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II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores

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II Congresso Nacional de Formação de Professores

XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores

POEMA EM LINHA RETA: VIDEOINSTALAÇÃO. PROJETO DE TRABALHO E INTERDISCIPLINARIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES.

Maria Inês Ruas Vernalha

Eixo 1 - Formação inicial de professores para a educação básica - Relato de Experiência - Apresentação Oral

Este relato de experiência apresenta o desenvolvimento de um Projeto Interdisciplinar realizado com alunos de Artes Visuais, da FAAT-Faculdades, em Atibaia. Na graduação busca-se trabalhar com propostas que abordem a interdisciplinaridade para auxiliar os professores em formação a organizarem percursos de ensino e aprendizagem que criem conexões entre temas, conteúdos e meios de produção da arte contemporânea. A interdisciplinaridade favoreceu o desenvolvimento de estudos sobre a arte contemporânea e a obra “Poema em Linha Reta”, de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa. Conteúdos sobre a vida e obra do poeta Fernando Pessoa integram o currículo de Língua Portuguesa, abordando teoria literária e literatura, no Ensino Médio. Desta forma, lançar mão de um projeto que trabalhe com Fernando Pessoa na educação foi totalmente pertinente. Os alunos apresentaram o “Poema em Linha Reta” no Centro de Convenções Victor Brecheret, em Atibaia, como parte integrante de uma videoinstalação. Ao se trabalhar com imagens, sons, desenhos e conceitos, foram requisitadas relações que envolveram dimensões emocionais e intelectuais, fato que contribuiu para intensificar o envolvimento dos alunos.

Trabalho Completo

Ficha Catalográfica

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POEMA EM LINHA RETA: VÍDEO INSTALAÇÃO

PROJETO DE TRABALHO E INTERDISCIPLINARIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Maria Inês Ruas Vernalha. Universidade Estadual de Campinas e Faculdades - FAAT, Atibaia, São Paulo.

Introdução

Este Relato de Experiência é o resultado de um projeto interdisciplinar, que incorporou as artes visuais e a poesia, desenvolvido com os professores em formação, do curso de licenciatura em Artes Visuais da FAAT – Faculdades, de Atibaia. A ideia principal foi trabalhar com a interdisciplinaridade, um enfoque relevante presente atualmente no ensino da arte no Brasil, por meio da realização de um projeto que abordou a arte contemporânea e buscou promover um diálogo entre as artes visuais e a poesia, neste caso, o Poema em Linha Reta, de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.

O arte educador em formação vai atuar como um mediador responsável por proporcionar a apreensão de conhecimentos por parte dos seus alunos, sobre as manifestações artísticas nas modalidades: música, teatro, dança e artes visuais. No processo de ensino e aprendizagem, o professor deverá possibilitar que aconteça a articulação de conteúdos de arte com os conteúdos trazidos pelos educandos, criando, desta forma, conexões que auxiliam na construção do conhecimento.

Ana Mae Barbosa ressalta que a arte deve não somente ser uma disciplina que compõe o currículo no Ensino Básico, como também estar presente de alguma forma em todas as outras disciplinas para enriquecer os conteúdos estudados e as atividades que os alunos fazem. Citando a obra “Educação através da Arte”, de Herbert Read, Barbosa explica que a arte deve ser como uma disciplina transversal que interpenetra as outras disciplinas e facilita o processo de aprendizagem “(...) pela qualidade cognitiva dos gestos, do som, do movimento e da imagem” (2008, p.3).

O objetivo deste estudo foi o de instigar os professores em formação a realizarem pesquisas em torno do conceito de interdisciplinaridade e a desenvolverem um projeto, teórico e prático, que abordasse algumas interconexões entre duas disciplinas: arte e língua portuguesa.

Percebe-se que pouca atenção é dada pelos professores ao que significa “singular”, componente “particular a cada ser humano” (RITCHER, 2003, p.40). Nessa linha de pensamento, na obra Interculturalidade e estética do cotidiano no ensino das

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expressar de um modo individual, afirmando que “é por meio desse componente que se podem compreender os estilos individuais.” (2003, p.40). Ana Mae Barbosa (2003) relata que, nas escolas, as culturas locais mais desfavorecidas economicamente são ignoradas, até mesmo pelas pessoas que estão inseridas no processo educacional.

As décadas de luta para que os oprimidos possam se libertar da ignorância sobre eles próprios nos ensinaram que uma educação libertária terá sucesso só quando os participantes no processo educacional forem capazes de identificar seu ego cultural e se orgulharem dele. (BARBOSA, 2003, p.20).

É preciso, pois, que os arte educadores invistam em um ensino pautado na interculturalidade, na interdisciplinaridade e nas possíveis conexões entre a Arte e os “(...) meios como modos de produção e significação desafiadores de limites, fronteiras e territórios que reclamam uma visão rearticuladora do mundo e de nós mesmos” (BARBOSA, 2008, p.2).

Percebe-se que os professores em formação sentem dificuldade em organizar propostas que abordem a interdisciplinaridade, o que dificulta criar interconexões de códigos culturais e entre temas, conteúdos e meios de produção da arte contemporânea.

Segundo Ana Mae Barbosa,

(...) a Arte Contemporânea trata de interdisciplinarizar, isto é pessoas com suas competências específicas interagem com outras pessoas de diferentes competências e criam, transcendendo cada um seus próprios limites ou simplesmente estabelecem diálogos. São exemplos o Happyning, a Performance, a Body Art, a Arte Ambiental, a Vídeo Art, a Arte Computacional, as Instalações, a Arte na WEB, etc. (BARBOSA, 2008, p.1).

Pensando em uma formação docente em que o aluno consiga tomar decisões na prática pedagógica e na construção de sua poética pessoal, supõe-se que o professor de arte deva, também, produzir arte. Vivenciar o fazer artístico pode contribuir para a atuação na educação no sentido de criar soluções, investigar hipóteses e saber desenvolver conteúdos que utilizem as diferentes linguagens artísticas.

O projeto desenvolvido com os alunos de Artes Visuais, com enfoque interdisciplinar, que abordou a obra de Álvaro de Campos, “Poema em Linha Reta”, teve seu desafio ampliado devido à apresentação final em forma de videoinstalação.

A formação docente é um processo em construção. Exercitar o trabalho de planejamento e ação em equipe atentando para as necessidades apresentadas pelos alunos é imprescindível. Fernando Hernandez (2005, p.32) ressalta que o importante não é somente ensinar, aos futuros professores, métodos prontos para usarem na prática pedagógica, mas sim estimulá-los a vivenciarem “essas estratégias mediante a criação de situações de vivência, convivência e colaboração (...)”.

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1. Projetos e Interdisciplinaridade na formação de professores

A participação no desenvolvimento de um projeto em arte, com conteúdos que usarão na prática docente, auxilia os alunos a aprender a aprender. Vivenciando situações de aprendizagem férteis, os professores em formação exercitam a reflexão e partem para a pesquisa. Por meio de projetos interdisciplinares, os alunos podem trabalhar com a arte, a história, o meio ambiente, a tecnologia, a linguagem verbal ou a ciência. Atuam como mediadores na ação docente, porque o trabalho com projetos requisita a participação constante do professor e dos alunos.

Quando se trabalha com projetos, a mediação é praticada como um sistema de inter-relações fecundas que se relacionam entre si, participando do processo: o objeto do conhecimento, o aluno, o professor/mediador, a cultura, a história, o artista, “a instituição cultural, a escola, a manifestação artística, os modos de especificação, a materialidade e suporte de cada linguagem artística...” (MARTINS In BARBOSA, 2003, p.56). Os projetos podem ser adotados como uma maneira de planejar, uma ferramenta para promover uma mediação articulada e que considere a história pessoal e coletiva dos alunos.

Os trabalhos com projetos geralmente abordam propostas interdisciplinares que requisitam a participação de todos os alunos. Nesse tipo de planejamento, ocorre uma motivação inicial que desencadeia na realização de uma série de etapas evolutivas e não raro envolve a ideia de transdisciplinaridade. Segundo Duarte Jr., a transdisciplinaridade designa “novas formas do conhecimento humano, a serem construídas com a superação de antigos parâmetros metodológicos e daqueles limites rigidamente demarcados entre disciplinas isoladas” (2004, p.31).

Para a compreensão do conceito de “interdisciplinaridade”, Richter (in BARBOSA, 2003) argumenta que o prefixo “inter” do termo “interdisciplinaridade” significa a inter-relação entre duas ou mais disciplinas sem que uma delas seja mais relevante do que as outras. Nos trabalhos interdisciplinares, as fronteiras entre as áreas do conhecimento precisam ser anuladas e a relação de reciprocidade e colaboração deve prevalecer.

No caso da transdisciplinaridade, ocorre um envolvimento de várias disciplinas que buscam objetivos múltiplos, mas buscam alcançar uma finalidade comum, como por exemplo, o caso citado por Isac Nikos Iribarry (2002): em um posto de saúde, diversos profissionais, como psicólogos, psiquiatras, fonoaudiólogos, neurologistas atendem pacientes com necessidades especiais e fazem diagnósticos para esses pacientes. Caso se pretenda adotar uma situação de transdisciplinaridade, os diagnósticos não serão feitos separadamente. Cada profissional precisará situar-se na sua área de origem e nas diversas áreas dos outros profissionais. Um exemplo claro que ajuda na compreensão de como se pode trabalhar com transdisciplinaridade na escola.

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Os temas transversais incorporam e articulam conhecimentos de várias disciplinas e possibilitam o desenvolvimento de uma visão significativa acerca da vida. “A transdisciplinaridade significa transgredir a lógica da não-contradição, articulando os contrários: sujeito e objeto, subjetividade e objetividade, matéria e consciência, simplicidade e complexidade, unidade e diversidade (...)” (SANTOS, 2008, p.75). Na articulação desses pares binários, a apreensão da realidade amplia-se e toma um significado diferente. Segundo Santos, quando são articulados os conhecimentos das diversas disciplinas, “(...) os temas transversais, tendo em vista um tema social,” [ultrapassam] “as fronteiras epistemológicas de cada disciplina, possibilitando uma visão mais significativa do conhecimento e da vida” (2008, p.75).

Desta forma, é preciso que se perceba que a multidimensionalidade refere-se aos diferentes níveis de apreensão da realidade induzida pelas articulações que a pessoa consiga fazer em torno de diversas referências. Uma educação que recorra à transdisciplinaridade se afasta da ideia de educação fragmentada. Nas palavras de Santos (2008, p.76), “(...) a pesquisa transdisciplinar pressupõe a pesquisa disciplinar, no entanto, deve ser enfocada a partir da articulação de referências diversas. Desse modo, os conhecimentos disciplinares e transdisciplinares não se antagonizam, mas se complementam”.

O aluno que se forma em um curso de licenciatura em Artes deve conhecer os “conceitos fundamentais da Arte até os meandros da linguagem artística” que pretende trabalhar (MARTINS In BARBOSA, 2003, p.52). Ele precisa saber como a arte é produzida, conhecer seus elementos e códigos e como tem sido culturalmente presente nas civilizações. Ter um olhar atento para as questões relacionadas ao multiculturalismo para valorizar a diversidade cultural.

Encontra-se uma afirmação no Relatório Jacques Delors (2007), Educação – Um

tesouro a descobrir, publicado para a UNESCO, da Comissão Internacional sobre a

Educação para o Século XXI, acerca do quanto é importante se valorizar a diversidade e a especificidade das pessoas, o que não acontece no sistema de ensino padronizado. Nos espaços escolares, não raro alguns alunos sentem-se excluídos por não pertencerem ao grupo dominante. O professor de arte pode levar para a sala de aula assuntos que abordem a riqueza das expressões culturais e ensinar seus alunos a exercitarem a prática da tolerância, a considerarem que as pessoas têm pontos de vista diferentes.

Fernando Hernandez (2000, p.120) explica que os dois percursos mais importantes para se estudar como ocorre a apreensão dos indivíduos sobre as obras de arte se aplicam às questões relacionadas à “apreciação estético-artística” e à “avaliação da compreensão”. O autor afirma que “(...) o nível de compreensão de um indivíduo sobre

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artes é o lento resultado de sua interação com o domínio artístico e o desenvolvimento cognitivo social” (p.120).

Um aspecto importante que foi estudado é o fato de a disciplina de arte nas escolas, não raro, incorporar a ideia de arte como um fazer técnico, atividade que não permite ao aluno explorar suas potencialidades de expressão. Agindo desta forma, comenta Mirian Celeste Martins:

Corre-se o risco de acontecer algo parecido ao que ocorreu com a linguagem verbal. Aprende-se as regras gramaticais, mas tem-se dificuldade em escrever um texto que exponha o que é pensado. Aprende-se a diferença entre a descrição, a narração e a dissertação, mas não sabe-se interpretar a realidade. Aprende-se sobre o parnasianismo, a poesia dodecassílaba, Machado de Assis, mas não incorpora-se à vida o deleite de apreciá-la de fato. (MARTINS In BARBOSA, 2003, p.54-55).

No ensino das artes, Lucimar Bello Frange propõe “(...) abrir espaços para a história e o projeto pessoal do aluno, unindo saberes e experiências, (...) saberes com sabores significativos, quer deliciosos, quer “terríveis”, mas transformados em delícias”. (FRANGE In BARBOSA, 2003, p.36). Isso não significa que não se deve recorrer ao ensino das técnicas, que é parte relevante no processo de criação. Por meio da experimentação das técnicas, o aluno pode produzir algo, desfazer, tentar novamente, reconstruir e chegar a novas sínteses.

Fernando Hernandez (2005, p.27), ao referir-se à formação de docentes, salienta que aspectos relacionados à subjetividade devem ser incorporados nesse percurso. Deve-se pensar em um tipo de formação que seja flexível e que, neste sentido,

(...) desencadeie processos formadores nos futuros docentes que vão de dentro para fora, para dizê-lo de alguma maneira. Processos que tenham que ver com o desenvolvimento de conhecimentos e a construção de competências vinculadas à realidade da educação nos seus diferentes níveis, integrando as experiências dos estudantes com suas leituras e suas construções como sujeitos (HERNANDEZ, 2005, p.27).

O professor precisa compreender os meios de produção da arte e suas possíveis conexões com outras áreas do conhecimento. O uso das novas tecnologias, a necessidade de se trabalhar com as múltiplas culturas, um ensino e aprendizagem em arte que se propõe a adotar o exercício da inter-relação entre os códigos culturais de diferentes grupos são metas que apontam para uma educação com ideias pautadas no multiculturalismo e na interdisciplinaridade.

2. Relato de experiência - “Poema em Linha Reta” / Videoinstalação Uma proposta de Interdisciplinaridade no ensino da arte

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O projeto de videoinstalação, realizado com os alunos do curso de Artes Visuais da FAAT, traz uma possibilidade de se trabalhar com arte contemporânea no Ensino Fundamental ou Médio em um contexto de sala de aula. A interdisciplinaridade favoreceu o desenvolvimento de estudos sobre a arte contemporânea e a poesia de Álvaro de Campos, “Poema em Linha Reta”.

O professor em formação precisa produzir arte e ser motivado no sentido de tomar decisões sem se distanciar da sua poética pessoal. Essa vivência deverá servir de estudo para o aluno aprender sobre modos de representação inseridos nos contextos históricos, culturais, sociais e antropológicos. “A proximidade com os objetos artísticos de diferentes épocas e procedências e a familiaridade com os procedimentos que os constituem, facilitam o encadeamento dos vários níveis de leitura e apropriação” (COUTINHO In BARBOSA, 2003, p.156), condição imprescindível para se compreender a arte contemporânea.

Para o desenvolvimento deste projeto, recorreu-se à interdisciplinaridade pela necessidade de se utilizar estratégias de ensino que envolvam os alunos, não apenas como ouvintes, mas como construtores ativos do processo.

A interdisciplinaridade supõe um eixo integrador, que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Nesse sentido, ela deve partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários (BRASIL, 2002, p. 88-89).

A importância de se trabalhar com videoinstalação no processo de ensino e aprendizagem em arte foi a de apresentar aos alunos uma modalidade artística que não utiliza suportes usuais (por exemplo, as telas). O visitante não apreende a obra somente através do olho. Também seu corpo mantém contato com a obra no momento em que ele entra no espaço da instalação. O trabalho apresentado para o púbico não é uma obra acabada. O espectador interage no ambiente da videoinstalação tornando-se um participador, um coautor da obra. O interior dessa modalidade de arte é um espaço poético que propicia o sentir através do corpo, por meio da visão, do tato, do olfato, um terreno sensorial que favorece o aprimoramento da percepção.

A arte contemporânea prioriza a experiência que o participador tem diante (ou dentro) da obra. O professor pode utilizar, na sala de aula, linguagens híbridas que mesclem conteúdos teóricos com imagens móveis, como as apresentadas em vídeo. Nesse contexto, não somente o olho será o único instrumento de apreensão da obra, como também o corpo do visitante. Nesse tipo de ambiente, o visitante se relaciona com a obra de um modo ativo. “No ambiente gerado pela videoinstalação, a imersão é um princípio estético. Tal princípio disponibiliza uma área em que todos os sentidos do corpo

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são inseridos e dá ao visitante a oportunidade de explorar o espaço perceptivo” (MELLO, 2007, p.1). A autora explica que, no interior de uma videoinstalação, o tempo é percebido de uma forma diferente do cotidiano.

No cinema clássico, o visitante interage com o filme em salas preparadas para isso, já na videoinstalação, as imagens instigam o participador a fazer uma espécie de imersão na obra. Nesse tipo de arte, o participador é parte da obra. Ele pode ir e vir no interior da obra, “(...) deslocar o seu corpo no espaço e ficar o tempo que julgar suficiente para que os seus estímulos sensórios mantenham diálogo com o trabalho” (MELLO, 2007, p.1).

Na arte contemporânea, os artistas produzem obras inovadoras que mostram formas variadas de expressão. São trabalhos que podem apresentar, na mesma obra, desenho, fotografia, pintura, escultura ou vídeo. As linguagens artísticas contemporâneas ampliaram o papel do espectador nas artes que, por sua vez, vivencia experiências que interferem na sua percepção.

O professor de arte precisa conhecer as diversas modalidades da arte na contemporaneidade. O trabalho de educação escolar em arte não se limita em “(...) dizer que os alunos precisam dominar os conhecimentos, é necessário dizer como fazê-lo, isto é, investigar objetivos e métodos seguros e eficazes para a assimilação dos conhecimentos” (LIBÂNEO, 1991, p.54).

Diante dessa reflexão, foi desenvolvido um projeto interdisciplinar com os alunos de Artes Visuais, professores em formação, que favoreceu a construção do conhecimento integrando os conteúdos de literatura portuguesa e arte.

Os estudos sobre a vida e obra do poeta Fernando Pessoa integram o currículo de Língua Portuguesa, abordando teoria literária e literatura, no Ensino Médio. Desta forma, lançar mão de um projeto que trabalhe com Fernando Pessoa na educação é totalmente pertinente. Na escola, nem sempre os alunos estudam um poema de uma forma prazerosa, por exemplo, apresentado para o mundo através de imagens, uma maneira diferente de “(...) saber as coisas, vale dizer, de saborear os objetos, os eventos do mundo num modo de apreensão não somente intelectual, mas integralmente corporal, com todos os nossos sentidos ativos e atuantes” (DUARTE Jr., 2010, p.83).

As palavras de um poema não cumprem apenas o papel de significar algo, mas ultrapassam essa função. As palavras de uma poesia exprimem um sentimento, uma ideia metafórica, que podem despertar em nós sentimentos diferentes, fazer surgir imagens de um novo saber sobre as coisas, como ressalta Duarte Jr:

Nessa trama de tecido poético e tal pequenos pontos, as metáforas alinhavam aquela que verdadeiramente surge como a manifestação maior da alma do poema: a imagem. A imagem poética constitui a simbolização maior pela qual se constrói o poema. Ela não nos fala

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sobre as coisas e eventos do mundo, como pretendem os conceitos no uso prosaico da linguagem, e sim nos apresenta os próprios objetos e acontecimentos vistos de modo inaudito, de um ângulo até então inusitado (2010, p.83).

Duarte Jr. salienta que não se pode compreender um poema de um modo racional, por intermédio da percepção prática, baseando-se no modo lógico-conceitual, e sim por meio da percepção estética. “Antes as imagens nos solicitam serem sentidas, isto é, percebidas em seu esplender, luminosidade que nos fala ao corpo inteiro” (p.83). As imagens não precisam de explicações, falam por si próprias.

O projeto foi desenvolvido pensando em apresentar aos alunos uma maneira de introduzir conteúdos de literatura nas aulas de arte, no caso, por meio da poesia, mas, como foi exposto por Duarte Jr., por meio da apreensão dos sentidos, e não apenas intelectualmente.

No início dos estudos, verificou-se que os heterônimos de Fernando Pessoa, Álvaro de Campos, Alberto Caieiro e Ricardo Reis, mesmo sendo fruto de sua imaginação, são tão “reais” quanto Fernando Pessoa. As obras de seus heterônimos estão inseridas no modernismo português. O poeta foi estudado sob a ótica da identidade e da multiplicidade. Foi escolhido o “Poema em Linha Reta”, de Álvaro de Campos, como tema do trabalho.

Posteriormente, os alunos aprenderam o que é uma videoinstalação, modalidade de arte que utiliza imagens que dialogam com a poética da obra e que causa algum tipo de inter-relação entre imagem, obra e espectador. Como expressão artística, a videoinstalação provoca reflexões sobre o que é sentido, pensado e vivenciado ampliando a compreensão sobre o mundo.

A ideia de trabalhar com poesia e videoinstalação foi ao encontro dos objetivos propostos no projeto: ensinar aos professore em formação que a “(...) interdisciplinaridade é uma nova atitude diante da questão do conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e dos aparentemente expressos, colocando-os em questão” (FAZENDA, 2002, p.11) e que é possível apresentar uma poesia aos alunos de um modo inusitado.

O estudo do poema de Álvaro de Campos revelou que o poeta faz uma crítica à sociedade de sua época interrogando o leitor e solicitando respostas para os seus questionamentos. No poema, Álvaro de Campos se ofende de um modo irônico utilizando alguns adjetivos como “reles, mesquinho, submisso, sujo, pessimista”. Declara que não se submete às convenções da sociedade, às etiquetas. Acusa as pessoas de serem falsas e hipócritas, uma sociedade que joga a sujeira embaixo do tapete.

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Poema em Linha Reta

Álvaro de Campos Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo.

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas, Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida... Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca! E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

O poema foi apresentado aos alunos de Artes Visuais por intermédio de um vídeo, uma gravação com a voz do ator Paulo Autran. Foi impactante. Os alunos não apenas conheceram uma poesia, apreenderam com múltiplos sentidos, ouviram metáforas, ritmo e sonoridade. Imediatamente, mostraram-se estimulados para prosseguirem com o trabalho. Estudaram a poesia, refletiram sobre a expressividade de Álvaro de Campos, vivenciaram sinestesicamente as palavras de Paulo Autran.

Cada aluno recebeu um verso da poesia de Álvaro de Campos para fazer a proposta de criação. Foi solicitado que fizessem desenhos expressando a mensagem do verso, utilizando imagens de mãos em movimento. Interagindo com cada desenho, os

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versos foram incluídos, formando um novo contexto. Um desafio para a imaginação. Os alunos relataram que tiveram de ouvir várias vezes a poesia para poderem imaginar, criar, construir metáforas. O suporte utilizado foi igual para todos: um papel grosso, de cor clara, com 35 cm de largura por 50 cm de altura.

A apresentação da videoinstalação aconteceu no Centro de Convenções Victor Brecheret, em Atibaia. Os desenhos foram dispostos em linha reta, mantendo um pequeno espaço entre eles. Logo acima dos desenhos, na parede, que é levemente curvada, foi feita uma linha reta com carvão preto, contendo em torno de 20 metros. .

No dia da abertura da exposição, durante todo o tempo em que o evento ocorria, um vídeo com imagens instigantes era projetado na parede, acima da montagem dos desenhos. A poesia foi apreendida com os sentidos. A voz de Paulo Autran ajudou os visitantes a imergir nos versos de Álvaro de Campos.

Conclusão

Na finalização do projeto, os alunos avaliaram o que produziram e refletiram acerca dos resultados. Percebeu-se que é importante criar situações em que os educandos possam avaliar o que produziram ao final e no decorrer do desenvolvimento do projeto. Desta forma, pode-se conversar sobre o que foi aprendido e fazer reflexões sobre o que se deve considerar importante ou não no trabalho. A reflexão deve fazer parte de todos os momentos da ação. Para dar continuidade às novas etapas do projeto, foi preciso avaliar constantemente os resultados alcançados no decorrer do trabalho. Compreendeu-se que o educador deve pensar em um trabalho pautado na ação-reflexão-ação. Essa maneira de trabalhar contribuiu para uma adaptação ao perfil dos alunos, considerando o tempo disponível que se tinha para o desenvolvimento do projeto e em relação aos materiais utilizados e à apresentação da videoinstalação.

Aprender por meio da transdisciplinaridade tornou prazeroso o processo de ensino e aprendizagem. Quando se adota esse viés na prática pedagógica evita-se demarcar limites entre os conteúdos. O conhecimento foi assimilado pouco a pouco, construído a partir das interconexões dos temas estudados, dinâmica percebida ao longo do desenvolvimento da videoinstalação “Poema em Linha Reta”, projeto que abordou as artes visuais e a poesia. Ao se trabalhar com imagens, sons, desenhos e conceitos, foram requisitadas relações que envolveram dimensões emocionais e intelectuais, fato que contribuiu muito para intensificar o envolvimento dos alunos.

Promover a construção de significados por meio do desenvolvimento de um projeto que aborde a interdisciplinaridade superou as expectativas de ensino e aprendizagem dos alunos de Artes Visuais. Percebeu-se que as situações de aprendizagem que possibilitam escolher, propor, opinar, decidir e avaliar estiveram

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presentes em todo o processo de realização do trabalho, aspectos que auxiliaram na conquista da autonomia do professor em formação.

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