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O MUNDO DO TRABALHO E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL

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Academic year: 2018

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O MUNDO DO TRABALHO E A FORMAÇÃO

PROFISSIONAL

- A difícil adequação

-Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, como exigência parcial para obtenção do Título de

Mestre em Administração, sob orientação

do Professor Doutor Ladislau Dowbor.

São Paulo PUC

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Banca Examinadora

_______________________________________

_______________________________________

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Dedicatória

Aos meus pais Manoel e Maria, porque com sabedoria e simplicidade, me incentivaram e encorajaram a explorar o mundo do trabalho e do conhecimento.

Ao meu marido Martino, que sempre

apoiou minhas opções e buscas, com incentivo e amor. Acreditou em mim, compreendeu meu afastamento e buscou suprir minha ausência junto às nossas filhas.

Às minhas filhas Andressa e Larissa,

amores da minha vida, pelas horas de atenção que lhes foram negadas em função deste Trabalho.

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Agradecimentos

Ao Professor Dr. Ladislau Dowbor, meu orientador, sempre tão rigoroso, sempre tão terno, me fez viajar pelo mundo a fora num imenso universo de conhecimento, com quem compartilho parte desta trajetória.

Ao Professor Dr. Onésimo pelas brilhantes aulas, fez despertar em mim vários questionamentos sobre a existência humana, os dogmas e os dilemas, me fez alcançar um plano mais elevado de reflexão e entendimento.

Ao Professor Doutor Leonardo Trevisan, que sempre me incentivou, ressaltando a importância do meu trabalho e pelas importantes considerações feitas no exame de qualificação.

À professora Dra. Marcia Leite, pelas recomendações feitas no exame de qualificação que levaram ao aprimoramento deste trabalho.

Aos professores e coordenadores do Ceeteps, que prontamente me ofereceram material para o desenvolvimento desse estudo.

Aos amigos do Ceeteps – Professor Antonio Carlos Baffi e Professor Jose Aparecido Santos, que contribuíram com o desbrotar das idéias e ajudaram a cultivá-las ao longo do estudo.

Às empresas de Transportes ABNT, CET, METRO, CBTU, SPTrans e Sindicatos dos metroviários, metalúrgicos ABC e bancários que gentilmente me concederam entrevistas.

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À Paulina, Marilini e Marani que com amor e carinho supriram a minha ausência, cuidando de minhas filhas, enquanto eu estudava e realizava este trabalho.

À amiga Marcia S.Michelotti, pelo incentivo e palavras de afago nos momentos de cansaço.

Às amigas Lucia Helena M.R. Domingues Fernandes e Eliane Shiobara pelo apoio e oportunidade da frequente troca de idéias.

Ao Manoel Carvalho pelos ricos debates e estímulo na vida acadêmica.

Aos meus alunos, que me propiciam reflexão constante sobre a complexidade do mundo em que vivemos, ampliando assim minha retórica sobre as transformações atuais.

E finalmente ao Programa de Pós graduação em Administração, que com o auxílio do Capes me concedeu a bolsa, tornando possível a conclusão deste trabalho.

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As atuais transformações sociais, econômicas e políticas ilustram o período de transição que vivemos. Neste momento de mudança de paradigma, o conhecimento torna-se elemento chave para transformações sociais, pois assim como as escolas as organizações empresariais estão alterando sua estrutura organizacional e política, de forma a articular as novas exigências com a formação profissional. Isto implica em sérios desafios para a educação e é preciso refletir tanto sobre a prática profissional como sobre a formação oferecida pelas escolas.

Nesse trabalho faremos uma análise sobre as transformações no mundo do trabalho, e a forma como as empresas reagem a essas transformações. Discutiremos também o conceito de qualificação. Em seguida visando exemplificar a dificuldade de adequação das instituições de formação profissional frente às novas demandas, faremos um breve histórico da educação profissional no Brasil e do Centro Paula Souza. Finalmente relataremos uma experiência de parceria entre o Ceeteps e as Empresas de Transportes.

Esta estrutura de trabalho permitirá a visão articulada dos grandes eixos de análise, a mudança do trabalho, as novas demandas empresariais e os esforços de adequação que hoje se exige dos centros de formação profissional.

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The present social, political and economical transformations show the transition period we have been facing. With the changes of management paradigms, knowledge becomes a key element of social transformation. Professional schools, just like corporations, are having to change their organizational structures, so that they can face the new demands. This means serious challenges for the education system, since the new trends modify both professional practice and the type of education schools have to offer.

In this study, we will first see how jobs are being transformed, and the way corporations are facing these changes. We will then discuss the concept of qualification. After that, as an example of the difficulties teaching institutions face in order to be respond to the new demands, we will present a brief history of the professional education system in Brazil and of the Centro Paula Souza. Finally, we will present an experience of partnership between CEETEPS and the transport companies.

This structure will allow us to show how three key trends, namely how jobs are changing, how the corporations are facing these changes, and how professional training institutions are responding, – can actually be faced by partnership and more flexible management.

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Relação de Figuras... Relação de Tabelas...

x xi Relação de Siglas e Abreviações ... xii

Introdução ...

PARTE I – O MUNDO DO TRABALHO

Capítulo 1 – Transformação no Trabalho

2 1.1. 1.2. 1.3. 1.4. 1.5

Concepções e dimensões do Trabalho e do Emprego... Inovações Tecnológicas e Reestruturação Produtiva ... Teletrabalho ... Desemprego ... Tempo Livre ...

10 15 21 25 30

Capítulo 2 – Estratégias Empresariais de Organização de Aprendizagem

2.1. 2.2.

2.3.

Tendências Organizacionais ... Organização Qualificante ... Gestão do Conhecimento ... 2.3.1. Educação Corporativa... 2.3.2. Organização de Aprendizagem ... 2.3.3. Do Teinamento à Educação ... 2.3.4. Treinar Competências – Aprender à Aprender ...

36 39 43 44 46 49 52

Capítulo 3 – Qualificação Profissional

3.1. 3.2. 3.3. 3.4. 3.5.

Discutindo os Conceitos ... Qualificação como Construção Social ... Qualificação como sinônimo de preparação de capital humano ... As noções de qualificação que tomam como parâmetros a produção e a

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PARTE II – A FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Capítulo 4 – Histórico do Ensino Profissionalizante

4.1. 4.2. 4.3. 4.4. 4.5. 4.6.

No Brasil ... Em São Paulo ... 4.2.1. A reforma educacional nos anos setenta em São Paulo... A Educação Profissional Pós Constituição de 1988 ... A Educação Profissional na LDB ... A Educação Profissional no Decreto 2208/97 ... 4.5.1. Os objetivos da Educação Profissional ... 4.5.2. Formas de Realização... 4.5.3. Níveis da Educação Profissional ... Parecer 16/99 ...

74 78 80 81 84 85 86 86 89

Capítulo 5 – A Instituição de Ensino Frente às Novas Demandas

5.1. 5.2.

5.3. 5.4. 5.5.

Caracterização de Instituição Ensino... Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza ... Diagnóstico da Gestão do Ceeteps ... A nova organização do Ceeteps ... Perspectiva de Mudança...

94 96 99 103 110

Capítulo 6 – A Articulação – Formação da Parceria 116

Considerações Finais ...

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Relação de Figuras e Tabelas

Figura 2.1. Aprendizagem por Competência ...46

Figura 2.2. O Modelo de Treinamento por Competência ...50

Tabela 4.1. Mudança de Paradigma da educação Profissional ...84

Tabela 5.1. Número de Inscritos cursos Técnicos de maior demanda ...91

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Relação de Siglas e Abreviações

ANTP – Associação Nacional de Transportes Público

ARH – Administração de Recursos Humanos

CEB - Câmara Educação Básica

CEETEPS- Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza

CET - Companhia de Engenharia de Tráfego

CETEC- Coordenadoria de Ensino Técnico do Centro Paula Souza

CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas

CNE - Conselho Nacional de Educação

CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos

DISAETE – Divisão de Supervisão e Apoio às escolas Técnicas Estaduais

ETAE – Escolas Técnicas Agrícola Estaduais

ETES – Escolas Técnicas Estaduais

FATEC – Faculdade de Tecnologia

FSP – Folha de São Paulo

FUNDAB- Fundação do Desenvolvimento Administrativo

IE - Instituição de Ensino

LDB – Leis de Diretrizes e Bases Curriculares

MEC - Ministério da Educação e Desporto

METRÔ- Cia Metropolitano de São Paulo

MTB – Ministério do Trabalho

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PROEP- Programa de Educação Profissional

SEFOR- Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional

SPTrans- São Paulo Transportes

UNESP- Universidade Estado de São Paulo

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Introdução

O mundo do trabalho passa por mudanças profundas, os desafios que estas mudanças trazem estão relacionados aos avanços tecnológicos e às novas expectativas das empresas que enfrentam agora mercados globalizados e extremamente competitivos. Com isso, surgem também novas exigências em relação ao desempenho de todos os profissionais1.

No marco dessas transformações, consolida-se o consenso, entre os empresários, da superação gradativa da concepção “taylorista-fordista” de organização do trabalho. Isso nos leva, inevitavelmente, à mudança da concepção de tarefa que deixa de requerer um aprendizado por assimilação de operações, às vezes repetitivas e sem experiência e qualificação, para requerer formas mais abrangentes e organizadas de aprendizagem, onde o ato de pensar preside o ato de fazer. Daí a necessidade de ajudar o trabalhador-aluno a pensar e, mais ainda, de contribuir para que esse trabalhador aproveite sua experiência de vida, organizando-a intelectualmente para utilizá-la em seu trabalho.

As novas tendências atuais do mundo do trabalho, sugerem, portanto, novos modelos de gestão, que enfocam a necessidade do aprendizado contínuo e do comprometimento das empresas na busca do aprimoramento de seus recursos humanos. Paulo Freire (1997), já atentava para a necessidade do aprender a aprender, enfatizando em seu livro “Pedagogia da Autonomiaque para se aprender é preciso que se ensine e para se ensinar é preciso que se aprenda”.

A dinâmica da reestruturação produtiva e seus impactos sobre o mercado de trabalho e sobre a qualificação profissional definem novas competências trazendo mudanças estruturais na configuração dos mercados de trabalho e nos planos nacional, regional e local.

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Esse processo apresenta uma série de desafios para os sistemas de educação profissional, uma vez que valoriza o trabalho qualificado, com características de multifuncionalidade e polivalência, num contexto de mudança altamente dinâmico. A educação passa então a ser uma necessidade para a empresa e um interesse para o trabalhador e para a sociedade, exigindo que se repensem as bases pedagógicas da educação geral e da educação para o trabalho. Ao discutir tal questão Elenice Leite nos fala:

“Em face da crescente difusão de um novo perfil de competências no mercado de trabalho, começa a perder sentido a dicotomia educação/formação profissional e a correspondente separação de campos de atuação entre instituições educacionais e de formação profissional. Trabalho e cidadania, competência e consciência não podem ser visto como dimensões distintas, mas reclamam desenvolvimento integral do indivíduo que, ao mesmo tempo, é trabalhador e cidadão, competente e consciente [....]. A busca de novas metodologias, tanto para jovens como para adultos, coloca em xeque a própria cultura organizacional e pedagógica da maior parte das instituições educacionais e de formação profissional, fruto em grande parte, das teses da organização científica. Perfil inovador, crítico, ousado e com iniciativa dificilmente pode ser formado pela velha escola de organização e administração” (1995, p.13).

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De acordo com essas premissas, a literatura sobre as novas dinâmicas do trabalho e de formação profissional evidenciam a necessidade desse tipo de articulação. A nova legislação preconizada pelo MEC vem enfrentar essas questões, da forma como estabelece no decreto 2208 de 17/04/1997 diz:

“Art.5º - A educação profissional de nível técnico terá organização curricular própria e independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou seqüencial a este”.

E ainda ressalta a importância do desenvolvimento de estudos de mercado para a construção de currículos sintonizados com o mundo trabalho e com os avanços tecnológicos:

“Art.7º - Para a elaboração das diretrizes curriculares para o ensino técnico, deverão ser realizados estudos de identificação do perfil e das competências necessárias à atividade requerida, ouvido os setores interessados, inclusive trabalhadores e empregadores.”

Constatamos portanto, que no paradigma que ora se implanta na educação brasileira, o currículo, tradicionalmente entendido como uma grade disciplinar preestabelecida e, obrigatoriamente reproduzida pelas escolas, passa a ser um conjunto de situações meio organizado de acordo com uma concepção criativa local e particular, voltado para a geração de competências, estas sim estabelecidas para cada área profissional. De acordo com esse paradigma e como resposta ao novo perfil que a laborabilidade ou a trabalhabilidade vem assumindo, o foco central da educação profissional transfere-se dos conteúdos para as competências.

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O grande desafio que o Ceeteps enfrenta é o de atender as novas demandas, que é constituída também pelo aluno - trabalhador que tem experiência mas necessita de reconhecimento e certificação de competências. Assim o Ceeteps não mais atenderá somente o jovem estudante egresso do ensino médio, mas também o trabalhador, pois é importante que as competências adquiridas, especialmente durante a vida profissional, possam ser reconhecidas pelas empresas mas também pelo sistema educativo formal Há projetos destes atualmente em estudo em diversas regiões do mundo, a exemplo da comissão Européia2 que prevê a criação de “certificados pessoais de competências” que façam com que cada indivíduo possa ver reconhecidos os seus conhecimentos e aptidões à medida que os for adquirindo. Essa mudança de postura representa uma alteração significativa nos procedimentos habituais de preparação e planejamento de seus cursos. Empresa e escola precisam estar lado a lado para definir o que deve ser ensinado aos alunos, o que torna esta parceria muito importante.

A escolha por esta temática a ser desenvolvida neste trabalho é resultante do nosso envolvimento com a formação profissional. Exercendo a função de professora de cursos profissionalizante nas unidades do Ceeteps, pudemos vivenciar dia a dia as grandes transformações decorrentes das exigências do mercado de trabalho, da incorporação de novas tecnologias, novo modelo curricular, com importantes implicações sociais econômicas, políticas e culturais, internas e externas à escola. Percebemos a necessidade de uma revisão do modelo de gestão institucional, uma vez que o modelo de formação profissional, com raras exceções estão todos estruturados para atender aos padrões fordistas de produção. Nesse contexto educacional, a organização curricular caracteriza-se pela divisão do conhecimento em disciplinas (conteúdo determinado por especialistas, que costumam ver o mundo a partir da ótica de sua disciplina) num processo de fragmentação da cultura escolar.

Assim optou-se como instrumental analítico relatar os depoimentos dos atores sociais envolvidos na construção do “Primeiro Curso Técnico em Transporte

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Metropolitano sobre Trilhos no Estado de São Paulo”. Esse curso técnico na área de transportes foi elaborado em parceria com empresas do Setor e com apoio na ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos e foram desenvolvidos sob a coordenação do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – Ceeteps.

Essa articulação entre empresa e escola demonstra a ruptura do modelo pedagógico tradicional e do modelo convencional de treinamento oferecido pela área de recursos humanos das empresas, como nos relata Marcos Monteiro3 :

“O curso técnico em transporte metropolitano sobre trilhos, é um projeto piloto em São Paulo, representa um desafio para os atores envolvidos, pois a construção do itinerário de competência é uma experiência nova no Brasil. A parceria entre escola e empresa só é possível concretizar-se a partir de um diálogo entre as partes ”(2000).

Concordamos com Monteiro e acreditamos na importância de relatar essa negociação, pontuando os depoimentos entre as partes envolvidas. De um lado a instituição de ensino habituada a fazer seu planejamento de ensino, a partir de um processo individual de aprendizagem de formas de fazer, definidas pelas necessidades da ocupação a ser exercida, para então desenvolver cursos a partir da necessidade da empresa. E de outro, as empresas alterando seu perfil de treinamento, que era considerado como um meio para adequar cada pessoa ao seu cargo, para modernamente considerá-lo como um meio de desenvolver competências nas pessoas, objetivando maior produtividade.

Com base neste pensamento o Ceeteps está buscando uma adequação à nova proposta de educação profissional e uma organização pró-ativa. A primeira privilegia as demandas do mercado de trabalho e a segunda uma articulação com a sociedade e o mundo do trabalho. Essa nova organização de gestão e de organização compreende alterar a divisão do conhecimento em disciplinas para o princípio da interdisciplinaridade, essencialmente sócio-humanista e parte da reflexão sobre como se dá o conhecimento e para que serve este conhecimento, levando-se em conta o ponto de vista social. Esse princípio resgata o método de

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projetos, os centros de interesse e outras propostas pedagógicas essencialmente operatórias, críticas e democráticas.

Acreditamos ser oportuno um estudo à respeito na medida em que a parceria representa um desafio para os atores sociais envolvidos com a qualificação profissional, uma vez que é preciso superar a visão segmentada, setorizada que a maioria das organizações tem delas mesmas. Torna-se necessário um grande esforço para coletivizar idéias novas, o que implica uma ação de harmonização de interesses, a fim de desenvolver formas de ensino que façam constantemente conexões com a sociedade.

A partir de um mapeamento dos referenciais teóricos associados à dinâmica da questão da qualificação em uma perspectiva da sociologia do trabalho e da educação, poderemos confrontar a expressão dos princípios que organizam e legitimam a passagem de um ensino centrado em saberes disciplinares a um ensino definido pela produção das competências verificáveis em situações e tarefas específicas. Tal estudo compreende uma relação interdisciplinar, quando recorre a várias áreas do conhecimento para garantir sustentação nos referenciais teóricos. É precisamente nesse contexto que esta dissertação pretende dar sua maior contribuição, pois vale ressaltar que a literatura existente sobre as transformações no trabalho e as reformas do ensino profissional reconhece a importância da articulação entre os atores sociais. Entretanto, ainda parecem ser poucos os trabalhos que relatam experiências concretas de cooperação técnica entre empresários e agentes educacionais.

Para desenvolver nossa proposta organizamos este trabalho em seis capítulos dispostos da seguinte forma:

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O Capítulo 2 discute as estratégias empresariais, demonstrando como as empresas reagem às transformações no mundo do trabalho. Especificamente no que se refere à questão da aprendizagem e gestão do conhecimento, ressalta a importância de diferenciar o aprendizado individual do organizacional, evidenciando a necessidade do alinhamento entre as estratégias da organização e administração de recursos humanos.

O capítulo 3 introduz um debate sobre a alteração do conceito de qualificação, relacionando-o com o conceito de competência. Através deste capítulo será possível compreender como o conceito de qualificação é polissêmico, podendo ser assumido com várias acepções e analisado sob ângulos e enfoques distintos.

O capítulo 4 apresenta a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Profissional, identifica as configurações atuais, bem como os rumos a serem seguidos ante a proposta de reforma educacional contida na Lei nº 9.394/96 e no Decreto nº 2208/97. Discute o Parecer CEB/CNE nº 16/99, que é apresentado como Referencial Curricular Nacional para a Educação Profissional.

O capítulo 5 caracteriza o que é uma instituição de ensino, objetivando compreender a sua relação com o meio ambiente e identifica o modelo de gestão de uma instituição de ensino – no caso específico o Centro Paula Souza (Ceeteps), de maneira a entender como esta reage ao processo de mudança.

O Capítulo 6 apresenta um estudo de caso envolvendo o Ceeteps e as empresas de transportes – ANTP, Metrô, CET/SP, CPTM e SPTrans. Apresenta também partes de entrevistas realizadas com os sujeitos envolvidos no processo de cooperação técnica educacional. Este capítulo mostra, portanto, formas renovadas de parceria empresa/escola.

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Esta estrutura deve nos permitir a visão articulada dos três grandes eixos de análise, a mudança do trabalho, as novas demandas empresariais, e os esforços de adequação que hoje se exige dos centros de formação profissional.

PARTE I

O MUNDO DO TRABALHO

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David Harvey, Condição Pós-Moderna

Capítulo 1

Transformações no Trabalho

Esse capítulo aborda os grandes eixos de interpretação da realidade em transformação, portanto representa a base para compreensão e justificativa do tema objeto de estudo. A partir das visões de vários autores analisa um conjunto de idéias sobre as transformações no mundo do trabalho e sobre os impactos causados devido ao surgimento de novas tecnologias, de forma a elucidar os argumentos teóricos que justificam a necessidade de um novo modelo de formação profissional.

1.1. Concepções e dimensões do Trabalho e do Emprego

Etimologicamente o termo trabalho aparece com dois diferentes significados: o primeiro, derivado de tripalium, como sinônimo de tortura e escravidão, mais tarde passou a expressar a idéia de esforçar-se, exercer um ofício; o segundo significado está relacionado com a idéia de orientada para um fim, construção, transformação.

Segundo Chnee4, uma análise da história da humanidade nos mostra que trabalho e técnica sempre estiveram presentes em todas as formas de sociedade, por mais rudimentares que fossem, desempenhando papel fundamental na formação e organização das mesmas. Toda evolução baseia-se em conquistas que se deram a partir do trabalho, ou foram desenvolvidas por meio de técnicas e, a partir de certo momento, por meio da tecnologia. A evolução do trabalho esteve sempre relacionada à estrutura sócio-econômica e cultural, desempenhando um papel importante na construção do sentido do trabalho. A forma de concebê-lo e

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lo passou a determinar o modo de vida das sociedades, sendo inclusive responsável pela diferenciação das mesmas5.

No entanto, ameaças ao trabalho estiveram ligadas a importantes momentos de crises sociais e econômicas ao longo da História, trazendo a tona questionamentos a respeito de sua importância e de seu significado. Muitos trabalhadores lutaram e ainda lutam por melhores condições de trabalho, alguns a partir de justas reivindicações e outros por oportunismo. As máquinas desenvolvidas, para aumentar a eficiência do processo de manufatura, originaram o sistema fabril de produção – que levaria à Revolução Industrial, substituindo o homem em tarefas repetitivas ou perigosas com mais rapidez. Se por um lado a máquina contribuiu com o trabalho efetuado pelo homem, por outro ganhou parte de seu espaço e, em certos casos, tirou seu lugar, determinando uma nova organização do trabalho. Essas novas formas de organização refletem a introdução de novos procedimentos, como por exemplo a Gestão do Conhecimento e Educação Corporativa, e o afastamento daqueles até então dominantes.

Thomas Khun nos ensinou que a ciência avança pela vitória de novos paradigmas, novas explicações e ou procedimentos para entender o mundo sobre verdades estabelecidas. Podemos extrapolar essa proposição também para outras áreas. Assim nos deparamos com vários eixos de interpretações, sendo designado várias propostas de formato de trabalho, diferenciadas em função da ênfase de cada autor em determinado aspecto. Algumas dessas propostas são: “produção de alta performance”, “fabricação enxuta”, “automação flexível”, “just-in-time”, “kan-ban”, “toyotismo”, “era da Informação”, “era do Conhecimento”, “Pós Industrial” ou ainda “Terceira Onda” de Alvin Tofler, entre outros. Estes novos conceitos sinalizam mudanças na organização do trabalho. Mudanças que favorecem a disseminação do novo “modelo de gestão” e remetem à “crise”, de natureza estrutural e de abrangência mundial, atravessada pela economia capitalista ao final da década de 60 e início dos anos 70. Sua complexidade explode nos anos 80 e com diferentes nuanças vem se alastrando, até os dias de hoje, a “todos os campos mais

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abrangentes da vida social - econômico, político, social e cultural”, caracterizando uma ampla “crise societária” ou uma crise global (Wanderley, in Aprile 1996).

Diante da diversidade e da pluralidade de práticas emergentes de trabalho nas sociedades contemporâneas, Leila Blass (1996) sugere que o conceito de trabalho deve ser redefinido. Para Blass, a noção ampliada de trabalho romperia, assim, os limites de um conhecimento sociológico fragmentado e compartimentado, herdeiro da ciência moderna. Além disso, torna-se possível diferenciar os termos trabalho e emprego, resolvendo a problemática surgida historicamente com a generalização das práticas de assalariamento.

Mais do que uma questão de semântica e afora os modismos, a distinção dos termos é um indicador da necessidade de mudança: o empregado (aquele que tem um emprego) ou o funcionário (aquele que exerce uma função). Até mesmo o recente e bastante difundido termo empregabilidade (capacitar-se para ser absorvido pelo mercado de trabalho) começa a ser substituído por trabalhabilidade (capacidade de auto motivar-se e criar oportunidades de trabalho onde não há emprego). Isto nos remete a fala de Dowbor, que afirma:

“O problema do trabalho não pode ser reduzido à questão do “emprego” que garante uma vinculação formal da pessoa com uma instituição. A comunidade necessita de um grande volume de serviços antigamente prestados pela família “ampla“, pelos avós, tios, amigos da família que ajudavam a cuidar da casa, das crianças e dos espaços comunitários” (1998, p.70).

Assim, segundo Helena Hirata (1996) pode-se afirmar que o trabalho, no sentido de trabalho assalariado, perde sua centralidade na medida em que o volume do emprego assalariado regride e ocorre um aumento dos empregos precários. Portanto, repensar o sentido do trabalho, hoje ao nível da sociedade é de certa forma, tentar dar respostas para essa questão da centralidade do trabalho.

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esse raciocínio reduz o universo de análise, quando o momento atual sugere outras possibilidades de trabalho, (tais como: teletrabalho, terceirização, autônomo). Daí a importância, para efeito desse estudo, de distinguirmos os conceitos de trabalho e emprego, como veremos a diante.

Segundo o Dicionário Aurélio da Lingua Portuguesa o termo emprego significa: Ato de empregar, aplicação, ou ainda de Cargo ou Ocupação em serviço particular, público, etc. Para William Bridges (1995), os empregos não fazem parte da natureza. São produtos históricos. Nada torna este fato mais claro do que o significado mutante da própria palavra: emprego. As palavras que usamos são coisas vivas com histórias próprias, e quando seus significados mudam com o passar do tempo, podemos garantir que ocorreram mudanças nas realidades sociais e psicológicas também.

A palavra emprego (Job) é antiga e remonta um período anterior ao ano de 1400, mas até 1800 tinha significado diferente do seu significado atual. No começo, a palavra emprego (job) pode ter sido uma variante de gob (bocado), porque significava “uma pequena porção compacta de alguma substância, um pedaço, um naco, um bocado”. Tanto job (emprego) como gob (bocado) podem, de fato, ter surgido originalmente de uma palavra céltica, gob ou gop significando “boca”. Iniciando-se com o sentido de “pedacinho” de alguma coisa, a palavra começou a ampliar seu significado para incluir “grandes montes” de coisas, como montes de feno ou estrume de curral (a idéia de que esse emprego original possa ter sido um “monte de esterco” parece muito moderna para alguns trabalhadores). Por volta da época em que os imigrantes, puritanos ingleses, chegaram a Plymouth, seu significado sofreu mais uma transformação, mudando de “grande monte” em si para o ato de transportar tal monte numa carroça. A partir daí, foi um passo para se usar o termo emprego (job) para referir-se a “qualquer tarefa que fosse uma peça única de trabalho” (Bridges,1995).

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serviço”. Em outras, ainda, como em “Tive um trabalho duro para encontrá-lo” ou “Ela fez um negócio ruim ocultando seus sentimentos”, passou a utilizar o termo para referir-se a quase que qualquer empreitada ou esforço.

Contudo, o emprego nos moldes atuais desenvolveu-se inicialmente nas tecelagens, na metaloplastia e nas fábricas de calçados, atividades executadas além daquelas de pastoreio e agricultura, que eram desempenhadas artesanalmente e denominadas job-work (Bridges, 1995). A idéia moderna de emprego surgiu como algo assustador, desagradável e socialmente ameaçador. Para os críticos, tratava-se de uma forma de trabalho antinatural, desumana e insuportável. Mas com a apropriação das terras onde havia plantio e pastoreio e com o oferecimento de trabalho nas fábricas, cada vez mais pessoas deixaram o job-work ao estilo antigo e dedicaram-se a arranjar um emprego.

O trabalho nas fábricas e organizações burocráticas dos países que se industrializavam trouxe consigo o conceito de emprego. Até então as pessoas trabalhavam, mas em geral em grupos que variavam segundo as tarefas. Desempenhavam diversas atividades, que podiam ser breves e leves, ou árduas e demoradas, para si próprio ou para outros por meio de contratos. Não existia emprego no sentido fixo. A programação era determinada “pelo sol, pelo tempo e pelas necessidades do dia” (Bridges 1995).

Contribuindo com esse pensamento, Phlippe Zarifian (1990) acredita que o referencial do emprego não é outra coisa senão uma sequência lógica de tarefas, a partir das quais infere-se as capacidades físicas, os conhecimentos técnicos e uma disciplina social “qualidades” que todo indivíduo pretendendo ocupar aquele posto de trabalho deve possuir.

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em desempregados (Rifkin e Bridges, 1995). É fácil compreender o problema se considerarmos que o trabalho faz parte dos projetos de vida das pessoas, o que dificulta o fato de programá-lo em sua total ausência (Chnee, 1998).

Entretanto, Ladislau Dowbor (1998) adverte que o problema do emprego vai mais longe, a visão conservadora do mundo está ruindo (Antony Guiddens) e estamos no limiar de uma nova era, à qual as ciências sociais devem responder o que está nos levando para além da modernidade. Basta dizer que estamos evoluindo para a era dos serviços? É fácil dizer que nos Estados Unidos a agricultura ocupa 2,5% da mão-de-obra. Tal avaliação segundo Dowbor, é possível porque reduzimos a atividade agrícola à lavra da terra. Hoje o agricultor americano se apoia em serviços de análise de solos, em serviços de inseminação artificial, serviços de calagem, serviços de silagem, serviços meteorológicos e outros. Não há mais agricultura, ou a agricultura passou a funcionar de outra forma?

Da mesma forma poderíamos dizer que a secretária ou engenheiro que trabalham na fábrica não estão na indústria, estão na área de serviços. “Na realidade trata-se em grande parte de uma transformação do conteúdo das atividades produtivas, e não do desaparecimento destas atividades em proveito de uma nebulosa área de serviços. De certa forma, é o conjunto das atividades humanas que está sendo transformado ao incorporar mais tecnologias, mais conhecimento e mais trabalho indireto” (Dowbor, 1999).

Sabemos então que o motor de transformações se dá pelo efeito causado pela introdução de novas tecnologias, no âmbito do trabalho e do emprego. Portanto, para efeito desse estudo, apontaremos seus efeitos no âmbito do emprego e das novas formas de trabalho, as quais em boa parte pode resultar em uma exigência de maior qualificação para o trabalhador.

1.2. Inovações Tecnológicas e Reestruturação Produtiva

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contratos temporários, terceirizações, organizações virtuais, projetos transnacionais, teletrabalho, etc. Dessa forma, a atividade profissional passa então a ter uma característica universal, expandindo a dimensão social do significado que lhe é atribuído, uma vez que muitos profissionais já não fazem parte de um mercado de trabalho local, mas sim mundial.

Em matéria de gestão e organização empresarial, Elenice Leite nos fala sobre as definições que se difundem nesse quadro, uma série de princípios que configuram uma “nova filosofia de produção”, ou como aventam alguns estudiosos, um “novo paradigma”, sob vários aspectos distintos da arquitetura taylorista-fordista que teria predominado no modelo anterior. Essa reestruturação, segundo Leite, chega a configurar uma fase de crise e transição, de modo a incorporar um novo ideário nos discursos de diferentes atores — empresários, trabalhadores, educadores, administradores e associações de classe, assumindo de certa forma, a mesma dimensão paradigmática que a organização científica atingiu ao longo dos anos do pós-guerra.

Entretanto, esse ideário, inicialmente mais localizado no plano do discurso, acaba incidindo na prática das empresas, definindo novas práticas produtivas, com impactos diretos sobre o trabalho e na qualificação do trabalhador. A reestruturação empresarial, assim conduzida, tem como componente básico a busca de:

• Integração, no sentido de racionalizar e otimizar recursos, ou ainda, superar progressivamente “gargalos” ligados a estoques, tempos mortos, desperdícios, e

• Flexibilidade, em particular na definição do mix de produtos e em suas especificações segundo o perfil dos clientes.

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Manuel Castells (1999) em seu livro “A Sociedade em Rede” nos fala do surgimento de uma nova estrutura social, associada à ascensão de um novo modo de desenvolvimento: o informacionalismo. A economia informacional é caracterizada por cultura e instituições específicas, mas não está relacionada a uma determinada e única sociedade. Um de seus aspectos mais importantes é que ela não se restringe a uma área geográfica ou a um país isolado; ao contrário, surge em contextos culturais muito distintos, da América do Norte à China, passando pelos mais variados pontos do planeta, exercendo influência em todos os países e gerando uma estrutura de referências multiculturais.

Castells (1999) enfatiza que a revolução tecnológica não é caracterizada pela centralidade de conhecimentos e informação, mas sim pela aplicação desses conhecimentos e dessa informação para a geração de conhecimentos e de dispositivos de processamento/comunicação da informação, em um ciclo de realimentacão cumulativo entre a inovação e sua aplicação. Vejamos em suas próprias palavras:

“Computadores, sistemas de comunicação, decodificação e programação genética são todos amplificadores e extensões da mente humana. O que pensamos e como pensamos é expresso em bens, serviços, produção material e intelectual, sejam alimentos, moradia, sistemas de transporte e comunicação, mísseis, saúde, educação ou imagens. A integração crescente entre mentes e máquina, inclusive a máquina de DNA, está anulando o que Bruce Mazlish chama de a “Quarta descontinuidade” (aquela entre seres humanos e máquinas), alterando fundamentalmente o modo pelo qual nascemos, vivemos, aprendemos, trabalhamos, produzimos, consumimos, sonhamos, lutamos ou morremos” (Castells, 51:1999).

Portanto, as tendências tecnológicas e organizacionais que vêm sendo introduzidas no mundo do trabalho indicam que suas formas rígidas de organização começam a ser flexibilizadas, dando passagem a um novo regime de acumulação, que alguns autores denominam de “especialização flexível” ou “acumulação flexível”. O novo “modelo produtivo”, conforme destaca Harvey (1992) :

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taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional.

Ainda, segundo Harvey6, a “acumulação flexível”, envolve:

(...) rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como em regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado setor de serviços, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (...)(140:1992).

Sob a égide da “acumulação flexível”, o velho “modelo taylorista/fordista” estaria sendo substituido por um “novo” modelo de organização do trabalho, cujas características principais seriam a produção em pequenos lotes, a reintegração das atividades de execução, planejamento e ainda, o emprego de trabalhadores mais qualificados para o desenvolvimento de um trabalho mais variado.

Nadia Araujo Castro, ao tratar de questões relativas ao trabalho e à organização industrial num contexto de crise e de reestruturação produtiva, considera que:

[...] sinais emitidos do mundo da moderna atividade industrial, ou seja, indicadores conjunturais insistentemente veiculados ao longo de 1993 davam conta do crescimento da população, da produtividade e da capacidade integração competitiva em alguns setores, como a automobilística, que se constituem em carros chefes da indústria no Brasil. Estes resultados pareciam decorrer não da simples incorporação milagrosa de equipamentos sofisticados, mas sim de um intenso e simultâneo processo de reestruturação organizacional, que tem alterado tanto a estrutura interna das empresas – suas formas de organizar e gerenciar a produção e o trabalho- quanto as relações entre empresas. (1994, p.116).

Tal processo, como afirma Oliveira Neto7, além de envolver mudanças na estrutura produtiva, acarretou transformações micro e macroeconômicas, mudanças institucionais no âmbito da sociedade civil e mudanças políticas e culturais, presentes também no cenário mundial, as quais se fizeram sentir no País com o processo de abertura iniciado na década de 90, o que colocou a indústria aqui instalada – de capital nacional e estrangeiro diante de novos desafios. Foi o momento de mudanças produzidas pelo processo de transição política, econômica e

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cultural decorrentes da implantação de um projeto político nacional iniciado no Governo Collor, seguido pelo de Itamar Franco e intensificado pelo de Fernando Henrique Cardoso.(1999).

Por outro lado, numa perspectiva macro social, Dowbor8 (1999) nos fala sobre o conjunto das atividades humanas que está sendo transformado ao incorporar mais tecnologias e mais conhecimentos. Adverte que nem a área produtiva, nem as redes de infraestruturas, e nem os serviços de intermediação funcionarão de maneira adequada se não houver investimento no ser humano, na sua formação, na sua saúde, na sua cultura, no seu lazer, na sua informação. Em outros termos, a dimensão social do desenvolvimento deixa de ser um “complemento”, uma dimensão humanitária de certa forma externa aos processos econômicos centrais, para se tornar um dos componentes essenciais da transformação social que vivemos. Portanto, Dowbor nos lembra que o principal setor econômico nos Estados Unidos não é mais a indústria automobilística, ou bélica, mas a saúde, que representa 14% do seu PIB.

Sendo assim, por mais paradoxal que possa parecer a tecnologia, quanto mais sofisticada, torna-se também mais acessível a um número maior de pessoas e mais é reconhecido o valor do capital humano como vantagem competitiva das empresas. Isto enfatiza o caráter de ferramenta da tecnologia freqüentemente sub utilizada e não como um concorrente ou substituto do trabalho humano. Assim como o arado para o período agrícola e a máquina a vapor para o período industrial, hoje dispomos da informática como ferramenta na substituição de atividades repetitivas e automatizadas, que prescindem de características basicamente humanas na criatividade, intuição e inteligência. O que conta não é o quanto de tecnologia que se dispõe, mas se o uso que se faz dela implica em diferença no resultado final do produto ou serviço apresentado ao cliente.

Entretanto, cabe ressaltar que não estamos diante de um padrão único, estamos diante de um complexo processo de construção social, para o qual a história

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Oliveira Neto, Paulo Rocha. Aspectos do Trabalho na Pós Modernidade. Dissertação de Mestrado. São Paulo. Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação e Qualificação Profissional. PUC/SP, 1999.

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pregressa e a cultura dos agentes sociais envolvidos na transformação desempenham uma enorme importância na definição de suas características. Assim vale considerar por exemplo que algumas empresas implantam programas de qualidade total (TQC ou CQT), Just-In-Time, reengenharia conceitos de cliente interno e do binômio-cliente fornecedor em paralelo com inúmeras formas de trabalho informal e mal pago.

Nessa linha de reflexão Marcia Leite nos alerta sobre a performance da indústria japonesa, especialmente no setor automobilístico, que tem levado a um duplo movimento entre os estudiosos: por um lado, pode-se identificar uma tendência à idealização das características do chamado “modelo japonês” que seria responsável pela adoção de formas de organização do trabalho mais satisfatórias, baseadas no trabalho qualificado, bem pago e estável, por outro lado, uma tendência à crença de que tal modelo deverá se expandir pelo mundo repetindo as mesmas características do “modelo japonês” no que se refere à organização do trabalho, relações entre empresas e formas de gestão da mão-de-obra, o que tem se expressado inclusive no novo termo criado para a discussão de tal fenômeno, qual seja, a japonisação ((japanization) (M.Leite, 2000:17).

Esse tipo de consideração como nos fala M.Leite9, nos alerta não só para a necessidade de levar em conta a diversidade nas formas de adaptação ao novo contexto internacional, mas mais que isso, de ter presente que uma nova divisão internacional do trabalho pode estar em andamento, provocada especialmente pela enorme expansão do capital japonês a nível internacional nos últimos anos, a qual tenderia a concentrar as fases mais sofisticadas do processo de produção em alguns países, ao lado de uma externalização das fases mais simples, que se dirigiria às regiões com maior concentração de mão-de-obra barata. Tal tendência, que levaria a uma difusão de empresas que se caracterizariam por uma utilização mais predatória da mão-de-obra, seria encontrada não só em alguns países em desenvolvimento, mas inclusive em algumas nações do mundo desenvolvido onde a qualificação da mão-de-obra é relativamente baixa e o custo do trabalho é igualmente baixo ou vem tendendo ao declínio nos últimos anos (2000:20). Isso

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significa que estamos passando por processos complexos e contraditórios e que requer, portanto, a capacidade de balizar as macro idéias.

Enfim, vale destacar que face à essas constatações, compreendemos que as transformações que caracterizam o atual mundo do trabalho e o novo modelo de gestão é orientado por um conjunto de valores e idéias, cujas mudanças provocam sobre os processos de trabalho e gerenciamento da mão-de-obra configuram uma nova ofensiva do capital frente às novas exigências que lhe são impostas. Ao alterar a maneira de trabalhar e de produzir, o “Novo modelo de gestão” atinge diretamente a classe trabalhadora, colocando “em xeque” a qualificação profissional, nos moldes em que vem sendo tradicionalmente obtida, e ao mesmo tempo, exige do trabalho qualificado o preenchimento de novos requisitos.

Portanto, qualquer discussão acerca das perspectivas que se apontam para o futuro da qualificação profissional, passa necessariamente por um processo de reflexão sobre as contradições e diversidades do atual mundo do trabalho. Consideramos importante que essas mudanças apontadas pelos autores, devem ser vistas com realismo e de acordo com a capacidade individual de cada contexto social econômico e político.

Assim, os debates sobre as transformações no trabalho, que resultam numa exigência de maior qualificação, devem levar em conta a diversidade real (por exemplo, a divisão sexual e a discriminação da força de trabalho por gênero) ou ainda as diferenças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Pois o universo do trabalho, que está na base das discussões, é aquele das grandes empresas, empregando mão-de-obra masculina com processos de inovação tecnológica intensos nos países do Norte.

1.3. O Teletrabalho

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casa, ou de casa, ou mesmo na rua, no caso dos vendedores. As telecomunicações, aliadas à informática, vêm dando um grande suporte a essa forma de trabalho, permitindo a comunicação entre empregados, colegas e empresa através de recursos tais como: o fax, telefone, a viva-voz, o correio eletrônico e o vídeo-conferência. Porém, não se trata de uma idéia nova. Handy 1994:cap.4, cita uma empresa britânica, a F. International, que iníciou em 1962 um programa chamado “Free-lance Programmers”. Na realidade, tratava-se de uma só pessoa que escrevia em sua própria casa programas de computador para empresas. Em 1988, a F. International empregava 1100 pessoas, 70% das quais trabalhando em casa e 90% eram mulheres. Essas pessoas não trabalhavam isoladas, mas em grupos formados em torno de projetos e tarefas. Uma rede de telefones e computadores permite a comunicação entre esses grupos, possibilitando o cumprimento dos objetivos propostos (Tose: 1997).

Para De Masi (2000) existem muitas formas de teletrabalho: empresas de trabalho à distância, escritórios-satélites, centros comunitários, trabalho em domicílio, trabalho em escritórios móveis, como por exemplo, aqueles instalados em ônibus da equipe de políticos durante as campanhas eleitorais (205).

Assim segundo este autor nem todos os trabalhos são descentralizáveis. Eles o são mais facilmente, sobretudo, quando consistem numa atividade simbólica (ler, traduzir, processar dados, etc) e se têm como matéria-prima a informação que, devido a sua natureza ubíqua10, é transmissível em tempo real. É um trabalho que se realiza com procedimentos bem codificados no que diz respeito ao seu início e fim: a ordem é do tipo “até depois de amanhã, na hora tal devo ter feito isso”. Porém, apresenta procedimentos bastante decodificados no que diz respeito ao processo: o trabalhador pode cumprir sua tarefa de manhã ou de noite, na cozinha, no terraço, tanto faz, isso não interessa à empresa.

Este modelo de trabalho requer, portanto, uma boa autonomia técnico-instrumental ou ao menos a possibilidade de obtenção por parte de alguém mais qualificado se surgirem dificuldades. Requer também, a possibilidade de usufruto de todos os

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recursos indispensáveis ao trabalho: se este exige o uso do correio eletrônico, deve-se poder consultá-lo através do computador ou da Web TV. Todavia, De Masi adverte que é preciso avaliar bem suas vantagens e desvantagens para os trabalhadores, para os empregadores, para os sindicatos e para a sociedade em seu conjunto.

Para os trabalhadores, segundo De Masi, parece que as vantagens são sobretudo as seguintes:

“Autonomia dos tempos e dos métodos, coincidência entre o lar e o local de trabalho, redução dos custos e do cansaço provocado pelos deslocamentos, melhoria da gestão da vida social e familiar, relações de trabalho mais personalizadas, além da possibilidade de redução das horas de trabalho propriamente dito” (2000:206).

Ainda, segundo o mesmo autor as desvantagens podem ser:

“Isolamento, marginalização do contexto e da dinâmica da empresa (logo o provérbio “o que os olhos não vêem, o coração não sente”, significando menores chances na carreira), o problema da reestruturação dos espaços dentro de casa, dos hábitos pessoais e das relações familiares (do tipo quem leva os filhos para escola?). Mas também sobre este ponto goza-se da vantagem oferecida pela flexibilidade dos horários e do fato de se passar mais tempo em casa” (2000:207).

Do ponto de vista das Relações de trabalho, poderão existir dificuldades para:

“Ações coletivas com os colegas de trabalho até que se descubra a idéia de fazê-las de tipo informático: utilizando os mesmos veículos com os quais a empresa passa a informação para passar contra-informação”.

E no que se refere a organização sindical, haverá dificuldades até o momento em que os sindicatos aprendam a usar estas tecnologias e se transformem em teles-sindicais.

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“O poder contratual, pois se o trabalho é substituível, o trabalho poderá se tornar mais precário. O espaço da concorrência se estende a todo o planeta. E existe, por esse motivo mesmo, o risco da má distribuição”.

Por outro lado, as empresas poderão aproveitar as vantagens de uma maior flexibilidade econômica (podendo empregar, com o teletrabalho uma pessoa que está na mesma cidade, ou outra do outro lado do mundo) e de uma maior flexibilidade organizacional. Poderão reduzir os custos de locação (em Milão, a IBM calcula que um único emprego implica um custo de 30 milhões de liras por ano, contando aluguel e as outras despesas) e os custos com o transporte dos funcionários, nos casos em que pagavam por ele. Poderão gozar de um incremento da produtividade e, em certos casos, também da motivação e da criatividade dos empregados (De Masi, 2000: 207).

Suas desvantagens, segundo o mesmo autor, em potencial derivam do fato de que, como isso altera a hierarquia empresarial e os quadros oferecem resistência: querem manter os subalternos sob controle, pois, de fato, com o teletrabalho este controle é bem mais difícil de ser exercido, seja em termos de relação pessoal, seja do ponto de vista do processo de trabalho. O controle só pode ser feito com o produto acabado. Há o perigo de que diminua-se a identidade empresarial, isto é, que os empregados se sintam mais distanciados e estranhos à empresa. Com efeito, os chefes de pessoas em empresas que adotaram o teletrabalho organizam festas, reuniões, mostras cinematográficas para reavivar nas pessoas o “espírito de empresa”.

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Nosso objetivo com esta discussão foi o de identificar os fatos que demonstram como as novas tecnologias sugerem novas formas de organização de trabalho, desenvolvem-se atividades de organização, pesquisa, gerenciamento, design e outras que têm sido chamadas, segundo Dowbor de atividades “intangíveis”11, porque não produzem um produto concreto, não trabalham com uma máquina concreta. Muita gente tem denominado estas atividades como serviços, que é um termo vago. Mas na realidade, trata-se de uma forma mais intensiva em conhecimento de desenvolver atividades de transformação produtiva industrial (2000:6)

Assim, o conhecimento se torna um elemento chave de transformação social e a própria importância da educação muda qualitativamente, deixando de ser um complemento e adquirindo uma nova centralidade no processo (Dowbor, 2000). Na ausência desse e de outras políticas de articulação social, deparamos com o desemprego, conforme analisaremos mais detalhadamente a seguir.

1.4 Desemprego

A literatura sobre o tema apresenta vasta polêmica sobre os impactos da modernização em relação ao emprego, não raro sem respostas definitivas. Entretanto, parece haver consenso de que a questão do emprego não pode ser reduzida à criação ou destruição de postos nas unidades produtivas, nem condicionadas aos ditames da tecnologia, uma vez que envolve antes de tudo políticas e formas de gestão (SINGER, 1998).

Há apenas 25 anos, havia abundância de empregos industriais bem remunerados em setores como siderurgia, automóveis e borracha. Hoje, constatamos um declínio em massa de empregos fabris, pois uma grande parte desses empregos nos países industrializados foram substituídos por equipamento automatizado e , reestruturado em empregos que exigem habilidades técnicas de nível consideravelmente complexas.

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Segundo Manuel Castells, ao discutirmos as características do desemprego industrial, fazendo uma analogia com o que ocorreu com o rural, podemos afirmar que não haverá empregos suficientes no setor de serviços para substituí-los porque os próprios empregos desse setor estão sendo rapidamente automatizados e eliminados, e este movimento se acelerou na década de 90 (1999: 276).

Todavia, segundo esse mesmo autor, a tecnologia da informação em si não causa desemprego, mesmo que obviamente reduza o tempo de trabalho por unidade de produção. Mas sob o paradigma informacional, os tipos de trabalho mudam em quantidade, qualidade e na natureza do trabalho executado. Assim, um novo sistema produtivo requer uma nova força de trabalho e os indivíduos e grupos incapazes de adquirir conhecimentos informacionais poderiam ser excluídos ou rebaixados.

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Assim, Rifikin adverte que a não distribuição dos ganhos auferidos com a automação está levando a uma grande concentração de renda. Esta é agravada pela irresponsabilidade social da classe empresarial, uma vez que esta só age no sentido de aumentar ainda mais os índices de desemprego e a informalização do mercado de trabalho, o que gera inevitáveis tensões sociais.

Rifikin se dedica, então, a mostrar como a renda poderia ser redistribuída. Em primeiro lugar ele aponta a necessidade de uma reestruturação da jornada de trabalho e dos níveis salariais. A redução da jornada de trabalho poderia causar um impacto positivo nos índices de emprego, especialmente se fosse generalizada para todos os setores, evitando que a classe empresarial recusasse a proposta através do argumento de perda de competitividade. Paralelamente, uma política de desestímulo ao pagamento de horas extras minimizaria as tentativas de sabotar a redução da jornada de trabalho. Para assegurar a demanda por produtos e serviços seria preciso aumentar ou manter os níveis salariais, proposta que naturalmente sofreria oposições por parte do empresariado, mas que poderia ser solucionada com uma negociação por um salário menor e a contrapartida de participação nos lucros.

Por outro lado, Rifkin assinala a necessidade de se estabelecer um novo pacto social, uma vez que nem o Estado e nem o mercado tem se mostrado capazes de satisfazer as necessidades básicas da humanidade. Nesse pacto, vislumbra-se a participação do Terceiro Setor, que poderia absorver o tempo ocioso da população economicamente ativa e a força de trabalho dos desempregados por meio da prestação voluntária de serviços sociais. Em sua opinião, o Estado poderia apoiar esse novo pacto com um salário indireto para os empregados que doassem seu tempo. Isto poderia ocorrer através de um mecanismo de dedução no imposto de renda por hora de trabalho voluntário ou de um salário social para os desempregados que se dispusessem a ajudar sua própria comunidade.

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milhões de empregos nos países industrializados e na Europa Ocidental. Propõe que se proceda uma revisão profunda da duração do trabalho, das suas finalidades e da natureza de suas atividades. Assim, a alternativa estaria entre duas formas de gerir a abolição do trabalho – a sociedade do desemprego ou a sociedade do tempo liberado.

A sociedade do desemprego é a dualidade12, tem-se de um lado trabalhadores protegidos, e de outro lado uma massa crescente de desempregados, e, entre estes dois segmentos, um proletariado de trabalhos precários com tarefas menos qualificadas. A sociedade do tempo liberado começa a se esboçar como contraponto à sociedade existente e fundamenta-se no princípio de que, para que todos trabalhem, é preciso trabalhar menos e ter mais atividades autônomas. O trabalho socialmente útil seria distribuído entre aqueles que desejassem trabalhar, deixando de ser a ocupação principal ou exclusiva de cada indivíduo, para dar lugar a um conjunto de atividades autodeterminadas e executadas em função do interesse ou do prazer.

Compartilhamos com o autor a idéia de que a única forma de crescimento sustentável que tem sentido é a que repousa numa redistribuição do trabalho. Isto é, num modelo de sociedade que não desenvolva de forma indefinida a produção de mercadorias mas converta em parte os ganhos de produtividade em benefício qualitativo: o tempo livre, Redistribuir o tempo liberado pelo trabalho para que todos possam trabalhar cada vez menos, essa vertente é confirmada por Gorz :

“Ter duas vidas, uma pela qual se assume seu lugar na mega-sociedade e se influi nela; a outra pela qual o homem pertence a si-mesmo, a seus próximos, às redes micro-sociais auto organizadas tendo em vista uma livre cooperação, tendo em vista trocas recíprocas e a realização do bem comum. Tudo pelo meio tempo,

afirmava Aznar há uns dez anos; “trabalhar a meio- tempo é viver

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em dobro”, escreve ele hoje em dia. É a possibilidade de todos pertencerem a duas esferas de uma “sociedade bipolar”, a do trabalho macro-social determinado pelas exigências funcionais do sistema e aquela das atividades autodeterminadas, privadas ou públicas, individuais ou cooperativas, regidas por valores e critérios outros que não os do dinheiro, ou do mercado. A sociedade bipolar é a alternativa e o antídoto à sociedade dualista” (GORZ, apud Aznar 1995).

Sendo assim, para os autores aqui citados, Aznar, Bridges, Castells, Dowbor, M. Leite, Rifkin e outros, a tecnologia em si não gera e nem elimina empregos, ela, na verdade, transforma profundamente a natureza do trabalho e a organização da produção. A reestruturação de empresas e organizações, possibilitada pela tecnologia da informação e estimulada pela concorrência global, está introduzindo uma transformação fundamental: a individualização no processo de trabalho. O sinal mais evidente dessa mudança talvez seja o lema “Não há longo prazo”. No trabalho, a carreira tradicional, que avança passo a passo pelos corredores de uma ou duas instituições, está desaparecendo, e também a utilização de um único conjunto de qualificações no decorrer de uma vida de trabalho.

De outro lado, é de senso comum, no debate sobre o desemprego, que profundas transformações estão em curso na relação que os sujeitos sociais, e sobretudo os jovens, mantêm com o trabalho. É possível que estejamos a ponto de sair da “civilização do trabalho” que, desde o século XVIII, colocou a economia no posto de comando e a produção na base do desenvolvimento social. Este pensamento demonstra um apego fora de moda ao passado subestimando as inovações que se fazem e as alternativas que se buscam para ultrapassar a concepção clássica de trabalho. Tanto que o reconhecimento da dignidade social de um indivíduo não é necessariamente o emprego assalariado e nem mesmo o trabalho, mas sua utilidade social, isto é, sua participação na produção da sociedade. Tal posição é sustentada, com variantes, por sociólogos como C.Offe ( 1985), G.Aznar (1995) e Castells (1999) e por economistas como Dowbor, (1998) J. Rifkin (1990) e outros.

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de trabalho que segundo a sua ótica deve ser distribuída em processos concretos de produção, e por outro lado os frutos desse trabalho devem ser distribuídos entre aqueles que trabalham e os que legitimamente não trabalham (através de orçamentos privados e públicos). Os sistemas capitalistas de economia de mercado devem solucionar esse duplo problema (1989, 87). No entanto, segundo os sistemas capitalistas de economia de mercado, “solucionaram” esse duplo problema erigindo um mercado para a “mercadoria” da força de trabalho e essa solução implica na monetarização da capacidade de trabalho (trabalho assalariado). Sendo assim, a força de trabalho distingue-se das mercadorias usuais por causa de sua marcante variabilidade e determinabilidade. O que o empregador de força de trabalho compra no mercado não é propriamente “trabalho”, mas sim uma capacidade de trabalho, então o grande desafio é como transformar a capacidade de trabalho em trabalho real.

1.5. Tempo Livre

Dedicamos o final desse capítulo para refletir sobre as propostas revolucionárias de Domenico de Masi (2000), que expressa uma profunda insatisfação com o modelo social elaborado pelo Ocidente, sobretudo pelos Estados Unidos, centrado na idolatria do trabalho, do mercado e da competitividade. Ele propõe um novo modelo baseado na simultaneidade entre trabalho, estudo e lazer, no qual os indivíduos são educados a privilegiar a satisfação de necessidades radicais, como a introspecção, a amizade, o amor, as atividades lúdicas e a convivência.

Segundo De Masi, “o ócio” pode transformar-se em violência, neurose, vício e preguiça, mas pode também elevar-se para a arte, a criatividade e a liberdade. É no tempo livre que passamos a maior parte de nossos dias e é nele que devemos concentrar nossas potencialidades.

Assim para de De Masi:

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E ainda :

“O futuro pertence a quem souber libertar-se da idéia tradicional do trabalho como obrigação e for capaz de apostar numa mistura de atividades, onde o trabalho se confundirá com o tempo livre e o estudo. Enfim, o futuro é de quem exercitará o “ócio criativo”.

As transformações no trabalho indicam que agora é possível produzir sempre mais bens e serviços com sempre menos trabalho humano. Portanto, segundo De Masi, o trabalho deverá descer do trono onde tinha sido posto pelos patrões, pelos filósofos e pela igreja. Se há cem anos a idolatria do trabalho era indispensável para liberar-nos da miséria, hoje, na maioria dos casos, é apenas uma inútil escravidão psicológica(2000: 298).

Uma vez delegadas às máquinas as tarefas executivas, para a maioria das pessoas sobra só o desempenho de atividades de tipo intelectual, flexível, criativo, empreendedor: atividades que, pela sua própria natureza, desembocam no estudo e no jogo. O publicitário que deve criar um slogan, o jornalista em busca de uma “dica” para um artigo, o juiz às voltas com a pista de um crime, todos têm maior chance de encontrar a solução justa, passeando ou nadando, ou indo ao cinema, do que se ficarem trancafiados dentro das corriqueiras, tediosas e cinzentas paredes dos seus respectivos escritórios.

Entretanto, De Masi reconhece a dificuldade de aceitação de sua proposta e esclarece que esta dificuldade se dá, infelizmente, porque todas as instituições que cuidaram das pessoas — a família, a escola e as instituições religiosas – prepararam, de uma forma obsessiva, para trabalhar, negligenciando a educação para o lazer, identificado só somente como consumo exibicionista, caro e perigoso.

Portanto para De Masi, tempo livre significa:

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ir á praia, fazer amor com a pessoa amada, adivinhar os pensamentos, os problemas e as paixões que estão por trás dos passageiros do metrô, admirar as fachadas dos prédios e as vitrines das lojas, assistir a um festival de televisão, ler um livro, levantar uma polêmica com um motorista de táxi, assistir ao pôr do sol ou ao nascer da lua, admirar a sábia beleza de uma garrafa, de um ovo ou dos carros que circulam pelas ruas. Balançar-se numa rede, que foi símbolo por excelência do ócio criativo, perfeita antítese da cadeia de montagem que o símbolo do trabalho alienado. Em suma dar sentido às coisas de todo dia, em geral lindas, sempre iguais, diversas e que infelizmente ficam depreciadas pelo uso cotidiano (2000: 300).

Sendo assim, para efeito desse estudo julgamos as idéias de Masi importante para a reflexão científica no que se refere ao conhecimento, pois conforme vimos, tudo indica que não estamos enfrentando apenas uma revolução tecnológica. Na realidade, conforme Dowbor, o conjunto de transformações parece estar levando a uma sinergia da comunicação, informação e formação, criando uma realidade nova, que está sendo designada como “sociedade do conhecimento13. De certo modo, o processo reflete os primeiros passos do homo culturalis, em contraposição ao homo economicus dos séculos XIX e XX.

Neste processo de transição, os desafios à educação estão lançados, na medida em que é valorizado o conhecimento. Vejamos nas palavras de Dowbor:

“O universo cultural dos indivíduos ou de uma comunidade não possui uma gaveta estanque para “educação“ – os processos educativos devem articular-se com os diversos espaços de conhecimento existentes, envolvendo a televisão, a formação empresarial, as dinâmicas religiosas e assim por diante. A tarefa da educação se complementa assim com a articulação de atores sociais, promoção de eventos que aproximam as pessoas”. (2000: 29).

Isso significa que a educação para o trabalho não deve voltar-se unicamente para o processo de reestruturação produtiva, especialmente para não operar uma relação entre educação e emprego, educar para o ócio significa ensinar a escolher um filme,

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uma peça de teatro, um livro. Ensinar como se pode estar bem sozinho, consigo mesmo significa também habituar às atividades domésticas e à produção autônoma de muitas coisas que até o momento comprávamos prontas. Ensinar o prazer do convívio, da introspecção, do jogo e da beleza. Para De Masi, a pedagogia do ócio também tem sua própria ética, sua estética, sua dinâmica e suas técnicas, e tudo isso deve ser ensinado. Educar significa enriquecer as coisas de significado.

Convém considerar que as transformações no trabalho aqui indicadas partem de um mapeamento teórico a partir de macro visões. Há algumas tendências audaciosas, como por exemplo nos fala De Masi, sobre o tempo livre. São idéias revolucionárias e podemos até dizer que é contraditória frente à realidade atual, uma vez que nós Brasileiros estamos trabalhando cada vez mais e tendo menos tempo livre, assim como em outros países como EUA e Japão. Cabe ressaltar que os japoneses trabalham cinco semanas inteiras por ano a mais que os americanos, ou seja competimos com pessoas que trabalham muito. Tanto é verdade que trabalhar demais no Japão é um fenômeno social e econômico14.

O nosso objetivo nesse capítulo, foi o de expor um conjunto de idéias sobre as transformações no mundo do trabalho, os impactos causados pelas novas tecnologias, de forma a demonstrar os argumentos teóricos que justificam a necessidade de um novo modelo de formação profissional. Há que se considerar como esclarece M. Leite, como o fordismo não assumiu as mesmas características em todos países, é possível pensar que o novo modo de acumulação e organização do trabalho venha a apresentar características também distintas, tendo em vista que são diferenciadas as formas de inserção das distintas economias nacionais no processo de globalização. Isso significa que, longe de representar um processo homogêneo, a globalização pode ter repercussões muito distintas nos diferentes países. A maneira e as condições através da qual cada economia nacional se relaciona com o mercado globalizado, é de fato, bastante, diferenciada, variando de acordo com a sua capacidade produtiva, suas condições políticas, sua cultura, sua

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história e a capacidade de organização de seus distintos segmentos sociais (M.Leite,2000:34).

Assim, vislumbramos essas macro visões, desde a possibilidade de trabalhar menos para trabalharem todos, articulação e parcerias com a sociedades e até

mesmo a audaciosa proposta de trabalhar a pedagogia do ócio. No entanto

consideramos importante relativisar estes conceitos considerando as diferenças culturais, sociais e econômicas de cada sociedade.

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