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Fake news: limitação da responsabilidade

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Academic year: 2021

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SAMUEL MARICATO RIBEIRO

FAKE NEWS: LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Palhoça 2019

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SAMUEL MARICATO RIBEIRO

FAKE NEWS: LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador (a): Prof. Tânia Maria Françosi Santhias, Msc.

Palhoça 2019

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

FAKE NEWS: LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 13 de novembro de 2019.

______________________________________ SAMUEL MARICATO RIBEIRO

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Primeiramente à Deus, nosso criador e protetor. À minha família, que me ofereceu, além de apoio incondicional, exemplo de luta e dedicação, e a quem eu devo, também, minha existência. Aos colegas e amigos, com os quais mantive ótimo relacionamento, conversas edificantes, trocas de informações, experiências e apoio para a conclusão da presente monografia.

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AGRADECIMENTOS

É inevitável, ao alcançarmos esses capítulos finais da vida acadêmica, que façamos reflexões acerca de tudo o que ocorrera nesses anos. E nisso, entre outras coisas, se destacam as pessoas que entraram e passaram pelas nossas vidas, cumprindo propósitos que vão dos mais simples aos mais complexos.

Agradeço, primeiramente a Deus, Pai e criador do universo. À minha família e mais especificamente aos meus pais, que me deram todo o suporte, e sem os quais essa jornada não seria possível. Agradeço também aos meus colegas e amigos, que da mesma forma ofereceram apoio durante todo o curso, com os quais tive conversas de suma importância tanto para a minha vida acadêmica quanto para a vida pessoal. Com certeza esses anos foram muito mais leves e suaves por conta do apoio destes, e espero levá-los para toda a minha vida.

Por fim, mas não menos importante, agradeço a todos os professores que de alguma forma contribuíram com a minha vida acadêmica, e em especial à professora Tânia Maria Fançosi Santhias, que me orientou e guiou na elaboração deste trabalho monográfico, sem o seu apoio e seus conselhos com certeza essa jornada seria mais árdua.

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RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo a identificação da limitação da responsabilidade civil em casos de divulgação de fake news (notícias falsas). Para esse fim, buscando base teórica para o entendimento do objeto central, fora apresentado o conceito de responsabilidade civil, as suas espécies e seus requisitos. Em seguida, apresentou-se o conceito de fake news, a sua ocorrência na sociedade desde os primórdios da sociedade, mas que ganhou grande relevância com o advento da internet e aumento dos meios de comunicação e difusão de notícias. Foi tratado, ainda, da relação entre as notícias falsas, os direitos à informação e liberdade de expressão, e a imprensa, grande responsável pela veiculação de informações e responsável pela busca da verdade. Ainda, a inovação das novas agências de checagem de fatos na luta contra as fake news, meios utilizados pelos sites, redes sociais e imprensa na busca da verdade. Por fim, a título de informação, foram apresentadas as as ações utilizadas para a responsabilização civil e penal em casos de divulgação de notícias falsas, e a limitação prevista na legislação e aplicada pela jurisprudência na responsabilização civil nesses casos, e os projetos de lei em tramitação que têm como objeto o tema proposto. Ao final, concluiu-se que o autor das notícias deve ser responsabilizado, bem como o veículo de informação caso aquele seja preposto deste, sendo vedada a responsabilização civil dos provedores de internet, salvo em caso de descumprimento de decisão judicial que ordene a retirada dos conteúdos.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 9

2 RESPONSABILIDADE CIVIL ... 11

2.1 REQUISITOS PARA A RESPONSABILIDADE CIVIL ... 12

2.1.1 Ação e omissão ... 13

2.1.2 Necessidade de dano e o nexo causal ... 14

2.2 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL ... 16

2.3 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL ... 17

2.3.1 Responsabilidade subjetiva ... 18

2.3.2 Responsabilidade objetiva ... 19

3 FAKE NEWS ... 23

3.1 DEFINIÇÃO DE FAKE NEWS ... 24

3.1.1 IDENTIFICAÇÃO DE FAKE NEWS... 26

3.2 LIBERDADE DE EXPRESSÃO ... 27

3.3 O DIREITO DE INFORMAÇÃO, DE INFORMAR E DE SER INFORMADO ... 30

3.3.1 FAKE NEWS E A IMPRENSA ... 32

4 DELIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE EM CASO DE FAKE NEWS ... 35

4.1 LEI DE IMPRENSA – LEI 5.250/67 (INCONSTITUCIONAL). ... 35

4.2 MARCO CIVIL DA INTERNET - LEI 12.965/2014 ... 35

4.3 AÇÃO CÍVEL (ILÍCITO PASSÍVEL DE RESPONSABILIZAÇÃO) ... 37

4.4 AÇÃO PENAL E A TIPIFICAÇÃO (CRIME CONTRA A HONRA, CALÚNIA, INJURIA, DIFAMAÇÃO) ... 38

4.4.1 Calúnia ... 38

4.4.2 Difamação ... 39

4.4.3 Injúria ... 40

4.5 PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO ACERCA DO TEMA. ... 40

4.5.1 Projeto de Lei do Senado nº 246 de 2018. ... 40

4.5.2 Projeto de Lei 3389 de 2019 ... 41

4.5.3 Projeto de Lei 9647 de 2018 ... 42

4.6 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ... 43

5 CONCLUSÃO ... 49

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1 INTRODUÇÃO

Com o advento de novos meios de comunicação e difusão de notícias, avolumaram-se os casos de divulgação de fake news (notícias falsas). Entre os motivos para tal fenômeno, está o acesso e facilidade no processo de transmissão de notícias, e ausência de apuração da veracidade das mesmas. Portanto, o direito de informação vem sendo erroneamente usado, visto que não é visualizada a apuração devida dos fatos. É certo que a informação, além de um direito, é um dever, porém quem exerce tal direito tem o compromisso de divulgar a existência de um fato, um trecho da realidade devidamente apurado.

Sem a devida apuração, a veracidade é posta em cheque e, caso haja a existência e divulgação de notícias inverídicas, surge a possibilidade de um dano e, portanto, de responsabilização civil dos propagadores da notícia. Nesse caso, surge a dúvida acerca do alcance da responsabilização civil aos agentes da relação.

A importância do tema se dá, portanto, pelo aumento dos casos de divulgação de fake news, de lesões ocorridas por esta e pela necessidade de se reparar o dano experimentado pela vítima, bem como do aumento dos meios de difusão de informações com o advento da internet.

Portanto, quais os critérios legais para a responsabilização do dano causado em virtude de compartilhamento de fake news?

O método de abordagem é de pensamento dedutivo, visto que parte de uma generalização, que é a análise do instituto da responsabilidade civil objetivando o alcance de uma questão específica e particular, que é a limitação da responsabilização civil em casos relacionados a fake news. O método de procedimento é monográfico, por abordar somente um tema, e a técnica de pesquisa será bibliográfica, tendo como base a legislação vigente, entendimento doutrinário e jurisprudencial, artigos científicos, teses e dissertações.

O presente trabalho monográfico se divide em três capítulos de desenvolvimento, sendo o primeiro destinado a conceituar o instituto da responsabilidade civil, bem como apresentar os requisitos para a responsabilização civil, que são a ação ou omissão, a necessidade de demonstração do dano e o nexo causal, e as espécies de responsabilização civil, que são a contratual, exigindo vínculo jurídico entre o ofensor e a vítima, e extracontratual, que dispensa a existência de vínculo, caracterizando-se pela lesão a dever legal.

O segundo a apresentar a definição e identificação de fake news, sua relação com o direito de informação e liberdade de expressão, bem como sua relação com a imprensa, a importância e responsabilidade da imprensa no cenário atual como refúgio na busca pela

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verdade e com a busca pela comprovação da veracidade de fatos veiculados nos meios de comunicação.

O terceiro, por fim, apresentando as formas de responsabilização civil e criminal, e alcançando o objetivo do presente trabalho, que é identificar a limitação para responsabilização civil em casos de divulgação de fake news, por meio de análise jurisprudencial, doutrinária e da legislação vigente. Ao final da pesquisa apresentar-se-á a conclusão final em resposta à problematização.

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2 RESPONSABILIDADE CIVIL

Para um bom desenvolvimento do trabalho, se faz necessária a conceituação do instituto da responsabilidade civil, bem como apresentação de seus requisitos e possibilidades de aplicação.

A responsabilidade civil é a obrigação de se restituir o status quo ante do objeto da responsabilização, decorre de um dano previamente comprovado, seja ele material ou moral, ou na impossibilidade de se restituir ao estado anterior, o pagamento de quantia pecuniária. É como asseveram Stolze e Pamplona Filho:

a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator ao pagamento de uma compensação pecuniária à vítima, caso não possa repor in natura o estado anterior de coisas.1

Deve-se lembrar também que a responsabilidade civil é uma instituição destinada a acolher os insatisfeitos, injustiçados, lesados. Sendo, portanto, assecuratória de direitos.2

A própria existência de requisitos para configuração e responsabilização civil é uma grande evolução histórica. A sociedade, em tempos passados, nem sempre se comportava assim, como assevera Carlos Roberto Gonçalves: “Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava do fator culpa. O dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não havia regras nem limitações. Não imperava, ainda, o direito. Dominava, então, a vingança privada [...].”3

No mesmo norte, cumpre relembrar que, nos primórdios das sociedades, a vingança assumia a posição da responsabilização civil. Aquele que sofria um dano, ou prejuízo, era autorizada a buscar a justiça com as próprias mãos, sem qualquer interferência ou repressão do Estado.4

Ainda, lembra-se que a responsabilidade civil possui multifuncionalidade, quer sejam: a função reparatória, punitiva e precaucional. Sobre isso, trata Felipe Peixoto Braga Neto:

(1) Função reparatória: a clássica função de transferência dos danos do patrimônio do lesante ao lesado como forma de reequilíbrio patrimonial; (2) Função punitiva: sanção consistente na aplicação de uma pena civil ao ofensor como forma de desestímulo de

1 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 3:

responsabilidade civil. 19. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2019. (p. 57).

2 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

acréscimo de acórdãos do STF e STJ. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 179).

3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil / Carlos Roberto Gonçalves. – 17. ed. – São Paulo :

Saraiva, 2016. (p. 47).

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comportamentos reprováveis; (3) Função precaucional: possui o objetivo de inibir atividades potencialmente danosas. Certamente, há uma Função preventiva subjacente às três anteriores, porém consideramos a prevenção um princípio do direito de danos e não propriamente uma quarta função.5

Para a configuração e aplicação da responsabilidade civil, são necessários alguns requisitos, além da própria ação/omissão: nexo causal, dano e culpa. A presença ou ausência da culpa como requisito para a responsabilização civil decorre de duas teorias aceitas e presentes no ordenamento jurídico atual: a Responsabilidade Objetiva e a Responsabilidade Subjetiva. Esses pontos serão tratados a seguir.

Apesar da controvérsia acerca da presença ou não da culpa como requisito para responsabilização civil, Caio Mário da Silva Pereira assevera “não importa se o fundamento é a culpa, ou se é independente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento, aí estará a responsabilidade civil.”6 Cumpre ressaltar, ainda, que a responsabilidade civil pode ser repartida em contratual e

extracontratual. Esta decorre de violação à norma preexistente, enquanto aquela decorre de violação ao disposto em contrato que envolva as partes (agente e vítima).7

Tendo exposto os requisitos para a responsabilidade civil, passa-se, agora, a um panorama geral dos mesmos.

2.1 REQUISITOS PARA A RESPONSABILIDADE CIVIL

Os requisitos para a responsabilização civil são extraídos do artigo 186 do Código Civil, in verbis: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”8

Portanto, colhe-se como elementos para tal, os quais serão tratados a seguir: a ação (ou omissão) humana, o dano, e o nexo causal. Há, ainda, a culpa, porém esta, ainda que presente e considerada regra geral, não constitui pressuposto geral da responsabilidade civil,

5 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; DE FARIAS, Cristiano Chaves. Novo tratado de responsabilidade civil. 3.

ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2018. (p. 68).

6 PEREIRA, Caio Mário da Silva; TEPEDINO, Gustavo. Responsabilidade Civil. 12. ed. rev., atual. e ampl. –

Rio de Janeiro: Forense, 2018. (p. 14).

7 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

acréscimo de acórdãos do STF e STJ. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 215).

8 BRASIL. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. DF: Presidência da República, 2002.

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tendo em vista a existência e aplicação da teoria objetiva, que dispensa a comprovação da culpa para configuração da responsabilidade civil.9

2.1.1 Ação e omissão

Não há a possibilidade de responsabilização civil sem que tenha havido uma conduta humana contrária ao ordenamento jurídico,10 seja ela positiva ou negativa. Esta é

considerada, portanto, o primeiro elemento a ser estudado da responsabilidade civil.11 Arnaldo

Rizzardo a conceitua, em sua obra, como:

A ação ou omissão do agente, investindo contra alguém, ou deixando de atuar, ferindo seu direito ou o patrimônio. Opera-se por ato próprio essa ação ou omissão, com a atuação direta do agente, que ataca uma pessoa, ou destrói seus bens, ou investe contra sua honra, ou descumpre uma obrigação de proteção; ou por ato de terceiros, como nos danos causados pelos filhos, pelos tutelados e curatelados, pelos empregados, pelos hóspedes, pelos educandos, ficando responsáveis os pais, o tutor ou curador, o empregador, o hoteleiro, o educador; ou pelo fato dos bens ou coisas que se encontram na guarda e poder de uma pessoa, e, assim, pelos prejuízos provocados pelos animais, pelos veículos, pela máquina.12

Destaca-se, ainda, como já mencionado, que a conduta humana pode ser positiva ou negativa, o que significa dizer que o agente pode ter cometido o ilícito com ou sem a ciência dos possíveis resultados, mas assumindo o risco de provocá-los. O dolo, no entanto, é sempre repudiado.13 Aqui abstrai-se da culpa, por esta não ser considerada pressuposto geral da

responsabilidade civil, como já mencionado anteriormente. Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, em sua obra, tratam sobre a diferença entre a conduta humana positiva e negativa:

A primeira delas traduz-se pela prática de um comportamento ativo, positivo, a exemplo do dano causado pelo sujeito que, embriagado, arremessa o seu veículo contra o muro do vizinho. A segunda forma de conduta, por sua vez, é de intelecção mais sutil. Trata-se da atuação omissiva ou negativa, geradora de dano. Se, no plano físico, a omissão pode ser interpretada como um “nada”, um “não fazer”, uma “simples abstenção”, no plano jurídico, este tipo de comportamento pode gerar dano atribuível ao omitente, que será responsabilizado pelo mesmo.14

9 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v. 3 :

responsabilidade civil. 15 ed. – São Paulo : Saraiva, 2017. (p. 74).

10 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

acréscimo de acórdãos do STF e STJ. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 203).

11 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v. 3 :

responsabilidade civil. 15 ed. – São Paulo : Saraiva, 2017. (p. 77).

12 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 7. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2015. (p. 31-32).

13 LOTUFO, Renan. Código Civil comentado : parte geral (arts. 1o a 232), volume 1 / Renan Lotufo. – 3. ed. –

São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 574).

14 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v. 3 :

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Rui Stocco, em sua obra, trata ainda da necessidade do comportamento humano para responsabilização, independente se este é positivo ou negativo, dizendo “deve haver um comportamento do agente, positivo (ação) ou omissivo (omissão), que, desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa a bem ou a direito deste.”15

Obviamente, não é qualquer conduta humana, ainda que ilícita, que causa dano ou viola direito de outrem. Porém, quando a ação humana gera dano a alguém, quer seja patrimonial, apenas moral ou ambos simultaneamente, e é estabelecida a relação entre o comportamento do agente e o dano da vítima, nasce o dever de indenizar. Esta relação é chamada de nexo causal.16

Portanto, trazendo ao objeto central do trabalho, têm-se que a ação de divulgar ou propagar fake news é requisito indispensável para caracterizar a responsabilização civil, bem como a omissão, em certos casos que serão analisados em capítulo posterior.

2.1.2 Necessidade de dano e o nexo causal

Para possibilitar a busca ou necessidade da responsabilização civil, é necessária, como já discutido, a existência de um dano, seja ele material ou moral. E que a causa desse dano possa ser imputada a alguém, que agindo positiva ou negativamente causou ou ensejou a sua efetivação.17 É o que assevera Rui Stocco:

O dano é, pois, elemento essencial e indispensável à responsabilização do agente, seja essa obrigação originada de ato lícito, nas hipóteses expressamente previstas, seja de ato ilícito, ou de inadimplemento contratual, independente, ainda, de se tratar de responsabilidade objetiva ou subjetiva.18

Vale lembrar que, ao analisar o artigo 186 do Código Civil, vê-se que não há uma limitação do que se considera um dano, sendo no caso um conceito vago. Tal posicionamento do legislador, ao não ser preciso na conceituação, opera no sentido de alargar as possibilidades de proteção, cabendo à jurisprudência e ao estudo de cada caso concreto identificar o que se

15 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

acréscimo de acórdãos do STF e STJ. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 200).

16 LOTUFO, Renan. Código Civil comentado : parte geral (arts. 1o a 232), volume 1. 3. ed. – São Paulo :

Saraiva, 2016. (p. 574).

17 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 7. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2015. (p. 67).

18 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

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deve considerar, conferindo autenticidade e possibilidade de constante evolução do conceito, variando o mesmo na concretude de cada litígio.19

No entanto, não se deve desprender da ideia que o dano é a pedra fundamental da responsabilidade, sendo, portanto, indispensável para a responsabilização civil, qualquer que seja a espécie que esteja sob análise, seja contratual ou extracontratual, objetiva ou subjetiva,20

as quais serão expostas posteriormente.

O dano, ainda, pode ser dividido em dano patrimonial (ou material), ou moral. O dano material se traduz em lesão a um interesse econômico, e os efeitos do mesmo incidem na esfera patrimonial da vítima, diminuindo-o. Quando o dano diminui diretamente o patrimônio atual da vítima, é chamado então de “dano emergente”, mas quando a vítima deixa de obter certa vantagem em razão do dano, denomina-se “lucro cessante”.21 Há, ainda, a existência do

dano estético, que Braga Netto conceitua em sua obra:

Cuida-se de uma ofensa à integridade física da pessoa qualificada pelo elemento da “permanência”, ou seja, uma lesão corporal de efeitos prolongados e não meramente transitória ou sanável. O dano estético deve se manifestar de forma duradoura, mesmo que sem carga de definitividade ou irreversibilidade. Não obstante o avançado recurso a cirurgias plásticas reparadoras, muitas lesões estéticas nos acompanham de forma perene.22

Vale ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça, na súmula 387, previu a incidência e cumulação entre dano moral e dano estético: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.”23

Como já exposto, a existência do dano é vital para a responsabilização civil, mas não é o requisito singular. Para a aplicação do instituto, é necessário que se prove a relação causa-efeito entre a ação do ofensor e o dano sofrido pela vítima.24 Tal relação é denominada

nexo causal.

O nexo causal trata-se, também de requisito vital da responsabilidade civil. É o que fala Sílvio de Salvo Venosa

19 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; DE FARIAS, Cristiano Chaves. Novo tratado de responsabilidade civil.

3. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2018.

20 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v. 3 :

responsabilidade civil. 15 ed. – São Paulo : Saraiva, 2017. (p. 85).

21 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 7. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2015. (p. 15). 22 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto, DE FARIAS, Cristiano Chaves. Novo tratado de responsabilidade civil.

3. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2018. (p. 481).

23 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 387. É lícita a cumulação das indenizações de dano

estético e dano moral. Brasília, DF. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2013_35_capSumula387.pdf. Acesso em: 18 out. 2019.

24 PEREIRA, Caio Mário da Silva; TEPEDINO, Gustavo. Responsabilidade Civil. 12. ed. rev., atual. e ampl.

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O conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que se conclui quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida. Nem sempre é fácil, no caso concreto, estabelecer a relação de causa e efeito.25

Por nexo causal pode-se entender, segundo as palavras de Rui Carvalho Piva como “ligação entre o comportamento humano, comissivo ou omissivo, e o prejuízo provocado, que deverá ser provado pelo prejudicado, caso isso seja necessário, como ocorre quando a apuração depende de intervenção judicial provocada pela propositura de ação.”26

Ainda que presentes os demais pressupostos (dano, ação humana e culpa ou risco), não é certa a necessidade de responsabilização civil, caso não seja estabelecida a relação entre a conduta ou omissão do agente e o dano sofrido pela vítima.27

Portanto, caso reste inexistente a ligação entre a ação humana e o dano sofrido pela vítima, não há a possibilidade de responsabilização civil. Injusto, seria, se o contrário fosse aplicado. Por este motivo, o nexo causal é requisito indispensável para aplicação do instituto.

Trazendo à matéria central do presente trabalho, a comprovação do dano causado por fake news é necessária, portanto, para que o agente seja responsabilizado, bem como o nexo causal entre o dano e a ação ou omissão do agente que causou ou ensejou a efetivação deste.

2.2 Responsabilidade contratual

Na responsabilidade contratual, como o próprio nome deixa a entender, já há uma relação jurídica entre o ofensor e a vítima, uma obrigação preexistente, um vínculo formado por contrato ou declaração unilateral de vontade. No caso, o inadimplemento, ou descumprimento de obrigação prevista, resulta em perdas e danos.28

Carlos Roberto Gonçalves, em sua obra, exemplifica a responsabilidade contratual:

Uma pessoa pode causar prejuízo a outrem por descumprir uma obrigação contratual. Por exemplo: quem toma um ônibus tacitamente celebra um contrato, chamado contrato de adesão, com a empresa de transporte. Esta, implicitamente, assume a

25 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

(p. 506).

26 PIVA, Rui Carvalho. Direito civil: parte geral, obrigações, contratos, atos unilaterais, responsabilidade civil,

direito das coisas. Barueri, SP: Manole, 2012. p. 181.

27 NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de

Janeiro: Forense, 2016. (p. 121).

28 NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil. 6. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de

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obrigação de conduzir o passageiro ao seu destino, são e salvo. Se, no trajeto, ocorre um acidente e o passageiro fica ferido, dá-se o inadimplemento contratual, que acarreta a responsabilidade de indenizar as perdas e danos [...].29

A dificuldade, no entanto, reside na distinção e identificação se o ato danoso decorreu de contrato, uma obrigação preexistente, ou declaração unilateral, não sendo este ponto, por vezes, claro. Por exemplo, na hipótese de transporte gratuito, ou caronas, em que não há sequer o contrato de adesão, identificado pela doutrina, por exemplo, no transporte público.30

2.3 Responsabilidade extracontratual

Como já fora mencionado, em vezes há a dificuldade em se identificar e distinguir a responsabilidade contratual e extracontratual (por vezes chamada também de aquilana). No entanto, a responsabilidade extracontratual trata de lesão a dever legal, não havendo nenhum vínculo jurídico prévio entre ofensor e vítima, e a contratual de lesão a algo acordado entre as partes.31

Entende-se, consequentemente, quando se trata de violação direta de mandamento legal pela atuação do agente ensejadora do dano, se trata de responsabilidade extracontratual.32

Rui Stocco, denomina, ainda, a responsabilidade extracontratual como:

[...] responsabilidade decorrente do ato ilícito, ou seja, do mau relacionamento entre pessoas e do descumprimento de um direito preexistente. Esta, também designada de responsabilidade aquilana, divide-se, no aspecto subjetivo ou da vontade, em responsabilidade: objetiva (sem culpa, quando o dever de reparar decorre do só fato do dano, desde que existente o nexo causal); subjetiva, que repousa fundamentalmente no conceito de culpa, sem a qual não nasce a obrigação de indenizar [...]33

Portanto, o que difere a responsabilidade contratual da extracontratual é o objeto ensejador da responsabilidade. Ou seja, “na responsabilidade extracontratual, ocorre a infração de uma lei; na contratual, de obrigação assumida em negócio jurídico.”34

29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4 : responsabilidade civil / Carlos Roberto

Gonçalves. – 14. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. (p. 44-45).

30 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 18. ed. – São Paulo: Atlas,

2018. (p. 467).

31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4 : responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo

: Saraiva Educação, 2019.( p. 45).

32 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v. 3 :

responsabilidade civil. 15 ed. São Paulo : Saraiva, 2017. (p. 65).

33 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform. com

acréscimo de acórdãos do STF e STJ. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 214).

34 NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de

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2.3.1 Responsabilidade subjetiva

A responsabilidade subjetiva, teoria amplamente adotada no Código Civil, é considerada regra geral no nosso ordenamento jurídico, baseando-se na teoria da culpa. Portanto, para que o agente seja responsabilizado e indenize, é necessária a comprovação da culpa.35 Não se admite a responsabilização civil na ausência desta, salvo nos casos previstos

em lei (quando se aplica a responsabilidade objetiva), sendo, portanto, pressuposto necessário para tal, como trata Carlos Roberto Gonçalves:

Diz‐ se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro desta concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa.36

Caio Mário da Silva Pereira, em sua obra, trata sobre a essência da responsabilidade subjetiva, in verbis:

A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características37

É certo afirmar, portanto, que segundo a teoria da responsabilidade subjetiva, a responsabilidade civil não existe se não há culpa.38 Ambas estão interligadas, como garante

Sergio Cavalieri Filho:

A ideia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva.39

É necessário ressaltar que, quando se fala de culpa, inclui-se o dolo também. O já citado artigo 186 do Código Civil prevê ambos ao se referir a “ação ou omissão” (dolo) e “negligência ou imprudência” (culpa). Consiste, a culpa, na ação equivocada de uma pessoa, sem a intenção de causar lesão a alguém ou violar um direito dela, mas que pela presença de

35 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil – v. 2. 14. ed. Rio de

Janeiro: Forense, 2019. (p. 537).

36 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 59).

37 PEREIRA, Caio Mário da Silva; TEPEDINO, Gustavo. Responsabilidade Civil. 12. ed. rev., atual. e ampl. Rio

de Janeiro: Forense, 2018. (p. 41).

38 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4 : responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo :

Saraiva Educação, 2019. (p. 48).

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imprudência, negligência ou imperícia o causou. Enquanto o dolo é decorrente da vontade consciente do agente em produzir o dano, em alcançar o fim ilícito.40

A responsabilidade subjetiva é considerada regra no ordenamento jurídico atual, portanto, a comprovação de culpa é necessária para a responsabilização civil, inclusive nos casos envolvendo o objeto principal do presente trabalho monográfico. No entanto, com a multiplicidade de casos e crescente complexidade dos mesmos, à medida que a sociedade evolui, surgiu uma nova teoria da responsabilidade civil, que é admitida do ordenamento jurídico brasileiro.

2.3.2 Responsabilidade objetiva

Com a evolução da sociedade, e consequente necessidade de evolução do ordenamento jurídico, surgiram casos nos quais era difícil ou impossível para a parte lesada comprovar a culpa do agente causador do dano. Como já foi visto, segundo a teoria subjetiva, para alcançar a responsabilização civil e, portanto, a reparação do dano, a vítima tem que provar o dolo ou a culpa do agente. No entanto, muitas vezes isso se torna difícil.41 Então, é nesse

cenário que surge a Teoria da Responsabilidade Objetiva que dispensa, para a configuração da responsabilidade civil, a existência da comprovação de dolo ou culpa. Presente no Código de Direito Civil de 2002, tem previsão no artigo 927 da lei:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.42

É notável, também, o espaço ocupado pela teoria também no Código de Consumidor, o qual, ao tornar regra a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva nas relações de consumo, a fez conquistar grande território.43

Sobre a necessidade de transformação constante da responsabilidade civil, Patrícia Peck Pinheiro, em sua obra, expõe a relação desta com o mundo digital, relação de suma importância e conexão com o presente trabalho:

40 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil : doutrina e jurisprudência. 10. ed. rev., atual. e reform.

com acréscimo de acórdãos do STF e STJ. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. (p. 203-204).

41 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 67).

42 BRASIL. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. DF: Presidência da República, 2002.

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/LEIS/2002/L10406.htm. Acesso em: 10 set. 2019.

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Em primeiro lugar, a responsabilidade civil é um fenômeno social. Para o Direito, um dos principais pressupostos da responsabilidade civil é a exis- tência de nexo causal entre o ato e o dano por ele produzido. Muito mais importante que o ato ilícito que causou o dano é o fato de que esse dano deve ser ressarcido. A responsabilidade civil é um instituto em transformação no contexto da sociedade digital. Isso porque estão sendo redefinidos os valores que devem prevalecer e ser protegidos em um contexto de relações cada vez mais não presenciais, independente do local de origem das partes, já que a Internet é um território global e atemporal.44

A transição entre a predominância da responsabilidade civil subjetiva para objetiva nota-se mundial, tendo importância maior a partir da metade do século XIX em países como Bélgica, França e Itália, como traz Carlos Roberto Gonçalves:

Historicamente, a partir da segunda metade do século XIX foi que a questão da responsabilidade objetiva tomou corpo e apareceu como um sistema autônomo no campo da responsabilidade civil. Apareceram, então, importantes trabalhos na Itália, na Bélgica e em outros países. Mas foi na França que a tese da responsabilidade objetiva encontrou seu mais propício campo doutrinário de expansão e de consolidação.45

Acerca dessa mudança de entendimento e transição, trata Sergio Cavalieri Filho:

Aos poucos os juristas perceberam que a teoria subjetiva não mais era suficiente para atender a essa transformação social (que vinha ocorrendo a partir da segunda metade do século XIX); constataram que, se a vítima tivesse que provar a culpa do causador do dano, em numerosíssimos casos ficaria sem indenização, ao desamparo, dando causa a outros problemas sociais, porquanto, para quem vive de seu trabalho, o acidente corporal significa a miséria, impondo-se organizar a reparação.46

Cumpre salientar que, apesar de se apresentar como inovação no Código Civil de 2002, as teorias subjetiva e objetiva coexistem, inclusive no próprio código, como já fora visto no subcapítulo destinado à responsabilidade subjetiva. Caio Mário da Silva Pereira diz que “na esteira dessas considerações, o Código Civil construiu sistema dualista em que as duas teorias – subjetiva (art. 186) e objetiva (art. 927, parágrafo único) – se complementam.”47

A ausência da culpa, no entanto, não pode ser confundida com a ausência de nexo causal entre a ação e o dano causado pelo agente, sendo este, obviamente, requisito necessário em ambas as teorias, para que não se responsabilize a quem não deu causa ao infortúnio. É como traduz Sergio Cavalieri Filho;

Importa, isso, admitir que também na responsabilidade objetiva teremos uma atividade ilícita, o dano e o nexo causal. Só não será necessário o elemento culpa,

44 PINHEIRO, Patricia Peck. Direito digital. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 513).

45 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo : Saraiva, 2016.

46 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 13. ed. – São Paulo: Atlas, 2019. (p.

223).

47 PEREIRA, Caio Mário da Silva; TEPEDINO, Gustavo. Responsabilidade Civil. 12. ed. rev., atual. e ampl. Rio

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razão pela qual fala-se em responsabilidade independentemente de culpa. Esta pode ou não existir, mas será sempre irrelevante para a configuração do dever de indenizar. Indispensável será a relação de causalidade porque, mesmo em sede de responsabilidade objetiva, não se pode responsabilizar a quem não tenha dado causa ao evento.48

Portanto, para Monteiro, Maluf e Da Silva, em se tratando de responsabilidade objetiva, não importa no caso a comprovação do dolo, culpa, ou mesmo a existência de negligência, imprudência ou imperícia, bastando para a configuração da responsabilidade civil a comprovação do nexo causal entre a ação e o dano, e a própria lesão.

A responsabilidade objetiva é fundamentada no risco. Aqui não importa se houve dolo, se houve negligência, ou imprudência, ou imperícia. Importa apenas a verificação dos pressupostos – ação, nexo causal e dano. Diante de ação lesiva e da relação de causalidade dentre a ação e o dano, surge a responsabilidade civil. Em suma, não se cogita da subjetividade do agente. A vítima somente precisa demonstrar a ação ligada ao dano, para que suja o dever do lesante de repará-lo.49

Buscando fundamentar e justificar a transição entre a teoria da responsabilidade subjetiva e objetiva, uma das teorias aplicadas é a teoria do risco. Para ela, todo aquele que exerce alguma atividade cria um risco, decorrente do próprio exercício, para terceiros. E em caso de dano, este fica obrigado a repará-lo, ainda que a conduta causadora do dano seja isenta de culpa.50 Sobre ela, disserta Sérgio Cavalieri Filho:

Na busca de um fundamento para a responsabilidade objetiva, os juristas, principalmente na França, conceberam a teoria do risco, justamente no final do século XIX, quando o desenvolvimento industrial agitava o problema da reparação dos acidentes de trabalho. Risco é perigo, é probabilidade de dano, importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os riscos e reparar o dano dela decorrente. A doutrina do risco pode ser, então, assim resumida: todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o causou, independentemente de ter ou não agido com culpa. Resolve-se o problema na relação de causalidade, dispensável qualquer juízo de valor sobre a culpa do responsável, que é aquele que materialmente causou o dano.51

Com a aplicação da teoria do risco, não é necessária, como requisito para responsabilização civil, a culpa, sendo esta suprida, como aborda Carlos Roberto Gonçalves:

A responsabilidade civil desloca‐se da noção de culpa para a ideia de risco, ora encarada como “risco‐proveito”, que se funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em consequência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi onus); ora mais genericamente como

48 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2019. (p. 223). 49 MONTEIRO, Washington de Barros; MALUF, Carlos Alberto Dabus; DA SILVA, Regina Beatriz Tavares.

Curso de direito civil, 5: direito das obrigações, 2ª parte. 39. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. (p. 573).

50 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 17. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016. (p. 60).

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“risco criado”, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá‐ lo.52

É importante frisar que, como já tratado anteriormente, a teoria da responsabilidade objetiva recebeu grande importância no Código do Consumidor, e, portanto “como tudo ou quase tudo em nossos dias tem a ver com o consumo, não haverá nenhuma impropriedade em se afirmar que hoje a responsabilidade objetiva, que era exceção, passou a ter um campo de incidência mais vasto do que a própria responsabilidade subjetiva.” 53

Claro que, inexistindo previsão legal para a aplicação da responsabilidade objetiva nos casos de divulgação de fake news, não há como configurá-la. Sendo, portanto, necessária a ação, a demonstração do dolo ou culpa do agente, o dano e o nexo causal entre a ação e o dano.

52 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 17. ed. – São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 60). 53 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil 13. ed. São Paulo: Atlas, 2019. (p. 229).

(25)

3 FAKE NEWS

Dado o conceito de responsabilidade civil e suas espécies, passa-se agora à definição de fake news, à sua relação com a imprensa, os prejuízos causados a ela e aos direitos relatados a seguir, à exposição dos direitos à liberdade de expressão e informação, bem como seus desdobramentos, e seus limitantes.

Claramente, a disseminação de fake news é longínqua. Ainda que a frequência e proporção que estas podem tomar atualmente é fruto do aumento dos meios e veículos de comunicação, principalmente a internet, mas a existência vem provavelmente desde o início da comunicação entre os seres humanos.54 Como trata Renê da Costa Braga, em seu artigo, o

advento da internet contribuiu, e muito, com a reincidência dos casos de fake news:

Se uma mentira repetida mil vezes se torna verdade, com o advento da internet uma mentira pode ser repetida, cantada, recitada, filmada e fotografada um milhão de vezes, atraindo a atenção de um grupo incontável de usuários que buscam informações na internet.55

Como já fora mencionado, com o advento da internet, os casos de divulgação de notícias falsas cresceu vertiginosamente. Para Gabriel Itagiba, pesquisador do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, a difusão de fake news no passado encontrava quatro barreiras: o custo alto para o alcance de uma audiência expressiva; a falta de flexibilidade do material que, por exemplo, ao ser impresso, não podia ser modificado; a falta de conhecimento sobre o leitor, ou a dificuldade de saber o que ele pensa; e a ausência de um contexto ideal, ou impressão de credibilidade que a fonte pode transmitir. A popularização da internet fez com que as quatro barreiras começassem a ser quebradas.56 Ou seja, apesar de todas as benesses,

criou também um cenário ideal para a difusão e propagação das fake news.

Como se verá posteriormente, a liberdade de expressão é um direito fundamental previsto na Constituição Federal, bem como os seus desdobramentos (o direito de informar e de ser informado), no entanto, a partir do momento que o exercício desses direitos afeta direitos fundamentais de terceiros, cria-se a necessidade de limitar a liberdade de expressão. Por esse

54 CARVALHO, Gustavo Arthur Coelho Lobo de; KANFFER, Gustavo Guilherme Bezerra. O Tratamento

Jurídico das Notícias Falsas (fake news). Disponível em:

https://www.conjur.com.br/dl/tratamento-juridico-noticias-falsas.pdf. Acesso em: 18 jun. 2019. (p. 1).

55 BRAGA, Renê Morais da Costa. A indústria das fake news e o discurso de ódio. In: PEREIRA, Rodolfo

Viana (Org.). Direitos políticos, liberdade de expressão e discurso de ódio. Volume I. Belo Horizonte: IDDE, 2018. p. 203-220. ISBN 978-85-67134-05-5. Disponível em: https://goo.gl/XmUwkd. Acesso em 24 out. de 2019.

56 ITAGIBA, Gabriel. Fake news e Internet: esquemas, bots e a disputa pela atenção. 2017. Disponível em:

<https://itsrio.org/wp-content/uploads/2017/04/v2_fake-news-e-internet-bots.pdf>. Acesso em: 29 de outubro de 2019.

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motivo, se faz necessário entendimento do conceito de fake news, o que são, bem como da conscientização da população sobre o tema, do aprimoramento dos meios de identificação de notícias falsas para a posterior responsabilização daqueles que contribuem para a divulgação das mesmas.

3.1 DEFINIÇÃO DE FAKE NEWS

Na era da informação, na qual vivemos, a existência e facilitação da divulgação e compartilhamento de dados, informações, notícias pela população em geral influencia no aumento da propagação das notícias falsas e boatos. Isto ocorre por que estas informações compartilhadas não passam por filtros, não são submetidas a padrões éticos e averiguação de veracidade. A ação, em sua maior extensão, é realizada por pessoas sem vínculos com imprensa ou meios de comunicação o que aumenta, consequentemente, a frequência do que se passou a denominar como fake news, em alusão à expressão emprestada da língua inglesa.

Essa expressão ganhou ainda mais notoriedade com a eleição presidencial de 2016, nos Estados Unidos da América, em que o então candidato Donald Trump frequentemente usava o termo para relativizar e minorar a importância das notícias contrárias a ele veiculadas pela imprensa norte-americana.57

Assim como se configurou na eleição presidencial dos Estados Unidos da América, no ano de 2016, as fake news foram presentes também no Brasil, na eleição presidencial de 2018. Sobre o tema, trata Juliana Antero Luciano:

É fácil encontrar exemplos no âmbito da política, principalmente no Brasil, ao qual grupos de ideologias políticas diferentes passam a propagar fake news em tentativa de descreditar um ao outro, aos representantes políticos, ou candidatos. Formando uma estratégia de manipulação da informação, para atingir o eleitorado de um determinado posicionamento ideológico.58

Portanto, além de servir como ferramenta para difusão de boatos inverídicos, durante as eleições as fake news têm sido usadas para manipulação de ideais e, consequentemente, influência na decisão da população nos pleitos eleitorais.

57 SPINELLI, Egle Muller; SANTOS, Jéssica de Almeida. Jornalismo na era da pós-verdade: fact-checking

como ferramenta de combate às fake news. 2018. Disponível em:

https://sistemas.uft.edu.br/periodicos/index.php/observatorio/article/view/4629/13090. Acesso em 20 out. 2019. (p. 6).

58 LUCIANO, Juliana Antero; CAMURÇA, Eulália Emilia Pinho. Fake News: os desafios do controle e censura.

2019. Disponível em: https://periodicos.uni7.edu.br/index.php/iniciacao-cientifica/article/view/715/562. Acesso em: 25 out. 2019.

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Inexiste na legislação nacional conceito definido para as fake news. Diversos projetos de lei tramitam no congresso para criar ou alterar leis para tratar do tema, e no parecer n. 1 de 2018, em que analisa os projetos, o Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional citou alguns pontos a serem tratados, e a necessidade de “definição clara e bem delimitada do que seja Fake News: Estabelecer um conceito com limites práticos para sua aplicação, pois em termos penais, por exemplo, eventual lacuna irá tisnar a norma como “norma penal em branco”, o que é vedado.”59

Para elucidação, o projeto de lei n. 8592 de 2017, de autoria do então deputado Jorge Wicks Côrte Real e que tem por objetivo alterar o Código Penal, acrescentando o artigo 287-A, para tipificar o crime de divulgação de fake news, diz:

Divulgação de informação falsa

Art. 287-A Divulgar ou compartilhar, por qualquer meio de comunicação social capaz de atingir um número indeterminado de pessoas, informação falsa ou prejudicialmente incompleta, sabendo ou devendo saber que o são.

Sobre o tema, trata Isadora Forgiarini Balem:

Sabemos que a notícia circula em torno da ideia de verdade. Não necessariamente a verdade utópica do jornalismo totalmente imparcial, desprovido de interesses, mas aquela que dá o sentido à atividade jornalística, como fonte de informação. Nesse contexto, emerge o conceito das “fake news”, expressão que pode ser entendida como ‘notícia falsa’ e a qual, em verdade, se refere a uma ‘mentira contada na forma de notícia’. 4 Declarações ambíguas, enviesadas, ou derivadas de enganos são na prática equiparadas a mentiras inventadas pelos mais diversos motivos.60

Já segundo Paulo Tiago de Castro, o conceito de fake news pode ser definido como “o boato, a falsa notícia ou ainda a notícia propagada de forma parcial (com o intuito de enganar), distribuída intencionalmente através de internet, televisão, rádio ou jornal impresso, como também nas mídias sociais.”61

Também sobre o conceito, Hunt Allcott e Matthew Gentzkow definem fake news como “artigos e notícias que são intencionalmente e verificavelmente falsos, e que podem enganar os leitores”,62 quer seja para simplesmente difundir mensagens inverídicas, abalar a

59 BRASIL. Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional. Brasília, DF,: Congresso Nacional,

2019. Disponível em:

https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=7740092&ts=1567520392686&disposition=inline. Acesso em: 15 out. 2019.

60 BALEM, Isadora Forgiarini. O impacto das fakenews e o fomento dos discursos de ódio na sociedade em

rede: a contribuição da liberdade de expressão na consolidação democrática. 2017. Disponível em:

http://coral.ufsm.br/congressodireito/anais/2017/1-12.pdf. Acesso em: 15 out. 2019.

61 CASTRO, Paulo Tiago de. Fake news, o Direito e as Providências. 2018. Disponível em:

<https://advpt.jusbrasil.com.br/artigos/582641980/fake-news-o-direito-e-as-providencias>. Acesso em: 20 de outubro de 2019.

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imagem de alguém, ou para caçar acessos (ou cliques – o chamado clickbait). Já para o dicionário de Cambridge, pode se definir fake news como “histórias falsas que parecem ser notícias, divulgadas na internet ou usando outra mídia, geralmente criadas para influenciar opiniões políticas, ou como piadas.”63

Portanto, têm-se que as fake news podem ser caracterizadas pela falsidade ou distorção da verdade no que é relatado, seja intencionalmente ou por mero descuido com a fonte utilizada para sua elaboração ou compartilhamento. Nem todo cidadão possui consciência dos direitos e deveres envolvidos no ato de se divulgar uma notícia possivelmente falsa.

3.1.1 IDENTIFICAÇÃO DE FAKE NEWS

Como já fora dito, as mídias digitais vêm se tornando grandes meios de propagação de notícias. Essa mudança afeta a percepção e o comportamento dos usuários, o que gera novas estratégias para o alcance de maiores índices de consumidores dessas notícias.64 Daí surge a

necessidade de se identificar essas notícias falsas.

Por óbvio, identificam-se as notícias falsas pela inverdade ou distorção da verdade dada por notícia, ou artigo publicado, e a importância de identifica-las transcende apenas a responsabilização civil dos ofensores e criadores da notícia, alcançando direitos fundamentais inerentes a cada cidadão.

Algumas das ferramentas utilizadas atualmente para esta checagem e identificação são as agências de fact checking (checagem de fatos). Felipe Valentim traz importantes princípios mantidos pela International Fact Checking Network, unidade que reúne essas agências ao redor do mundo, e que norteiam a atuação das mesmas:

A International Fact-Checking Network (IFCN), unidade vinculada ao Poynter Institute nos Estados Unidos, que tem como objetivo reunir e checar os fact-checkers ao redor do mundo, mantém um código de princípios aos quais as agências de fact-checking signatárias devem seguir. Tais códigos são: (I) compromisso com imparcialidade e o apartidarismo; (II) compromisso com a transparência das fontes; (III) compromisso com a transparência do financiamento e da organização; (IV) compromisso com a transparência da metodologia; (V) compromisso com uma política de correções aberta e honesta. Estes códigos, norteiam a atuação das agências de fact-checking signatárias à IFCN ao redor do mundo, estabelecendo as diretrizes a

Disponível em: <https://web.stanford.edu/~gentzkow/research/fakenews.pdf>. Acesso em: 29 de outubro de 2019.

63 FAKE NEWS. Cambridge Advanced Learner's Dictionary & Thesaurus. Disponível em

https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/fake-news. Acesso em 24 out. 2019.

64 SASTRE, Angelo; CORREIO, Claudia Silene Pereira de Oliveira; CORREIO, Francisco Rolfsen Belda. A

influência do “filtro bolha” na difusão de Fake News nas mídias sociais: reflexões sobre as mudanças nos

algoritmos do Facebook. Revista GEMInIS, São Carlos, UFSCar, v. 9, n. 1. 2018. Disponível em: http://www.revistageminis.ufscar.br/index.php/geminis/article/view/366. Acesso em: 19 out. 2019. (p. 6).

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serem seguidas por essa modalidade jornalística, demonstrando assim, confiabilidade e credibilidade na informação checada. Os números de agências de factchecking não param de crescer ao redor do mundo. Hoje, já são cinquenta e oito agências de fact-checking signatárias à IFCN ao redor do mundo, sendo três no Brasil.65

Por meio das premissas acima elencadas, as agências de fact checking contribuem e muito na luta contra a desinformação gerada pela divulgação de notícias falsas, boatos e distorções. Por esse motivo, e por estas oferecerem mão de obra agilizada e especializada na checagem de fatos e dados66, a imprensa tem utilizado cada vez mais o serviço dessas agências,

o que se observa também por parte dos sites e redes sociais.

O Facebook, por exemplo, lançou um produto de verificação de notícias em parceria com duas agências brasileiras de checagem de fatos, Agência Lupa e Aos Fatos, em que utiliza de vários mecanismos para coibir a criação de notícias falsas e diminuir o seu alcance. Em seu mecanismo de notícia, o Facebook Newsroom, a empresa trata que “esse mecanismo permitiu cortar em até 80% a distribuição orgânica de notícias consideradas falsas por agências de verificação parceiras nos Estados Unidos, onde a ferramenta já está funcionando há algum

tempo.”67

A identificação das fake news significa grande avanço na contenção das mesmas, visto que abre a possibilidade de se limitar o alcance das publicações de sites mal-intencionados, e obviamente, no caso de lesões, a consequente responsabilização civil e punição dos criadores das notícias, o que consequentemente também contribui para a repressão da divulgação.

3.2 LIBERDADE DE EXPRESSÃO

A elaboração e o compartilhamento de fake news se tratam de atos atentatórios à democracia, como já fora mencionado, e geram a necessidade de limitação dos direitos à liberdade de expressão, bem como seus desdobramentos (liberdade de informar e ser

65 VALENTIM, Felipe. Fact-checking como possível ferramenta qualificadora do debate público. Caderno

da Escola Superior de Gestão Pública, Política, Jurídica e Segurança. Curitiba, vol. 2, n. 1, p. 197-215, jan./jun. 2019.

66 SPINELLI, Egle Muller; SANTOS, Jéssica de Almeida. Jornalismo na era da pós-verdade: fact-checking

como ferramenta de combate às fake news. 2018. Disponível em:

https://sistemas.uft.edu.br/periodicos/index.php/observatorio/article/view/4629/13090. Acesso em 20 out. 2019. (p. 13).

67 FACEBOOK lança produto de verificação de notícias no Brasil em parceria com Aos Fatos e Agência Lupa.

Facebook Newsroom, 2018. Disponível em:

https://br.newsroom.fb.com/news/2018/05/facebook-lanca-produto-de-verificacao-de-noticias-no-brasil-em-parceria-com-aos-fatos-e-agencia-lupa/. Acesso em: 25 out. 2019.

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informado), além de atentar contra a credibilidade da imprensa, esta que tem como premissa a busca e divulgação de fatos, jamais de boatos ou inverdades.

A grande conquista dos já mencionados direitos veio depois de um período obscuro da história brasileira. Após o período de regime militar, que teve início com o golpe de 1964, em que ocorriam censuras políticas e ideológicas, se fez necessário assegurar, na Carta Magna, a liberdade de expressão,68 um direito assegurado pela Constituição Federal de 1988. A mesma

abarca também a liberdade de informação, que será tratada posteriormente, conforme se vê na previsão dos incisos do Art. 5º, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; [...]

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.69

Entende-se que a liberdade de expressão é o direito de se expor, expor suas ideias, pensamentos e convicções, não passando, necessariamente, a ideia de compromisso com a veracidade que a liberdade de informação, contém, por exemplo.70 Nas palavras do ministro

Gilmar Mendes, em sua obra, a liberdade de expressão “é um dos mais relevantes e preciosos direitos fundamentais, correspondendo a uma das mais antigas reivindicações dos homens de todos os tempos”.71

A liberdade de expressão é uma importante ferramenta para a democracia, visto que garante a todos o direito de se expressarem, não só com informações, mas com outros tipos de manifestações, sejam elas artísticas, intelectuais, científicas, de informação ou políticas. É na exposição de pensamentos, no diálogo, no confronto de ideias que reside a importância da democracia, em que todos podem participar pelos meios acima expostos.72 Ao proteger o

pluralismo de opiniões e da formação da vontade livre, a liberdade de expressão é, portanto, um grande instrumento para a proteção e funcionamento da democracia e do sistema democrático.73

68 PINHO, Rodrigo César Rebello; Direito Constitucional : teoria geral da constituição e direitos fundamentais. 17. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019. (p. 116).

69 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência

da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 10 out. 2019.

70 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 12. ed. – São Paulo: Atlas, 2015. (p. 157) 71 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Bonet. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. São

Paulo: Saraiva, 2016. (p. 263).

72 MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. 8. ed. – São Paulo: Atlas, 2019. (p. 127) 73 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Bonet. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. São

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Acerca da liberdade de expressão, Sylvio da Motta Filho cita que esta se estende não só ao conteúdo expresso, mas sim ao meio eleito pra que este seja veiculado, in verbis:

A liberdade de expressão garantida pelo texto constitucional, quanto aos instrumentos pelos quais pode ser veiculada, é a mais ampla possível. Assim, todo e qualquer instrumento, seja oral, escrito, mímico, por meio de desenhos, pinturas, fotografias está abrangido no dispositivo. Da mesma forma, todos os meios de transmissão da atividade estão nele albergados, tais como jornais, livros, revistas, rádio, televisão, cinema, internet etc.74

Portanto, conforme já fora tratado, a liberdade de expressão surge na Carta Magna como uma grande ferramenta de defesa contra a censura e contra o autoritarismo estatal75, o

que ocorreu no exemplo já citado do período pré-Constituição de 1988, a ditadura militar, no qual ocorria, por exemplo, a censura prévia. Pelas palavras de Alexandre de Moraes, a censura prévia significa “o controle, o exame, a necessidade de permissão a que se submete, previamente e com caráter vinculativo, qualquer texto ou programa que pretende ser exibido ao público em geral.”76

Como já foi dito, o texto constitucional repele expressamente a censura prévia, sendo permitido, por óbvio a censura punitiva ou repressiva, feita após a divulgação da informação ou opinião.

É óbvio, no entanto, que apesar da liberdade de expressão possuir posição de preferência, não é um direito absoluto77, e não se pode confundir liberdade com abuso78, por

isso existem limitações. Por vezes a manifestação de pensamentos pode ferir um direito fundamental de outrem, como a imagem e a honra. Por isso a identificação do autor da expressão é necessária, possibilitando a sua identificação para eventual responsabilização pelos danos sofridos pela vítima.79

Nesse norte, é vedado também o anonimato na divulgação de informações ou opiniões. É como trata Clever Vasconcellos, in verbis:

74 MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. Direito constitucional: teoria, jurisprudência e questões. ed. rev.,

atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016. (p. 229).

75 NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed.

JusPodivm, 2017. (p. 358).

76 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 33. ed. rev. e atual. até a EC nº 95, de 15 de dezembro de

2016 – São Paulo: Atlas, 2017. (p. 53).

77 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 20. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva,

2016. (p. 1186).

78 MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. Direito constitucional: teoria, jurisprudência e questões. ed. rev.,

atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016. (p. 228).

79 NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed.

(32)

Veda-se, entretanto, o anonimato, manifestações apócrifas – aquilo que não tem nome – no sentido de que toda a divulgação do pensamento deve ser nominada, a fim de se atribuir eventual responsabilidade àquele que a manifestou. É que eventual ultrapassagem dos limites no momento da divulgação do pensar pode ensejar responsabilidades de cunho civil e/ou penal.80

Esse pensamento é previsto no inciso V do artigo 5º da Constituição Federal, que prevê: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”81

A liberdade de expressão, portanto, se trata de importante instrumento na busca pela democracia. Incentiva a apresentação de informações, fatos, bem como opiniões, desde que esta não incorra em ilícitos e danos à eventuais vítimas, sendo prevista, nesse caso, a censura repressiva, ou punitiva.

3.3 O DIREITO DE INFORMAÇÃO, DE INFORMAR E DE SER INFORMADO

Vivemos numa sociedade de informação, este é um direito de todos, inclusive previsto na Constituição Federal. Muitas vezes a posse da informação é mais valiosa que a posse de bens de produção82. Sobre o tema, trata Clever Vasconcellos:

O livre acesso à informação nada mais é do que uma consequência inerente a um Estado Democrático de Direito, que decerto se preocupa em garantir à população o conhecimento sobre os diversos fatos e acontecimentos, que formarão o cidadão esclarecido e devidamente instruído.83

Conforme trata o mesmo autor, a informação é uma necessidade de todos, inclusive no que tange ao conhecimento de seus direitos e deveres, in verbis:

Existe, pois, uma necessidade contemporânea de o indivíduo manter-se informado, para que assim possa participar de forma ativa e principalmente com conteúdo dos negócios de uma sociedade politicamente organizada; podendo, deste modo, vencer as barreiras do desconhecimento e da aceitação do que lhe é imposto, reivindicando seus direitos e aprendendo a respeitar os do próximo. Nesse passo é que assinalamos: a Constituição, ao assegurar a todos o acesso à informação, não se dirigiu somente aos profissionais da comunicação, mas também aos membros da sociedade em geral.84

80 VASCONCELLOS, Clever. Curso de direito constitucional. 6. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2019. (p.

159).

81 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência

da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 10 out. 2019.

82 PINHEIRO, Patricia Peck. Direito digital. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Saraiva, 2016. (p. 89). 83 VASCONCELLOS, Clever. Curso de direito constitucional. 6. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2019. (p.

197).

84 VASCONCELLOS, Clever. Curso de direito constitucional. 6. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2019. (p.

Referências

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