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ROMANCE POLICIAL: UM DEGRAU NA FORMAÇÃO DO LEITOR

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Academic year: 2021

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YAMANE, Sara Yuri – PUC PR

Área Temática: Teorias, Metodologias e Práticas Professora orientadora: Cátia Toledo Mendonça Resumo

Esta pesquisa relaciona a obra de Marcos Rey destinada ao público jovem com o gênero romance policial. Marcos Rey por meio de suas narrativas promove uma ligação entre a literatura de entretenimento (policial) e a literatura clássica sugerindo a seu jovem leitor que procure outras leituras sem imposição ou obrigação. A escola deve introduzir esse tipo de leitura para que o aluno sinta-se instigado a buscar as indicações e referências trazidas pelo autor em seus livros proporcionando o gosto pela pesquisa e leitura de obras canônicas da literatura brasileira ou estrangeira, além de entrar em contato com a cultura em geral.

Palavras-chave: Romance policial; Formação do leitor; Literatura infanto-juvenil; Marcos

Rey.

Introdução

Sabemos que a literatura direcionada a jovens e crianças nem sempre é bem vista no meio literário. Por ser destinada a um público ou leitor em formação, talvez não haja tanto interesse em produzir algo direcionado a esse grupo, mas existem alguns autores que têm preferência por jovens leitores, justamente por estarem em formação, como é o caso de Marcos Rey, conhecido autor de livros infanto-juvenis da série Vaga-lume. Nascido Edmundo Nonato, tinha grande predileção em escrever para o público jovem, por entender que a responsabilidade em formar um leitor é muito grande. Por meio de suas narrativas policiais, Marcos Rey consegue atrair leitores ainda em fase de aquisição do gosto pela leitura, despertando o hábito e por que não, o prazer da leitura.

Por meio dessas obras direcionadas ao público infanto-juvenil, a escola pode introduzir no cotidiano de seu aluno o hábito da leitura, pois o romance policial proporciona uma familiarização inicial com textos longos, exigindo mais de seu leitor, preparando-o para próximas leituras, porém a obra de Marcos Rey é muito vasta e diferente do já se produziu para o público em início de fase escolar.

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A narrativa policial de Marcos Rey

Para influenciar a leitura, Marcos Rey, em suas narrativas, sempre encontra um meio de citar obras e autores como uma forma de atentar o leitor de seus livros aos clássicos da Literatura Brasileira e Estrangeira. Trabalhar literatura infantil é muito mais do que contar uma história que tem uma moral no final, é abrir uma porta a novas leituras e principalmente despertar o gosto e o prazer em ler. Marcos Rey consegue envolver seu leitor na trama e orientá-lo a leituras consagradas despertando a curiosidade de buscar novos textos e maneiras de ver mundo, como acontece em sua primeira obra destinada ao público infantil – O mistério

do Cinco Estrelas1 – em que o personagem Gino, que direciona as investigações, é um assíduo leitor de jornais, tradutor e jogador de xadrez. A investigação que ocorre no livro é toda feita com base nas leituras feitas pelo rapaz, sempre usando de pensamento lógico e dedutivo.

“[...] Quando tia Zula foi para a cantina [...] o primo quis que contasse com detalhes tudo que acontecera. [...]

- Fiz mal em reconhecer o corpo do homem – disse Leo. [...] – Leo, a verdade é como fumaça, sempre aparece.

- É uma boa frase.

- Li num livro, se não me engano, policial. [...]” (REY, 1993, p.48)

Assim temos um exemplo da primeira leitura que pode ser trabalhada com crianças e adolescente em sala de aula, pois a leitura de livros de policiais é um passo na construção do hábito de leitura, começando pela atenção requisitada quando se lê um romance de enigma ou mistério. A atenção do leitor para acompanhar a investigação, que é feita, é imprescindível para uma boa compreensão do que se lê, assim o romance policial é um caminho para se fortalecer a memória e atenção necessárias para futuras leituras e consolidando o hábito de ler. Se de um lado temos a leitura de entretenimento, que serve como uma distração - leitura para divertir - Marcos Rey se utiliza da maior acessividade desse tipo de leitura para introduzir referências culturais, muitas vezes não encontradas em outros livros destinados a leitores jovens.

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História de Leonardo Fantini que trabalhava num luxuoso hotel de São Paulo, como bellboy. Em um dia normal de trabalho, ao atender a um pedido de um ilustre hóspede do hotel, Leo depara-se com uma surpresa: um cadáver debaixo da cama do hóspede. O que parecia ser só imaginação do rapaz se revela verdade, quando Leo, investigando por conta própria, descobre que o cadáver realmente existia e que por saber demais acaba sendo incriminado por um roubo e despedido do hotel. Para se inocentar e provar o assassinato do homem, Leo se junta a seu primo Gino.

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Mesmo tratando-se de romance policial, percebemos que muitas características desse gênero foram modificadas. De acordo com S.S. Van Dine, o vilão não pode ser movido por razões pessoais e o crime é a história de uma ausência: sua característica mais justa é que ela não pode estar imediatamente presente no livro (Todorov, 1970). O aspecto mais marcante do romance policial, a investigação promovida pelos personagens de modo dedutivo excluindo qualquer tipo de resolução fantástica ou emocional, ainda é mantido, porém Marcos Rey ainda acrescenta novos aspectos a essa produção, introduzindo elementos mais atrativos e próximos à realidade do seu jovem leitor como: a inclusão social do personagem Gino de O

Mistério do Cinco Estrelas, que usa cadeira de rodas, o romance, a presença da família,

introdução de linguagem mais coloquial, aproximando-se mais do público jovem, entre outros aspectos e ainda retoma traços da literatura infanto-juvenil que deve transmitir valores como justiça, honestidade e coragem. No prefácio há as seguintes linhas:

“È a história dum Davi contra um Golias. O pequeno Davi da Bíblia venceu o gigante Golias apenas com uma pedra e uma funda. Mas há outros meios de se derrubar grandes obstáculos. A persistência não é o mais prático, mas talvez seja de todos o mais eficiente.”

Logo na introdução, Rey mostra que a persistência e a coragem devem ser qualidades adquiridas durante a vida, que mesmo um garoto (percebe-se aí o trabalho de identificação com o leitor) pode vencer obstáculos e, no caso da obra, vencer no mundo dos adultos e provar que o jovem ou adolescente pode realizar coisas importantes.

Assim, Rey criou um modelo de narrativa que seria seguido por outros autores da série Vaga-lume, aliando elementos policiais a aspectos mais atraentes às crianças e pré-adolescentes, mas sua proposta para o público infanto-juvenil vai além do entretenimento que o romance policial proporciona, instiga o leitor a buscar novas leituras e autores.

Personagens leitores

A maioria dos seus personagens, tanto dos livros infanto-juvenis quanto os de literatura adulta, está envolvida em leituras. É possível encontrá-los lendo a todo tipo de literatura desde quadrinhos até obras clássicas como Memórias de um Sargento de Milícias2 e a autores como: Monteiro Lobato, Álvares de Azevedo. A empatia dos personagens é

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elemento principal no incentivo à leitura, pois é por meio deles que obras e autores importantes são introduzidos aos jovens, por isso é importante que haja uma identificação por parte do leitor com os personagens.

As atitudes de leitura mostradas nos livros de Rey permitem que os leitores aumentem seu repertório de leituras e conseguem instigar nos leitores mais curiosos a busca pelas obras citadas de maneira natural e livre da obrigação de ler um livro para responder uma prova ou questionário. Marcos Rey, desse modo intensifica a noção de que a leitura é um importante meio de adquirir conhecimento e cultura, como acontece em Dinheiro do céu3 de

1985, quando o doutor Barroso incentiva à leitura, principalmente a literária: “Enquanto não chegar a hora de decidir o que vai fazer da vida, leia. Tenha sempre um livro por perto. Poesia, romance, biografia, qualquer coisa. O melhor dos homens está nos livros” (p.17)

Inúmeras são as obras cujos personagens são leitores intensos e que sentem prazer em ficar em casa lendo, como é o caso de Danilo em Dinheiro do céu:

“Quando chovia, preferia ficar no quarto, lendo. Eu descobria Machado de Assis e Lima Barreto e andava animado com eles. Se não desse pra cursar a faculdade, tentaria adquirir cultura assim: lendo. Aliás, esses escritores, por coincidência, não puderam estudar muito” (p.93)

Podemos observar que a busca pelo conhecimento, sempre enfatizada por Rey, deve ser feita de modo voluntário. O personagem mesmo não podendo estudar, quer adquirir cultura por meio dos livros. O autor chega mesmo a apontar a leitura como um caminho para se adquirir cultura, a exemplo dos dois autores que se tornaram famosos, apesar de não terem tido ensino regular (Mendonça, 2006).

Além das indicações de leituras clássicas, Marcos Rey também apresenta uma lista considerável de referências culturais em seus livros, como indicações de filmes, referências à televisão, revistas em quadrinhos e músicas.

O leitor que se depara com uma obra cheia de referências e menções pode ficar entusiasmado em conhecer todas essas artes e escritores, tornando-se um sujeito independente na buscar desse conhecimento, não se limitando ao que a escola tradicionalmente traz em sala de aula. A cultura adquirida em situações naturais tem outro significado, quem a detém

3 Publicado em 1985, conta a história de Danilo e sua família, que esperam a volta do avô do rapaz que vai à

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se dono do conhecimento alcançado e tem plena liberdade crítica de escolher o que lhe agrada ou que lhe é necessário.

Ao reproduzir as falas de seus personagens, Rey enfoca as variantes lingüísticas que ocorrem em determinados grupos sociais, faixas etárias a que pertencem os personagens, criando uma aproximação com a linguagem dos jovens, com acontece em O Enigma da

Televisão4 de 1987, em que a fala de um punk é reproduzida: “Não estamos nessa de vender discos – disse o mais alto – é fajutagem. Agora pinica, que falamos até demais” (MENDONÇA, 2006).

Um leitor com um repertório literário maior poderá fazer ligações da obra de Rey com outras obras clássicas da literatura. Essa relação intertextual pode despertar nesse leitor mais experiente relações e compreensões em níveis mais profundos. Ao ler, por exemplo, O

rapto do menino de ouro5 pode-se perceber a intertextualidade com Tom Sawyer6 de Mark Twain, O lobo e o mar7 de Jack London. O movimento contrário também pode ocorrer, se o leitor vier a ter contato com essas obras poderá ativar a memória e perceber que o que está lendo já foi visto ou lido em algum outro lugar. Assim, não só os personagens devem citar nomes de livros ou autores, mas o próprio texto transmite de maneira mais sutil as referências clássicas da literatura.

O trabalho na escola

Como foi dito anteriormente, a literatura policial não deve ser tratada como alta literatura e sim como um instrumento de iniciação e aproximação com o ato de ler. Ao iniciar esse tipo de leitura o professor deve orientar o aluno a perceber as informações e referências utilizadas pelo autor, sempre tendo em mente que esse “degrau” deve ser ultrapassado para que o aluno ou leitor chegue às leituras clássicas sem medo ou preocupação. Uma boa leitura iniciada pode construir um leitor faminto de conhecimento e independente e as obras de Marcos Rey conseguem despertar prazer na leitura.

4 Narrativa situada no Rio de Janeiro, trata da investigação de uma série de assassinatos de atores de uma rede de

televisão e apresenta características tradicionais do romance policial, não envolvendo personagens adolescentes. (MENDONÇA, 2006)

5 Publicado em 1982, a história se passa em São Paulo e conta a investigação realizada por Leo e seus amigos

para solucionar o rapto de um menino famoso do bairro que ganhara um premio num programa de televisão.

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Um dos personagens mais conhecidos da literatura infantil americana, foi publicado em 1876.

7 Publicado em 1904, London rompe com o paradigma do romance de aventura trabalhando os perfis

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Construir um repertório de leitura desde criança é muito importante, pois quando se chega à literatura clássica, o estabelecimento de relações torna-se fácil. Um leitor eficiente é aquele que relaciona obras e autores e as mais diversas esferas de arte e os livros de Marcos Rey mostram por onde começar.

Considerações Finais

A literatura policial serve como uma maneira de criar o hábito de ler, não deve ser encarada como o único tipo de literatura, e sim ser um degrau para se chegar a outros tipos de leitura. Marcos Rey propõe uma revisão da literatura destinada a jovens, ela deve ser atraente - os elementos de ação e romance atraem mais o jovem leitor - e possibilitar uma identificação com personagens e situações, nunca deixando o molde clássico da literatura policial que é solucionar o mistério usando de inteligência e pensamento lógico.

A leitura das obras infato-juvenis de Marcos Rey se torna uma orientação de onde buscar conhecimento e cultura. Mostrar o caminho é muito mais produtivo do que dar a informação pronta, é preciso não subestimar o leitor. A era da internet facilita a pesquisa e o acesso, só é preciso orientar de maneira clara o que deve ser estudado.

Tratar de coisas que fazem parte do mundo e do interesse do jovem e da criança são essenciais para que a leitura seja adotada no cotidiano de adolescentes e crianças. É preciso cativá-los sempre, não subestimando sua capacidade de compreensão e de estabelecer relações com outras artes.

REFERÊNCIAS

MENDONÇA, Cátia Toledo. À sombra da lume: análise e recepção da série Vaga-lume. Curitiba. 2006. Tese apresentada como requisito à obtenção do Grau de Doutor ao Programa de Pós-graduação em Letras.

REY, Marcos. O Mistério do Cinco Estrelas. 12. ed. S. Paulo: Ática, 1993. REY, Marcos. Um rosto no computador. 3.ed. S. Paulo: Ática, 1995.

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