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Freqüência de queimadas durante secas recentes

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a s ú lt i m a s d u a s d é c a d a s, as queimadas na Amazônia

têm sido foco de inúmeras pesquisas cientificas visando a entender sua freqüência de ocorrência, seus impactos na vege-tação e no clima e o potencial efeito das mudanças ambientais sobre esses eventos (Uhl e Kauffman, 1990; Cochrane et al., 1999; Cochrane e Schulze, 1999; Rosenfeld, 1999; Ackerman et al., 2000; Laurance e Williamson, 2001; Laurance et al., 2001; Co-chrane e Laurance, 2002; Barlow e Peres, 2004a; Nepstad et al., 2004; Artaxo et al. 2005; Aragão et al., 2007; Aragão et al., 2008; Aragão e Shimabukuro, 2010). Atualmente, as pesquisas têm se concentrado em entender o futuro potencial incremento de quei-madas devido às mudanças climáticas e aos mecanismos de retro-alimentação entre desmatamento, queimadas e secas (Cochrane et al., 1999; Laurance e Williamson, 2001; Alencar et al., 2006; Aragão et al., 2008).

Esta preocupação recente se deve ao fato de alguns modelos

Freqüência de queimadas durante secas recentes

L. E. O. C. Aragão, Y. E. Shimabukuro, M. Cardoso, L. O. Anderson, A. Lima, B. Poulter

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de circulação global preverem que, futuramente, o clima Amazô-nico ficará mais seco devido às alterações nos padrões de circu-lação atmosférica global induzidos pelo aquecimento do planeta (Li et al., 2006). Este efeito de seca pode ter conseqüências catas-tróficas para o bioma Amazônico, incluindo uma potencial perda de biomassa, acelerando os efeitos das mudanças climáticas (Cox et al., 2004). Além do efeito direto na vegetação (Phillips et al., 2009), espera-se que a redução de chuvas sobre a Amazônia ca-talise o sinergismo entre as forçantes antropogênicas, como, por exemplo, desmatamento e queimadas (Cochrane e Laurance, 2002; Hutyra et al., 2005).

Os mecanismos responsáveis pela ocorrência desse processo de retroalimentação podem ser descritos da seguinte forma: sa-bemos que secas reduzem a produtividade florestal, aumentam a mortalidade de arvores e a perda de folhas (Phillips et al., 2009). Estes processos levam a um aumento da abertura do dossel e, consequentemente, a um aumento da radiação solar incidente e das temperaturas no interior do dossel, que favorecem o rápido secamento do material orgânico acumulado sobre o solo. Por-tanto, florestas sujeitas a tais condições, naturalmente, tornam--se mais vulneráveis a queimadas. No entanto, a vulnerabilidade dessas florestas e a probabilidade de queimadas podem ser inten-sificadas devido à interação entre secas e degradação, incluindo efeito de borda, corte seletivo e desmatamento (Uhl e Kauffman, 1990; Cochrane et al., 1999; Cochrane e Schulze, 1999; Barlow e Peres, 2004b; Nepstad et al., 2004). Além disso, grandes áreas desmatadas (Laurance e Williamson, 2001; Laurance et al., 2002; Nobre et al., 1991; Silva Dias et al., 2005; Costa et al., 2007) e a fumaça proveniente de queimadas (Rosenfeld, 1999; Ackerman et al., 2000; Artaxo et al., 2005) podem causar redução na preci-pitação local.

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Os mecanismos descritos acima retratam uma série de inte-rações que causam um ciclo de retroalimentação positivo entre secas e queimadas. Este ciclo tem o potencial de intensificar a vulnerabilidade da floresta Amazônica às mudanças climáticas. Sendo este um importante tópico para entendermos e prevermos os efeitos de mudanças climáticas no futuro funcionamento da Amazônia e estabelecermos estratégias de mitigação e adaptação frente a essas mudanças, este capítulo tem como principais obje-tivos:

1) Identificar os mecanismos responsáveis pela variação da freqüência de queimadas na Amazônia recentemente.

2) Quantificar as relações entre secas extremas recentes e queimadas na Amazônia, com foco especial nas secas de 2005 e 2010.

13.1 Mecanismos responsáveis pela variação na freqüência

de queimadas

a) Influência antrópica

Queimadas naturais no bioma Amazônico são raras (Cochra-ne, 2003; Bush et al., 2007), sendo estas historicamente mais co-muns no bioma Cerrado. Isto se deve, principalmente, ao clima do Cerrado, que apresenta prolongada temporada de estiagem (5-7 meses) com chuvas mensais abaixo de 100 mm, produzindo condições propícias para a ocorrência de queimadas naturais. No entanto, esse padrão natural não sereflete nas observações recen-tes de ocorrência de queimadas na região amazônica. Por exem-plo, Aragão e Shimabukuro (2010) analisaram uma série temporal de focos de calor (1998 a 2006), detectados pelo sensor AVHRR

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a bordo do satélite NOAA-12, e quantificaram uma tendência de aumento de queimadas em 42% da Amazônia brasileira. Por outro lado, utilizando essa mesma metodologia, foi possível veri-ficar uma tendência de diminuição de queimadas na região do Cerrado. Estes resultados, além de destacarem a importância das queimadas em áreas com probabilidade de ocorrência extrema-mente baixas, também contradizem muitas feições do resultado de modelos conceituais criados com o objetivo de auxiliar toma-dores de decisão no combate a queimadas (ex. Arima et al, 2007) (Figura 13.1).

Figura 13.1 Análise de tendência temporal utilizando dados de focos ativos detectados pelo AVHRR/NOAA-12 durante o período de 1998-2006. Nos painéis A e B tons do amarelo para o vermelho indicam tendência positiva de queimadas durante este intervalo de tempo e do verde claro para escuro, tendências negativas. Painel A destaca a região de floresta ombrofila, enquanto o painel B foca no Bioma Cerrado. O Painel C apresenta os resultados do modelo de probabilidade de fogo proposto por Arima et al. (2007), que falha em capturar as tendências demonstradas com os dados.

Portanto, por qual razão as queimadas na Amazônia Legal estão aumentando na área de floresta ombrófila densa (FOD), diminuindo na região do cerrado e, consequentemente, contradi-zendo modelos conceituais?

Como mencionado inicialmente, queimadas naturais são eventos extremamente raros na Amazônia. Durante a época Pré--Colombiana, estima-se que o intervalo de recorrência de quei-madas nas florestas da Amazônia era de cerca de 400 a 700 anos,

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e estavam provavelmente associados à secas severas (Meggers, 1994). Por outro lado estima-se que, atualmente, o intervalo de recorrência desses eventos tenha se reduzido para 5 a 15 anos como conseqüência do crescimento econômico e populacional ocorrido na região Amazônica desde finais da década de 60 (Gol-dammer, 1990; Cochrane et al., 1999; Alencar et al., 2006). Vol-tando à pergunta, focaremos inicialmente no fator uso da terra. Este é, talvez, o mais importante na regulação da atual ocorrên-cia de queimadas na Amazônia. Atividades assoocorrên-ciadas ao uso da terra geram fontes de ignição e, consequente, a ocorrência do fogo em áreas que outrora eram inafetadas por incêndios. Na área de FOD, podemos quantitativamente associar queimadas ao desmatamento (Aragão et al., 2008). No entanto, mesmo com a redução do desmatamento, as queimadas continuam aumentan-do em muitas áreas da Amazônia. Aragão e Shimabukuro (2010) hipotetizaram que este padrão poderia estar associado à conver-são de florestas secundárias (Fearnside et al., 2007) e ao aumento de fragmentos e áreas de borda (Broadbent et al., 2008) que são mais vulneráveis ao escape do fogo. Por outro lado, a redução de queimadas no Cerrado pode estar associada à agricultura meca-nizada (Aragão e Shimabukuro, 2010), que normalmente não é acompanhada por fogo (Eva e Lambin, 1998). Esse detalhamento de processos, principalmente aqueles relacionados ao tipo de uso da terra, não é normalmente capturado pelos atuais modelos e precisa ser mais bem entendido para que possamos fazer previ-sões realísticas do efeito antrópico na Amazônia, auxiliando efeti-vamente as políticas públicas.

b) Clima

Uma vez que as fontes de ignição estão estabelecidas e ativas, o clima passa a ter um papel fundamental na ocorrência de quei-madas. Algumas das variáveis climáticas mais importantes na

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de-terminação da freqüência de queimadas na Amazônia são: chuva, temperatura, umidade relativa (Cardoso et al., 2003; Sismano-glu e Setzer, 2005), água do solo disponível para plantas (PAW) (Nepstad et al., 2004) e o déficit de pressão de vapor (VPD) den-tro do dossel (Ray et al., 2005). A sazonalidade destas variáveis, que normalmente covariam, determina o período de ocorrência e intensidade (a intensidade também depende da disponibilidade de material combustível) das queimadas na Amazônia. Na maior parte da região Amazônica, as queimadas tendem a se intensificar durante os meses de julho, agosto e setembro (Figura 13.2). Este período corresponde à estação seca com chuvas mensais abaixo de 100 mm, elevadas VPD, baixa PAW, principalmente nas partes sul e leste da Amazônia. A Figura 13.2 além de mostrar a asso-ciação entre chuva e queimadas sazonais na Amazônia, também destaca a maior ocorrência de queimadas seguindo o Arco do Desmatamento, área na qual se concentra a maioria da atividade de uso da terra.

Figura 13.2 Média acumulada por trimestre de (painel superior) chuvas medida pelo sen-sor TRMM e (painel inferior) número de focos de calor do sensen-sor AVHRR/NOAA-12.

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No entanto, este problema pode ser exacerbado em condi-ções de secas extremas como as recentemente ocorridas na Ama-zônia, 1997/1998, 2005 e 2010. A maior parte das secas severas ocorridas na Amazônia está intimamente associada aos eventos de El Niños, tais como os ocorridos em 1982/1983, 1986/1987 e 1997/1998, que consiste no aquecimento das águas do Oceano Pacifico equatorial junto as costa do Peru (Marengo, 1992; Uvo et al., 1998; Ronchail et al., 2002; Marengo 2004). Diferentemente dos eventos citados acima, outro fenômeno tem sido apontado como causador das secas amazônicas atuais, o aquecimento da superfície das águas do Oceano Atlântico equatorial, seguindo um ciclo conhecido como Oscilação Multidecadal do Atlantico (AMO) (Li et al. 2006; Good et al., 2008; Marengo et al., 2008). Apesar de ser considerado um ciclo natural, alguns estudos indi-cam que este aquecimento pode estar relacionado com as mu-danças climáticas globais (Cox et al., 2008). A AMO foi identifi-cada como parcialmente responsável pela severa seca de 1997/98, e principal causadora das secas de 2005 (Marengo et al., 2008) e 2010 (Marengo et al., 2011).

O maior problema que enfrentamos no século 21 em relação às queimadas na Amazônia é o fato de que as secas extremas se-guem uma tendência de intensificação em relação aos padrões observados durante o século passado. Comparando as estimativas de máximo déficit hídrico acumulado anualmente (MCWD), calculados a partir das saídas dos modelos do IPCC, percebe-se, claramente, a partir do ano 2000, um aumento da freqüência de anos com maior déficit hídrico (Figura 13.3). Este padrão está potencialmente associado com a redução de chuvas durante o período mais seco do ano na Amazônia, proporcionando um au-mento da extensão da estação seca na região.

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Figura 13.3 Máximo Déficit hídrico climatológico baseado nos valores de chuva produzi-dos pelos modelos do IPCC-AR4. A linha vermelha indica o valor médio de 1900 a 2000 em comparacão a média entre 2000 e 2100.

Assim, torna-se extremamente importante refinar nosso co-nhecimento atual, não só sobre os fatores que influenciam as queimadas, mas também sobre como estas respondem às secas extremas, com o objetivo de explorar potenciais impactos futuros. As próximas seções deste capítulo, portanto, tratam da influência dos eventos extremos recentes na distribuição das queimadas nos ecossistemas amazônicos.

13.2 Secas extremas e queimadas na Amazônia Legal

brasileira

a) Temperatura da superfície do mar, redução de chuva e quei-madas

Conforme discutido anteriormente, ao contrário das secas que ocorreram antes de 1997/1998, fortemente relacionadas com o fe-nômeno de El Niño (Marengo, 1992; Uvo et al., 1998; Ronchail et al., 2002; Marengo, 2004), as secas atuais parecem estar predomi-nantemente associadas ao fenômeno AMO. Analisando uma sé-rie temporal recente (2002-2010) dos dados de anomalias do AMO

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produzidos pelo NOAA, foi possível demonstrar uma relação negativa significativa (p<0.001) entre as anomalias mensais do AMO e chuva na Amazônia, indicando a redução de chuvas com o aumento das anomalias AMO. Esta relação, por outro lado, não foi observada entre as anomalias de ENSO e chuva. Este resul-tado pode indicar a predominância do AMO sobre o ENSO na determinação dos padrões de chuva recentes. No entanto, é im-portante ressaltar que o ENSO afeta principalmente as áreas ao norte e leste da Amazônia. Como uma fração da região norte da Amazônia se encontra no hemisfério norte, e, portanto com um padrão oposto de chuva ao observado na parte Austral, quando analisamos a Amazônia como um todo, o efeito do ENSO pode ser cancelado, devido a esta oposição das estações chuvosa e seca nos hemisférios norte e sul.

Como esperado, devido à redução de chuvas com o aumento das anomalias na temperatura das águas do Atlântico observa-se um aumento de queimadas. O aumento das anomalias relacio-nadas ao AMO define a capacidade máxima (representada pela regressão linear utilizando o quartil de 90%) de ocorrência de queimadas na Amazônia e no Cerrado. Além disso, a análise des-ses dados demonstrou que a capacidade máxima de ocorrência de queimadas é maior no bioma Amazônia que no bioma Cerrado, possivelmente pela maior área e maior disponibilidade de mate-rial combustível. Um detalhe interessante é a dispersão dos valo-res de queimadas para diferentes valovalo-res de anomalias de AMO, mostrando que, mesmo com elevada anomalia, pode existir baixa ocorrência de queimada. Dois fatores explicam este padrão: (1) as anomalias ocorreram durante a época chuvosa, ou (2) ocorreram durante períodos de baixa atividade humana, neste caso minimi-zando as fontes de ignição (Figura 13.4).

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Figura 13.4 Regressão linear utilizando o quartil de 90% entre anomalias de AMO (es-querda) e ENSO (direita) para os biomas Amazônia (acima – pontos verdes) e Cerrado (abaixo – pontos laranja).

Não foram observadas relações claras entre as queimadas e as anomalias do ENSO durante o período analisado. No entanto, sabemos que o ENSO em sua fase de El Niño também intensi-fica a ocorrência de queimadas (Alencar et al., 2004; Alencar et al., 2006)

Como ressaltado acima, existe uma relação significativa entre chuva e queimadas. Observa-se um aumento drástico de queima-das quando as chuvas são reduziqueima-das a menos de 100 mm por mês em ambos os biomas, Amazônia e Cerrado (Figura 13.5).

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Figura 13.5 Relacão entre o total de focos de calor mensais detectados com o sensor MODIS-TERRA e a chuva mensal do sensor TRMM para a Amazonia e Cerrado.

A dispersão dos dados na Figura 13.5 é explicada pela época que as queimadas ocorrem. Focaremos, para exemplificar este fato, no número de focos de calor ocorridos no bioma Amazônia. Nota-se que um máximo de 5000 queimadas ocorre com chuva mensal aproximadamente igual a 50 mm. Por que uma variação tão grande nos valores mensais de queimadas? Claramente, nos meses que compõe o início da estação seca, o número de queima-das é menor devido à secagem incompleta do material combus-tível. No entanto, no final da estação seca, para um mesmo valor de chuva, o número de queimadas é significativamente maior, refletindo o processo de secagem do material combustível duran-te o período seco.

No tópico seguinte exploraremos os padrões espaciais de fre-qüência de queima durante a seca extrema de 2005.

b) Freqüência de queimadas durante a seca de 2005

Anomalias negativas de chuva em 2005 começaram a ser ob-servadas no segundo trimestre do ano (abril, maio, junho), con-tudo, não foi observado um aumento extensivo de queimadas du-rante este período de transição entre estação chuvosa e seca. Este

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padrão reflete as observações descritas acima, que mostra menor número de queimadas no início da estação seca em comparação com o final dessa estação. Por outro lado, as anomalias negativas de chuva se intensificaram no terceiro trimestre (julho, agosto, se-tembro), seguidas por anomalias positivas de focos de calor. Neste período de seca intensa foi observado um aumento de 33% no número de queimadas na Amazônia em relação à média (Aragão et al., 2007).

Com base em detecções feitas com o sensor TRMM-VIRS (Tropical Rainfall Measuring Mission - Visible and Infrared Scan-ner), Cardoso et al. (2007) também identificaram aumentos na atividade do fogo associados aos baixos valores de precipitação durante a seca de 2005. Usando médias espaciais do número de focos de calor entre 1998 e 2005, os referidos autores identifica-ram que, nas sub-bacias ao leste (principalmente Tapajós, Xingu e Paru), a atividade do fogo em 2005 foi tão grande quanto duran-te o El Niño de 1998, e nas sub-bacias a oesduran-te e sudoesduran-te (Madeira e ao oeste, e ao sul do Negro) os máximos de focos foram detec-tados em 2005.

Outro fato interessante é que as queimadas se concentraram, principalmente, ao longo do arco de desmatamento, onde a ati-vidade humana é intensa. Se focarmos na fronteira entre Brasil e Peru, a associação entre queimadas e atividade humana fica mais clara. Apesar da ocorrência de anomalias negativas de chuva no lado peruano, não observamos uma intensificação de queimadas como aquela observada em seu vizinho mais próximo, o estado do Acre (Figura 13.6). Isso demonstra claramente que existe a necessidade de ignição antrópica para ocorrência de queimadas, mesmo durante secas extremas na Amazônia.

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Figura 13.6 Anomalias trimestrais de (painel superior) chuvas e (painel inferior) número de focos de calor durante a seca de 2005. Tons de vermelho indicam valores de chuva menores que a média e valores de focos de calor maiores que a média, os tons de azul indicam o reverso.

Aragão et al. (2008) quantificou a relação entre desmatamen-to e queimadas em anos normais e calculou que durante a seca de 2005 o número de queimadas por área desmatada aumentou cerca de 45%. A ausência de chuvas promove um aumento de queimadas relacionadas ao uso da terra na Amazônia, no entanto, durante secas extremas essa freqüência é elevada não somente pela combustão mais completa do material em áreas desmata-das permitindo múltiplas detecções de focos ativos pelos satélites, como também devido ao freqüente escape do fogo para bordas de florestas adjacentes a desmatamentos.

Portanto, será que podemos observar essas mesmas característi-cas ao comparar a freqüência de queimadas durante 2005 e 2010?

c) Comparação entre 2005 e 2010

Durante o ano de 2005, cerca de 6000 e 2000 focos de calor (MODIS/Terra) foram detectados nos bioma Amazônia e Cerra-do, respectivamente. Já para 2010, este número foi reduzido dra-maticamente para a Amazônia (aproximadamente 1000 focos),

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provavelmente seguindo a tendência de decréscimo das taxas de desmatamento na região. No entanto, para o Cerrado a diferença entre 2005 e 2010 foi mínima. Em 2010, ao contrário do que foi observado para 2005, à predominância de queimadas ocorreu no bioma Cerrado (Figura 13.7).

Figura 13.7 Número de focos de calor durante os anos de seca em 2005 e 2010 para os biomas Cerrado e Amazonia.

Em 2010, apesar de uma redução de 66% das taxas de desmata-mento observadas em 2005, quantificou-se apenas 6% de redução no número de queimadas por área desmatada em 2010 com re-lação a 2005. Além disso, em 2005 foi observada uma freqüência de queimadas por unidade de área desmatada 45% maior que a media de focos (0.53 focos por km2 desmatado), enquanto para

2010 esse valor foi 36% maior que a média.

Fica claro que, apesar da diminuição das fontes antropogêni-cas de ignição com a redução do desmatamento e consequente diminuição do número absoluto que focos de calor, secas extre-mas como as ocorridas em 2005 e 2010 promovem condições fa-voráveis para o aumento da freqüência de queimadas por unidade de área desmatada em relação aos anos “normais”. Torna-se inte-ressante ressaltar que 2010 foi o ano com a menor taxa de desma-tamento já registrada, mesmo assim o número de focos de calor por área desmatada foi significativamente maior que os anos de 2003 e 2004, quando o desmatamento na Amazônia atingiu seu

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ápice (Figura 13.8). Podemos associar esse padrão a fatores com combustão mais completa do material vegetal, combustão de ma-terial proveniente de desmatamento de vegetação secundária não contabilizada pelo PRODES como também a queima de bordas de florestas e áreas degradadas que durante secas extremas ficam mais suscetíveis ao escape do fogo proveniente de áreas adjacentes.

Figura 13.8 Linha vermelha representa as taxas de desmatamento anual de 2003-2010 e as barras azuis o número anual de focos de calor normalizado pela area desmatada.

13.3 Conclusão

Neste capítulo identificamos os mecanismos responsáveis pelas alterações na freqüência de queimadas na Amazônia. Concluí-mos que o clima tem um papel importante no aumento das quei-madas na Amazônia, mas, essencialmente, o uso da terra parece ser peça fundamental para que essas queimadas ocorram. Sem

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fontes de ignição, mesmo em condições climáticas extremas é pequena a probabilidade de ocorrência de queimadas naturais. Além disso, concluímos que a seca de 2005 propiciou a ocorrên-cia de mais focos de calor na Amazônia que a seca de 2010. No entanto, houve uma predominância de queimadas no bioma Cer-rado durante 2010. Fato interessante mostCer-rado neste capítulo foi o elevado número de queimadas normalizado pela área desmatada em 2010. Este resultado demonstrou que durante secas extremas na Amazônia, mais queimadas por unidade de área desmatada são observadas, indicando a queima de material proveniente de outras fontes além do desmatamento de florestas maduras moni-torado pelo PRODES.

Portanto, com a possibilidade de aumento da freqüência de secas na Amazônia, torna-se indispensável um planejamento para mitigação de queimadas nesta região. Coibir as fontes de ignição antrópica pode anular o efeito de secas extremas na determinação dos padrões de queimadas na Amazônia.

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