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PL 258/16 - o novo código brasileiro de aeronáutica e o possível conflito de norma

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA BRUNO BRUNET PAES PENTEADO

PL 258/16 – O NOVO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA E O POSSÍVEL CONFLITO DE NORMAS

Palhoça 2018

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BRUNO BRUNET PAES PENTEADO

PL 258/16 – O NOVO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA E O POSSÍVEL CONFLITO DE NORMAS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Especialização em Gestão e Direi-to Aeronáutico, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para ob-tenção do título de Especialista.

Orientador: Prof. Romeu Artur Lemos. M.e.

Palhoça 2018

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BRUNO BRUNET PAES PENTEADO

PL 258/16 – O NOVO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA E O POSSÍVEL CONFLITO DE NORMAS

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi jul-gado adequado à obtenção do título de Especi-alista em Gestão e Direito Aeronáutico e apro-vado em sua forma final pelo Curso de Especi-alização em Gestão e Direito Aeronáutico, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Palhoça, ________ de ____________________ de 20_____

_______________________________________________ Prof. e orientador Romeu Artur Lemos. M.e.

Universidade do Sul de Santa Catarina

_______________________________________________ Prof. ______________

Universidade do Sul de Santa Catarina

_______________________________________________ Prof. _______________________

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AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente à Deus, por me iluminar nesta trajetória que foi o presente trabalho. Agradeço também à minha namorada Larissa, pela paciência e conselhos dados.

Agradeço ainda o professor Hélio Luis de Abreu e em especial o professor Romeu Artur Lemos pela paciência e dedicação na orientação deste TCC, e a instituição de ensino Unisul por todo o suporte e atenção durante este curso de Pós-Graduação.

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso teve por objetivo analisar o Projeto de Lei nº 258 de 2016 que tramita atualmente na Comissão Especial do Senado, e que visa atualizar o Códi-go Brasileiro de Aeronáutica. O nosso atual códiCódi-go, fonte primária do direito aeronáutico é de 1986, ou seja, já não reflete os anseios e problemas enfrentados pela aviação brasileira. A falta de uma norma atual não somente afeta no desenvolvimento do setor a qual esta visa re-gular, como também força os órgãos que são diretamente envolvidos, como agências regula-doras, a produzir diversos outros tipos de normas, como instruções, regulamentos e orienta-ções para suprir a falta de uma legislação superior. O Projeto que tramita no Congresso visa atualizar a legislação sobre a atividade aérea no Brasil, mas como é analisado no presente trabalho, o legislador tenta ao máximo atender as demandas já existentes e imaginar as que surgirão e acaba assim por promover uma série de confusões legislativas, como por exemplo, a adoção das Convenções Internacionais para resolução de conflitos jurídicos referente a vôos nacionais, sendo já pacífico a utilização do Código de Defesa do Consumidor.

Palavras-chave:PL 258. Novo Código Brasileiro de Aeronáutica. Conflito de Normas. Diálo-go das fontes. CódiDiálo-go de Defesa do Consumidor.

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ABSTRACT

The present work had the objective to analyze the Law Project nº 258/2016 currently under-way in Special Commission of Senate, which aims to update the Brazilian Air Law Code. Our current code, the primary source of aeronautical law “born” at 1986, so, it no longer reflects the yearnings and problems faced by Brazilian aviation.The lack of a current rule not only reflects the development of the sector that is trying to regulate, but also forces the government agencies, to issue several other types of rules, to make up the lack of a updated legislation. The project that is being carried out in Congress is coming to help the air activity in Brazil, but as it is analyzed in the present work, the legislator tries to the maximum to answer the existing demands and imagine the ones that will emerge and ends to promote a series of legis-lative confusions .The confusion that caught our attention, was the intention of the legislator to ignore some laws and codes that influence and are sources of aeronautical law, and give the new BAC (Brazilian Air Code) a privileged position in conjunction with the International Conventions. In that way, without using a “crystal Ball”, we can already imagine future dis-cussions on conflicts of norms, and wich legislation to apply, as has already occurred in Aeronautical Law and seems to return the discussions.

Key Words:PL 258. New Brazilian Air Code.Conflict of Norms.Source Dia-logue.CodeofConsumerProtection.

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 7 1.1 PROBLEMÁTICA ... 7 1.2 OBJETIVOS ... 9 1.2.1 Objetivo geral ... 9 1.2.2 Objetivo específico ... 9 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 10

2.1 HISTÓRIA DA LEGISLAÇÃO AERONÁUTICA BRASILEIRA ... 12

2.2 CONVENÇÕES DE VARSÓVIA E MONTREAL E A INTERNACIONALIZAÇÃO AO DIREITO BRASILEIRO ... 14

2.3 SOLUÇÃO PARA OS CONFLITOS DE NORMAS ... 17

3 O PROJETO DE LEI 258/2016 – O NOVO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA ... 20

3.1 A LINHA DO TEMPO DO PL 258/2016 NO LEGISLATIVO ... 20

3.2 FUNDAMENTOS DO LEGISLADOR NO PL 258/2016 ... 23

4 A RESOLUÇÃO DO CONFLITO DE NORMAS ... 26

4.1 A RESOLUÇÃO DO CONFLITO DE NORMAS ENTRE O ATUAL CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ... 28

4.2 A RELAÇÃOENTRE O ATUAL CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA E OS TRATADOS INTERNACIONAIS NO TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL ... 31

4.3 OS POSSÍVEIS CONFLITOS ENTRE O NOVO CBA E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ... 36

5 CONCLUSÃO ... 43

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1 INTRODUÇÃO

A idéia do presente trabalho nasce após o acompanhamento do Projeto de Lei 258 de 2016 que tramita atualmente no Senado Federal e que, após muita discussão e 350 emen-das depois, foi apresentado com 374 artigos, tratando dos mais diversos assuntos relacionados à aviação, mas principalmente, o que nos chama maior atenção é o ineditismo do legislador em definir que este novo Código Brasileiro de Aeronáutica em conjunto com as Convenções Internacionais de Aviação, já internalizadas pelo direito pátrio, serão normas a serem aplica-das pelos operadores do direito em relação a outras legislações.

O que se visa neste trabalho é observar que no futuro, com a entrada em vigor desta nova lei no direito brasileiro, poderão ocorrer possíveis conflitos de normas em relação as legislações que também tratam do direito aeronáutico, como o Código de Defesa do Con-sumidor (CDC), como será explicado mais a frente. Apesar do interesse do legislador em se antecipar a estes possíveis conflitos, determinando que o novo CBA será a norma correta a ser aplicada, não possui este autonomia o bastante para desconsiderar outras fontes do direito, principalmente o CDC, que quando da sua publicação, trouxe diversos princípios protegidos constitucionalmente e que mudaram profundamente as relações contratuais em que figure uma relação de consumo.

Sendo assim, destarte o argumento objetivo do legislador em que o novo CBA se-rá norma mais específica e mais nova do que o CDC, não deve este simplesmente ignose-rá-lo e ultrapassar sobre direitos já consagrados no texto constitucional. Cabe então aqui uma análise mais profunda desta possível antinomia em busca de uma resolução pacífica, como a defendi-da na tese do diálogo defendi-das fontes, trazido ao direito brasileiro pela Profª Claudia Lima Mar-ques, de forma que o tão esperado novo CBA não retroceda no que tange aos direitos do con-sumidor, mas que ambos possam coexistir no universo jurídico brasileiro.

1.1 PROBLEMÁTICA

O transporte aéreo de passageiros e cargas é um ramo comercial de extremo di-namismo, tanto a nível nacional como em escala global. Sendo assim, todos aqueles que dire-ta ou indiredire-tamente possuem vínculo com a aviação, sejam pessoas sejam as próprias institui-ções, devem buscar se atualizar na mesma velocidade que esta, sob pena de penalizá-la.

Entre as instituições, o arcabouço jurídico que tradicionalmente se modifica para acompanhar o desenvolvimento da sociedade é um dos que precisam correr atrás do desen-volvimento da aviação. Tomemos por base, o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) em vigor (Lei 7.565/86), principal diploma legal da nossa aviação civil. Gestado e promulgado no

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período dos governos militares que dominaram o país entre 1964 e 1988, é anterior a outros diplomas legais como a Constituição Federal de 1988, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) de 1990 e o Código Civil de 2002. Esta anterioridade do CBA em relação aos citados diplomas acaba, de certa forma, por afetar a aviação brasileira em vários e importantes assun-tos, na medida em que dá margem a conflitos de normas com dispositivos legais mais atuali-zadas, ao mesmo tempo em que deixa de contemplar temas como a regulamentação do uso de veículos aéreos não tripulados (VANT),e os já populares drones. Sua desatualização acaba também, não raro, por levar insegurança jurídica àqueles que direta ou indiretamente se rela-cionam com a aviação.

No ano em que entrou em vigor,1986, o CBA tratou, em 42 artigos, do importante tema da responsabilidade civil do transportador,e o fez, com base no que dispõe a Convenção de Varsóvia ao tratar dos danos decorrentes dos contratos de transporte aéreo. Contudo, em 1990 foi promulgado o Código de Defesa do Consumidor que, cumprindo mandamento da Constituição Federal passou a proteger o consumidor em toda relação contratual de consumo, incluindo aí o contrato de prestação de serviço de transporte. Com o novo código, nossos tri-bunais passaram a aplicar o CDC quando da necessidade de reparação dos danos causados aos consumidores decorrentes dos contratos de transporte aéreo.

Antes do CDC, a própria Constituição Federal, de 1988, portanto, dois anos após a vigência do CBA, já estatuía em seu art. 37, § 6º, a responsabilidade civil objetiva nos servi-ços públicos, em termos conflitantes com o Codex aeronáutico.

O novo Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002) trouxe em seu conteúdo um capítulo inteiro dedicado ao transporte em geral, obviamente incluindo o modal aéreo e tam-bém este importante diploma legal, abordou temas como a responsabilidade civil, as indeniza-ções e a chamada cláusula de incolumidade, todos estes afetos à aviação e divergindo do pres-crito no CBA.

Diante da evidente necessidade de se atualizar o Código Brasileiro de Aeronáuti-ca, em 2016, o Senado Federal instituiu por meio do Projeto de Lei PL 258/16, que visa a criação de um novo Código Brasileiro de Aeronáutica.

Este projeto, até a data da confecção deste trabalho já havia recebido 350 emen-das. Não sendo objetivo do trabalho analisar o PL258/16 em todo seu conteúdo, faz-se neces-sário apontar que o projeto parece desconsiderar o Código de Defesa do Consumidor quando trata da responsabilidade civil no título IX, afirmando o legislador de forma, no mínimo não usual, que o PL é norma especial em relação aos dispositivos legais internos devendo prevale-cer sobre estes sempre que aquele for contrariado.

O presente trabalho visa assim debater sobre o PL 258/16, que provavelmente se converterá no Novo Código Brasileiro de Aeronáutica, no que tange a relação com alguns

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importantes tópicos que integram dispositivos legais já existentes. Logo, supondo-se que o PL entre em vigor com a atual redação, podemos estar diante da possibilidade de novos conflitos jurídicos envolvendo assuntos outrora já pacificados? Em suma, este trabalho visa também uma reflexão sobre o nascimento desta nova lei que poderá acarretar em mudanças bruscas nas relações entre passageiros e empresas aéreas.

1.2 OBJETIVOS

Nesta seção são apresentados os objetivos geral e específicos, para que se alcan-cem os resultados desejados.

1.2.1 Objetivo geral

Discorrer sobre a relação do novo Código Brasileiro de Aeronáutica que tramita atualmente no Senado por meio do PL 258/16 e sua relação com outros diplomas legais já em vigor, em especial o Código de Defesa do Consumidor.

1.2.2 Objetivo específico

1. Apontar pontos conflitantes na nova norma que poderão ensejar interpretações de caráter ambíguo.

2. Compreender como será a relação do novo CBA com a legislação em vigor, e a possível aplicação simultânea destas por meio do diálogo das fontes.

3. Confrontar os fundamentos constitucionais do Direito do Consumidor com o padrão hierárquico do futuro Código Brasileiro de Aeronáutica.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) atual, “nascido” em 19 de dezembro de 1986, trouxe à época uniformidade e segurança jurídica para um ramo comercial que cres-cia vertiginosamente no Brasil e assim ansiava por uma legislação que a regulasse de forma pertinente. Neste diapasão, promulga-se o CBA inovando em diversos temas e dirimindo dú-vidas para o setor.

Entretanto, a aviação civil por se tratar atividade em constante evolução, muda não somente a si, mas também a forma de se relacionar com aqueles que estão ligados a ela, seja direta ou indiretamente.

Neste sentido, o atual CBA, dado sua obsolescência, face ao surgimento de um novo arcabouço jurídico formado pela Constituição Federal, promulgada em 1988, pelo Códi-go de Defesa do Consumidor, de 1990 e o CódiCódi-go Civil, promulgado em 2002, para viCódi-gorar a partir do início de 2003, necessita, ser atualizado, em que pese algumas emendas incorporadas visando atenuar seu desgaste.

E curta síntese pode-se apontar, por exemplo, a necessidade de se regulamentar importantes mudanças ocorridas na aviação e que estão sem uma regulação devida, como os ARP´s (Aeronaves Remotamente Pilotadas). Ou seja, a atividade aeronáutica precisa de segu-rança jurídica e objetividade, e o que se vê na prática hoje em dia é um Código desatualizado somado a diversas outras normas, como portarias e regulamentos emitidos pela ANAC (A-gencia Nacional de Aviação Civil), revelando uma verdadeira profusão de todo tipo de norma no âmbito da legislação aeronáutica.

Sendo assim, o PL258 de 2016 que ainda tramita nas Comissões Especiais do Se-nado Federal viria suprimir essa defasagem legislativa. Porém, a julgar pelo relatório inicial do PL, já podemos antever a possibilidade de confusões em determinados temas que serão detalhados futuramente. Em um deles, o novo CBA poderá resultar em a regressão de direitos do consumidor como Calazans antevê:

Outrossim, no atinente à responsabilidade civil do transportador aéreo, o trabalho produzido pela nobre Comissão reproduziu o texto do atual CBAer nos diversos pontos relativos à limitação da responsabilidade do transportador aéreo, tendo sido manifesta a preocupação em se afastar ao máximo de uma possível incidência do sistema compensatório real e efetivo estipulado pelo Código do Consumidor e pelo Código Civil, o que tem sido objeto de enorme grau de judicialização no País há muitos anos. Tal preocupação foi tão acentuada que se chegou a buscar conceituar, no próprio texto, que a lei é “especial” em relação a outras (Art. 316, §único), o que é algo inusitado em matéria de técnica legislativa e provavelmente de pouca efetivi-dade, mas capaz de gerar alguma insegurança e litigiosidade.

(...)

E, de certo modo, o texto do PLS 258/16 restou confuso no tratamento do transporte aéreo doméstico, ao afirmar que a responsabilidade do transportador “está sujeita

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aos limites estabelecidos neste Título”, sem, todavia, tê-los consignado em relação aos danos a passageiros (Arts. 288 c/c 295). (CALAZANS, 2017, p. 2).

Ao analisarmos o PL258 em conjunto com pareceres técnicos emitidos pela Co-missão Especial de Defesa do Consumidor (CEDC) da OAB Nacional e pela Associação de Proteção aos Consumidores PROTESTE1, podemos antever novos conflitos jurídicos de con-sumidores em face de empresas aéreas. Um exemplo que se destaca como possível foco de conflito é o fato do legislador reconhecer somente o PL e as Convenções como hábeis a tratar de direito aeronáutico e assuntos correlatos, “pondo de lado” para transportes aéreos nacionais a proteção dada pelo Código de Defesa do Consumidor. Para fins de exemplificação, trans-crevemos o Art.299 do PL 258 que trata sobre a responsabilidade do transportador sobre ba-gagens:

Art. 299. A responsabilidade do transportador no transporte de carga limita-se ao va-lor estipulado no item 3 do Art. 22 da Convenção para a Unificação de Certas Re-gras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional2.

O dispositivo traz somente um exemplo de como o PL pode limitar a responsabi-lidade do transportador, em desfavor do consumidor. Pode-se assim dizer que o legislador, talvez com base na recente jurisprudência do STF, solidificou o entendimento de que para transportes internacionais aplicar-se-á as Convenções Internacionais que já foram ratificadas pelo Brasil. Contudo, no âmbito do transporte nacional, a jurisprudência consolidada aponta em sentido contrário,afirmando que aplica-se, o CDC e o Código Civil, enquanto o legislador propôs, aplicar tão somente o Novo Código Brasileiro de Aeronáutica e as Convenções Inter-nacionais, no que este a remeter. Ou seja, tem-se a impressão que o legislador não consegue vislumbrar a possibilidade de, como recomenda a doutrina e jurisprudência atual, em sendo o caso, mais de uma norma tratar do mesmo assunto sem se excluírem mutuamente.

1Audiência Pública da Comissão CEARO do Senado Federal. Realizada em 18/10/2017. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/comissoes/reuniao?reuniao=5485&codcol=2031>. Acesso em: 22 mai. 2018.

2BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado n° 258, de 2016. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/126231>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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2.1 HISTÓRIA DA LEGISLAÇÃO AERONÁUTICA BRASILEIRA

O Brasil, como berço do pai da aviação, veio a iniciar a sua exploração comercial formalmente a partir de 1927 com o primeiro voo de uma empresa aérea, a Condor, em um voo do Rio de Janeiro para Florianópolis. Neste mesmo ano tivemos a fundação da compa-nhia aérea Varig e ainda a criação das primeiras linhas regulares de passageiros3. Logo, o ano de 1927 foi o marco inicial nesta nova atividade econômica no Brasil, um país de dimensões continentais no qual parece a aviação ter nascido para integrar o seu desenvolvimento.

A importância da aviação para atividade econômica do Estado Brasileiro pode ser notada na primeira legislação a tratar do assunto, o Decreto nº 4.911 de 12 de janeiro de 1925 que possuía como objetivo tratar da despesa geral da República e acabou por abarcar de forma geral a aviação em seu Art.19:

Art. 19. O Governo regulamentará o serviço de aviação, quer para as linhas interna-cionaes, quer para as interiores, tendo em vista os princípios geraes estabelecidos na Constituição de 24 de fevereiro, com respeito á navegação de cabotagem e á não concessão de privilegios, os regulamentos adoptados em outros paizes e as conven-ções internacionaes existentes, acautelados os interesses da Defesa Nacional, poden-do contractar o transporte da correspondencia postal, mediante o pagamento poden-do pro-ducto, ou de parte do propro-ducto, que for apurado pela venda de sellos especiaes, cuja tabella poderá organizar4.

Ainda no ano de 1925, temos a primeira legislação a tratar especificadamente so-bre aviação, que foi o Decreto nº 16.983 de 22 de julho de 1925, ao dispor em seus 102 arti-gos o “Regulamento para os Serviços Civis de Navegação Aérea”, definindo por exemplo em seu art.2º5 que era de competência exclusiva da União a jurisdição sobre o espaço aéreo na-cional.

Em termos constitucionais, somente com a Constituição de 1934 há a primeira ci-tação sobre aviação ao confirmar como já antevia o Decreto nº 16.983, a competência privati-va da União em legislar sobre o tema, conforme Art. 5º inciso VIII e letra “a” do inciso XIX:

Art. 5º - Compete privativamente à União: [...]

VIII - explorar ou dar em concessão os serviços de telégrafos, radiocomunicação e navegação aérea, inclusive as instalações de pouso, bem como as vias-férreas que

3MESQUITA, Ivan Muniz de. O direito aeronáutico e sua evolução. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28113>. Acesso em: 08 mai. 2018.

4BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 4.911, de 12 de janeiro de 1925. Disponível em:

<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-4911-12-janeiro-1925-565565-publicacaooriginal-89335-pl.html>. Acesso em: 22 mai. 2018.

5Art. 2º Compete á União exclusivamente a jurisdicção sobre o espaço aereo nacional, devendo o estabelecimen-to das respectivas vias de communicação obedecer ás prescrições deste regulamenestabelecimen-to. (BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto 16.983 de 22 de Julho de 1925. Disponível

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guem diretamente portos marítimos a fronteiras nacionais, ou transponham os limi-tes de um Estado;

[...]

XIX - legislar sobre: a) direito penal, comercial, civil, aéreo e processual, registros públicos e juntas comerciais6;

A Constituição de 1937 manteve basicamente os preceitos da Constituição de 34 mantendo a validade do Decreto nº 16.938. Contudo, visando uma identidade nacional legisla-tiva maior, tendo em vista que o decreto que até então regulava a aviação era baseado em normas de outros países, foi promulgado em 8 de junho de 1938 o primeiro Código Brasileiro do Ar, trazendo um volume de conteúdo maior que o do Decreto nº 16.938, ao contemplar 173 artigos.

Uma novidade trazida pelo novo Código foi a criação do primeiro órgão criado para tratar exclusivamente sobre a aviação, o Conselho Nacional de Aeronáutica, criado com a finalidade em auxiliar o Governo na coordenação e desenvolvimento do transporte aéreo, o Conselho foi substituído logo em seguida, em 1941, pelo Ministério da Aeronáutica, criado devido aos clamores dos militares em virtude da Segunda Guerra Mundial que já evoluía em território Europeu7.

A Segunda Grande Guerra trouxe profundas mudanças para o mundo em todos os aspectos, e em relação a aviação comercial não poderia ser diferente. Com a aproximação de seu término, observou-se um aumento substancial no volume do transporte aéreo, não somen-te por carregar mais passageiros, mas também por prestar agora essomen-te serviço com novas somen- tecno-logias, melhores aviões, infraestrutura aeroportuária e etc.Cumpre salientar que para atender esta nova demanda de tráfego de pessoas, foram utilizadas aeronaves excedentes de guerra, como a famosa aeronave DC-3, amplamente utilizada pelo mundo afora, tanto para o trans-porte de passageiros quanto os de carga.Como consequência do novo panorama aeronáutico mundial, realizou-se em 1944 a Convenção de Chicago, formada inicialmente por 52 países, incluindo o Brasil. Dentre os feitos de maior importância da Convenção, senão o maior, está a criação, por força do artigo 43 da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), que viria somente a se materializar em 04 de abril de 19478, com o objetivo de desenvolver e es-timular a navegação e o transporte aéreo pelo mundo de forma segura e ordeira.

No Brasil, a Convenção de Chicago, foi internalizada ao direito brasileiro por meio do Decreto nº 21.713 de 27 de agosto de 1946. Assim, quase dez anos após a promulga-ção do Código Brasileiro do Ar de 1938, tem-se uma nova legislapromulga-ção sobre direito

6BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 16.983 de 22 de Julho de 1925. Disponível em:

<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-16983-22-julho-1925-529760-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 30 ago. 2018.

7MESQUITA, Ivan Muniz de. O direito aeronáutico e sua evolução. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28113>. Acesso em: 08 mai. 2018.

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co para integrar este sistema jurídico específico.Começa-se assim o conjunto de leis, regula-mentos e normas que integrarão o sistema jurídico sobre o direito aeronáutico.

Até o ano de 1964,convivíamos com o Código de 38 e as normas internacionais até então nacionalizadas. Porém, com o advento da ditadura militar em março de 1964, dois anos e meio após seria promulgado o Decreto-lei nº 32 de 18 de novembro de 1966, instituin-do um novo Código Brasileiro instituin-do Ar, seninstituin-do posteriormente recepcionainstituin-do pela Constituição Brasileira de 1967, emendada em 1969. A maior dicotomia deste código para o anterior é o maior detalhamento das infrações e penalidades.

O término da ditadura em 1985, e a chegada gradual da democracia levaram a cri-ação do Código Brasileiro de Aeronáutica de 1986, que a cronologia permite facilmente de-duzir, ainda sofreria forte influência dos militares em sua elaboração.

Em vigor atualmente junto com o amplo arcabouço jurídico brasileiro e de leis que refletem os acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário, o CBA é frequentemen-te alvo de citações em nossos tribunais que reclamam suas defasagens com a atualidade.

Neste diapasão, vivenciamos atualmente no direito aeronáutico uma verdadeira celeuma de normas e leis, um CBA desatualizado e diversas outras normas espalhadas no or-denamento jurídico que frequentemente o contradizem, o que acaba por criar empecilhos até para o próprio desenvolvimento da aviação brasileira, uma vez que a falta de uniformidade legislativa leva consequentemente a uma insegurança generalizada como doutrina:

A adição do risco provocado por uma governança mal definida e, principalmente, um arcabouço jurídico com legislação “não organizada e com lacunas e sobreposi-ções”, pode encarecer a utilização desse modal, diminuir o crescimento do setor e afugentar possíveis investidores nacionais e internacionais. (BAPTISTUCCI, 2016, p. 22).

Desta forma, faz-se necessário mais do que nunca uma atualização digna do tamanho que a aviação brasileira atingiu desde a década de 80, sob pena de ficar “amarrada” e ver seu cres-cimento cada vez menor em virtude das dificuldades que se apresentam com este “atraso” na atualização de sua principal lei.

2.2 CONVENÇÕES DE VARSÓVIA E MONTREAL E A INTERNACIONALIZAÇÃO AO DIREITO BRASILEIRO

O mundo após a Primeira Grande Guerra passou por uma profunda transformação econômica com a aviação não poderia ter sido diferente. Durante a guerra o avião foi pela

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primeira vez utilizado como arma de combate o que acabaria levando a um desenvolvimento rápido de suas atribuições, como o transporte de pessoas e cargas.Terminada a guerra iniciou-se o transporte comercial de passageiros pelo modal aéreo, modificando profundamente a forma de as pessoas se conectarem.

Com o início das atividades comerciais das primeiras empresas aéreas, observou-se a necessidade de observou-se regulamentar a atividade e alguns de observou-seus principais temas como de-terminar a responsabilidade do transportador no caso de mortes ou lesões a passageiros, danos as bagagens, limites das compensações e naturalmente, estabelecer um padrão para as normas dos diversos Estados que faziam uso do modal.

Com este intuito, em 1929, 152 Estados compareceram à Convenção de Varsóvia, que formalmente recebeu o nome de Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, a qual viria a se tornar um dos mais importantes instru-mentos do direito aeronáutico internacional ao estabelecer princípios, direitos e deveres de empresas aéreas por todo o mundo, criando estabilidade para o crescimento continuo da avia-ção9.

A Convenção de Varsóvia, a qual o Brasil ratificou, foi internalizada pelo direito nacional por meio do Decreto 20.704 de 24 de dezembro de 193110, composto por 40 artigos e tratando especialmente sobre as responsabilidades do transportador a partir do Art.17 do Ca-pítulo III. Dentre os artigos, estabeleceu a Convenção a obrigação do transportador em emitir bilhetes, limitar a prescrição para reclamação em 2 anos e estabelecer o limite da responsabi-lidade do transportador, fixando inclusive valores para possíveis indenizações.

A Convenção de Varsóvia, devido ao ritmo exponencial no desenvolvimento da aviação fez com que fosse emendada seguidas vezes com o objetivo de acompanhar esta evo-lução no campo dos direitos e deveres. Entre 10 e29 de maio de1999, na cidade de Montreal no Canadá, teve início a Conferência Internacional de Direito Aeronáutico11,conhecida como Convenção de Montreal com o intuito de atualizar e assim substituir os ditames do Sistema de Varsóvia, a qual já demonstrava sinais de esgotamento de tantas emendas.O novo instrumento conforme Pacheco (2006, p.31) atualizou e consolidou as regras do Sistema de Varsó-via.passou a vigorar em 2003, estabelecendo padrões relativos à responsabilidade no transpor-te aéreo, definindo o que era transportranspor-te aéreo intranspor-ternacional e estabelecendo as diferenças do

9ICAO. The Warsaw System on Air Carries Liability. Disponível em: <https://www.icao.int/secretariat/PostalHistory/the_warsaw_system_on_air_carriers_liability.htm>. Acesso em: 30 ago.2018.

10BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 20.704 de 24 de Dezembro de 1931. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/D20704.htm>. Acesso em: 30 ago. 2018.

11PACHECO, José da Silva. Comentários ao Código Brasileiro de Aeronáutica. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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doméstico, propiciando, enfim, maior segurança jurídica para as empresas aéreas, Estados, passageiros e demais elos do setor.

O Sistema de Montreal foi internalizado no Brasil por meio do Decreto nº 5.910 de 28 de setembro de 2006, e diferente da responsabilidade subjetiva prevista pela Convenção de Varsóvia, a de Montreal inovou conforme explicita Carrá (2015, p.283):

O sistema de Montreal inova ao estabelecer um modelo bifronte (two-tier system) de responsabilização, matéria que se encontra disposta no Art. 21 dessa derradeira Convenção.

Trata-se, em resumo, de um regime de responsabilidade em dois níveis. A responsa-bilidade será objetiva até o limite de 100.000 DES (cerca de 135.000 dólares). Aci-ma desse valor, ele continua fundamentado na culpa, sempre presumida e com a no-vidade da retirada da tarifação.

A responsabilidade do transportador no que exceder 100.000 DES, por passageiro, poderá, nada obstante, ser elidida se ele provar que: a) o dano não se deveu à negli-gência ou outro ato ou omissão de sua parte ou de seus prepostos ou agentes; ou b) o dano causado se deveu unicamente à negligência ou outro ato ilícito ou omissão de uma terceira parte.

Desta forma, os direitos dos usuários do transporte aéreo já de longa data integram o arcabouço jurídico no Brasil, e desde a ratificação e nacionalização da Convenção de Var-sóvia em 1931, há regras que impõem limites e definem direitos. Entretanto, como será abor-dado oportunamente, a internacionalização dos tratados e o surgimento do Código de Defesa do Consumidor de 1990 e do Código Civil de 2002, trouxeram um conflito de normas e inse-gurança jurídica para as relações entre passageiros e empresas aéreas, tendo em vista que pas-samos a possuir mais uma fonte normativa regendo a mesma relação e dando soluções distin-tas.

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2.3 SOLUÇÃO PARA OS CONFLITOS DE NORMAS

Em um possível conflito de normas, não há mais que se falar em decidir qual apli-car, mas sim viabilizar a convivência entre elas, como na tese do diálogo das fontes, trazida ao direito brasileiro pela ilustre Claudia Lima Marques (2011).

A questão do conflito de normas, ou formalmente, da antinomia entre leis, é re-solvido inicialmente pelos 3 meios tradicionais previstos no Decreto-Lei nº 4.657 de 4 de se-tembro de 1942, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), antiga Lei de Introdução ao Código Civil (LICC), que exprime em seu Art. 2º e parágrafos:

Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a mo-difique ou revogue.

§ 1ºA lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

§ 2ºA lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revo-gadora perdido a vigência12.

O Art.2º da LINDB em poucas palavras define que em um caso de conflito entre duas leis, deverá o aplicador desta levar em consideração a hierarquia entre elas, o tempo, ou seja, quem é mais recente, e dentre as duas qual é mais especial em relação ao tema que se busca regular.

Dentre os métodos aplicáveis ao conflito entre o novo CBA e o CDC, o aplicador deve primeiramente verificar se há hierarquia entre as normas analisadas. Havendo esta dife-rença, não há que se falar de conflito, pois uma norma superior deve ser respeitada pela infe-rior, mesmo sendo esta mais recente e especial. Deve o aplicador do direito utilizar uma nor-ma como complemento ou espelho da outra no ato de interpretação.

Contudo, sendo as leis de mesma hierarquia, deve o aplicador passar para o crité-rio espacial, em que a lei mais recente revoga a mais antiga, naquilo em que divergirem ou se vier a regular a matéria em discussão como um todo. Observe que não se deve automatica-mente desconsiderar a lei mais antiga, neste momento já há necessidade em se verificar o que foi efetivamente revogado ou não pela nova lei.

Por último, temos o método especial, no qual o aplicador verificará qual das leis trata da matéria em questão de forma especial, com mais detalhes, tornando a outra geral em relação ao tema. Neste método, encontramos maior subjetividade no momento prático de apli-cação a um caso concreto. Pois, inicialmente uma lei pode ser mais especial em determinado

12BRASIL. Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657.htm>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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assunto dentro da matéria que ela regula e em outros ser mais geral. É neste momento que entra o recurso do “diálogo das fontes”, criado por Erik Jayme, demonstrando ser possível fazer com que ambas as normas vivam no mesmo sistema jurídico de forma simultânea.

Não obstante, deve o aplicador sempre observar que os métodos estipulados pela LINDB nem sempre serão um guia concreto na resolução do problema ao aplicador. Na ver-dade, ocorre por vezes exatamente o contrário, os critérios clássicos geram uma maior dúvida, devendo então o aplicador se valer de outros, como a norma maior de um sistema jurídico, que serve de “farol” aos questionamentos, a Constituição. Neste sentido, expõe a doutrina:

Relembre-se que, sempre que o interprete considerar que a utilização dos critérios clássicos (cronológico, hierárquico e da especialização) não resultará em clara de-terminação da norma que deverá prevalecer, poderá igualmente utilizar uma terceira fonte, no caso, a lei máxima do sistema, a Constituição. (MARQUES, 2011,p.657).

Este trabalho não tem por escopo questionar se o atual CBA será ou não revoga-do, isto será um fato quando e se o PL 258 entrar em vigor. O que deve-se observar sobre a questão de um possível conflito de normas é entre o novo CBA e as demais legislações que também regem de certa forma os contratos de transporte aéreo, como o Código Civil de 2002 e principalmente o Código de Defesa do Consumidor de 1990, principalmente no que trata a responsabilidade contratual do transportador. Salienta-se que, as Convenções Internacionais sobre o tema, já nacionalizadas pelo direito pátrio não serão a priori alvos de antinomia pois, inicialmente a jurisprudência do STF assentou posição no que tange a regulação do transporte aéreo internacional pelas Convenções e a própria narração do novo CBA procede conforme este entendimento.

Entretanto, na seara do transporte aéreo nacional, é pacífico atualmente a utiliza-ção do Código de Defesa do Consumidor quando diante de relautiliza-ção de consumo, ou seja, quando uma parte do contrato figura o fornecedor de produto ou serviço, e na outra ponta um consumidor, podendo ser pessoa física ou jurídica, mas que essencialmente são mais vulnerá-veis (hipossuficientes) em relação ao fornecedor. Isto se dá porque existem possibilidades de estarmos diante de um contrato de transporte aéreo que, todavia, não envolva necessariamen-te um fornecedor e um consumidor, como por exemplo, já se encontra pacificado também neste sentido, que a relação entre a empresa aérea efetuando o transporte de uma carga para outra empresa que comercializará esta carga e que não possui o requisitos de usuário final e da hipossuficiência previstos pelo CDC para caracterizar o consumidor, abrigado pela tutela especial de seus direitos.

Em prevalecendo o texto conflitante do Projeto, estaremos diante de possível anti-nomia, entre o CDC e o novo CBA, solução pode não ser tão simples, pois estaríamos diante de direitos fundamentais previstos no Art.5º, XXXII da Constituição Federal de 1988, que

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instituiu como dever do Estado a proteção e defesa do consumidor, e que não devem ser miti-gados.

É aceito por toda a doutrina que na Constituição Federal de 1988, a defesa do con-sumidor foi introduzida como um direito e uma garantia fundamental (Título II DOS DIREI-TOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. Art. 5°, XXXII: O Estado promoverá, na forma da

lei, a defesa do consumidor). Desnecessário afirmar que “a lei” à qual se refere a Constituição

é o CDC, promulgado apenas dois anos após a Carta Magna. Dessa forma, permite-se questi-onar: se o texto constitucional concedeu à a proteção ao consumidor o status de direitos fun-damentais, ao mesmo tempo que instituiu a obrigação pelo Estado na implementação de polí-ticas públicas na defesa do direito desses sujeitos, como ver esses direitos desconsiderados pelo novo código, cujo hierarquia, enquanto lei ordinária é obrigatoriamente infraconstitucio-nal?

O conflito com o Código de Defesa do Consumidor não é incomum, pelo contrá-rio, já houve alvo de amplo debate jurisprudencial entre o atual CBA e o CDC, assim como, por exemplo, também já ocorreram conflitos entre o CDC e a Lei 9.656/1998 – Lei do Segu-ro Saúde, que é posterior ao CDC e mais especial, por tratar exclusivamente de seguSegu-ro-saúde e mesmo assim houve discussão sobre qual lei aplicar. Portanto, o assunto em tela não é novo, possui antecedentes na jurisprudência e doutrina que devem ser levadas em conta pelo aplica-dor da lei em casos futuros.

Neste sentido, torna-se relevante debruçarmo-nos sobre o PL em questão e apon-tar pontos conflitantes antes que seja votado, pois, como nos ensina o antigo provérbio popu-lar “é mais fácil prevenir do que remediar”, ou seja, é melhor trazer agora ao debate as mu-danças necessárias do que vivenciarmos o início de novos conflitos judiciais.

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3 O PROJETO DE LEI 258/2016 – O NOVO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁU-TICA

O Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) em vigor desde 1986, já não reflete as necessidades e desafios impostos pela atual aviação civil brasileira. A aviação, como todo ramo econômico intimamente relacionado com a tecnologia e com os anseios da sociedade, evolui exponencialmente e para que isto não ocorra de forma desregulamentada ou pior, sofra atrasos em sua evolução, devido a lacunas em normas que a deveriam estimular, faz-se neces-sário a constante modificação e atualização da lei para tentar acompanhar estas mudanças.

3.1 A LINHA DO TEMPO DO PL 258/2016 NO LEGISLATIVO

O anseio da aviação brasileira por uma norma mais atual e que refletisse sua evo-lução já havia passado da hora. Neste sentido, o legislador brasileiro iniciou em 2015, os tra-balhos necessários para a atualização do CBA ao instituir em junho de 2015 a Comissão de Especialistas de Reforma do Código Brasileiro de Aeronáutica (CERBA), que seria responsá-vel pela elaboração do anteprojeto de reforma do CBA. Inicialmente esta Comissão foi insta-lada com a composição de 17 membros, sendo nomeado como presidente Georges de Moura Ferreira e relatora do anteprojeto, Maria Helena Fonseca de Souza Rolim13.

A CERBA que nasceu em junho de 2015 por meio do Ato nº 11 da presidência do Senado Federal, durou quase um ano, até abril de 2016, quando seus trabalhos foram encerra-dos, tendo sido apresentado à mesa da presidência do Senado Federal o PL 258 de 2016. Du-rante sua existência foram realizadas mais de 15 reuniões para ouvir os mais diversos perso-nagens que pudessem contribuir com o novo CBA. Para a finalidade deste trabalho, vale ape-nas registrar que na 10ª reunião foi realizada audiência com o Sr. Daniel Alves da Cunha, Especialista em Regulação da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), para discutir so-bre a responsabilidade civil no transporte aéreo, e que na 14ª reunião, foi convidado um repre-sentante da Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON) do Ministério da Justiça, para emitir opinião qualificada sobre direitos dos passageiros.

Em junho de 2016, exatos 1 ano da abertura da CERBA, o Presidente do Senado Federal Renan Calheiros declarou extinta a Comissão e designou outra Comissão temporária, composta agora por 11 Senadores, destinada a analisar o PL 258. Esta nova Comissão

13CERBA - Comissão de Especialistas de Reforma do Código Brasileiro de Aeronáutica. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/121782>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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al (CEARO), possui como Presidente o Senador Vicentinho Alves e Relator o Senador José Maranhão14.

Assim como ocorreu na Comissão anterior, esta também realizou reuniões com diversas entidades a fim de otimizar o texto do Projeto. Sendo assim, na 8ª reunião, ocorrida em 18 de outubro de 2016, foi realizada audiência pública para colher sugestões sobre o tema de defesa do consumidor no anteprojeto. Para esta audiência estiveram presentes a Sra. Marié Miranda, Presidente da Comissão Nacional de Defesa do Consumidor da OAB, e o Sr. Ricar-do Bisinotto Catanant, Superintendente de Acompanhamento de Serviços Aéreos da ANAC. Ademais, foram juntados ainda o parecer enviado pela PROTESTE – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor15.

Nesta reunião, todos os 3 convidados foram unânimes em apontar certos retroces-sos por parte do Projeto no que tange a Defesa do Direito do Consumidor. O Sr. Ricardo Ca-tanant, representante da ANAC nesta audiência, depõe que:

E por fim, Senador, eu realmente não quero me alongar muito, eu quero prestigiar a fala dos outros convidados que estão aqui pela primeira vez, inclusive, é fundamen-tal que esta proposta, na nossa avaliação, prestigie o princípio da especialidade das leis. Muito se discute, por conta de uma série de disposições, que a lei da aviação ci-vil e os tratados internacionais aos quais o Brasil está jungido e que deve observar trazem hoje a colocação do problema em termos de conflito. A legislação de aviação civil e os tratados internacionais conflitam por vezes com dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.

Nós temos a visão de que deveríamos colocar essa questão em outros termos, não em termos de conflito, mas em função da especialidade das leis para setores regula-dos, inclusive, em que há uma agência reguladora responsável, com poderes legal-mente atribuídos, para que ela legisle em alguns pontos, nesses pontos, claro, em que não haja ofensa ou que contrarie frontalmente dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, que eles devam ser prestigiados e observados16.

Neste sentido, foi possível observar a preocupação do representante da ANAC no que tange aos conflitos que poderão ocorrer, caso o Projeto seja promulgado com a atual re-dação.Observou-se ainda que, o próprio representante da ANAC falou em coexistência entre as normas, ou seja, não necessariamente o novo CBA deve conflitar com as normas já exis-tentes, mas deve-se buscar a complementaridade entre elas.

Logo após a fala do Sr. Contanant, foi dada a palavra à Marié Miranda, presidente da Comissão Nacional de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil. Em sua fala, destaque-se:

14BRASIL. Senado Federal. 8ª Reunião da Comissão Especial CEARO. Ocorrida em 18/10/2016. Disponível em:

<https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao;jsessionid=8552D961C62E8F2611193DF9112D8F07?0&codco l=2031&data1=2016-07-13&data2=2018-04-28>. Acesso em: 22 mai. 2018.

15Ibid., Acesso em: 30 ago. 2018.

16BRASIL. Senado Federal. 8ª Reunião da Comissão Especial CEARO. Ocorrida em 18/10/2016. Disponível em:

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Eu só gostaria de salientar que a luta em defesa do consumidor vem há muitos anos. O Código tem 26 anos. Então, é um direito adquirido.

Eu acho que a resolução da Anac, como o projeto de lei também abraçou a maioria das situações apresentadas pela Anac, o Senado tem que observar, acima de tudo, o consumidor. Nós não podemos adotar no Brasil a situação que é adotada nos Estados Unidos e na Europa. As circunstâncias de vida são outras, os usuários são outros, a vivência é outra, tanto que se deu a demanda maior de dez anos para cá.

Eu acho que não é o momento de mudanças tão trágicas. Eu acho que é uma viola-ção de direitos, do direito do consumidor, do Código Civil e da própria Constituiviola-ção Federal. Então, eu gostaria muito que se observassem todos esses direitos para que eles não sejam violados, para que não sejam feridos. Porque a Anac, hoje – perdo-em-me meus colegas –, não trabalha muito em defesa do consumidor. A defesa da Anac hoje é mais em função das empresas do que do consumidor, porque, infeliz-mente, os serviços aéreos no Brasil estão passando por muitas dificuldades e lesando muito o consumidor17.

Da leitura das palavras da advogada pode-se notar o alerta em relação ao impacto que o PL causará aos direitos do consumidor. A representante da Comissão Nacional de Defe-sa do Consumidor da OAB foi mais a longe e iniciou a sua crítica a Resolução nº 400 da A-NAC, que visa, no seu entender regular assuntos na relação entre empresa aérea e consumi-dor, como a taxação da bagagem. Para ela, o PL 258/2016 abraça o entendimento desta reso-lução da ANAC se sobrepondo aos direitos do consumidor previstos pelo CDC. Salienta Sra. Marié que tanto a ANAC quanto o novo CBA, devem respeitar os direitos já adquiridos e de-fendidos pela Constituição Federal.

Ao final, Marié demonstrou a sua enorme preocupação com o fato de que após i-númeras reuniões, poucas entidades de defesa do consumidor foram consultadas, gerando um Projeto confuso e pouco agregador:

Eu observei que houve 23 audiências públicas em relação a esse Projeto de Lei nº 258. Em nenhuma dessas audiências a OAB esteve presente. De acordo com o meu conhecimento, poucas entidades de defesa do consumidor também estiveram presen-tes. Hoje eu me sinto em desigualdade porque a única entidade que representa a de-fesa do consumidor, na verdade, que está aqui presente é a OAB. Então, no decorrer dessas 23 audiências – eu não tenho conhecimento de quem foram os convidados –, eu acredito que também a minoria dos convidados foi em defesa do consumidor, porque para se chegar à última audiência e o projeto de lei estar ainda nessas cir-cunstâncias, em total desagrado, em total afronta ao Código de Defesa do Consumi-dor, ao próprio Código Civil e também à Constituição, é porque a defesa do consu-midor esteve pouco presente nessas 23 audiências, o que eu lamento muito18.

<https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao;jsessionid=8552D961C62E8F2611193DF9112D8F07?0&codco l=2031&data1=2016-07-13&data2=2018-04-28>. Acesso em: 30 ago. 2018.

17BRASIL. Senado Federal. 8ª Reunião da Comissão Especial CEARO. Ocorrida em 18/10/2016. Disponível em:

<https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao;jsessionid=8552D961C62E8F2611193DF9112D8F07?0&codco l=2031&data1=2016-07-13&data2=2018-04-28>. Acesso em: 22 mai. 2018.

18BRASIL. Senado Federal. 8ª Reunião da Comissão Especial CEARO. Ocorrida em 18/10/2016. Disponível em:

<https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao;jsessionid=8552D961C62E8F2611193DF9112D8F07?0&codco l=2031&data1=2016-07-13&data2=2018-04-28>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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Apesar destes discursos e pareceres, não houve uma mudança do PL 258que per-maneceu inalterado neste quesito. Contudo, como o Projeto ainda tramita na CEARO, há a possibilidades destas pautas serem novamente trazidas ao debate, evitando que no futuro, os previsíveis conflitos venham a ocorrer.

Atualmente, a Comissão Especial encontra-se sem atividades desde o dia 14.11.2017, quando a 11ª reunião foi adiada, e não se conhece nova data para ser retomada. Com a morosidade que tramita o PL 258/2016, pode-se antever que dificilmente teremos um novo CBA antes de 2020.

3.2 FUNDAMENTOS DO LEGISLADOR NO PL 258/2016

O Projeto de Lei 258 de 2016, nasce primeiramente da necessidade em se atuali-zar o atual Código Brasileiro de Aeronáutica de 1986. Na Comissão Especial do Senado Fe-deral foram analisadas diversas outras proposições, totalizando 22 outros projetos de lei que de alguma foram modificavam o atual CBA. Estas proposições foram analisadas pela Comis-são para a sua integração ou rejeição ao Projeto principal de modificação do CBA.

O PL 258/2016 é composto por 374 artigos, 50 artigos a mais do que a Lei 7.565 de 1986, o atual CBA. Em relação aos títulos do Projeto, a inovação vem ao introduzir um título específico para a Regulação (Título III).

Um dos argumentos principais que se respalda o legislador para o Projeto, é o fato de que o vigente CBA é anterior a Constituição Federal de 1988, ao Código de Defesa do Consumidor de 1990, do Código Civil de 2002, da Lei de Licitações, da Lei de criação da Agência Nacional de Aviação Civil, entre outros importantes dispositivos legais. Desta forma, a atualização do CBA teria também como intuito, melhorar a “Regulação da Infraestrutura Aeronáutica e dos Serviços Aéreos”.

Como o presente trabalho não visa esmiuçar o PL 258, vale destacar os artigos do Projeto que poderiam induzir a confusão normativa e assim ensejar possíveis conflitos no fu-turo. Primeiramente, observe-se logo no início do Projeto, o Art.1º do Título I que trata das disposições gerais, a intenção do legislador ao afirmar que o presente PL em conjunto com os tratados internacionais constitui a legislação a ser aplicada pelo operador do direito:

Art.1º. O Direito Aeronáutico é regulado pelos tratados, convenções e atos interna-cionais firmados pela República Federativa do Brasil, por este Código e pela legisla-ção complementar.

(...)

§ 4° A legislação complementar é formada pela regulamentação prevista neste Có-digo, pelas leis especiais, regulamentos de execução e demais normas sobre matéria aeronáutica.

§ 5° As normas previstas neste Código e nos tratados firmados pela República Fede-rativa do Brasil constituem legislação especial aplicável aos serviços de transporte

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aéreo, prevalecendo sobre qualquer disposição contratual ou legal interna que as contrariem19.

Outro destaque, no Art.285, Título IX, versando sobre responsabilidade civil. O PL determina que a responsabilidade do transportador estará sujeita aos limites estabelecidos pelo Título IX, ou seja, não há qualquer remissão a outras legislações, fazendo com que, ao conciliar com os demais artigos deste Título, possamos mais uma vez interpretar que o legis-lador possui o interesse em afastar o CDC e o Código Civil de 2002:

Art. 285. A responsabilidade do transportador por danos ocorridos durante a execu-ção do contrato de transporte aéreo, está sujeita aos limites estabelecidos neste Títu-lo.

Ainda no que concerne aos direitos do consumidor, o legislador no Art.286 esta-belece a responsabilidade subjetiva, ou seja, aquela em que se faz necessário a comprovação de dolo ou culpa por meio de provas, apesar do CDC estabelecer que nas relações de consumo deve-se aplicar a responsabilidade objetiva, devido a hipossuficiência do consumidor e a complexidade de se produzir provas em alguns casos:

Art. 286. Os limites de indenização previstos neste Título não se aplicam se for pro-vado que o dano resultou de dolo ou culpa grave do transportador ou de seus prepos-tos.

§ 1° Para os efeitos deste artigo, ocorre o dolo ou culpa grave quando o transporta-dor ou seus prepostos quiseram o resultado ou assumiram o risco de produzi-lo. §2° O demandante deverá provar, no caso de dolo ou culpa grave dos prepostos, que estes atuavam no exercício de suas funções.

Não se poderia deixar de mencionar que PL 258 comete verdadeira afronta ao Código de Defesa do Consumidor nos arts. 298 e 299, ainda sob o título da responsabilidade civil:

Art. 298. O transportador é responsável pelo dano decorrente da destruição, perda ou avaria da carga, desde que comprovadamente verificado durante o transporte aéreo. Parágrafo único. O transportador não será responsável se, comprovadamente, a des-truição ou perda ou avaria da carga se deve a um dos seguintes fatos:

I - natureza da carga, defeito ou vício que lhe é próprio; II - embalagem defeituosa da carga;

III - ato de guerra ou conflito armado;

IV - ato de autoridade relativo ao transporte ou à entrada, saída ou o trânsito da car-ga.

Art. 299. A responsabilidade do transportador no transporte de carga limita-se ao va-lor estipulado no item 3 do Art. 22 da Convenção para a Unificação de Certas Re-gras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional.

§ 1° O limite de responsabilidade previsto neste artigo não será aplicado se o expe-didor fizer uma declaração especial de valor de entrega no lugar de destino, por

19BRASIL. Relatório do Projeto de Lei 258 de 2016. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleggetter/documento?dm=7149973&disposition=inline>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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sião da entrega da carga para transporte, e tenha pago uma quantia suplementar, se exigido pelo transportador.

§ 2° Na hipótese do § 1°, o transportador deve indenizar em valores não excedentes ao valor declarado, salvo se comprovar que este valor é superior ao valor real da en-trega no lugar de destino.

§ 3° Em caso de destruição, perda, avaria ou atraso de uma parte da carga ou de qualquer objeto que ela contenha, para determinar a quantia que constitui o limite de responsabilidade do transportador, somente se levará em conta o peso total do volu-me ou voluvolu-mes afetados.

Ainda sobre os artigos 298 e 299, ao determinarem como se dará a indenização do consumidor no caso de extravio ou danos a sua bagagem, não há qualquer referência ao Códi-go de Defesa do Consumidor. O legislador limita a indenização ao que está previsto em trata-dos internacionais, como fundamenta a seguir:

Destaca-se ainda o Art. 298, que estabelece limite de responsabilidade do transpor-tador por dano decorrente da destruição, perda ou avaria na devolução da bagagem despachada, ocorrido durante a execução do contrato de transporte aéreo. A finali-dade do artigo do PLS é dirimir dúvida existente hoje sobre a aplicabilifinali-dade do Có-digo de Defesa do Consumidor, que nega a limitação de responsabilidade, ou da Convenção de Montreal (sucessora da Convenção de Varsóvia) que estabelece um valor máximo de indenização por quilo de bagagem. Os autores do PLS fazem a op-ção por limitar a responsabilidade ao valor estipulado no item 2 do Art. 22 da Con-venção para Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacio-nal (Convenção de Montreal).

Ora, primeiramente cumpre salientar que a dúvida existente sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ou da Convenção de Montreal não mais perdura, tendo em vista que o Superior Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 636.331, que será abor-dado futuramente neste trabalho, já definiu em sede de repercussão geral que aplica-se os li-mites da Convenção de Montreal no que tange aos transportes internacionais e aos direitos materiais. Ou seja, quando diante de pedido de danos morais, ou em se tratando em transporte nacional, se a Suprema Corte entendesse que havia qualquer tipo de conflito, também teria se pronunciado dirimindo dúvidas. Se não o fez, entende-se claramente que deva prevalecer o Código de Defesa do Consumidor! Contudo, o legislador do PL 258, como ele próprio infor-ma, decidiu determinar que deverá o operador do direito utilizar os limites impostos pela Convenção, configurando, como já se disse, verdadeira afronta aos direitos do consumidor.

Neste sentido, parece ficar claro por parte do legislador a idéia de afastar o Códi-go de Defesa do Consumidor e seus princípios, que foram conquistados após longas batalhas jurídicas através dos anos e eis que no novo Códex parecem ter sido esquecidos. O fato de o ovo CBA tratar de um contrato específico, não obsta a possibilidade do operador do direito em utilizar em conjunto os princípios e regras do CDC.

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4 A RESOLUÇÃO DO CONFLITO DE NORMAS

O ordenamento jurídico de um Estado é formado por um complexo conjunto de leis e normas que obedecendo um critério de hierarquia compõem um sistema jurídico. Este sistema não possui somente como base a norma, a regra em sentindo amplo, mas, também é formado por princípios, pela doutrina e jurisprudência, e até pelos usos e costumes, conquanto este três últimos são de pouca aplicação ((jurisprudência) ou nenhuma (usos e costumes) no direito aeronáutico. Todos estes itens fazem parte de uma grande “cadeia de elementos” que permitirá, com certa coesão, coordenar as atividades da sociedade sobre a qual incide.

A integração destes elementos, somam-se, no plano internacional, as relações do Estado perante outros Estados que frequentemente estabelecem acordos, ou outros mecanis-mos legais os quais dependendo da matéria, possuem força capaz de modificar seus ordena-mentos jurídicos. Há, portanto, uma constante dinâmica nesta grande estrutura legal que vi-sando, entre outras coisas, manter a lógica e clareza dos aparatos jurídicos seja no plano inter-no seja inter-no exterinter-no.

Este dinamismo na produção de normas e integração das outras externas, traz ao ordenamento uma pluralidade de leis que muitas das vezes podem, ocasionar a sobreposição delas em determinadas matérias, gerando ao operador do direito dúvidas sobre qual legislação aplicar ao seu caso concreto. Pode parecer simples, mas a decisão sobre qual lei utilizar, passa por diversos critérios que em algumas vezes não se pode apontar com tanta clareza, impondo-se investigações mais aprofundadas e complexas.

Ao se deparar com um conflito entre normas, deve o aplicador do direito primei-ramente se debruçar sobre os 3 critérios clássicos de resolução de conflitos que são:

a) Critério temporal; b) critério especial; c) critério hierárquico.

Estas três possibilidades, defluem do Decreto-Lei nº 4.657 de 1942 (Lei de Intro-dução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB) em seu Art.2º e parágrafos:

Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a mo-difique ou revogue.

§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existen-tes, não revoga nem modifica a lei anterior.

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§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revo-gadora perdido a vigência20.

Diante do dispositivo em análise, o conflito de leis no ordenamento brasileiro po-de ser resolvido por uma revogação total ou parcial, que popo-derá, no que interessa a este traba-lho, ser expressa quando o texto da nova lei assim o afirmar, ou quando a nova lei regular totalmente a matéria em questão, como é o caso do PL 258que assim revogará por completo o atual CBA. A revogação também poderá ser tácita, em que se exigirá do interprete uma análi-se mais detalhada, como quer o legislador em relação ao Projeto de Lei e o Código de Defesa do Consumidor.

Como visto anteriormente, ao se deparar com uma antinomia, ou seja,quando um dispositivo legal acarretar na renúncia de um direito assegurado por outra norma, deverá o interprete fazer uso dos métodos clássicos de resolução de conflitos, vistos no artigo supraci-tado.

O critério cronológico, que se define na própria nomenclatura, entende que uma lei posterior deve prevalecer sobre a anterior por representar um pensamento mais atualizado do legislador em face do ordenamento jurídico.

O segundo critério, é o de hierarquia das leis. Segundo este, uma lei hierarquica-mente superior prevalecerá sobre a inferior. Isto se deve ao comprometimento do legislador em manter a coesão e a lógica hierárquica do ordenamento jurídico, pois se assim não o fosse, teríamos casos de leis ordinárias posteriores se sobrepondo a ditames da Constituição Federal por exemplo.

O terceiro e último critério, cuja aplicação, por vezes, é bastante complexa, é o da especialidade, segundo o qual leis que regulam assuntos específicos ou grupos determinados, possuirá mais força do que a lei geral. Este método demonstra-se mais subjetivo do que obje-tivo, como por exemplo ocorre com o próprio CDC nas palavras de Claudia Lima Marques:

Observe-se, por exemplo, que o CDC é lei especial na sua face subjetiva, pois só impõe regras para relações contratuais e extracontratuais envolvendo pessoas, que define como consumidores e fornecedores. De outro lado, é lei geral em grande par-te de sua face mapar-terial, pois trata de várias relações jurídicas envolvendo consumi-dores e fornececonsumi-dores, não tratando exaustivamente ou especificamente de nenhuma espécie de contrato em especial, mas impondo novos patamares gerais de equilíbrio e de boa-fé a todas as relações de consumo. (MARQUES, 2011, p. 640).

Contudo, mesmo que o próprio ordenamento jurídico brasileiro estabeleça os meios para a resolução, poderá o aplicador do direito se confrontar com situações em que

20BRASIL. Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657.htm>. Acesso em: 22 mai. 2018.

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tes critérios clássicos não serão o bastante para a resolução do conflito, e neste momento, de-verá o aplicador se salvaguardar em outros institutos como afirma Marques (2011, p.613):

Assim, o aplicador da lei deve examinar o conflito com olhos plurais, adaptando sua própria formação e seus preconceitos às necessidades desta sociedade de consumo e de informação, de rapidez fantástica e de produção legislativa cada vez mais impres-sionante e plural (tratados, leis gerais, leis especiais, leis praticamente materiais, leis complementares, leis com números e sem números, medidas provisórias mensais, decretos, portarias, circulares etc.). O aplicador deve também visar o diálogo das fontes, de forma a dar efeito útil a um grande número de normas, privilegiando as normas narrativas, os valores constitucionais e, sobretudo, os direitos humanos, pois, como lembra Erik Jayme, o Leitmotiv, o fio condutor, do direito na pós-modernidade, do direito do século XXI, serão os direitos humanos. (MARQUES, 2011,p. 613).

Sendo assim, ao se deparar com uma antinomia complexa, em que os critérios clássicos não poderão de forma simples direcionar a uma solução, deverá o operador do direi-to buscá-la no próprio sistema jurídico. Com isdirei-to, se está a dizer que não deverá o aplicador do direito buscar aplicar tão somente uma das leis, dando a outra a mais severa das “puni-ções” que é a retirada de sua eficácia. Ao contrário, com um olhar para os princípios e funda-mentos da Constituição Federal, deverá este buscar a coexistência entre as duas normas, de modo a retirar de ambas suas melhores ordens.

Neste diapasão, ensina a Profª Claudia Lima Marques (2011, p.627) apoiando-se na tese do Diálogo das fontes de Erik Jayme:

O aplicador da lei, portanto, ante o aparecimento de uma contradição entre normas do CDC e leis anteriores, leis gerais ou especiais, ou leis posteriores, gerais ou espe-ciais, verificará inicialmente se é possível compatibilizar as duas normas pretensa-mente em contradição. Se uma interpretação compatibilizadora, integrativa, que permita a aplicação das duas normas ao mesmo tempo, é possível, será esta a esco-lhida e desaparecerá a antinomia meramente aparente. (MARQUES, 2011,p. 627).

Em resumo, o aplicador do direito não deve se pautar única e exclusivamente pe-los critérios clássicos de resolução de antinomias, mais do que isso, deve utilizar da tese do diálogo das fontes, já utilizado por nossa jurisprudência21, para com base na Constituição Fe-deral e seus princípios e valores, poder buscar uma coexistência entre os ditames de cada norma, fazendo com que estas continuem com eficácia no ordenamento jurídico, sem uma necessidade de revogação expressa.

4.1 A RESOLUÇÃO DO CONFLITO DE NORMAS ENTRE O ATUAL CÓDIGO BRASI-LEIRO DE AERONÁUTICA E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

21Como exemplos: STF, ADI-DF 2.591. Min. Rel. Eros Grau. Plenário. DJ em 29.09.2006; STJ Resp 1.037.759/RJ. Min. Rel. Nancy Andrighi. DJ em 23.10.2010.

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O conflito de normas, no que tange ao Código Brasileiro de Aeronáutica e o Có-digo de Defesa do Consumidor iniciou-se com a promulgação deste último, em 1990, portan-to, o CDC é posterior ao CBA. Até a entrada em vigor do CDC, nossos magistrados e tribu-nais fundamentavam suas decisões no CBA, em conjunto, ou não, com as Convenções Inter-nacionais envolvendo direito dos passageiros, internalizadas pelo direito brasileiro.

Contudo, com a promulgação do CDC, em 1990, começaram a despontar os con-flitos com o CBA, em especial no que referia a questão da responsabilidade civil do transpor-tador. O CBA já trazia desde de 1986 a previsão de direitos e deveres do transportador, mas e com o advento do Códex Consumerista estes direitos e deveres foram “modificados”, sempre que estivéssemos estamos diante de uma relação de consumo nos termos estatuídos por aquele diploma legal.

Neste sentido, deve-se inicialmente esclarecer que não há antinomia entre o CBA e o CDC sobre a responsabilidade do transportador quando não estivermos diante de uma típi-ca relação de consumo. Isto porque, somente estaremos diante de uma relação de consumo quando verificar-se que em um contrato de transporte aéreo estiverem presentes nos pólos opostos as figuras de um fornecedor e de um consumidor,nos termos determinados pela Lei 8.078/1990 (CDC) em seu seus arts. 2º e 3º:

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que in-determináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante re-muneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista22.

Desta forma, estando diante de uma relação que não se encaixe na descrição dos artigos acima, não há que se falar em conflito. Aplicar-se-á o CBA em conjunto com o Códi-go Civil e o CódiCódi-go Comercial para regular o contrato.

Ultrapassado este ponto, a análise pelo operador do direito deve sempre possuir como base os ditames principiológicos e valorativos trazidos pela Constituição Federal de 1988. Com é sabido, o CBA, norma de 1986, não foi debatida pelo legislador sob a atual ótica constitucional, como o foi o CDC, de 1990, permitindo inferir que este reflete melhor as

22BRASIL. Lei 8.078 de 11 de setembro de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8078.htm>. Acesso em: 31 ago. 2018.

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