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Curso: Direito Tributário
Aula: Aspectos Gerais, Impostos Reais e Pessoais, Progressividade
Professor: Mauro LopesResumo
Introdução
Nesta aula será iniciado os estudos acerca da capacidade contributiva, sobre a qual já se falou brevemente em aulas anteriores, todavia, a partir desta aula será feita uma sistematização do conteúdo. De início, destaque-se que é um princípio limitador da atividade tributária e, ao longo das aulas, será visto o porquê, bem como a posição jurisprudencial acerca da temática e de sua aplicação de modo geral.
Capacidade contributiva: previsão constitucional
A constituição brasileira dispõe acerca do princípio da capacidade contributiva no artigo 145, §1º: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]
§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Referido dispositivo faz menção expressa e direta à figura dos impostos em relação à capacidade contributiva. É dizer, o constituinte foi explícito no sentido de aplicar o princípio da capacidade contributiva apenas em relação aos impostos (considerando-se que existem outras espécies tributárias), todavia, o Supremo Tribunal Federal estendeu essa aplicação a outras figuras tributárias.
Além disso, outro aspecto que salta aos olhos nesse dispositivo constitucional se refere à parte que diz “sempre que possível”. A primeira interpretação desse dispositivo denota que nem sempre seria possível a aplicação do princípio da capacidade contributiva aos impostos. Entretanto, uma outra análise revela que a expressão “sempre que possível” diz respeito apenas à parte “caráter pessoal”, de modo que a capacidade contributiva do constituinte deve ser sempre observada.
Capacidade contributiva e os impostos reais e pessoais
Embora haja a distinção entre impostos reais e pessoais, como visto em aulas anteriores, e que nos impostos reais considere-se apenas o bem tributado, sem levar em conta aspectos pessoais do indivíduo, há ainda assim respeito à capacidade contributiva do obrigado, a qual é expressa objetivamente no valor do bem tributado. Exemplo claro disso é o IPVA, o qual, para fixação do valor a ser recolhido, é considerado apenas
2 características do veículo e não de seu proprietário. Todavia, o fato de o contribuinte possuir um veículo automotor de certas características denota que ele possui capacidade contributiva.
Sendo assim, considera-se que a capacidade contributiva é princípio que sempre deve ser observado, mas que em certos tributos é considerado de forma objetiva (impostos reais) e em outros, de forma subjetiva (impostos pessoais, como é o caso do Imposto de Renda de Pessoa Física).
Subprincípio da personalização do imposto
É possível extrair também do art. 145, §1º o princípio da personalização do imposto, expresso por meio da expressão “Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal”, o qual possui caráter programático, isto é, referido princípio exorta o legislador a estabelecer os impostos de modo a levar em consideração as características pessoais do contribuinte, tendo em vista que neste caso a capacidade contributiva seja observado em caráter subjetivo, a fim de garantir maior equidade e justiça na cobrança dos tributos.
Verifica-se, portanto, que tais princípios são corolários do princípio da isonomia, uma vez que busca tratar igualitariamente aqueles que se encontram em uma situação igual e de maneira desigual aqueles que se apresentam em situações diversas, considerando-se como discrímen a capacidade contributiva do sujeito passivo da obrigação tributária.
Há alguns autores que consideram que o fato de o art. 145, §1º da constituição afirmar que os impostos serão graduados conforme a capacidade contributiva, significa que as alíquotas devem ser, necessariamente, progressivas, ou seja, o princípio da capacidade contributiva imporia a progressividade das alíquotas dos impostos.
Todavia, o Supremo Tribunal Federal sempre entendeu que tal progressividade deveria vir de forma expressa no texto constitucional, não com base na interpretação do texto. Esse é o fundamento, a compreensão de que a progressividade da alíquota dos impostos deve vir expressa no texto constitucional e de que tal autorização não se encontra no art. 145, §1º, da edição da Súmula 656:
Súmula 656, STF. É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis - ITBI com base no valor venal do imóvel.
Entretanto, no julgamento do RE 562045, após a mudança da composição da corte, determinou que o ITD (“irmão” do ITBI) podia ser progressivo, pois a capacidade contributiva valida a progressividade de alíquotas.
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Curso: Direito Tributário
Aula: Seletividade
Professor: Mauro LopesResumo
Introdução
Como visto na aula passada, o princípio da capacidade contributiva não impõe a progressividade de alíquota, todavia, seguindo o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, admite-a. A matéria ainda se apresenta pouco controversa, em razão da súmula 656 que expressa o entendimento anterior da Corte e que ainda não foi expressamente cancelada.
Nesta aula será estudado a seletividade de alíquotas e sua relação com o princípio da capacidade contributiva.
Seletividade de alíquotas: previsão constitucional
A seletividade de alíquotas está presente nos seguintes dispositivos constitucionais: art. 153, §3º, I e art. 155, §2º, III
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: [...]
§ 3º O imposto previsto no inciso IV:
I - será seletivo, em função da essencialidade do produto;
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...]
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...]
III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;
Conforme se extrai desses dispositivos, a seletividade será obrigatória para a União, no tocante ao IPI, mas facultativa para os estados, no que diz respeito ao ICMS.
4 Sabe-se que o IPI e o ICMS incidem sobre mercadorias e serviços que são essenciais e supérfluos. Assim, o IPI incidirá e o ICMS poderá incidir sobre itens supérfluos (ou seja, pouco ou nada essenciais) de forma áspera, enquanto que a incidência sobre itens muito essenciais seria leve. Logo, as alíquotas variariam na proporção inversa à essencialidade da mercadoria tributada. Assim, caso a mercadoria seja, além de supérflua, prejudicial à saúde (como é o caso do cigarro), a alíquota será muito alta, a chamada alíquota proibitiva. Isso ocorre porque referidos tributos são considerados como impostos indiretos, ou seja, o valor da tributação é repassado para o consumidor, de modo que, em última análise, quem suporta o ônus da tributação é o consumidor final, o chamado contribuinte de fato.
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Curso: Direito Tributário
Aula: Aplicação a Outras Figuras Tributárias Além do Imposto
Professor: Mauro LopesResumo
Introdução
Prosseguindo com os estudos acerca da capacidade contributiva, será estudado nessa aula a sua aplicação a outras figuras tributárias, pois como visto, embora o texto constitucional (art. 145, §1º) se refira expressamente apenas aos impostos, a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal estendeu sua aplicação a outros tributos.
Espécies tributárias e o princípio da capacidade contributiva
Como visto, o art. 145, §1º da CF faz menção expressa apenas aos impostos:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]
§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Que a capacidade contributiva deve ser observada na cobrança dos impostos não é nenhuma surpresa. Isso porque o imposto é um tributo não vinculado, ou seja, um tributo que não é devido em função de alguma atividade estatal específica em relação ao obrigado. O fato gerador do imposto, portanto, é um fato do próprio indivíduo, desvinculado de qualquer ação estatal. Sendo assim, referido fato não pode ser arbitrário, isto é, não pode ser despido de qualquer significado econômico, tanto que o fato gerador de imposto precisa ser um “fato-signo presuntivo de riqueza”, conforme o ensinamento de Alfredo Augusto Becker.
Portanto, o princípio da capacidade contributiva é mais relevante em relação à figura do imposto, uma vez que seu fato gerador é atrelado diretamente à riqueza do contribuinte, isto é, à sua capacidade econômico-financeira.
Tem-se como espécies tributárias: - Imposto;
- taxas;
- contribuição de melhoria; - contribuições especiais;
6 - empréstimo compulsório.
a) Impostos: como já visto, a figura dos impostos está diretamente relacionada ao princípio da capacidade contributiva.
b) Taxas: a taxa está relacionada a uma contraprestação do contribuinte a alguma tarefa específica e divisível praticada pelo Estado. Embora as taxas sejam determinadas, basicamente, pelo valor daquela atividade estatal, a capacidade contributiva é utilizada, ainda que de forma secundária. Por exemplo, presume-se que uma pessoa que possua um imóvel maior, tenha mais capacidade contributiva e produza mais lixo, de modo que o tamanho do imóvel será utilizado para determinar o valor a ser pago a título de taxa de lixo. Outro exemplo diz respeito às regras imunizantes decorrentes da incapacidade contributiva, como a taxa para emitir certidão de nascimento.
c) Contribuição de Melhoria: a própria hipótese de incidência desse tributo já traz em seu bojo a ideia de capacidade contributiva, uma vez que tal tributo é devido em razão de valorização imobiliária decorrente de obra pública;
d) Contribuições especiais: são variadas, porém necessitam observar a capacidade contributiva, sobretudo aquelas que não são vinculadas a uma atividade estatal específica vinculada ao contribuinte;
e) Empréstimo compulsório: é o tributo sem fato gerador próprio. Todavia, o fato gerador utilizado para esse tributo é/deve ser um fato-signo presuntivo de riqueza.
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Curso: Direito Tributário
Aula: Capacidade Contributiva e Sigilo Bancário
Professor: Mauro LopesResumo
Introdução
Prosseguindo com os estudos acerca da capacidade contributiva, será estudado nessa aula a parte final do artigo 145, §1º da Constituição.
Administração tributária e a capacidade contributiva
Conforme se extrai da parte final do §1º do art. 145 da Constituição, é permitido à Administração Pública identificar o patrimônio e atividades econômicas do contribuinte:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...]
§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Nesse sentido, com o advento da Lei Complementar nº 105, em observância a parte final do dispositivo supra mencionado, e, em seu artigo 6º determinou a possibilidade de quebra de sigilo bancário por parte da administração tributária a fim de identificar os rendimentos e atividades econômicas do contribuinte.
Diante dessa nova lei, a matéria foi questionada perante o Supremo Tribunal Federal, por meio do Recurso Extraordinário nº 389808, de 2010. No julgamento desse RE, o STF entendeu que referida norma que permitia à administração tributária quebrar o sigilo bancário do contribuinte era inconstitucional, pois violava a intimidade do contribuinte, com fulcro no art. 5º, X e XII da Constituição
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
8 XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
Diante desses dispositivos, o Supremo Tribunal Federal consagrou o direito ao sigilo bancário, com base principalmente na inviolabilidade da intimidade do indivíduo.
Entretanto, no julgamento do RE 601.314, julgado em 2016 sob o regime de repercussão geral, determinou que o art. 6º da Lei Complementar 105/2001 não é inconstitucional, pois não há quebra do sigilo bancário, uma vez que o objetivo da referida norma é realizar o princípio da capacidade contributiva, que representa a isonomia material entre os contribuintes, vez que não seria justo e equânime o fisco não cobrar devidamente de um contribuinte em razão de este ocultar seu patrimônio. Ademais, não há quebra do sigilo, pois as informações sigilosas mantidas com o banco permanecem sigilosas com a administração tributária, vez que ela é obrigada a manter esse sigilo sobre as informações a que tem acesso relacionadas a pessoa do contribuinte.