIS... 125

REFERÊNCIAS...130

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CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

A universidade, enquanto instituição social, compartilha e produz suas próprias contradições. As práticas pedagógicas realizadas em seu interior são reflexo da sociedade, espelhando a complexidade da dinâmica social e da interação humana (Santos & Soares, 2011). É no espaço Universitário, mais propriamente nas relações de poder exercidas neste campo de estudo, que surgem os pensamentos e reflexões sobre a trajetória de quem os escreve e viveu nesse contexto.

No Brasil a universidade carrega uma história que reflete as relações nela existente, o que pode explicar muitas de suas ações. Neste estudo, embarcaremos sob diferentes perspectivas e com cautela sobre a interação aluno-professor, que é um dos incontáveis fenômenos apontados na literatura que influenciam no processo de ensino e aprendizagem, emergindo nas relações de poder. Essas relações, mesmo que muitas vezes não sejam conscientemente compreendidas pelos atores do processo, se apresentam fortemente na prática pedagógica dos professores, na reação dos alunos e no comportamento de ambos, frente ao planejamento e avaliações didáticas (Attie, 2013; Fuhr, 2010).

Assim, a educação superior que perdura é aquela que, de modo geral, prioriza um ensino com pouca contribuição para o desenvolvimento de sujeitos sociais construtores de sua própria história. Ao invés disso, possui como uma de suas principais funções preparar futuros trabalhadores, submissos e passivos, dada a concepção de aprendizagem mecânica, baseada na transmissão de conteúdos de forma sistemática e descontextualizada, no qual os estudantes são subordinados ao poder do educador (Santos & Soares, 2011).

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Apoiadas na literatura, em teóricos que se dedicaram em discutir o processo de ensino e aprendizagem, assumimos como pressuposto que na interação aluno-professor a relação de poder exercida em sala de aula tem grande impacto na aprendizagem. Professor e aluno muitas vezes são limitados, influenciados ou acostumados com o modelo de educação bancária (Freire, 2011) e pelas estruturas da sociedade que exercem sobre eles determinações sociais. O modelo educacional é controlado por regras institucionais e um sistema burocrático que dificultam a mudança da estrutura hierárquica.

As estruturas de poder desencadeiam o processo, ao serem legitimadas pelas próprias vítimas que a ele estão submetidas, em que todos se tornam alvos, alimentando o sistema de dominação-sujeição. Dessa maneira, considerando, então, que as relações de poder se expandem por todas as outras formas de relações cotidianas e que refletem no âmbito da pesquisa educacional, surge o interesse de compreender neste trabalho como alunos e professores, sendo os principais atores do processo na universidade, percebem a relação de poder na interação aluno-professor. Torna-se, portanto, importante discutir como essa questão, que se constrói e reconstrói nas vivências cotidianas no campo universitário, interfere na relação em sala de aula e se existem outras possibilidades para essa interação ocorrer.

Conhecer e saber as implicações da relação de poder na universidade é fundamental para a tomada de consciência e decisivo para que sejam efetuadas ações no sentido de sua discussão. Pesquisar sobre esse tema traz à tona diversos interesses pessoais e sociais. Uma das disposições para a pesquisa foi o fato de eu ter sido um dos sujeitos da relação aluno-professor na universidade em questão e, portanto, sofrer os contentamentos e os padecimentos dela advindos. Interligado a isso, o interesse também surgiu a partir de observações e vivências de fatos – ligados ao poder – ocorridos na minha trajetória escolar que incomodavam e causavam desconforto.

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No ensino fundamental, o professor exercia um poder sobre os alunos que a princípio não me afetava diretamente, apesar de muitas vezes me perceber sem uma escuta, apenas seguindo o que era ordenado. Lembro-me de sempre tentar realizar exatamente as tarefas de casa como a professora havia mencionado, mesmo que existissem outras formas de serem feitas. No ensino médio, isso não se alterou e infelizmente o poder passou a ser exercido com mais autoridade, principalmente devido ao vestibular e escolha de curso, em que tudo indicava que existia uma “receita de bolo” para se obter êxito, que era “simples”: seguir os comandos dos professores, realizar muitos exercícios, questionar pouco e tentar ao máximo encontrar a solução do problema segundo foi indicado, sem buscar outras soluções paralelas, voltar ao início e repetir o processo. Nesse momento, eu questionava muito internamente o porquê de algumas relações se estabelecerem no espaço escolar.

Mas, foi só na universidade que pude ver como as relações vivenciadas me afetaram de fato. O curso de Psicologia abriu portas pela procura de conhecimento, vi um outro lado da educação, na verdade, vivenciei vários lados da educação e da relação aluno-professor. Tive a oportunidade de ter diversos professores com diferentes atuações em sala, o que me fez perceber que a procurar por assuntos que até então estavam adormecidos era possível, assim como os questionamentos e discussões, mas que era preciso cautela, pois nem todos os professores abririam espaço para abordamos outras perspectivas.

Ao mesmo tempo, as matérias cursadas, pesquisas realizadas e estágios feitos na graduação me surpreenderam com uma nova visão sobre os profissionais, incluindo o psicólogo escolar e o professor. Apesar disso, algumas vezes me vi engessada e sem autonomia ao escrever, por estar muita acostumada a seguir o que era imposto. Quando alguns professores proporcionavam liberdade na produção eu me via perdida, foi

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necessária uma percepção inicial sobre o que me afetava para conseguir trabalhar algumas das minhas inquietações. Incluindo a isso o amadurecimento e a coragem, a graduação me proporcionou uma visão crítica, adquirindo um embasamento maior para compreender os acontecimentos e pensar nas relações entre os conhecimentos aprendidos.

Foi ao final da graduação, em meio ao contexto de estágio, futuro profissional e relações amistosas entre eu, como aluna, e professores, que resolvi procurar mais sobre as relações aluno-professor, o que me fez inscrever para a seleção de mestrado. Tinham sido dados os primeiros passos para um novo mundo, a pesquisa em sua estrutura completa. Várias questões me faziam querer estudar mais o campo universitário e a preparação para o mercado de trabalho. Uma das primeiras questões era por que em algumas disciplinas se discutia tanto e em outras tão pouco? Isso acontecia só na Psicologia? Por que alguns professores continuavam com a mesma forma de ensinar vista no ensino médio, com conteúdos a memorizar e provas? Enquanto outros professores iam além? Ainda questionava o porquê de os professores não darem retornos aos seus alunos sobre provas, conteúdos e notas. Muitas questões não eram discutidas e carregava sempre um sentimento de aflição. Outras pessoas também se sentiam assim? O que pensam os alunos e professores sobre as interações em sala? Há um poder? Ele é camuflado? Quem o exerce?

A partir de tais questionamentos, que já faziam parte do meu cotidiano, adentrei no mestrado. Na pesquisa busquei ir além do convencional esperado, introduzindo ao campo as minhas aflições, discutindo aspectos sócio-histórico-culturais, as formas dominantes e submissas de existir neste mundo e buscando ainda conhecer e compreender melhor as relações de poder, que nem sempre são muito claras e que estabelecem um campo psicológico do qual somos sujeitos.

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Além de o tema ser instigante, como o são todas as questões que se referem ao ser humano, buscamos socialmente promover apoio para que as instituições de ensino superior, ao perceberem as implicações da relação de poder no ensino-aprendizagem, possam rever suas formas de atuação e elaborar novos métodos de intervenção, repensando estratégias de ensino e de avaliação. Esperamos que o conhecimento produzido também contribua para o fortalecimento da relação aluno-professor, em que ambos possam refletir sobre como as relações de poder existentes podem estar afetando o seu convívio e a partir disso possam dialogar a respeito, desenvolvendo uma consciência crítica sobre essa realidade. Em âmbitos mais abrangentes, a pesquisa ainda buscou contribuir para a reflexão sobre as repercussões das relações de poder na sociedade atual.

Teoricamente, este tema de estudo tem sido muito discutido e pesquisado em esferas mais amplas da sociedade e do Estado, porém, como ressalta Foucault (2004), o poder não é uma instituição, ele está em toda parte, e por isso é preciso conhecê-lo e discuti-lo. Afinal, são nessas mínimas instâncias que os seres humanos vivem e experimentam suas mais profundas consequências. Pesquisando sobre as relações de poder no campo educacional, torna-se fundamental referenciar alguns trabalhos e autores que têm analisado essa questão. Assim, somente conhecendo as manifestações de poder que ocorrem nesse campo, mais especificamente na relação aluno-professor na universidade, é que podemos compreender e refletir sobre medidas necessárias para transformá-la.

Além disso, estudos apontam que a preocupação com o papel do professor ou mesmo sobre aspectos relacionados ao processo de ensino-aprendizagem têm sido direcionados para as dificuldades encontradas nos primeiros anos de escolarização, ficando quase que excluídos os alunos do ensino superior. É nesse sentido que se destaca a importância de analisar aspectos referentes ao recorte, visto que a ampliação teórica tem

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potencial para afetar as políticas públicas que levem em conta as particularidades da relação aluno-professor no ensino superior (Rocha & Fernandes, 2014).

Estrutura da dissertação:

Com o intuito de construir uma pesquisa com os propósitos e a importância aqui expostos, os capítulos seguintes, que versam sobre a revisão de literatura, foram divididos em três partes. No primeiro deles apresentamos um breve histórico sobre a universidade, em especial a Universidade de Brasília - UnB, onde o estudo teve seu foco.

Ao partimos para o segundo capítulo, abordamos sobre a relação de poder no contexto universitário, primeiramente referenciando o que o estudo compreende como poder, para depois explicá-lo nas interações entre aluno e professor em sala de aula no ensino superior. Com isso, pretendemos que o capítulo forneça elementos para subsidiar a investigação da concepção de alunos e professores sobre a relação de poder na universidade. No último capítulo, buscamos refletir sobre as possibilidades de um campo universitário diferenciado nas interações entre alunos e professores, em que as relações de poder possam ser percebidas e reestruturadas em um modelo menos vigilante e mais acolhedor.

Após tais embasamentos, indicamos os objetivos e a proposta metodológica, no qual foram abordadas as escolhas realizadas durante o percurso da pesquisa. Assim, procuramos uma metodologia alinhada ao compromisso social da Psicologia, percebendo o sujeito de pesquisa como participante ativo. Para isso, utilizamos a metodologia qualitativa e realizamos entrevistas semiestruturadas com alunos de licenciatura e professores universitários, permitindo, assim, que a pesquisadora e os participantes ficassem mais próximos à realidade investigada. As informações geradas foram

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analisadas com base na Análise de Conteúdo de Bardin (2009), na qual as falas foram agregadas em unidades de significação.

O capítulo referente aos Resultados e Discussão, foi dividido em três categorias principais: 1. Concepções sobre a UnB, em que discutimos as visões dos alunos e professores sobre a universidade, quem manda na UnB e os três pilares principais da universidade: ensino, pesquisa e extensão; 2. Interação aluno-professor, em que analisamos o que os participantes pensam sobre a relação de poder e como ocorrem a interação entre alunos e professores em sala de aula; e 3. A última categoria, o futuro da

educação almejada por professores e alunos, retratou outros caminhos para as relações

ocorrerem na universidade, com mais diálogos, troca e afetividade. A dissertação encerra com as considerações finais, referências e anexos.

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CAPÍTULO 2

REVISÃO DE LITERATURA

A universidade

Este capítulo tem como objetivo traçar brevemente aspectos históricos do ensino superior no Brasil, em especial na Universidade de Brasília - UnB, assim como seu desenvolvimento. Para isso, procuramos primeiro retratar de forma sucinta o percurso da instituição universitária, em que pincelamos, a respeito de outros países, alguns aspectos relacionados ao tema, destacando semelhanças e diferenças, e assinalando os diversos momentos vivenciados pelo ensino superior no Brasil.

O surgimento das universidades brasileiras: uma breve história

Ao pesquisarmos a história da universidade no Brasil, logo percebemos que sua criação foi tardia em comparação com a das universidades na Europa e na América do Norte. Muitas pesquisas indicam a Europa como o berço do surgimento das primeiras universidades, inicialmente em países como Itália, França e Inglaterra, logo no início do século XII. O ensino ministrado nesses países tornou-se modelo para muitos outros e expandiu-se por todo o território europeu. A partir dos séculos XIX e XX, a expansão se amplia pelos demais continentes, passando as instituições universitárias a integrar o elemento central da prática do ensino superior (Mendonça, 2000). Antes disso, tudo o que se encontra são “embriões” do que mais tarde poderia vir a ser chamado de universidade, como é o caso de instituições existente na Grécia e em Roma, que se remetem mais propriamente a centros de estudo (Rossato, 2005).

Com relação à América Latina, no início do século XVI, o sistema universitário espanhol foi trazido aos poucos, primeiro com a criação de universidades no México, em seguida Guatemala, Peru, Cuba, Chile, Argentina. Naquela época, o modelo europeu,

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especialmente o francês, que exercia forte influência em Portugal e na Espanha, foi o adotado pelas sociedades e universidades latino-americanas. Com isso, a educação superior era destinada somente à elite, como também o acesso aos postos políticos e burocráticos. A história mostra que ao final do século XVIII já haviam sido criadas 19 universidades na América Latina e, no século XIX, mais 31 surgiram. Nessa época, quase todos os países latino-americanos já possuíam uma ou mais universidades, estando o Brasil entre as poucas exceções (Rossato, 2005).

No Brasil, como podemos perceber, o cenário foi outro. A história da criação da universidade no Brasil revela uma considerável resistência inicial, seja de Portugal, como reflexo de sua política de colonização, seja de uma parcela de brasileiros, que não viam justificativa para a criação de uma instituição como essa na colônia. Assim, a elite da época que visava se graduar deslocava-se até a Europa, geralmente para a Universidade de Coimbra (Fávero, 2006). De acordo com Luckesi, Barreto, Cosma e Baptista (2007, p. 34), “Portugal não permitia, apesar dos esforços dos jesuítas, a criação de uma Universidade no Brasil”, bem possivelmente porque naquela época uma instituição desse tipo poderia ser indício de independência da colônia.

Assim, há registros de várias tentativas de instituir universidades no território nacional no período colonial, principalmente pelos jesuítas, embora, todas tenham fracassado. Nos conventos, os padres e seminaristas tinham acesso ao conhecimento de nível superior nas áreas de filosofia, teologia, gramáticas grega, latina e portuguesa; ninguém externo aos conventos, entretanto, tinha acesso a esse nível de conhecimento. Nessa época, ou melhor, durante dois séculos (1549-1759), apenas um ensaio sobre educação apareceu no Brasil, elaborado pelos jesuítas e divulgado pela Companhia de Jesus, sendo seu principal objetivo difundir e conservar a fé católica entre senhores de engenho, colonos, escravos e índios (Fávero, 2006).

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Costa e Rauber (2009) comentam que, apenas em 1808, com a chegada da família real, expulsa de Portugal pela invasão francesa, iniciou-se a implantação do ensino superior no Brasil. O rei D. João VI, estando em território brasileiro, criou institutos de ensino superior a exemplo dos de medicina, engenharia e economia, principalmente nas capitais do Rio de Janeiro e da Bahia. Desse modo, esse nível de instrução nasce no Brasil como um modelo de instituto isolado e de natureza profissionalizante, destinado essencialmente a atender aos filhos da aristocracia, que não podiam ir estudar em outros países devido ao bloqueio estabelecido pela esquadra napoleônica.

Nessa mesma época, há registros da criação da Academia de Marinha e, em 1810, do surgimento da Academia Real Militar, no Rio de Janeiro, voltadas para a formação de oficiais e engenheiros civis e militares. Em 1827 consta a criação dos primeiros cursos jurídicos em Olinda e em São Paulo, com posterior expansão pelo território nacional, que influenciaram politicamente a mentalidade do Império e, ainda, a reconstrução da elite. Ocorre também a instalação de algumas escolas superiores em diferentes localidades, vistas por muito tempo como substitutas à universidade (Costa & Rauber, 2009).

Essas instituições, cursos e academias criados na época de D. João VI foram os elementos responsáveis pelo surgimento de escolas e faculdades profissionalizantes que constituíram o conjunto de instituições de ensino superior até o período da República, a partir de sucessivos processos de sua reorganização, fragmentação e aglutinação. Assim, podemos observar que tais instituições que exerciam a prática do ensino superior estavam diretamente relacionadas e essencialmente preocupadas com a defesa militar da colônia, da formação de profissionais para atuar no setor público e de profissionais liberais para os diversos setores, como destaca Mendonça (2000).

Apesar disso, no período imperial, mesmo com diversas propostas, não foi criada uma universidade no Brasil. Proclamada a República, outras tentativas são feitas, muitas

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fracassadas, até que, em 1909, ainda sem ato de apoio do governo federal e como instituições livres, graças a uma legislação que na época favorecia a descentralização da educação superior nos estados, criou-se a Universidade de Manaus,1 seguida pela Universidade de São Paulo, em 1911, que durou apenas seis anos, e a Universidade do Paraná, em 1912, extinta em 1915. Apesar de os registros apontarem os dados expressos, há que ressaltar a inexistência de consenso a respeito de qual teria sido a mais antiga universidade no Brasil, bem como da data exata em que isso teria acontecido (Fávero, 2006).

De acordo com o que indicam os registros históricos, o ano mais mencionado para a criação da primeira universidade no Brasil é 1920. Muitos historiadores consideram esse ano um marco, pois foi o da criação da primeira instituição universitária legalmente autorizada pelo governo federal; surge, então, a Universidade do Rio de Janeiro,2 como consequência de um decreto de 1915, reunindo, para sua criação, três outras unidades de ensino superior: Faculdade de Medicina, Faculdade de Direito e Faculdade Politécnica. Essas três faculdades brasileiras eram independentes umas das outras e possuíam orientação profissional elitista. Além disso, seguiam o modelo das escolas francesas da época, que eram instituições seculares mais voltadas para o ensino do que para a pesquisa (Costa & Rauber, 2009; Fávero, 2006; Mendonça, 2000).

Apesar da junção, cada uma das faculdades, bem como a universidade em seu âmbito geral, conservou suas características próprias, mesmo tendo recebido autonomia didática e administrativa para agir como unidade (Mendonça, 2000; Morhy, 2004). Na teoria, as universidades teriam o intuito de ir além do ensino, se preocupando também com a ciência e a cultura. Na prática elas ainda funcionavam como ilhas isoladas

1 Atual Universidade do Amazonas.

2 Posteriormente se converteu em Universidade do Brasil e, depois, em Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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(Mendonça, 2000). Lançou-se, assim, a base que se propagou para a criação das demais universidades no Brasil.

Na mesma década da criação da Universidade do Rio de Janeiro, também foram fundadas, em 1924, a Associação Brasileira de Educação (ABE) e a Associação Brasileira de Ciências (ABC). Essas instituições tinham por objetivo discutir a concepção de universidade, sua função, sua autonomia e seu modelo, e conscientizar educadores, público e autoridades quanto aos problemas inerentes à educação nesse período, tentando buscar soluções mais adequadas (Costa & Rauber, 2009). Fávero (2006) recorda que a partir de 1930 inicia-se um esforço de arrumação e transformação do ensino superior no Brasil, no qual a junção de três ou mais faculdades já se legitimava como universidade. Com centralização política acentuada nos diversos setores da sociedade, há também, nessa época, a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, visando um ensino mais moderno e com estruturas mais similares para a capacitação da elite com vistas ao trabalho. Em seguida, o Conselho Nacional de Educação (CNE) é implementado, em resposta a questionamentos referentes à reforma na educação brasileira; assim, são decretados os regulamentos e a própria organização do ensino superior e de segundo grau, como também o modo de organização da Universidade do Rio de Janeiro.

Além dos transplantes e adaptações, da instauração das primeiras universidades no Brasil, há outros marcos que incrementaram a vida acadêmica e intelectual no país entre 1930 e 1960. Entre os quais o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nacional, em 1932 − que levantava questões como ensino gratuito para todos e igualdade de acesso ao ensino, além de buscar elaborar um panejamento do processo educativo para todo o país − e a concepção, em 1951, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (Capes) (Mendonça, 2000).

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Há também que destacar a criação, em 1934, da Universidade de São Paulo (USP), que ocorreu entre a eleição do presidente Getúlio Vargas e a implantação do Estado Novo. A USP tinha como influência modelos de ensino europeu e professores que assinaram o Manifesto dos Pioneiros ou dele eram simpatizantes e que visavam a uma atividade criadora do aluno, sem passividade. Essa universidade propunha mudanças, e isso repercutiu em muitos sistemas educacionais brasileiros (Mendonça, 2000).

No ano seguinte, 1935, foi criada a Universidade do Distrito Federal (UDF), no Rio de Janeiro a partir da integração da Escola de Ciências, do Instituto de Educação, da Escola de Economia e Direito, da Escola de Filosofia e Letras e do Instituto de Artes. A universidade trazia consigo a proposta de desenvolvimento integrado de pesquisa, ensino e extensão, de acordo com as diretrizes propostas pelas novas leis vigentes, além de ter como uma das principais finalidades a propagação do ensino nas escolas e como uma premissa a formação de profissionais do magistério. Foi criada pelos esforços de Anísio Teixeira, contrapondo-se à importação dos modelos europeus, e resultou em um sistema universitário com princípios da educação democrática. A UDF era na época a mais inovadora e desafiadora universidade criada, pois estava pautada em princípios norteadores que se mostravam como modelos para o funcionamento da universidade ideal. Não obstante, a criação da UDF só perdurou até 1939, ano em que foi institucionalizada a Universidade do Brasil (UB), mantida e dirigida pela União, e criada por meio da incorporação dos cursos da UDF, o que culminou na sua desativação e consequente extinção (Fávero, 2006; Lelis, 2011).

Já entre 1940 e 1970, a história pontua que houve o estabelecimento de universidades federais em quase todos os estados brasileiros, merecendo destaque o Rio Grande do Sul e Minas Gerais, com mais de uma unidade criada. Esse período marcou a descentralização do ensino superior e sua regionalização. Na história, há registros de ser

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a época com o mais alto crescimento na educação brasileira, em que atuaram diversos educadores, até hoje lembrados por suas realizações. Nessa época, mais precisamente na Era Vargas, pós-1945, com os processos de institucionalização universitária e do ensino superior no país, obtivemos também importantes tentativas de luta pela autonomia universitária. Acompanhada pela expansão das universidades no território nacional, que se multiplicaram em extraordinária velocidade, seguindo o ritmo do desenvolvimento do país provocado pelo processo de industrialização, priorizou-se a formação profissional com ênfase na pesquisa e na produção de conhecimentos (Fávero, 2006).

A aceleração do desenvolvimento, marcada pela industrialização, acarreta novas transformações, principalmente nos campos econômico, social e político. Nos anos 50 e 60 o ensino superior no país sofre forte e profunda influência política, passando a adotar novas ideologias como base de sustentação dos governos que se sucederam até 1964. Alguns registros das décadas de 1950 e 1960 ainda comentam tentativas de mudanças na estrutura pedagógico-administrativa do ensino superior, bem como debates promovidos principalmente por movimentos estudantis que lutavam, entre outras coisas, pela abertura da universidade à população por meio da extensão e dos serviços comunitários, articulação das universidades com órgãos governamentais principalmente no interior do país, e pela liberdade de expressão (Mendonça, 2000).

Em meio a esse cenário, surge a Universidade de Brasília (UnB), em 21 de abril de 1962 (Fávero, 2006). Há consenso entre os diferentes autores que vêm trabalhando sobre o tema, quanto ao fato de a UnB ter sido considerada a mais moderna universidade do país (Arruda, 2012; Fávero, 2006; Fernandes, 2013; Rossato, 2005). Afinal, antes dela, as universidades brasileiras não buscaram traçar um plano de ação, apenas tentaram se adaptar às demandas da população, visto que havia exigências de melhor qualificação profissional no mercado.

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Os traçados da Universidade de Brasília (UnB)

Por meio de esforços e pensamentos revolucionários de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, constituiu-se a UnB. Ainda em 1959, Darcy Ribeiro, que na época era vice-diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep), no Ministério da Educação, e Anísio Teixeira, que era diretor e professor da mesma instituição, idealizaram uma universidade brasileira que fosse considerada a mais moderna e com ensino diferenciado do que existia na América Latina. Ambos insistiram com o presidente da época, Juscelino Kubistchek (JK), para que a mesma fosse criada em Brasília. Houve uma resistência inicial, mas com o apoio de Victor Nunes Leal e de Cyro dos Anjos, chefe e subchefe de gabinete do Presidente, respectivamente, JK apoiou a insistência dos sonhadores (Querubim, 2013).

Era uma época em que o país visava ao futuro e à expansão. Lúcio Costa, arquiteto e urbanista que idealizou Brasília, em seus projetos iniciais, também defendeu um centro de propagação de cultura e de renovação do pensamento:

Cidade planejada para o trabalho ordenado e eficiente, mas ao mesmo tempo cidade viva e aprazível, própria ao devaneio e à especulação intelectual, capaz de tornar-se com o tempo, além de centro de governo e administração, num foco de cultura dos mais lúcidos e sensíveis do país (Costa, 1962, p. 22).

Darcy e Anísio visavam a um ensino diferenciado dos modelos tradicionais, e o projeto também pretendia realizar mudanças nos campos educacionais do Brasil. Ambos tinham o sonho de fazer da UnB uma “universidade necessária” (Ribeiro, 1978, p. 41), em que se pudesse complementar o projeto da construção de Brasília, que almejava simbolizar avanço e modernização.

Nas principais obras dos autores sobre o assunto, A universidade necessária e

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Ribeiro (1975) e Anísio Teixeira (1989), respetivamente, discutiram as fragilidades, divergências e possibilidades do ensino superior. O intelectual Anísio Teixeira, que debateu sobre a educação e a reforma universitária da época, defendeu em sua obra que o ensino superior não passava de uma imitação dos modelos estrangeiros. Fez críticas ao sistema educacional por considerá-lo com aspectos pedagógicos medievais, pelo fato de a universidade ser um espaço fechado com estudos distantes, centralizado no professor, disfarçado com exposições orais e reproduções verbais dos temas, aulas somente expositivas e exames para verificação do conteúdo. O autor ainda acrescentou que as universidades no Brasil viviam em constante isolamento, com professores e alunos acomodados, e que muito se aprendia sozinho (Teixeira, 1989).

Inspirando-se em uma nova concepção, que visava ao desenvolvimento científico e à valorização da cultura, Anísio Teixeira ansiava que a universidade tivesse o papel de criar e ampliar o saber, pois só assim haveria a possibilidade do desenvolvimento do conhecimento. Para ele, a universidade poderia servir de instrumento de união, não mais atuando com faculdades isoladas, sendo necessário investir na socialização entre os cursos, ou seja, a universidade seria um guia para os futuros profissionais atuarem em sociedade, modificando-a com o saber, transmitindo seu conhecimento e não apenas o reproduzindo (Teixeira, 1998).

A função da universidade nos pensamentos de Teixeira (1998, p. 18), seria: Uma função única e exclusiva. Não é só difundir conhecimento. O livro o faz. Não é conservar a experiência humana. O livro também conserva. Não é preparar práticas profissionais, ou ofícios de arte. [...] Mais do que isso, a universidade deveria [...] formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para que a mesma se torne consciente e progressiva.

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Além disso, a proposta seria no sentido de que o ensino superior se preocupasse com a cultura e em expandi-la, pois, na prática, Anísio Teixeira via um ensino profissional e específico, distante dos estudos sobre a cultura nacional. Almejava uma formação mais longa e que preparasse os profissionais para refletir sobre os diferentes aspectos brasileiros, com espaço para pesquisa, em constante investigação e discussão pela verdade. Corroborando isso, o autor pretendia que a universidade construísse uma nova cultura, mais adequada à sociedade brasileira contemporânea, tornando-se, assim, um centro de investigação e de pesquisa científica (Teixeira, 1964).

Nas palavras do autor:

A universidade será assim um centro de saber, destinado a aumentar o conhecimento humano, um noviciado de cultura capaz de alargar a mente e amadurecer a imaginação dos jovens para a aventura do conhecimento, uma escola de formação de profissionais e o instrumento mais amplo e mais profundo de elaboração e transmissão da cultura comum brasileira. Estas são as ambições da universidade (Teixeira, 1964, p. 236).

O professor Darcy Ribeiro, corroborando as propostas de Anísio Teixeira, acreditava na universidade como “meio de produção, difusão do conhecimento científico e base do desenvolvimento tecnológico de uma nação” (Querubim, 2013, p. 68). Com similaridade às propostas de Teixeira, o intelectual Ribeiro comenta que a universidade poderia influenciar a cultura, e, como consequência, a cultura poderia modificar a sociedade. Ribeiro (1975) ainda argumenta que, por mais árduo que fosse, a universidade deveria ainda se preocupar com a criatividade cultural e científica em seus trabalhos.

Ao analisar as estruturas universitárias de outros países, Darcy Ribeiro percebeu que a universidade deveria atentar às demandas sociais advindas das transformações históricas. Ou seja, deveria notar o cenário contemporâneo do país em vez de analisar os

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modelos externos, pois só assim haveria uma transformação social adequada às necessidades reais. Com essa visão, a universidade teria a função de promover o desenvolvimento de uma consciência crítica e de discussões políticas, buscando o rompimento da submissão e a defesa da autonomia, e seria principalmente voltada para o interesse comum da maioria da população (Ribeiro, 1975).

Muitas das funções almejadas provocaram resistências, posto que uma parte da sociedade buscava a neutralidade do saber. Ribeiro (1975), contudo, já alertava na época a respeito de que a estrutura universitária havia passado por outras mudanças, às vezes por pressão social ou por pressões dos docentes e estudantes, porém quase sempre as alterações eram vistas como um complemento da vida universitária, por não se fundamentar em algum programa, o que acabava fazendo com que não atingissem as mudanças necessárias à universidade. Dessa forma, a proposta de Darcy era realizar uma estrutura integrada e respaldada, em que ensino e pesquisa seguissem juntos tanto na função docente – auxiliando os alunos em seus estudos e saberes – como em aspectos técnico-científicos – visando estender a cultura e a ela incorporar aspetos políticos. Para ele a função política deveria ser tratada na universidade, principalmente em suas pesquisas e em união com a realidade sociocultural (Ribeiro, 1986).

O autor, ao se propor a realizar um modelo teórico universitário, deixa claro que a universidade, fazendo parte do meio social, pode tanto transformá-lo como também refletir as mudanças nele decorridas. Nesse ponto, há que pensar que a universidade ao mesmo tempo colabora para o sistema e o transforma (Querubim, 2013). A crítica de Darcy era no sentido de que não havia necessidade de reinventar a universidade, bastando analisar suas estruturas e interesses para assim modelar novas possibilidades, dando autenticidade e funcionalidade que correspondessem às “necessidades do desenvolvimento autônomo” (Ribeiro, 1975, p. 169).

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Com base nesses pensamentos republicanos, ousados e inovadores, que provocaram reações das camadas conservadoras brasileiras, surgiu a Universidade de Brasília. Em seus anos iniciais, a UnB funcionou de forma precária. Os primeiros cursos foram realizados em edifícios públicos administrativos improvisados. Em 1962, ano seguinte a sua criação, o Ministério da Educação (MEC) forneceu algumas salas para seu uso. Timidamente os cursos passaram para a área que lhes era reservada pelo Plano Piloto de Brasília. Nascia, assim, o campus universitário, atualmente com proporções bem maiores do que na época, mas ainda no mesmo local então destinado (Lelis, 2011).

Ao contrário da timidez e modéstia iniciais para ocupar seu espaço no Plano Piloto, a proposta da UnB era autêntica e visava tornar a universidade ponto de referência não só nacional, como internacional, já que até então não havia uma tradição propriamente universitária no país. O projeto considerava em sua base as necessidades e o desenvolvimento da população, e para isso visava disseminar o conhecimento pelos cursos e extensões, contribuir para diferentes níveis de educação, promover uma boa formação para os profissionais em diversos ramos, difundir o conhecimento científico e servir de base para o desenvolvimento tecnológico, estimular a cultura, entre outras metas (Ribeiro, 1978; Teixeira, 1998). A UnB serviu de esperança para as políticas educacionais do país, por ter sido planejada após a análise e constatação das dificuldades de outras universidades brasileiras, almejando poder superá-las (Querubim, 2013).

A criação da UnB, entretanto, passou por diferentes momentos e articulações para que se tornasse possível. Um dos percalços era a própria localização, que na época ainda possuía infraestrutura física escassa e não havia muita demanda acadêmica e cultural até então em Brasília. Mas, o presidente Juscelino Kubistchek, junto com seus aliados, refletiu sobre a necessidade de uma universidade, para que a cidade pudesse se impor como capital e principalmente para se repensar o sistema educacional. A modernidade de

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Brasília se alinhou então à universidade, inspirando seus pensamentos. Aos poucos a UnB se consolidou e se constituiu como um espaço sociável e sensível, agregando jovens intelectuais que buscavam mudanças. Houve, ainda, a importância da geração de emprego que essa nova estrutura possibilitou (Martins, 2009).

Darcy Ribeiro foi o primeiro reitor e auxiliou a UnB nas inovações. Foram criados logo no início cursos-tronco em que os alunos tinham, antes de tudo, uma formação chamada de básica nos dois primeiros anos, com diferentes interações entre alunos e disciplinas, para só depois prosseguirem sua formação “a fim de lhes dar preparo intelectual e científico básico para seguir os cursos profissionais nas Faculdades” (Costa, 1962, s.p.). Os alunos se organizavam para cursar três troncos básicos: a) direito, b) letras brasileiras e c) arquitetura e urbanismo (Arruda, 2012; Fávero, 2006; Martins, 2009).

Após cursar as primeiras matérias, o estudante continuaria seu curso, que poderia ser a título profissional ou acadêmico, bacharelado, licenciatura ou com formação profissional, e a depender disso, se desenvolver em institutos ou faculdades. A UnB também inovou na introdução do sistema de créditos, em que as disciplinas cursadas seriam reconhecidas, sem a necessidade de o aluno ter que cursá-las novamente, caso se transferisse para outro curso. Havia ainda a possibilidade de uma educação continuada, com cursos de pós-graduação, extensão e aperfeiçoamento. A proposta curricular de 1962 ainda se preocupou em não delimitar aspectos mais minuciosos, como a organização das faculdades e institutos, pois acreditava-se que isso deveria ser responsabilidade dos especialistas das respectivas áreas. Assim, não visaram prever leis com particularidades, deixando a cargo dos intelectuais, gestores e professores o funcionamento e consolidação da estrutura de ensino. Esse ponto também foi visto como moderno e peculiar para época. Em relação à parte administrativa da universidade, foi definido primeiramente que haveria uma estrutura básica formada pelos institutos centrais, as faculdades e os órgãos

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complementares associados à UnB. A administração ocorreria diretamente pelo reitor e membros da universidade, todos nomeados pelo presidente da República (Costa, 1962).

Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira ao pensarem a UnB buscaram promover discussões sociais e culturais, além de pensamentos críticos. Refletindo sobre as outras universidades e o que poderiam promover na UnB, os estudiosos propuseram novas formas de interação com os conteúdos e aspiraram a mudanças no país. Eles pretendiam que estudantes e professores pudessem ter mais autonomia e abertura em seus estudos, aproveitando a universidade a seu modo, construindo um programa acadêmico único (Lelis, 2011; Silva, 2001). A UnB ambicionava superar as dificuldades das universidades brasileiras da época, tendo como expectativa obter incentivos políticos e educacionais mais acessíveis para o desenvolvimento dos cidadãos (Lelis, 2011).

Sob tal perspetiva, podemos considerar que a criação da UnB introduziu uma nova postura não só nas universidades, mas também nas agências de fomento à pesquisa e em seu papel na formação intelectual e cultural dos estudantes. Ponto interligado a esse foi a reestruturação da carreira docente, sendo instaurados novos postos, introduzindo diferentes critérios para a formação de professor, com abrangência para a titulação e também o aumento da discussão sobre a contratação em tempo integral e a dedicação exclusiva. A UnB também foi de total importância para o clima cultural da cidade, pois por meio das ideias e práticas concebidas nos meios acadêmicos, em diferentes institutos e departamentos, impactou e aproximou muitos habitantes recém-chegados a Brasília (Arruda, 2012; Salmeron, 2007).

Ao mesmo tempo em que isso ocorria, entretanto, a UnB começava a passar por dificuldades para se manter. Logo nos primeiros anos, muitas transições foram necessárias, algumas mudanças tiveram, aliás, que ser improvisadas. A grande questão, porém, diz respeito ao fato de o caráter transitório ir se tornando permanente. Mesmo com

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tais dificuldades, o que se percebia nos primeiros anos era um clima otimista, perpetuado entre as pessoas desde o início da instauração do projeto. Em algumas referências bibliográficas consultadas, notamos a ideia de credibilidade dada ao modelo de ensino superior esperado na UnB, pois ele visava a um desenvolvimento cultural, social e intelectual, necessário na época. Até porque a universidade buscava incluir jovens de todos os lugares – não só da elite –, criando a expectativa de que uma nova forma de ensino estava surgindo e levando em consideração sua multidiversidade (Costa, Siqueira & Bandeira, 1992; Fávero, 2006).

Viveu-se aqui, nos anos sessenta e setenta, uma experiência única que congregou as diversidades regional, social, campos do conhecimento, em síntese, uma experiência ecumênica (Costa, Siqueira & Bandeira, 1992, pp. 285-286).

[...] onde e quando os interioranos teriam tido a oportunidade de conviver [com] tamanha multidiversidade, senão no campus da UnB? [...] O campus foi um meio seguro para se despir da ignorância e da pobreza cultural (Costa, Siqueira & Bandeira, 1992, p. 287).

Porém, embora as propostas tenham realmente sido inovadoras para a criação da UnB, o momento histórico é considerado um dos mais problemáticos. Entre os anos 60 e 70 quase todos os países da América Latina – Brasil, Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai – passaram pela ditadura militar. O Brasil foi um dos primeiros a entrar nesse processo, em 1964, com o golpe militar, e teve uma das ditaduras mais longevas, que durou até 1985, levando a sociedade brasileira a viver durante 21 anos sob regime autoritário (Fernandes, 2013).

Ainda enquanto era uma instituição recente e frágil, se comparada às outras universidades do país, os anos de ditadura fizeram com que a tão sonhada UnB se deparasse com vários empecilhos. Afinal, o ideal dos fundadores, que queriam uma

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instituição consciente para solucionar problemas nacionais com o conhecimento conquistado e desenvolvido naquele espaço, foi interrompido. Os militares, com um sistema autoritário, suspenderam a democracia, abafaram a universidade e investiram no desenvolvimento capitalista. (Lelis, 2011; Saviani, 2008).

Aos poucos, com o golpe, evidenciou-se uma nova visão pedagógica, em que os investimentos do ensino se voltaram para o aumento da produtividade e renda. O ensino médio objetivou a preparação de profissionais para o desenvolvimento econômico, e o ensino superior a formação de mão de obra mais especializada, que era o que as empresas precisavam. Com a Constituição de 1967, o governo reduziu os recursos para a educação e investiu na privatização do ensino superior (Lelis, 2011).

As universidades se tornaram alvo bastante perseguido pelos militares, principalmente porque durante o governo de João Goulart os estudantes tiveram um papel de destaque e por isso foram muito visados pela repressão. A organização estudantil sofreu perseguições por parte dos militares desde o primeiro dia. No Rio de Janeiro (RJ) uma das primeiras ações foi incendiar a sede da União Nacional dos Estudantes (UNE) (Fernandes, 2013).

Muitos historiadores e até mesmo professores que vivenciaram a ditadura naquela época, contam que a UnB foi invadida pelo menos quatro vezes pelas forças militares. A primeira ocorreu logo no primeiro ano, em 1964, depois em 1965, 1968 e, a última, 1977. Na primeira invasão, no dia 9 de abril de 1964, o campus foi invadido por tropas da Polícia Militar de Minas Gerais, que chegaram à UnB em vários ônibus com soldados equipados. Eles cercaram alguns prédios e fizeram inspeção à procura de armas e materiais que consideravam subversivos, como livros, bandeiras e cartas. Houve um grande expurgo na UnB, quando, aproximadamente, 40 professores foram expulsos da instituição, muitos dos quais acabaram presos e depois exilados. Poucos dias após a

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invasão, os fundadores da UnB – Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira – também foram obrigados a deixar a universidade que idealizaram. O presidente da época, general marechal Castelo Branco, afastou arbitrariamente o recém-empossado reitor Anísio Teixeira de seu cargo, nomeando para o posto de reitor o professor de medicina veterinária da USP Zeferino Vaz (Fernandes, 2013; Lelis, 2011).

O reitor Zeferino Vaz também não permaneceu muito tempo, logo deixando seu cargo à disposição para Laerte de Carvalho. Em seu mandato, a UnB sofreu a segunda invasão de tropas militares, no campus, em 1965, solicitada pelo próprio reitor, devido ao fato de professores e alunos terem aderido a uma greve de 24 horas em resposta à demissão dos professores Ernani Maria de Fiori, Edna Soter de Oliveira e Roberto Décio de Las Casas, afastados por “conveniência da administração”. Em uma madrugada de outubro as tropas chegaram à UnB, cercaram o campus e impediram a entrada de alunos e professores. Uma semana após o ocorrido, o reitor expulsou 15 professores, alegando “medida disciplinar”, pois eles eram os responsáveis pelo ambiente de perturbação. Tal ato fez com que em torno de 223 professores3 se revoltassem com o ocorrido e pedissem demissão (Fernandes, 2013; Lelis, 2011). Salmeron (2007), ainda destaca em seu livro, que os professores estavam fartos do clima de instabilidade que se havia instalado na universidade.

Os docentes começaram a ser substituídos, e mais protestos e greves foram vistos, com repercussão nacional. Alguns anos depois, ainda na década de 1960, mais especificamente em 1968, a UnB foi invadida novamente, sendo essa considerada a mais violenta das invasões. Os alunos,4 estavam protestando contra a morte do estudante Edson Luís de Lima Souto, assassinado no Rio de Janeiro por policiais militares. Eles se

3 Na época, o quadro da UnB tinha 305 professores. 4 Cerca de três mil alunos.

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reuniram entre a praça da Faculdade de Educação e a quadra de basquete5. O campus foi fechado, pessoas − entre elas alunos, professores e funcionários − foram baleadas, agredidas e detidas na quadra de basquete.6 Além disso, foi decretada a prisão de sete universitários, entre eles, Honestino Guimarães (Salmeron, 2007).

Nesse mesmo ano, a Reforma Universitária entra em vigor (Lei 5540/1968). O documento não só buscou firmar as bases da universidade brasileira, como também propôs um ensino superior interligado com a produtividade do sistema econômico, instituiu a educação superior em departamentos e organizou o currículo em ciclos básicos e profissionalizantes (Arruda, 2012). Nos anos seguintes, a UnB retoma lentamente suas atividades acadêmicas. Em março de 1971, o professor e pesquisador Amadeu Cury assumiu a reitoria com uma proposta de reestruturação da universidade. (Fernandes, 2013).

Em 1976, assumiu um novo reitor, o professor doutor em física e oficial da Marinha, José Carlos de Almeida Azevedo. Na gestão de Azevedo, intensificou-se a repressão às mobilizações estudantis. Os professores, e principalmente alunos, se manifestaram novamente. Um ano após à mudança na reitoria, multiplicaram-se os protestos de alunos contra a má qualidade do ensino, a ociosidade nos laboratórios e a falta de professores. Os estudantes e professores também pediram a retirada do reitor José Carlos Azevedo. Isso, entretanto, só aumentou a tensão, gerando mais suspensões e expulsões de estudantes. Assim, em 1977, novas invasões ocorrem, tropas militares invadiram a UnB, prenderam estudantes, professores e funcionários. Dessa vez, o estopim foi a greve que estudantes e professores declararam para dar um fim às agressões que

5 Existentes até hoje.

6 Não há um número preciso de pessoas detidas na quadra de basquete, mas muitos historiadores comentam que foram cerca de 500 pessoas.

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sofriam. Eles lutaram pela dignidade da UnB e para não aceitar mais os tratamentos sofridos (Salmeron, 2007).

As invasões, contudo, realmente só cessaram com o início da abertura política no Brasil. Em 1979, o Congresso aprova a Lei de Anistia, que perdoou os crimes políticos cometidos desde 1961. O reitor José Carlos de Almeida Azevedo permaneceu até 1984, quando finalmente foi eleito um reitor, pós-ditadura, por eleições diretas: assumiu o professor doutor em economia Cristovam Buarque. Encerrava-se, assim, um ciclo e iniciava-se outro, com novos desafios e perspectivas. A academia começou a vivenciar uma redemocratização (Fávero, 2006; Salmeron, 2007).

Entre 1964 e 1985 não foi possível discutir intelectualmente com liberdade de expressão, principalmente na universidade, onde o ambiente acadêmico visava exatamente ao contrário: por meio da vigilância, controlar as mentes “subversivas”. A UnB durante essa época se tornou um centro de resistência intelectual, com aproximações políticas que impactaram os pensamentos e pressupostos almejados para a universidade (Fernandes, 2013).

Com isso, após a ditadura, a universidade era outra, se distanciando de seus objetivos primários. A departamentalização, exigida na reforma de 1968, se manteve e se desenvolve até os dias atuais. Para a pós-graduação ficou o espaço de pesquisa, seguindo a estrutura dos EUA, que divide os alunos em áreas, limitando o que deve ser pesquisado (Fávero, 2006; Lelis, 2011).

A herança do regime militar ocasionou dificuldades consideráveis à qualidade do ensino superior. Saviani (2008, p. 307) esclarece as consequências do golpe para a educação:

eliminação das turmas/classes resultante da departamentalização aliada à matrícula por disciplina e ao regime de créditos, dificultando o trabalho dos

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professores junto aos alunos e desconsiderando as especificidades das diferentes carreiras profissionais na programação das disciplinas que integram os respectivos currículos; substituição do período letivo anual pelo semestral, reduzindo o tempo de trabalho pedagógico do professor com seus alunos, o que inviabiliza a superação das eventuais lacunas e dificulta a assimilação efetiva, pelos alunos, dos conhecimentos constitutivos das disciplinas consideradas indispensáveis à sua formação.

Ao término da ditadura, um novo tempo se inaugura no Brasil, com a redemocratização do país reverberando em diferentes frentes: sociais, políticas, culturais. Tal época foi muito esperada pela maioria da sociedade brasileira, que ansiava pelas liberdades que outrora foram sufocadas pela ditadura. Na Universidade de Brasília, esse tempo tão esperado foi simbolizado pela gestão do reitor Cristóvam Buarque, eleito diretamente pela comunidade universitária. Seu mandato durou de 1985 a 1989. Além de buscar medidas para reinstauração da democracia no campus, o reitor também visou reconquistar a autonomia da UnB (Longo, 2014).

A UnB completava seus 25 anos de vida, e Cristóvam desejava que ela voltasse a ter mais liberdade, autonomia, democracia. Logo no início de sua gestão o reitor extinguiu a Assessoria de Segurança e Informações, que durante o regime militar subsidiava o governo nas estratégias de controle sobre a UnB, reprimindo as forças contrárias à ordem militar; também buscou reformular alguns estatutos vigentes, que estavam constituídos segundo modelos que dialogavam com a ideologia do governo militar. Além disso, o reitor atribuiu à comunidade universitária a responsabilidade política das ações institucionais, portanto sua interferência nas tomadas de decisões dentro da UnB (Longo, 2014).

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O reitor Cristóvam ainda institucionalizou na UnB uma proposta político-pedagógica interdisciplinar, pautada na ideia de se pensar uma universidade tridimensional. Com essa proposta, haveria uma multidisciplinaridade, e estudantes e professores não seriam mais formadas por categorias do conhecimento apenas, mas a isso agregariam uma formação por categorias dos problemas que estudam, permitindo que um profissional ou estudioso fosse formado por dois ou mais departamentos. Dessa forma, ele ainda almejava que, no futuro, os problemas que atravessassem a sociedade fossem estudados dentro de uma proposta multidisciplinar, pois não dependeriam somente de uma área de conhecimento, mas do intercâmbio de saberes (Longo, 2014).

Outro elemento de grande importância no processo de redemocratização da UnB nesse período foi a anistia política concedida aos professores e servidores que tinham sido expulsos da UnB durante o período ditatorial, como também a todos os professores que se autodemitiram de seus cargos em solidariedade aos colegas expurgados. O reitor ainda abriu a universidade para a extensão com a recuperação do caráter democratizante da educação a distância. Os cursos de extensão aproximaram mais a universidade da sociedade em geral, algo que durante a ditadura militar fora impossível (Longo, 2014).

Apesar dos esforços de Cristovam, a UnB não era mais a mesma e se distanciou da proposta inicial, em vez de tentar restabelecer um programa político-pedagógico para a universidade, resolveu apenas investir bem menos, deixando em aberto sua função social. A crise econômica que se instalou no Brasil paralelamente à abertura democrática fez com que alguns dos projetos almejados não conseguissem ir adiante. Foram anos de subfinanciamento, graves problemas administrativos, crise de autoridade, desvalorização social e manifestações por meio de longas e frequentes greves de estudantes, docentes e servidores. A esse período seguiu-se o estabelecimento da visão neoliberal de educação no país por meio dos governos de Fernando Collor de Mello (1990-1992), Itamar Franco

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(1992-1994) e principalmente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Houve aumento na rede de ensino superior devido à desregulamentação e abertura para investimentos privados. Entretanto, essa expansão se deu apenas quantitativamente, uma vez que à expansão do número de vagas não foi associada a melhoria na qualidade de ensino (Almeida Filho, 2008).

Assim, apesar de o governo do presidente Fernando Henrique Cardodo (FHC) ter tido como iniciativa legislativa a sanção, em 1996, da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) − que manteve a coexistência de instituições públicas e privadas, e a gratuidade nas instituições oficiais. As universidades federais e até o serviço público, de forma geral, ficaram marcados; como bem aponta Carvalho (2006, pp. 128-129)

[...] sucateamento do segmento público, devido à redução drástica do financiamento do governo federal e à perda de docentes e de funcionários técnico-administrativos associados à compressão de salários e orçamentos. A situação tornou-se mais crítica, pois o crescimento da produtividade ocorreu, pela abertura de turmas no período noturno e pelo aumento de alunos em sala de aula, sem a reposição adequada do quadro funcional. Esse cenário estimulou a privatização no interior das instituições por meio da disseminação de parcerias entre as universidades públicas e as fundações privadas destinadas à complementação salarial docente e à oferta de cursos pagos de extensão.

Na época, a privatização da educação superior designou a educação como serviço não exclusivo do Estado, o que teve como consequência a concepção de educação como serviço – e não como direito. A esse respeito, Chaui (2001) alerta sobre as mudanças da universidade, que estariam perdendo sua função social e autoavaliativa, e investindo na produtividade, situação em que o conhecimento e a formação intelectual não seriam mais o alvo do foco, passando a priorizar a reprodução do conhecimento por parte dos docentes

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Tabela 1 –  Caracterização geral da amostra dos participantes

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