• Nenhum resultado encontrado

PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE: Dimensão educativa das práticas culturais em contextos populares

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE: Dimensão educativa das práticas culturais em contextos populares"

Copied!
146
0
0

Texto

(1)

1

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FABIANO SOARES DA SILVA

PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE:

Dimensão educativa das práticas culturais em contextos populares

Niterói – RJ 2017

(2)

2

FABIANO SOARES DA SILVA

PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE:

Dimensão educativa das práticas culturais em contextos populares

Versão para defesa de Projeto de Dissertação apresentada ao Pro-grama de Pós-graduação em Educação, da Universidade Federal Fluminense como requisito para a conclusão do Curso de Mestrado.

Orientadora: Maria Teresa Esteban do Valle

Niterói – RJ 2017

(3)

3

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá

S586 Silva, Fabiano Soares da.

Palavras que nascem da noite: dimensão educativa das práticas culturais em contextos populares / Fabiano Soares da Silva. – 2017.

144 f. ; il.

Orientadora: Maria Teresa Esteban do Valle.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Educação, 2017.

Bibliografia: f. 132-137.

1. Cultura. 2. Prática. 3. Classe trabalhadora. 4. Educação. 5. Educação popular. 6. Cotidiano. I. Esteban do Valle, Maria Teresa. II. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Educação. III. Título.

(4)

4

Dissertação defendida e aprovada em março de 2017

Pela comissão examinadora constituída pelos seguintes professores:

_______________________________

Prof.ª Dra. Maria Teresa Esteban do Valle – Orientador Universidade Federal Fluminense – UFF

_______________________________ Prof.ª Dra. Nilda Guimarães Alves

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ – ProPEd

_______________________________ Prof.ª Dra. Lúcia Cavaliere Universidade Federal Fluminense – UFF

_______________________________ Prof. Dr. José Valter Pereira Universidade Federal Fluminense – UFF

_______________________________ Prof. Dr. Ivanildo Amaro de Araújo

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ – Febf

Niterói 2017

(5)

5

Agradecimentos

À Prof.ª Dr.ª Maria Teresa Esteban, especial agradecimento, pela confiança, pelas discus-sões calorosas e pelo companheirismo comigo e com o grupo de pesquisa.

Aos/as professores/as, funcionários/as e colegas do Curso de Pós-Graduação do Mestrado em Educação.

Às professoras Lúcia Cavaliere, Nilda Guimarães Alves e aos professores Ivanildo Amaro de Araújo e José Valter Pereira, pela solicitude e gentileza de aceitarem compor a banca de exame de projeto e de defesa, pelas sugestões e análises significativas.

Ao grupo de pesquisadores/as das “orientações coletivas” ao qual me filiei no caminho desse curso, e aos/as colegas da linha de pesquisa Estudo do Cotidiano da Educação Popular pelas acaloradas discussões que contribuem para tecer reflexões sobre os processos de educação com as classes populares. À professora Carmen Lucia Vidal Pérez pelas colaborações partilhadas nas tro-cas de saberes e de experiências. E ainda, às professoras do Grupalfa, cujas reflexões ecoam nos passos dessa pesquisa e em outros espaços educativos.

A minha mãe, Francisca Regina Célia Soares da Silva, e meu pai, José Barreto da Silva. Também familiares: irmãos, irmãs, primos/as, tios/as, sobrinhos/as.

Aos sujeitos da pesquisa que entrecruzaram direta ou indiretamente suas experiências, saberes, lutas, sonhos, palavras e perspectivas para a tessitura dessa pesquisa: Sil (Silvana), Mo-duan Matus, Sergio Salles-oigerS, Altair Lisboa, Jonatan Magella, Gilliard Gomes Viana, André Luís Gomes, Antonio Cabral Filho, Manoel Inácio do Nascimento, Ivânia Cavalcante, Adelino Filho, Tati, Deley de Acari, Ivone Landim, Arnoldo Pimentel, José Roberto Magalhães, Jorge Me-deiros, entre outros/as e, em especial, a colaboração de Rosilene Jorge dos Ramos com sua leitura atenta.

A Elaine Freitas de Oliveira, a Regina Leite Garcia e a Carlos Alberto de Castro Martins, elas e ele in memoriam.

Termino meus agradecimentos entendendo que agradecer é um ato constante. Ofereço-lhes o poema Camarada, feito pelo afeto produzido em nossos encontros:

Alguns homens e mulheres Fazem das palavras Belas poesias sobre a vida. Mas, existem também Homens e mulheres Que fazem da sua vida Outras poesias ainda mais belas Impossíveis de transcrevê-las em palavras. Esses e essas Estão sempre ao lado Não deixam a gente esquecer Que a poesia mais bela É ainda Aquela em que todos e todas

Possam viver. Por isso nunca desistem de sorrir enquanto lutam Por um mundo livre E menos feio.

(6)

6 Resumo

O presente estudo busca tecer compreensões sobre as práticas culturais dos sujeitos das clas-ses populares e as relações que se articulam em seus contextos como dimensão educativa. Com esse interesse, o fio norteador dessa reflexão perpassa as interações constituídas no inte-rior dessas práticas e as inter-relações que constituem como entrecruzamentos de saberes e experiências vividas por tal grupo. Nesse aspecto, faço uma opção política de educação na medida em que pauto minha reflexão em uma educação popular na perspectiva de libertação e emancipação. Para isso, busco aqui as contribuições de Paulo Freire, Carlos Rodrigues Bran-dão, Néstor Garcia Canclini, Edwar Said, Milton Santos, entre outros, para apontar os entre-cruzamentos da pesquisa com o cotidiano, o diálogo como colaboração entre experiências e uma pedagogia que perambula nos contextos populares. Em vista disso, me aproximei dos estudos com o cotidiano, para tecer com os sujeitos da pesquisa uma compreensão de que os saberes e práticas culturais assumem funções de aprendizagens e de ressignificações das expe-riências vividas. Dessa maneira, busquei nas expeexpe-riências de produção de escrita, nas criações literárias, nos espaços de interações pessoais, nos processos de aprendizagens da produção e confecção do livro, pistas que apontam para um movimento de apropriação e expropriação da palavra nas relações afetivas dos grupos e coletivos. Dessa maneira, tais relações afetivas assumem uma dimensão política, colaborando com os sujeitos no reconhecimento de si e na tomada do ato de criar narrativas que historicizam experiências vividas. Por fim, as questões se voltam para pensar as práticas culturais nos contextos populares. Tais práticas delineiam-se na possibilidade de recriar ações libertadoras que delineiam-se contrapõem à lógica do capital, que reproduz ideias e práticas do imaginário de um mundo sem possibilidades históricas e de pa-peis sociais pré-definidos.

Palavras-chaves: Práticas Culturais; Classes Populares; Dimensão Educativa; Educação

(7)

7 Resumen

El presente estudio busca hacer diseños sobre las prácticas culturales de los sujetos de las cla-ses populares y de las relaciones que se articulan en sus contextos como dimensión educativa. Con esta finalidad, el hilo conductor de esta reflexión impregna las interacciones constituidas dentro de estas prácticas y las inter-relaciones que se constituyen como entrecruzamientos de saberes y experiencias vividas por tal grupo. En ese aspecto, hago una opción política de la educación en la medida en que guío mi reflexión en una educación popular en la perspectiva de la liberación y la emancipación. Para esto, busco aquí las contribuciones de Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão, Néstor García Canclini, Edwar Said, Milton Santos, entre otros, para señalar los entrecruzamientos de la investigación con el cotidiano, el diálogo como la colaboración entre experiencias y una pedagogía que corre a largo de los contextos populares. En vista de eso, me acerqué a los estudios con el cotidiana, para tejer con los sujetos de la investigación de una comprensión de que los saberes y prácticas culturales asumen funciones de aprendizaje y de resignificaciones de las experiencias vividas. De esta manera, busqué en las experiencias de producción de escritura, en las creaciones literarias, en los espacios de las interacciones personales, en los procesos de aprendizajes de la producción y la confección del libro, pistas que apuntan a un movimiento de apropiación y expropiación de la palabra en las relaciones afectivas de los grupos y colectivos. De esta manera, tales relaciones afectivas asumen una dimensión política, colaborando con los sujetos en el reconocimiento de sí y en la toma del acto de crear narrativas que historicizam experiencias vividas. Por fin, las cuestiones se vuelven para pensar las prácticas culturales en los contextos populares. Tales prácticas delinean la posibilidad de recrear acciones liberadoras que se contraponen a la lógica del capi-tal, que reproduce las ideas y prácticas del imaginario de un mundo sin posibilidades históri-cas y de funciones sociales preestablecidos.

Palabras clave: Prácticas Culturales; Clases Populares; Dimensión Educativa; Educación

(8)

8

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Baixada Fluminense – 19

Figura 2 – Encontros literários realizados entre 2014-2016 – 23 Figura 3 – Organograma de redes de produção de escrita – 33 Figura 4 – Recorte do Jornal Hoje – 58

Figura 5 - Terminal Rodoviário de Nova Aurora – 60

Figura 6- Fonte da Rosa, antes da construção do chafariz. – 98

Figura 7 – Livros feitos à mão, costurados e colados, com capa em isogravura – 108 Figura 8 – Momentos da produção do livro – 123

Figura 9 – Livro único e Zines – 125

(9)

9 SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO – 08

2. “UM OLHAR PELAS JANELAS DA BAIXADA” – 10

2.1 Do lugar ao território ou Palavras que caminham por múltiplos territórios – 18 2.2 Práticas culturais e ressignificações – 29

2.3 Caminhos que nos margeiam – 33

2.4 Os dizeres em versos e prosa dos sujeitos das classes populares -37 3. ENTRETECER O PENSAMENTO JUNTO – 51

3.1. Marcas da produção de uma escrita feminina – 61

3.2. Um movimento de sons, livros, pendengas e possibilidade dos entreteceres – 73 4. TEXTURAS, BURBURINHOS E OUTROS ARGUMENTOS – 87

4.1. Muitos fios de uma conversa em movimento – 97 4.2. Linguagens, escritas e memória... – 103

5. PRODUÇÕES DE ESCRITA, SABERES EM PROCESSO E EDUCAÇÃO POPULAR – 113 5.1. O livro às margens dos “segredos das abelhas” – 119

5.2. Produções coletivas – inter-relações de experiências – 124 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS – 129

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS – 132

7.1. Referências de autores independentes, periódicos e coletâneas – 135 Anexos

(10)

8

PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE:

Dimensões educativas das práticas culturais em contextos populares.

1. Introdução

“Piches

Formando mosaicos De personalistas garatujas

Remontam o cartão postal da paisagem. A arte camufla a arte

E o abandono

Erguido em sifões, cimento Cifrões e vácuos de progressos. O que se agiganta

Parece um calço ou uma ferradura Dando a ideia de uma marcha Em rabiscos atabalhoados.” Moduan Matus.

Este trabalho pretende fazer uma reflexão sobre as práticas culturais, as relações em que essas práticas se articulam e sua dimensão educativa como instrumento de uma pedagogia popular.

Embora eu faça um passeio pela poesia, provocando a ideia de que ela é uma reinven-ção da palavra que faz representificar um sentir humano, o estudo tem como fio norteador pensar as interações constituídas no interior das práticas culturais e as inter-relações que se constituem nos entrecruzamentos das práticas dos sujeitos em contextos sociais distintos.

A poesia, então, é um mote de entrada, que entendo ser uma representação do sentir humano que permite a cada um/uma construir sua própria significação a partir de suas experi-ências e de seus afetos. Esse estudo pretende pensar, também, sobre as relações afetivas que que se articulam ao caráter pedagógico que perambula nas práticas culturais dos contextos populares.

Nesse sentido, vou encontrar nos estudos com o cotidiano a possibilidade de convergir a uma perspectiva próxima da educação popular que possibilitou-me tecer uma reflexão sobre os saberes e práticas sociais nos quais interagem por homens e mulheres na ressignificação de suas experiências.

Ainda nessa perspectiva vou fazer um caminho atravessado e entrecruzado por dife-rentes sujeitos que participam de movimentações culturais, produzindo em suas práticas novas forma de interação e de aprendizagens. Nesse viés, encontro nas epistemologias que atraves-sam os referenciais bibliográficos, conceitos que vão demarcar um movimento de reflexão sobre as práticas culturais, a dimensão educativa e as relações interpessoais que se articulam nos contextos populares redefinindo-os a partir das experiências individuais e coletivas.

(11)

Nes-9

ses conceitos, as definições de “cultura do silencio”, de “contexto social”, de “práticas de co-lonialidade”, de “território usado”, de processos de “hibridação cultural”, de “interações cul-turais” e de “experiências de interações”, ajudam compreender essa movimentação de saberes e práticas culturais como possibilidade de pensar uma pedagogia que dialogue com múltiplos espaços formativos e que mude a vida de homens e mulheres para fomentar compreensões críticas sobre o mundo na transformação das relações da vida coletiva.

Desse modo, caminho no resgate das experiências, das conversas, das palavras senti-das desses sujeitos e senti-das diferentes práticas sociais em que articulam a vida, assim como, a reflexão sobre as epistemologias criadas a partir das múltiplas relações das práticas culturais em contextos populares.

Entendo as práticas culturais como relação dinâmica que exerce função de aprendiza-gens e de ressignificações das experiências vividas. Nessa dinâmica, a dimensão educativa das práticas culturais articulam-se às experiências dos sujeitos das classes populares em espa-ços coletivos, constituindo-se como releitura da realidade para transformá-la sob novas res-significações de sentidos.

Nessa dinâmica, a produção de escrita, leitura, reescrita e a confecção do livro repre-sentam novas formas, novas funções pedagógicas, à medida que as ressignificações criadas pelos sujeitos dão contornos das suas próprias vivências.

Por esse motivo, resgatar a experiências das produções de escrita, das criações literá-rias, dos processos da confecção/produção do livro, bem como a apropriação e expropriação da palavra, possibilita pensar a dimensão política que está ligada a um fazer, a um pensar e a um viver que se contrapõem à ideia de mundo acabado e de papeis sociais pré-definidos.

Nesse sentido, busco pensar que as práticas culturais dos sujeitos das classes popula-res colaboram na construção de espaços que possibilitam criação de práticas libertadoras que impulsionam a produção de uma escrita para dizer dos desejos, dos sentimentos e das expecta-tivas da vida individual e coletiva. De tal modo que, tomando a palavra, forjam o próprio dis-curso e as narrativas que historicizam as experiências vividas e saberes compartidos. Criando, assim, veículos próprios de comunicação, tais como espaços de trocas de ideias, saraus, even-tos de divulgação de suas produções e articulando intercâmbios culturais com outros sujeieven-tos para além do território de suas origens.

(12)

10 2. “UM OLHAR PELAS JANELAS DA BAIXADA”1

“Era um domingo tépido, sem apetrechos nem delongas, mas o sol, ah, o sol, o sol se fez presente e todos abriram janelas.” (Arte Poética - Antonio Cabral Filho)

Quando eu era criança me ensinaram que Nova Iguaçu era a cidade do vulcão. Do vul-cão adormecido que cuspia pedras. Depois aprendi que era de lá que vinha o trem de Japeri em direção à Central do Brasil trazendo pessoas que moram mais longe do que o lugar onde morava. Todos pareciam transitar pelos calçadões, fosse para ir ou vir do trabalho, ou estudar, resolver problemas, procurar emprego, etc. Minhas experiências encontram-se carregadas pelos meus pais e em tantas outras situações que me fizeram andar, me permitindo suscitar uma compreensão de mundo tendo em vista a superação relações sociais injustas. Já na juven-tude me encontro fazendo o percurso do bairro onde morávamos ao centro comercial de Nova Iguaçu. Nessas viagens que duravam em torno de 45 minutos, os ônibus estavam sempre lota-dos, cheios, desconfortáveis, aliviando como uma catarse coletiva ao chegar ao ponto final na Rodoviária “Velha”2

. Nesse lugar estudei o ensino médio e igualmente assinei minha carteira de trabalho, embora o trabalho já houvera assinado minhas mãos. Nesse caminho, algumas manhãs eram diferentes de outras, apesar do sono, apensar do peso do dia anterior, apesar de algumas circunstâncias serem quase sempre as mesmas. Eram diferentes, porque apesar de as bancas de jornais interromperem o fluxo de movimento dos passos apressados, havia algo diferente na arquitetura urbana que murava os caminhos do calçadão, daquela longa via de pedestre. Caminhava pelas ruas abertas, cortava caminhos por outras; percebia que nas portas de ferro onduladas do comércio, poesias escritas a giz denunciavam a passagem de pessoas, de ideias. Se para alguns a poesia poderia escorrer com o giz e com a poeira taciturna na lim-peza matinal, para outros permanecia como a memória de que à noite não guardava somente perigo.

Enquanto caminhava, muitas outras portas amanheciam escritas com giz, em versos dos/as que se encontraram aquela noite. Alguns poetas davam seus nomes, outros mantinham-se no anonimato. As mensagens que me roubaram os olhos, hoje mantinham-sei que não roubaram so-mente os meus. Se faltasse giz, ainda havia o vestígio de que a lasquinha e o pó que se dissol-via na fricção alinhava uma última palavra. Era para mim fascinante imaginar as mãos que se

1 Um olhar pelas janelas da Baixada, é o título do livro de crônicas do poeta Moduan Matus. 2 Atual Praça Rui Barbosa.

(13)

11

empenhavam em dizer o que se pensa, a ousadia de dizer, com eloquência ou com loucura, o que se sente. Como distúrbios infantis, talvez houvera poetas assim, mas com o sentimento de que não se pode viver só. E assim, a poesia era escrita, os fragmentos espalhados e tantos olhos que passavam tentando a seu modo captar o que se tinha a dizer.

Vivenciei tal cotidiano em meado da década de noventa, onde trabalhadores e trabalha-doras, estudantes em geral, que passavam pelo calçadão de Nova Iguaçu podiam se deleitar nos versos poéticos transcritos a giz. Os poemas eram escritos na noite anterior ou na madru-gada por grupos de pessoas que tinham a intenção de divulgar suas escritas. Pela manhã, não só a banca de jornal era o palco de atenção, mas toda extensão de lojas ao longo do calçadão eram páginas de um livro popular escrito por pessoas comuns. Os/as trabalhadores/as que moravam em outras cidades, como Belford Roxo, Queimados, Mesquita, Japeri, entre outras, ao descerem na antiga rodoviária, desaceleravam seus passos e inclinavam seus olhares na tentativa de decifrar as férteis linhas da linguagem poética transcritas na lataria das portas das lojas. Se havia os/as que não liam, havia também inquietações reveladas em perguntas curio-sas aos mais próximos que tentavam responder. Tive a oportunidade de vivenciar escurio-sas expe-riências, ainda como estudante e trabalhador assalariado como tantos e tantas.

Na minha rotina, as palavras nasciam da noite. Nas manhãs tantas palavras suscitavam gritos aos olhos e caminhavam nas portas das lojas, haicais perdidos e cuspidos sob o giz, pensamentos adormecidos, no paladar de cada um/uma. – Este eu gosto! – Pensava. Tentava memorizar de maneira vã. Por que escreveram aqui? Lembro que naquele momento não ha-via muitos livros em nosso contexto social, pelo menos não que eu desse conta, quando não eram caros, eram poucos, fossem os didáticos ou de literatura em geral. Foi a época que fui a uma das livrarias orçar o custo de livros de conteúdos didático que precisava como apoio ao estudo no ensino médio; estarrecido com os salários que deveria abdicar fiz como muitos e muitas, contentei-me com as cópias escolares, resumos, empréstimos de amigos/as e professo-res/as e grupos de estudo. Se dos livros não podia ter a aventura, censurada pela moeda, as escritas nas paredes profanavam os livros no deleite da caminhada, as páginas desfolhadas nas calçadas revelavam que homens e mulheres haviam estado por ali e que as histórias, contos, saberes não se limitavam aos livros, mas apenas marcavam um momento da ligação do ato de comunicação e que mesmo sem eles, ainda era possível dizer e reescrever em versos, em pro-sa, em garatujas os sentidos de lutar com a palavra. Nos meus rascunhos aprendia que a poe-sia também falava com quem passava. Nos dias seguintes os olhos ainda seguiam à procura de rastros de passagem naquele caminho. Assim como eu, homens e mulheres com seus ofícios, desempregados, subempregados do mercado informal, pessoas que passavam para fazer as

(14)

12

compras, para ir ao posto de saúde etc., estávamos ali lendo poesias, versos, buscando algum sentido do gesto da escrita e de alguma forma refletindo-a sob novos olhares e refazendo no-vas moradas.

É sobre este arranjo que vou constituindo os passos iniciais das reflexões, os referenci-ais e alguns pontos da trajetória inicial da pesquisa.

A construção deste trabalho, sob o título PALAVRAS QUE NASCEM DA NOITE:

Di-mensão educativa das práticas culturais em contextos populares, se realiza como fruto de

percepções, experiências, reflexões e no diálogo com os diversos sujeitos com quem interajo na pesquisa e do movimento de produções culturais existentes nos contextos populares. De tal maneira que proporcionou-me refletir sobre as práticas de produção de um movimento de escrita, de relações afetivas e de criação estética. Pensar o próprio fazer dos sujeitos e as (re)significações de modos de pensar, de sentir e de recriar nas práticas cotidianas as possibi-lidades de construção de autonomia.

A propósito do tema busco me aproximar das reflexões sobre uma pedagogia que pe-rambula no cotidiano, nas vivências populares e que se amarra aos saberes e práticas culturais. Compreendendo também que este trabalho é um esforço de sistematização para colaborar com movimentos e coletivos, para pensar uma pedagogia comprometida com os sujeitos das clas-ses populares, tendo em vista a possibilidade e necessidade da emancipação humana. Ressalto ainda que este trabalho é uma perspectiva, uma reflexão construída em diálogo com outros sujeitos. Pretende trazer à tona o debate em torno dos saberes e práticas culturais como possi-bilidade de uma pedagogia transformadora. Em outras palavras, busco aqui afirmar e enfatizar a existência de uma pedagogia, de um modo peculiar com que as classes populares se lançam à construção de seus próprios saberes, se articulam nas experiências distintas de seus sujeitos, modos que interagem com perspectivas e práticas que possibilitam aperfeiçoar suas habilida-des de aprendizagens/experiências.

Entendo que nessa trama em que se articulam aprendizagens, experiências e saberes, as classes populares se constituem ao produzirem um modo próprio de conduzir sua vida coti-diana.

No sistema econômico capitalista, o modo de produção é fundado na divisão de clas-ses sociais, na propriedade privada, na economia de mercado, no casamento monogâmico, etc., tendo em vista o capital produtivo e sua acumulação. Na sua dinâmica insere-se também na vida cotidiana um modo de pensar capitalista, que “enquanto modo de produção de ideia” (Martins, 1982), converte a capacidade do trabalho humano em realização de um processo produtivo onde o valor do trabalho é absorvido pelo capital.

(15)

13

Entretanto, por mais que o sistema vigente tenha força de organização das condições sociais, política e econômica, os sujeitos dessas classes produzem suas relações de convivên-cia, de afeto, de solidariedade, de vida e de força organizativa. Ainda que também se possa perceber junto a essas práticas uma oscilação que se encontra ora na lógica da reprodução social, na estratificação social, na exploração desenfreada do trabalho e ora em processos de resistência a essa reprodução, ou ainda em contextos mais intensos de conflito ou mais próxi-mo de uma hegepróxi-monia cultural, há produções de saberes que ressignificam ações e práticas dos sujeitos nos contextos populares que possibilitam configurar uma perspectiva de supera-ção das práticas de colonialidade (Quijano, 2010). Por colonialidade, entendo as práticas so-ciais de hierarquias de dominação produzidas a partir de uma mentalidade de identidade racial em que a classificação social se estabelece como subalternização das diferenças da popu-lação. Diante disso, tais práticas de colonialidade, revigora-se na ideia de que em contextos populares, como em regiões da Baixada Fluminense, só se produzem a feiura, a violência, a miséria, o crime, a discriminação, o preconceito, etc., ainda que os seus sujeitos não tenham consciência disso.

Neste esforço de compreensão da dinâmica das relações culturais, das suas práticas e da sua dimensão educativa, encaminho a proposta de investigação junto à linha de pesquisa Estudos do Cotidiano da Educação Popular, do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, onde busco o resgate de práticas culturais das classes popu-lares, suas aprendizagens, suas percepções e sensibilidade, assim como a partir de suas manei-ras de se (re)apropriar da produção/reprodução de um fazer, representar, sentir e ressignificar a dinâmica social em que estas classes estão inseridas, para indicar outras possibilidades de construção da autonomia dos sujeitos das classes populares à tomada de consciência e do seu reconhecimento de si na experiência histórica.

Nessa pesquisa, articula-se a abordagem da dimensão educativa à dinâmica da (re)apropriação da fabricação de livros e de produção de escrita como processos da luta pela ressignificação de experiências dos sujeitos envolvidos com a produção literária e/ou de uma escrita produzida pelas classes populares em espaços coletivos, constituindo-se como releitura da realidade para transformá-la sob novos sentidos. Assim, a pesquisa representa um caminho que se debruça sobre a reflexão de que a “literatura”, o “livro”, o “ler” e a “reescrita” são elementos de um processo pedagógico e este processo ganha forma à medida que os sujeitos recriam e ressignificam suas práticas culturais interagindo nas tramas sociais.

Quando me refiro práticas culturais, atribuo um sentido particular as atividades hu-manas que se constituem a partir do conjunto de pessoas ou coletivos que interagem entre si

(16)

14

reconstruindo e ressignificando formas de subjetividades. Nessa compreensão aproximo-me da ideia de que é possível perceber objetivamente essa movimentação das práticas culturais a partir de elementos que passam a compor uma estética cotidiana, não para defini-la como as-pecto de reprodução, mas para compreendê-la como resultado dinâmico das interações cultu-rais. Assim, os livros, as telas, o cenário, as histórias contadas e recontadas, as práticas, as músicas, o entrecruzamento de sons, os instrumentos sonoros e suas ferramentas de produção multiplicam-se as gambiarras como práticas que vão se realizando para satisfação de alguma necessidade, sem recorrer a um especialista ou a um profissional. Deste modo, essa práticas vão se especializando entre as articulações realizadas pelos diversos sujeitos que transitam em seus territórios; no exercício permanente de buscar novas lógicas para solucionar problemas da vida cotidiana. Diante das referências dessas práticas culturais, em particular, darei especi-al atenção ao aprimoramento dos meios de veiculação de escrita, através de periódicos e a “fabricação” de livros independentes ora chamados de alternativos, ora de artesanais. E como esses elementos suscitam uma série de movimentações afetivas e de fortalecimento das poten-cialidades de cada sujeito afetado por essas produções.

Ademais, considero igualmente importante para este estudo, as articulações e expres-sões plásticas, arranjos em que a arte caminha junto ao fazer cotidiano, seja na construção de habitação, nas formas de comunicação, códigos linguísticos e expressões variantes, nos ajus-tamento dos objetos e suas representações peculiares que dão finalidades diversas para os quais foram criados, nos ornamentos de “jardins” nas moradias populares onde as trocas e as “coleções” de plantas nas comunidades vão diversificando as flores e as formas, ou ainda nas bricolagens das oficinas de trabalho, em que os objetos ganham forma e cor.

A experiência da construção/(re)apropriação da produção/fabricação de livros inde-pendentes tem se evidenciado como um movimento de poetas, escritores/as, educadores popu-lares que, se apropriando das técnicas de produção e reprodução do livro, estabelecem comu-nicações, intercâmbios e trocas subjetivas e materiais a partir de relações afetivas e culturais. Decerto, o que se torna tangente em nosso estudo é o caráter de recriação intensa de uma pe-dagogia popular que se articula entre os sujeitos, reelaborando seus modos de compreender, ver e sentir o mundo e expressá-lo.

Entendo que nesse processo, os sujeitos recriam práticas pedagógicas que elucidam o potencial criativo dos agrupamentos populares, reordenando a compreensão de mundo, crian-do novos saberes e produzincrian-do legitimidades de seus próprios saberes na vida cotidiana.

Desse modo, o presente trabalho surge como resultado de um processo de diálogo, de inquietações e percepções das coisas vividas, cotidianas e relatos trazidos em conversas pelos

(17)

15

espaços em que transito, seja na escola em que atuo como professor ou em espaços dedicados a alguma manifestação ou atividade cultural, como saraus e encontros periódicos de poetas, escritores/as e pessoas ligadas ao movimento de escrita. Nesse trabalho faço uma opção polí-tica pela prápolí-tica pedagógica popular, seja com a minha inserção enquanto professor, ou en-quanto sujeito que atua com produções culturais ligadas aos usos de linguagens. Quero dizer que este trabalho nasce aberto como possibilidade investigativa, relacionada, sistematizada e encontra sustentação nas discussões no encontro com as orientações coletivas3.

A proposta aqui ganha forma no diálogo e na crítica estabelecidos que se reconfigura possibilitando resgatar a reflexão sobre os saberes que dão potência às vivências do dia a dia dos sujeitos das classes populares.

Nesse sentido, convirjo essa reflexão para os saberes e práticas culturais como possibi-lidades de uma pedagogia transformadora, que se constrói no cotidiano como prática e que se articula aos saberes em processos. Igualmente, compreendo que elementos dessa pedagogia se fazem presentes no conjunto de práticas comunitárias ou coletivas, em movimentos populares e redes de pessoas em suas lutas diversas. Assim, afluo ao resgate da experiência das produ-ções de escrita, dos modos de sentir e pensar dos sujeitos que vivem em regiões populares da Baixada Fluminense, dos processos da construção do livro e seus significados na reapropria-ção da palavra no mundo, para destacar a dimensão política que está ligada ao fazer, ao pensar e ao viver de cada um e cada uma que se constitui em relação. Busco também pensar a produ-ção de subjetividade e de uma escrita como domínio da compreensão da realidade que permite potencializar a ação política de práticas educativas emancipatórias.

De tal modo, considero que é relevante problematizar as dimensões política e pedagó-gica da educação popular que atravessam as práticas culturais para apontar as lutas pela liber-tação e pela emancipação dos sujeitos, confrontados com a ordem hegemônica que mantém suas práticas de colonialidade junto à reprodução social capitalista, deslegitimando saberes, invisibilizando experiências e negando sistematicamente a vida de homens e mulheres em prol de um modelo social. Em meio a este contexto, residem também as lutas sociais, os mo-vimentos, processos de resistência, redes de lutas dos sujeitos. Tais sujeitos imersos na trama social confrontam-se enquanto capazes de realizações de suas histórias, reelaborando seus modos nas impossibilidades e possibilidades de sua autodeterminação enquanto sujeitos

3 Orientação coletiva é o nome dado à atividade relacionada ao Seminário Permanente de Produção de

Conhe-cimento, onde orientadora e estudantes, da Linha de Pesquisa Estudo do Cotidiano da Educação Popular, se reúnem em encontros semanais para discutirem suas pesquisas, colaborando para suscitar novas questões, a par-tir de leituras críticas, percepções de cada participante.

(18)

16

ricos, bem como se re-apropriam (ou expropriam) dos conhecimentos e bens histórico-socialmente construídos.

A esse respeito, faço alguns recortes possíveis para caminhar na tarefa de pensar as práticas culturais, as formas de criação, os saberes populares e a dimensão política nos con-textos das classes populares. Considero que tais concon-textos, no processo de reconfiguração capitalista, são colocados à margem, à periferia, à zonas suburbanas em relação ao centro, à metrópole, à megalópole, à capital, etc. ora se ajustando à polaridade econômica, ora intera-gindo pelas necessidades materiais. Essa configuração se acentua em uma concepção hege-mônica de sociedade e de organização cultural, que se revigora na ideia de que as práticas e saberes populares são atividades e percepções ligados à tradição, de valor menor, de criações produzidas por indivíduos no senso comum tangíveis ao erro e ao equívoco; práticas e saberes que só passam a ter centralidade quando satisfazem os interesses dessa concepção social. En-tretanto, mesmo nas tensões que são postas, podem existir forças que materialmente têm inte-resses contrários à realização e à autodeterminação do conjunto maior de povos e sujeitos que denominamos das classes populares.

Nessa perspectiva da ação política, as práticas culturais populares remetem-me ao diá-logo entre sujeitos de relações múltiplas, dos contextos sociais suburbanos, subalternizados, periféricos e margeados pelas suas próprias produções subjetivas e objetivas, para pensar os aspectos da produção, da construção do discurso, da posse da palavra e a reprodução desse discurso. Assim, a palavra compartilhada nos contextos das produções literárias, parece-me assumir na dimensão afetiva, um valor político se compondo como prática de socialização de ideias e aprendizados. Percebo que tal dimensão se reconfigura a partir das redes de familia-res, artistas, escritores/as e poetas para se afirmar a voz como saber legítimo que se partilha através da palavra, seja ela impressa nos livros e produções independentes, nos muros, nas portas das lojas, em cadernos de anotações, etc, seja na oralidade dos sujeitos envolvidos a partir dessas produções, nos encontros criados para articular e transitar a palavra.

Deste modo, existem produções que circulam no eixo alternativo ou independente, como também existem aquelas que se interagem nos moldes e para o modelo hegemônico de produção cultural. Neste segundo momento de produção, os sujeitos se encontram na dimi-nuição da possibilidade de dizer por voz própria a sua alteridade e como negação de marcas que os identifiquem em sua completude. Entretanto, essa negação não é absoluta. Esses mes-mos sujeitos se encontram no entremeio de possiblidade que o sistema produtor de mercadoria favoreceu enquanto arte engajada com uma orientação política de uma classe e, ainda, das audácias que possibilitam uma apropriação de algum tipo veiculação de suas produções

(19)

cultu-17

rais. Por outro lado, tende-se na produção cultural ligada ao modelo hegemônico, a diminuir ou negar o direito dos sujeitos enunciarem suas próprias palavras. No entanto, mantendo-se as diferenças sociais, sobretudo, porque as produções desse sujeitos trazem marcas, experiências, expectativas de seus lugares e trajetórias e, quando aceitos pela perspectiva hegemônica, pelos meios de comunicação de massa, seus sentidos são modificados, maquiados e laqueados para se adequarem a um ideário societário.

Nessa tensão, duas questões me parecem latentes. A primeira é a percepção de um ajustamento às formas instituídas da produção cultural de massa, cujas ideias pairam a um

status via reprodução artístico-cultural. A outra condiz com uma produção cultural própria

nos contextos populares, ao mesmo tempo em que se articula com essa cultura de massa. Em uma aproximação com o que aponta Canclini (2015), na dinâmica em que se en-contram as classes populares, suas práticas podem ser entendidas “como resultado da apropri-ação desigual dos bens econômicos e simbólicos”, como ele afirma:

“As culturas populares não são efeito passivo ou mecânico da reprodução controlada pelos dominadores; também se constituem retomando suas tradi-ções e experiências próprias no conflito com os que exercem, mais que a do-minação, a hegemonia. Quer dizer, com a classe que, ainda que dirija politica e ideologicamente a reprodução, tem que tolerar espaços onde os grupos su-balternos desenvolvem suas práticas independentes e nem sempre funcionais para o sistema (hábitos próprios de produção e consumo, gastos festivos opostos à lógica de acumulação capitalista)” (Canclini, 2015, p.273).

Em outra perspectiva, as práticas culturais também assumem uma dimensão política na ação dos sujeitos que as tornam possíveis na relação com o grupo social. Nessa acepção, as possibilidades do fazer-refletir, do recriar suas formas e conteúdos, tornam-se reais e comuns para avançar em aprendizados e autonomia. Nesse sentido, as produções literárias, como ele-mento das práticas culturais no circuito de produção independente, se configuram como esfor-ço de elaboração da escrita que se transfigura nos estilos e gêneros; no exercício da releitura e da escrita, atravessando a percepção estética e o significado da sua forma para os sujeitos au-tores de suas próprias palavras. O livro independente, também como elemento dessas práticas, se apresenta como ligação entre os sujeitos, não como resultado de um processo ou dinâmica das práticas, mas como continuidade da palavra pronunciada, escrita e transcrita. Assim, a palavra, tanto na sua forma de estabelecimento de comunicação quanto o entrelaçamento dos processos cognitivos, de criação de significados e como busca do Ser que somos. Além disso, é necessário entender a palavra não apenas como solta em seus processos de decodificação na

(20)

18

aprendizagem da escrita, uma vez que ela tem “uma memória segunda que se prolonga miste-riosamente no meio das significações” (Barthes, 2004, p.15), mas entendê-la como ligação entre sujeitos, em disputa, em interação, como instrumento do fazer cotidiano e do trabalho das práticas coletivas que dão ao território as vozes e sons que caminham sob essas práticas. Por conseguinte, trazem contribuições para que os sujeitos encontrem soluções para os pro-blemas reais e façam uso dos seus aprendizados, interagindo inclusive com os processos de escolarização, mesmo que tardiamente. Por isso, a palavra não está dissociada das práticas sociais, das relações humanas e das experiências coletivas. Ela faz parte do universo vocabu-lar que ressignifica a dinâmica da vida social como prática educativa e nas formas de pensar uma compreensão do contexto social como elemento que possibilita amplificar os processos educativos na construção de conhecimentos.

2.1 Do lugar ao território ou Palavras que caminham por múltiplos territórios

O território tem voz. No entanto, para ouvi-la em nossa caminhada é preciso tecer a compreensão de território como espaço das relações constituídas no cotidiano, nas interações vívidas de constantes transformações. Assim, prematuramente me aproximo das ideias elabo-radas por Milton Santos em que define o território como “o lugar em que desembocam todas as ações, todas as paixões, todos os poderes, todas as forças, todas as fraquezas, isto é, onde a história humana (em itálico, grifo meu) plenamente se realiza a partir das manifestações da sua existência” (Santos, 2017, p.13). Nessa ideia me abrigo na noção de que a vida modifica o lugar de permanência, de repouso e de fluidez migracional, seja esta derivada das forças eco-nômicas e sociais ou pela intencionalidade, desejos e afetos pulsantes das relações humanas.

Desse modo, ao pensar o lugar, não me restrinjo a pensar exclusivamente enquanto as-pecto cartográfico da região, mas compreendo a noção de território como espaço em que exis-tem relações de poder. Território que se produz a partir das relações de força e das interações sociais. Sob esse aspecto, a dimensão política coexiste nas experiências com que os sujeitos percebem o mundo nas vivências cotidianas. De tal modo, me aproximo da ideia de território

usado, constituinte da dinâmica social ligada ao trabalho, ao “lugar da residência, das trocas

materiais e espirituais e do exercício da vida” (Santos, 2007, p.14). Nessa compreensão, o território pode corresponder aos modos como vão se articulando as experiências sob proces-sos históricos, econômicos, políticos e culturais. Configuração em que vai se sustentar o palco das práticas culturais.

(21)

19

Diante da perspectiva apresentada, faço o recorte espacial a partir da Baixada Flumi-nense enquanto território das minhas experiências e das relações afetivas e sociais que nesse lugar pude vivenciar. Historicamente, tal região foi constituída a partir da exploração dos re-cursos pela coroa portuguesa e rota de exploração do ciclo do ouro trazido de Minas Gerais, pela plantação do café, entre outros produtos. A rota do comércio, como virá a ser chamada, muda a característica geográfica da região com a introdução das ferrovias onde posteriormen-te vai se constituir, a partir da metade do século XIX, com o crescimento populacional, os pequenos centros urbanos às margens das ferrovias em decorrência da exploração imobiliária na capital e do deslocamento migratório que transformou as decadentesfazendas deimensos laranjais e hortifrutigranjeiros, em áreas de loteamentos, de grilagem e ocupações irregulares de moradia, sobretudo a partir da segunda década do século XX (Tôrres, 2004).

Figura 1 – Baixada Fluminense e região metropolitana

_________________________________________________________________________________

Fonte: http://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/info_territorios/RMRJ2013.pdf, modificado pelo autor.

Região localizada entre o Rio de Janeiro e a região serrana, é cortada pelas principais vias do Estado, como a Rodovia Presidente Dutra, a Avenida Brasil, a Linha Vermelha e Wa-shington Luís e representa para o Estado uma das regiões mais significativas do ponto de vista do crescimento econômico (comércio e indústria), populacional e urbano. Com uma popula-ção de 3,73 milhões, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a

(22)

Bai-20

xada Fluminense, como nos sinalizam Maria Helena Moreira Alves e Philip Evanson, em

Vi-vendo no Fogo Cruzado,

“tal qual a história do desenvolvimento urbano de outros lugares do Brasil, a extrema concentração de renda gerou baixos índices de de-senvolvimentos em termos de expectativa de vida, nível educacional e salários. Bolsões de pobreza contribuem para a formação de novas favelas (...). Tudo isso constitui uma enorme força de trabalho silen-ciosa e mal paga que torna possível o ritmo acelerado de desenvol-vimento dos serviços, indústrias e setores comerciais. Desigualdades no acesso a moradia, renda e educação estão presente” (Alves e Evanson, 2013, p.21)

Outra característica importante são os sujeitos que se constituem nessa região. A ori-gem de sua população tem a presença dos nativos Tupinambás, dos colonizadores portugueses e das populações negras escravizadas nas terras fluminense cujo início demarca o meado do século XVI, bem como, a crescente resistência negra contra a escravidão, com a formação de quilombos na região. A formação de uma população mestiça, formada por homens e mulheres “pardos”, juntamente com os contingentes migratórios do século XX, provenientes, sobretu-do, da região nordeste do Brasil e regiões metropolitanas, entre os processos migratórios ori-undos de outros países, vão colaborar para esse arranjo heterogêneo, de origens e identidades culturais diversas, e ainda, acentuadas marcas das desigualdades econômica e social. Estas, por sua vez, se encontram apoiadas em uma composição de valores sociais de marca cliente-lista. A partir dos anos 1950 a Baixada Fluminense vai ampliar o seu contingente populacio-nal, dado a partir das ocupações em áreas de loteamento, quase sem nenhuma infraestrutura, junto às contradições econômicas e políticas na conjuntura nacional, o surgimento de movi-mentos camponeses e a insatisfação popular que vão resvalar nos saques do início da década de 1960 em Duque de Caxias e expandindo-se por outros municípios da Baixada. Com a dita-dura civil-militar no Brasil, nessa mesma década, além das profundas marcas de perseguição, a censura e práticas de repressão política apoiaram à instauração dos esquemas de execuções sumária na Baixada Fluminense (Alves, 2003).

No sistema educacional, se reproduziu a lógica da perspectiva laboral para as classes populares, de modo a conservar um caráter de racionalização dos conhecimentos visando atingir metas, objetivos e garantir a eficiência nos processos de ensino. De tal modo que o

sistema educacional brasileiro pautado nos acordos MEC-USAID (Ministério de Educação

do Brasil - Agencia Nacional de Desenvolvimento dos Estados Unidos), firmados a partir da década de 1960, sob uma perspectiva tecnicista, o modelo taylorista vigorado até meado da

(23)

21

década de 1980 como proposta curricular, vai atuar diretamente em todos os níveis de ensino, na administração, planejamento, avaliação, estrutura curricular de seus conteúdos, contratação de pessoal, controle de publicações e na distribuição de livros.

Paralelamente a isso, as lutas pelo acesso à escolarização, pela qualidade educacional diante da diversidade cultural do país e pela implementação de políticas sociais e educacionais favoreceram a universalização do ensino e ampliação de espaços escolares na década de 1990, abrindo-se novos debates sobre as questões ligadas à qualidade do ensino básico, às concep-ções de educação e aos métodos e procedimentos articulados a uma abordagem técnica e cien-tífica de prescrição curricular tendo em vista a qualificação da formação da mão-de-obra e o controle social para o desenvolvimento econômico, ao mesmo tempo em que as políticas neo-liberais avançavam sobre a precarização do trabalho, os direitos sociais e redução dos inves-timentos estatais a serviços e políticas básicas.

Para compreender o termo Baixada Fluminense é preciso atentar para o movimento de articulação geográfica e social que define essa região do estado do Rio de Janeiro localizada entre a região serrana e o litoral, entre o centro econômico da capital do estado e as regiões fornecedoras de matéria-prima e derivados. Em seu relevo de planícies abarca os atuais muni-cípios de Belford Roxo, Duque de Caxias, Guapimirim, Itaguaí, Japeri, Magé, Mesquita, Ni-lópolis, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, São João de Meriti e Seropédica, onde reside uma parcela significativa de trabalhadores/as que fazem funcionar as engrenagens da produ-ção industrial, de comércios, de serviço, da construprodu-ção civil e demais sujeitos do chamado mercado informal. Junto a isso é preciso salientar a existência de mecanismos de segregação e desigualdade a que vai submeter um conjunto de trabalhadores/as à reprodução do Capital, sobretudo, após a década de 1970, a um modelo de desenvolvimento econômico e social de-sordenado onde a marca da violência, bem como sua naturalização instituída pelo aparato opressor do estado e segmentos paralelos, vai se evidenciar na taxa de homicídio que chegou ao número aproximado de 2000 assassinatos por ano na década de 1990 (Alves, 2013).

No período das décadas de 80 e 90, as políticas do estado se voltam para atender as necessidades básicas da população dessa região, sobretudo, quanto ao baixo índice de acesso aos serviços de água e esgoto; à concentração da pobreza e aos baixos índices de acesso à qualidade de vida; às desigualdades sociais, ao acesso à moradia, à educação, a saúde, ao em-prego. Verifica-se o rendimento per capita, em 1990, de 68,1% da população da Baixada Fluminense vivendo com até um salário mínimo (Porto, 2001). Na configuração dessa reali-dade, segundo o Censo de 2010 do Instituto brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), havia nessa região um número de 180.705 pessoas desocupadas. Soma-se a isso, a

(24)

22

acentuada exploração do trabalho, espoliação de direitos, a estagnação de salários ao mesmo tempo em que se aumenta a produtividade. Nessa dinâmica o “sistema vomita homens” e mu-lheres ao vasto exército de reserva, ao subemprego e a bolsões de pobreza, mantendo atuais as contribuições de Eduardo Galeano (2010), em seu livro As veias abertas da América Latina, para ajudar a pensar como vão se constituindo as margens desses homens e mulheres, consi-derados na lógica do sistema dominante como sujeitos de valor menor (fosse sua mão de obra ou ainda de seus processos de construção de subjetividade) e, consequentemente, os seus terri-tórios, tendo em vista as dinâmicas do capital para que o sistema mantenha-se ainda viável na lógica da sua reprodução. Articulam-se a essa lógica, os meios de informação onde se interli-gam os interesses do capital internacional, privilegiando territórios e configurando as relações de poder.

Com Milton Santos (2007), posso entender que o território “também pode ser definido nas suas desigualdades a partir da ideia de que a existência do dinheiro no território não se dá da mesma forma” (Santos, 2007, p.17). Mas também, vão ser produzidos, no cotidiano dos sujeitos das classes populares, modos próprio de suas articulações, ajustamento frente à dinâ-mica sócio-política e projeções de novas perspectiva societária. De todo modo, vai se consti-tuindo uma população heterogênea, de múltiplas perspectivas sociais, econômica e cultural.

Dessa noção heterogênea e de múltiplos entrecruzamentos culturais, torna-se possível a aproximação à reflexão trazida por Néstor Garcia Canclini, a respeito dos processos de

hi-bridação que surgem a partir da criatividade individual e coletiva.

O conceito proposto per Canclini (2015) parte da compreensão dos processos de hibri-dação como territórios fronteiriços em que se articulam relações culturais que se entrelaçam para potencializar conhecimentos e comunicação. As culturas, para o autor, “são fronteiras”, misturas interculturais que são fluidas, relativas e dinâmicas; mesclagens de fios das astúcias. Nesse pressuposto, encaminho minha reflexão a partir da ideia de que o processo de hibrida-ção também se realiza em contextos conflitivos tais quais encontro na Baixada Fluminense. Entendo por contexto conflitivos a exposição das linhas de demarcações de classe que acentu-am ações de controle social e da reprodução de práticas de colonialidades. Tal território é marcado por intensas experiências e pela diferença cultural das classes populares, visto que expressa uma zona demarcada por múltiplas culturas e pessoas oriundas de outras regiões do país.

Diante disso, sinalizo o recorte espacial para situar os pontos de interseção da minha aproximação com os sujeitos da pesquisa. Dos treze municípios que compõem hoje a região da Baixada Fluminense, tomarei dois deles apenas como referência dos entrecruzamentos das

(25)

23

redes de produções literárias e/ou de escritas de que participei e a que me vinculo. Belford Roxo e Nova Iguaçu4 fazem parte de um conjunto maior no cenário das conjunções dessas rodas de poesias, encontros literários, saraus e atividades culturais diversas. Tais encontros transitam entre os bairros mais centrais do polo econômico desses munícipios e os bairros mais periféricos da região. Sendo assim, forço-me a representar5, de modo parcial e limitado, algumas interações como tentativa de situar o caminho das vozes no território, bem como de-marcá-las brevemente na complexidade permeada por diferentes vivências no cotidiano dos sujeitos de quem me aproximo na pesquisa.

Figura 2 – Encontros literários realizados entre 2014-2016

__________________________________________________________________ Fonte: https://www.google.com.br/maps - grifado a partir de linha pelo autor.

A Baixada Fluminense é um território de um contingente significativo de poetas, escri-tores/as, artistas, agitadores/as culturais, movimentos e grupos que se mobilizam por interes-ses e questões próprias. Considerando apenas as referências que utilizo a partir das conversas, registros de atividades, periódicos, livros de publicações independentes e as atividades cultu-rais periódicas e itinerantes, contabilizei, em uma pesquisa primária, um pouco mais de 320 poetas e escritores/as que transitam ou residem na Baixada. Tomando como referências

4

Fonte: a população dos municípios de Belford Roxo e Nova Iguaçu giram em torno dos números de 469.332 e 796.257 respectivamente. IBGE: < http://cod.ibge.gov.br/KKO> e <http://cod.ibge.gov.br/2M6> : Acessado em 15/05/2016.

5

Os pontos de referências marcados na Figura 2 representam apenas a minha percepção dos lugares de encontros onde estas produções se inserem, mas não expressam uma totalidade. Trata-se de um recorte para demarcar o fluxo de um percurso, entre tantos outros círculos existentes nesses espaços.

(26)

24

cipais a coletânea organizada por Moduan Matus, denominada Anos 90, Poetas na Baixada:

Coletânea do fanzine Desmaio Públiko, Gambiarra Profana, Folha Cultural Pataxó e outros

nomes lembrados por poetas da pesquisa, listei um número de trezentos de vinte e seis nomes de poetas, escritores/as que transitaram ou transitam na Baixada Fluminense, de atuação a partir década de noventa, ou tem sua inserção em grupos que atuam ativamente, entre eles estão:

A.J. Batista, Adão Nascimento Amorim, Adelino Filho, Agnaldo da Silva Ramos, Ail-ton José Gomes da Silva, Alberto Cantalice, Alcides Eloy, Alcydinei Santos, Alessandra, Alex Fereitas, Alex Tomazzi, Alexandre Ballmann, Alexandre Rodrigues, Aliandú, Aline Cardoso, Aline Cortes, Almeida dos Santos, Almir Silvicola, Almiracir Segatt, Ana Cajueiro Martiniano, Ana Cajueiro, Ana Lúcia, Ana Maria Tavares de Andrade, Ana Oliveira, Ander-son Leite Lima, AnderAnder-son Nascimento, André Alasf, André Cardozo, André Eira NelAnder-son Freitas, André Eira, André Luiz, André Porfírio, Andréia Gama, Angela Maria das Neves (em memória), Antonio Cabral Filho, Antônio Carlos, Antonio Feitoza, Antônio Fraga, An-tonio Paulista, Antônio Ribeiro Feitosa, Antônio Taúna, Arnoldo Pimentel Filho, Avio Ri-cardo, Bernadete Tostes, Calber Soneca, Camila Senna, Carla Ribeiro, Carlos Esteves Ferrei-ra, Carlos Marta Carlos Orfeu, Carlos Paiva, Carlos Portugues, Catarina Nagamine, Celene Souza, Célia Cepac, Celso Felizola, Cezar Ray, Cirino Neto, Cláudia Miquelloti, Claudinha Oliveira, Cláudio Bastos, Cláudio Tira Onda, Costa, Cristiano Lávisfer, Cristiano Pinto, Cris-tina Amaral, Dalvanéria, Daniel Guerra, Daniele Cordeiro, Declev Dib Reynier, Decy Ribei-ro, Deise Cristina, Deise Freitas Addia, Dejair Esteves, Deley do Acari, Demétrio Oli, Deme-trius, Denise Gomes Duarte, Deoris, Diana Dijasmim, Dida Nascimento, Diego Aguiar, Die-go Ferrão, Dom Avelino, Domi Júnior, Doris Barros, Duda Amaral, Duda Moreno, Ecio Sal-les, Éder Rodrigues, Edhu Carval, Eduardo Cavalcante, Eduardo Ribeiro, Elaine Freitas de Oliveira, Eliana Souza, Emanuel Pessoa, Eud Pestana, Évio Eurístenes, Fabiano Soares da Silva, Fábio Guerra Helena, Fátima do Rosário, Felipe Mendonça, Felipe Quântico, Felipe Rey Rey, Fernando Felipak, Fernando Mattos, Flávia Soares, Flora Basto, Gabriel Ferrão, Gabriela Boechat, Gabriela Guanabara, Gabriela Pontes, Gê de Ias, Gelson Maciel, Gilma Botelho, Gilson Pinheiro, Giovanna Vitória, Gisela Barros, Gisele Andrade, Gleides Gonçal-ves, Guilherme de França, Gydeão, Heitor Neguinho, Henrique Souza, Hugo Guimarães, Huilberti, Ianê Mello, Indicampos, Ingrid, Inon, Iraí Rabello, Ivan Norberto, Iverson Carnei-ro, Ivna Macera, Ivone Landim, J A Lima (Laranja), J R Júnior (Blue), J. Kareta, J. Marujo, J.A.Lima e Thomaz Red, Jahmaica, Janaina Tavares, Janaina Martins, Janete Jan, Janete Ro-drigues de Freitas, Jaqueline Freitas, Jô Elma, Joana Ribeiro, João Antônio, João Batista de Lima, João Guerreiro, João Oscar, Joca Ribas, Jonas Fagundes, Jonatan Magella, Jorge Bas-tos, Jorge Cardoso, Jorge Carlos A. de Oliveira, Jorge Cosendey, Jorge Kafka, Jorge Leão, Jorge Medeiros, Jorge Pereira Zulu , Jorge Rocha, José Renato, José Rico De Deus Quirino, Josy Lozada, Idicampos (Colinha), R. Júnior, Juliana Carter, Júlio César Jacintho, Junior da Prata, Jussara Freire, Kako San, Kátia Nardi, Kátia Vidal, Lafayette Suzano, Lara de Barros Roberto, Leandro Duarte, Lenne Butterfly, Léo Rossetti, Leon Sake, Leonardo Léo, Lindacy Menezes, Lino Rocca, Lirian Tabosa, Lorraynne, Lucas D. Mery, Lucas Lucas, Luciana Be-názio, Luciana Nobre, Luciel Denm‟onorrs Litan, Luís Renato, Luisa Sant‟Ana, Luiz Anto-nio Lula da Silva, Luiz Cantalice, Luiz Claudio, Luiz Coelho Medina, Luiz Fernando, Luiz-mar Cabeça, Malena Xavier, Mané do Café, Marajá Divino, Marcelo Costa, Marcelo de Mo-raes, Marcelo França Diva, Marcelo Muniz Machado, Marcelo Negretti, Marcelo Parrara, Marcelo Peregrino, Marcelo Quirino, Marcelo Sampa, Marcelo Schiavone, Márcia Feijão,

(27)

25

Márcia Santos, Márcio Cedés, Marcos Rufino, Marcos Serra, Mariah Cardozo, Mariana Ló-pez Marília dos Santos Matos, Marina Coufal, Marinaldo Imperiano, Marlos Degali, Masal, Mateus Carvalho, Mauro Araújo, Mauro Vasconcelos, Meire de Oliveira, Mery Onírica, Mirna Maia, Moduan Matus, Moni Karla, Mônica Cardozo, Naldo Calazans, Negão Cleide, Nei Alberto Gonçalves de Barros, Neto, Ney Crespo, Nice Vicente, Nilson Nagamine, Noeli Rocha, Octaviano, Otto de Carvalho, Pamella Trinta, Patrícia Araújo Ferreira, Paula Beatriz Albuquerque, Paulo Fonseca, Paulo Igor, Paulo Silva Filho, Petrus, Plínio Amaro de Almei-da, Praxades, Rafael Damaceno, Rafael Garcia, Rafael Gomes, Rafaela de Freitas, Railson Nicácio, Raimundo Araujo, Ramide Beneret, Rebeca, Regina Grimaldi, Reginaldo Oliveira, Renata Pagy, Rita Cortes, Roberta Lara, Roberta Schiavone, Roberto Ramos, Roberval Cos-ta, Marlos Degani, Robson Gabiru, Rodinei CosCos-ta, Rodrigo Souza, Rogéria de Freitas, Rogé-rio de Oliveira, Ronaldo Calazans, Ronaldo, Ronnie Martims, Rosane Chamon, Rosângela W., Rosi Tanoca Vó Laura, Rosilene Jorge dos Ramos, Rufino Rock‟n‟Roll, Sabrina, Sand-man, Sandro E. P. Marschhausen (Monir Salomão), Sandro Rozzo, Sérgio do Amaral, Sérgio Fonseca, Sergio Salles-oigerS, Sheila Maria, Shirley Guimarães Sil, Silvia Regina, Simone de Lima, Simone Lopes, Solange Giorgini, Solange Maria Frazão, Sóstenes Fonseca, Stela Guedes, Tarcísio Valdevino, Thalita Indi, Thiago Kuerques, Thiago Mattos, Thiago Rocha Ribeiro, Tiago Costa, Uilames, Vagner Vieira, Valéria Assis, Valéria Malafaia, Vanderley Marins, Vantuir Marques Artesão, Vicente Atéa, Vicentinho Freire, Victor Loureiro, Viviane Barroso, Wagner Dias Araújo, William Ertorio, Wilson Manoel, Yamaraz, Silni de Lima, Yasmin Cupertino, Yolanda Soares, Zeca, Zinaldo,

No entanto, convém destacar que no desenvolvimento da pesquisa faço a escolha por alguns sujeitos por considerar as afinidades, a proximidade das relações de produção de escri-ta, do reconhecimento das aprendizagens e intercâmbios. Nesse esforço de canalizar compre-ensões, dou destaque a alguns sujeitos que fazem parte da minha experiência de aprendizagem da construção do livro independente, da dinâmica educativa em que esses sujeitos se inserem em seus contextos sociais e do movimento de produção literária que articulam experiências individuais na confecção do fazer coletivo como dimensão educativa das classes populares. Antonio Cabral Filho é um dos sujeitos para além da Baixada. Poeta, trabalhador da xérox do DCE da UFF na década de noventa, agitador cultural do circuito Niterói-São Gonçalo; Mo-duan Matus, poeta e escritor de Nova Iguaçu, destaco pelo reconhecimento da escrita dos/as poetas iniciantes, incentivo e colaboração com o registro que mantém a memória de produ-ções literárias na Baixada Fluminense de poetas e escritores/as; Sil (Silvana Elisabeth dos Santos), poeta, programadora visual e integrante do Encontro de Poetas e Afins, como agita-dora cultural, torna-se o elo de reencontros de poetas e escritores/as no contexto presente da pesquisa; Sergio Salles-oigelS, como poeta que protagoniza junto a mim uma aproximação entre os grupos Gambiarra Profana e Folha Cultural Pataxó com um movimento mais centra-do na reprodução centra-do livro independente. E neste contexto, Altair Lisboa e Jonatan Magella, de quem me aproximo visto suas percepções e experiências a partir das propostas de difusão da

(28)

26

ideia do aprender-fazer o próprio livro e o movimento de divulgação, não só da importância do papel da literatura, mas da necessidade da escrita como potencializadora das narrativas, desdobrando-se ao diálogo com outros jovens nas escolas em que trabalham.

Nesse movimento de articulação entre os diferentes espaços de aprendizagens, com-preensões contextuais e perspectivas, me aproximo de outros sujeitos que vão suscitar refle-xões sobre o movimento de interação e a dinâmica educativas na ampliação de saberes: Rosi-lene Jorge dos Ramos, Deley de Acari e Antono Inácio do Nascimento.

No entanto, mesmo considerando que muitos outros/as poetas poderiam ser fundamen-tais para esse diálogo, para suscitar outras reflexões e estimular novas questões para pensar os processos de aprendizagens, sinalizo apenas a existência de múltiplas experiências nestes e noutros contextos populares.

Rosilene Jorge dos Ramos, poeta e professora, nascida na Baixada Fluminense. Sua participação nas rodas de poesia e encontros literários tem início por volta de 1996, ainda quando era estudante, quando se reunia a convite de poetas e amigos para apresentar seus tex-tos ou declamar poesias nos encontros promovidos pelo grupo Desmaio Públiko. Nesses en-contros, procurava-se apresentar um autor ou autora, sua poesia ou produção literária, fosse consagrado ou não. A partir de 2006, Rosilene passa atuar como professora das redes públicas de ensino de Casimiro de Abreu e Macaé, região Norte Fluminense do estado. Sua aproxima-ção com a produaproxima-ção independente se intensifica na articulaaproxima-ção com outros sujeitos que produ-zem literatura fora do circuito da Baixada Fluminense, apresentando sua própria produção poética como esforço de aproximar e estimular seus alunos e alunas à produção de escrita.

Deley de Acari é um poeta e militante com quem participei em encontros e atividades culturais como o evento organizado pelos grupos Gambiarra Profana, Uni-vos e coletivo

Hip-hop O Levante em Nova Aurora (Belford Roxo) no ano de 2010. O nome do Centro

Cul-tural Poeta Deley do Acari é escolhido, tendo em vista o reconhecimento dos sujeitos que estão juntos com Deley na luta diária contra a violência praticada pela política do Estado, im-pondo “práticas de medo” às comunidades. No entanto, faz-se constituir na pesquisa a partir do resgate que faço da experiência na construção de um espaço cultural, em Nova Aurora (Belford Roxo) , e, intercâmbios para promover articulações de práticas culturais comuns para a formação de autonomia dos sujeitos. Igualmente, com Inácio, vou me encontrar em contex-tos diferentes, mas entremeado, pela mesma perspectiva social de práticas culturais pensadas como articulação entre sujeitos, grupos e comunidades.

Nessa compreensão, os sujeitos diante de formas distintas em que se fazem presentes, conjugam, recriam e reinventam suas lógicas próprias de produção de pensar-fazer a vida

(29)

so-27

cial, os saberes, a expressão ou representação de mundo, experiências vividas e memórias através da produção cultural e literária.

Refletindo sobre as práticas culturais me aproximo das ideias de Canclini (2015), de que as culturas são fronteiras e perdem a exclusividade de seu território para ganhar força “em comunicação e conhecimento”. Além do que, no movimento de interação e fluidez, não é so-mente as “artes” que se “desenvolvem em relação com outra”, mas, as narrativas de aconte-cimentos e das experiências vividas por um povo, também se conectam no intercâmbio com outros. Nesse entendimento, as culturas se configuram em processos constituintes nas suas relações cotidianas como prática de ressignificação.

Do mesmo modo, Edward Said (2011; 2007) tece uma compreensão de que toda cultu-ra é permeável e, que é uma “apropriação, de experiências comuns e interdependências de todos os tipos entre culturas diferentes (2011, p.339). Em vista disso, me aproprio dessa ideia para pensar que, quando os grupos se assumem como legítimos no território, tomando a cons-ciência de si, outras imagens se formam em torno desses territórios apropriados, bem como, suas revisões produzem novas relações culturais a partir de sua prática. Em vista disso, a di-mensão educativa é, pensada aqui, como processos de interações culturais e fluidez de entre-cruzamentos de inter-relações pessoais

Ao me referir às práticas culturais, tenho pensado o movimento da ação humana, que não se define necessariamente no lugar, mas a partir do território usado pelos sujeitos na di-nâmica de suas narrativas e da produção de escrita, nos espaços em que suas vozes tornam-se audíveis e na força ativa do uso da palavra como astúcia para denunciar e enunciar um mundo livre e solidário (Freire, 2014; Brandão, 1982). Na apropriação desse uso, tais sujeitos, estabe-lecem laços afetivos, relações de trocas simbólicas e reconfiguram suas singularidades na di-mensão coletiva. Nessa compreensão, penso que a noção de desterritorizar ou

reterritoriali-zar a palavra conjuga com a desmitificação da ideia, tão difundida pelos meios de

comunica-ção de massa, de que só quem “pode” escrever são poetas, escritores/as, intelectuais, filóso-fos, etc., para abrir territórios de linguagens que migram e se cruzam com outras (Canclini, 2015).

Nas relações que as pessoas estabelecem no cotidiano, parece haver uma definição de

poeta que se afirma, nem tanto pelo que ele/ela escreve, mas, sobretudo, pelo que ele/ela

re-presenta naquele contexto social. Para Said (2007), o escritor ou o intelectual pode significar “alguém que deve ser escutado como guia no presente confuso e, ao mesmo tempo, também como líder de uma facção, tendência ou grupo disputando mais poder e influência” (2007, p.147), isso porque, expressa no seu contexto vivido, uma necessidade oriunda da experiência

(30)

28

comum da pronúncia da palavra. Nesse sentido, os sujeitos da linguagem poética, têm um sentido de colaboração do que é vivido e percebido pelas pessoas comuns para possibilitar uma experiência dialógica de uma estética cotidiana.

Enquanto processos itinerantes de aprendizagens e de interação,apreendo uma noção de que as práticas quase sempre estão em colaboração e, no plano da produção literária, vão se constituindo no domínio da palavra e da pronúncia do mundo. Assim, me debruço a pensar algumas questões como:

 Que mudanças sócio-cultural-política-econômicas favoreceram, ou não, a per-cepção da realidade social?

 Tais mudanças são fruto de que perspectiva societária?

 Como tais perspectivas se relacionam a uma pedagogia libertadora e emancipa-tória? Existe este viés?

 Poderíamos pensar uma educação popular em uma sociedade de constantes ne-gociações capital-trabalho que aprofundam a esteira da exploração humana di-ante das pressões internacionais, sem de fato uma perspectiva de transformação construída com as classes populares?

Essas questões são problematizações que não têm a função de serem respondidas, mas apontar caminhos possíveis para pensar a dimensão educativa das práticas culturais, para fa-vorecer a construção de uma sociedade livre da exploração humana, sem as fronteiras que nos dividem e nos impedem de olhar adiante, com uma saída para além da barbárie.

Aqui, as experiências e as perspectivas dos sujeitos das classes populares são centrais na reconfiguração dos movimentos de cultura popular, entrecruzando-se na experiência estéti-ca, na interação social, como esforço da reprodução de suas representações, a respeito de co-mo constroem seus laços afetivos-culturais, de coco-mo potencializam seus conhecimentos e reconfiguram suas ações.

Referências

Documentos relacionados

Vários são os produtos industriais importantes derivados do óleo, como: Nylon 11 - obtido a partir do metil ricinoleato (Rilsan ), óleo hidrogenado ou cera para borrachas

Na primeira semana pós-parto (que engloba o período de contacto com as mulheres) em alternativa aos fármacos, quando já existe alguma dor e desconforto, estratégias

A dissertação se alicerça nas normas do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE (anexo A), estruturada em

Considerando a linguagem em sua dimensão social, a língua escrita como uma competência desenvolvida progressivamente a partir dos processos de socialização em meios que demandam

O objetivo deste trabalho é mostrar como dimensionar recursos para o setor de serviços através da matriz de insumo-produto, utilizando como exemplo um serviço

Assim, ao elegermos a Ilha de Caratateua como lócus desta pesquisa, asseguramos a sua relevância, uma vez que, nos trabalhos consultados especificamente sobre Juventude, Cultura

Após a colheita, normalmente é necessário aguar- dar alguns dias, cerca de 10 a 15 dias dependendo da cultivar e das condições meteorológicas, para que a pele dos tubérculos continue

Os resultados revelam que os estudantes apresentaram dificuldades na elaboração dos mapas conceituais devido a não utilização deste instrumento no processo de ensino, porém