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MINUTO ECONÔMICO. Do Bolsa Família ao Auxílio Emergencial: evidências sobre programas de transferência de renda no Brasil RELATÓRIO MARÇO 2021

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M aur is ligula sollicitudin. M aec enas netus , viv

amus mollis dui.

MINUTO ECONÔMICO

Do Bolsa Família ao Auxílio

Emergencial: evidências sobre

programas de transferência de

renda no Brasil

RELATÓRIO | MARÇO 2021

Comentários de Daniel Couri

e Pedro Fernando Nery

(2)

i

Origem e aspectos gerais do Programa

Bolsa Família - por Angelo Victor R. de Souza Carvalho

ii

Impactos do Bolsa Família:

indicadores-chave - por Henrique Castilho Del'Esposti

iii

Os impactos secundários do

Bolsa Família - por Ana Clara Souza Del Monte

iv

A pandemia e o Auxílio Emergencial:

uma rede de proteção necessária

- por Renan Rodrigues Torres

Do Bolsa Família ao Auxílio Emergencial

:

evidências sobre programas de transferência

de renda no Brasil

Prefácio: breves comentários sobre

a obra - por Daniel Couri e Pedro Fernando Nery

Introdução

3

5

6

8

14

20

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Daniel Couri1

O Pantawid Pamilya Pilipino Program é um programa de transferência de renda criado em 2007 pelas Filipinas. Por meio dele, apro-ximadamente 20 milhões de filipinos, um quinto da população, recebem um benefício do governo com a condição de manterem as crianças na escola e realizarem acompanha-mento da sua saúde. Há muitas semelhanças entre o programa asiático e o Bolsa Família. E elas não são coincidência. O Pantawid Pa-milya foi totalmente inspirado na bem suce-dida experiência brasileira.

Além do Brasil e das Filipinas, cerca de seten-ta países criaram programas de transferência condicionada de renda nas últimas décadas. Na média, se caracterizam pelo êxito na re-dução da pobreza e da extrema pobreza, es-pecialmente em países de baixa renda ou em desenvolvimento. No Brasil, em particular, o Bolsa Família poderia ser o modelo para as outras políticas públicas: desenho com base em evidência, monitoramento

permanen-1 Economista pela Universidade de Brasília (UnB), pós-graduado em orçamento público pelo Instituto Serzedello Corrêa (ISC/ TCU) e mestre em economia do setor público pela UnB. Diretor da Instituição Fiscal Independente do Senado Federal

te, coordenação interfederativa e avaliação sistemática.

Não deixa de surpreender que, diante de inúmeros resultados favoráveis, no Brasil e no mundo, programas como o Bolsa Família ainda sejam estigmatizados por boa parte das pessoas. O represamento da concessão de benefícios, que gerou uma fila de 500 mil famílias no início de 2020 é, em alguma me-dida, reflexo disso. Se o programa tem efei-tos positivos sobre educação, saúde e até mesmo empregabilidade, por que ser pre-terido na disputa por espaço no Orçamento? Apenas 2% do gasto federal vai para o Bolsa Família.

O e-book escrito por Ana Clara Del Monte, Angelo Carvalho, Henrique Del'Esposti e Re-nan Torres contribui para a disseminação do conhecimento adquirido nos dezessete anos de vigência do programa, sem se limitar a ser um mero compêndio de evidências. O texto tem ainda o cuidado de inserir a discussão sobre o Bolsa Família no contexto da

Breves comentários

sobre a obra

.

(4)

pandemia, mostrando como ela escancarou a necessidade de se aperfeiçoar a proteção social no país. Leitura fundamental para to-dos que se interessam pelo tema.

Pedro Fernando Nery2

O Bolsa Família é um programa fundamental para dezenas de milhões de brasileiros, mas ainda é desconhecido por boa parte da socie-dade. É comum a desinformação e equívo-cos quando se fala do benefício. Ao mesmo tempo, pouco se conhece das centenas de pesquisas investigando o resultado desses pagamentos em diversas áreas, de nutrição à educação. Por isso, este texto é tão impor-tante, divulgando de forma didática o conhe-cimento acadêmico sobre o Bolsa.

Em uma época em que tanto se fala de respeito à ciência, é preciso que esse lema também oriente as políticas públicas, inclusi-ve as políticas sociais. Neste texto, a ciência sobre o Bolsa Família e o auxílio emergen-cial é cuidadosamente explicada por Ana Clara Souza Del Monte, Angelo Victor R. de Souza Carvalho, Henrique Castilho Del'Es-posti e Renan Rodrigues Torres. A leitura vale para estudantes, pesquisadores, jornalistas e formuladores de políticas públicas com inte-resse no tema.

2 Doutor, Mestre e Bacharel em Economia pela Universidade de Brasília. Consultor Legislativo do Senado Federal, na área de Economia do Trabalho, Renda e Previdência.

(5)

Introdução

.

A pandemia do novo coronavírus escancarou velhas mazelas do Brasil. Com a chegada de um vírus desconhecido, milhões de brasile-iros sofreram com a perda parcial ou total de sua renda. O Bolsa Família, principal política social do país nos últimos anos, apresen-tava filas de beneficiários quando as princi-pais políticas de distanciamento social foram tomadas no Brasil.

À medida que a pandemia avançava no Brasil e no mundo, o debate público e os agentes governamentais discutiam a necessidade de uma rede de proteção mais sólida, visando principalmente os mais vulneráveis ao tra-balho formal. Dessa forma, o país consolidou o que seria o maior programa de transferên-cia de renda da história: o Auxílio Emergen-cial.

O programa, que disponibilizou em benefícios o mesmo que o Bolsa Família em dez anos, atingiu um terço da população brasileira. Com uma política tão robusta em mãos, é essencial que a sociedade busque entender os impactos sociais, econômicos e fiscais dessas medidas.

Assim, a proposta desse relatório é traçar um horizonte de revisão sobre os principais estudos, trabalhos e pesquisas que, de algu-ma foralgu-ma, nos auxiliam no entendimento das políticas de transferência de renda no Brasil. Por isso, as três primeiras seções abordam o Bolsa Família, a tradicional política brasileira que foi massivamente estudada ao redor do mundo. A última seção, então, traz à tona o impacto do Auxílio Emergencial e algumas perspectivas para o seu futuro enquanto política pública.

O nosso objetivo, enquanto iniciativa que busca traduzir o economês para o português, é aproximar o leitor mais distante do debate acadêmico sobre políticas sociais.

Por fim, o Minuto Econômico solenemente agradece aos senhores Daniel Veloso Couri e Pedro Fernando Nery pelos comentários, sugestões e apoio no decorrer da produção deste documento. O apoio daqueles que ad-miramos é um combustível único para con-tinuar nossa trajetória!

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Origem e aspecto

gerais do Programa

Bolsa Família

.

O Programa Bolsa Família (PBF) pertence à espécie dos programas de transferência de renda condicionada, ou Conditional Cash Transfer, em inglês (PTCs e CCTs, respecti-vamente). Isso significa que o recebimento do benefício é condicionado ao cummento de determinadas obrigações. O pri-meiro registro desse desenho de programa data de 1990, em Honduras, no Programa de Asignación Familiar, onde a transferência se destinava às famílias mais pobres, e cujas condicionalidades eram, em sua maioria, re-ferentes à frequência escolar e acompanha-mento de saúde, que falharam em ser moni-toradas (MOORE, 2007)1.

No Brasil, antes de existir o Bolsa Família, já tínhamos alguma experiência com PTCs, mas a nível municipal e estadual. Em 1995, no Distrito Federal e na prefeitura de Campinas, foi implementado o Programa Bolsa Familiar

1 MOORE, C. Assessing Honduras CCT Programme PRAF, Programa de Asignación Familiar: expected and unexpected realities. Brasília: International policy centre for inclusive growth, 2007 (Country Study, n. 15).

2 SOARES, Fabio Veras . PARA ONDE CAMINHAM OS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA CONDICIONADAS? AS EXPERIÊNCIAS COMPARADAS DO BRASIL, MÉXICO, CHILE E URUGUAI. In: CASTRO, Jorge Abrahão de (org.). Bolsa família 2003-2010: avanços e desafios. Brasília: Ipea, 2010. pp. 137-168.

para a Educação e o Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima, respectivamente. No programa do Distrito Federal o benefício era concentrado para crianças de famílias pobres, entre 7 e 14 anos, e a condicionali-dade era a frequência escolar. Já o progra-ma de Campinas se destinava a famílias em situação de extrema pobreza, com crianças até os 14 anos, e era condicionado a moni-toramentos escolares, de saúde, e atividades socioeducativas (SOARES, 2010).2

O PBF foi instituído através da Medida Provi-sória n° 132, em outubro de 2003, mais tarde convertida na Lei n° 10.836/2004. O progra-ma foi inicialmente gerido pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), que a partir do governo Bolsonaro foi incorporado ao-Ministério da Cidadania. Sua criação se deu pela unificação de quatro outros programas,

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o Bolsa Escola, Bolsa alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás, todos criados en-tre o período de 2001 e 2003. Essa unificação permitiu maior eficiência ao programa, uma vez que cada um contava com diferentes fontes de recursos, diferentes agências de administração e uma base de dados parti-cular. O resultado da unificação, portanto, foi a redução da burocracia, além de garantir maior controle dos recursos e permitir me-lhor focalização.

O foco do PBF são famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, cujos critérios de elegibilidade são: ter renda mensal de até R$ 89,00 por pessoa, para famílias extremamen-te pobres, ou estar na faixa de renda mensal entre R$ 89,01 e R$ 178,00 por pessoa, para famílias pobres, com a condicionante de ter, em sua composição, gestantes e crianças ou adolescentes entre 0 e 17 anos.

Destaca-se que seu desenho é feito de tal forma que famílias que receberam o benefí-cio, mas que agora se encontram acima da li-nha de elegibilidade, ainda recebam a trans-ferência por dois anos, pois se assim não o fosse, o programa poderia se tornar um custo que as famílias teriam de ponderar ao se en-gajar no trabalho formal.

Os benefícios são divididos em diferentes categorias: o chamado Benefício Básico é concedido às famílias em situação de po-breza extrema, onde o auxílio é de R$ 89,00 mensais. Já o Benefício Variável, pode ser concedido tanto às famílias em situação de pobreza quanto extrema pobreza, mas o va-lor do recebimento é condicionado à

com-3 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 15. 201com-3

posição da família. Ou seja, caso contenha gestantes, nutrizes (mães que amamentam) ou crianças e adolescentes de 0 a 15 anos. Os valores de cada variável são de R$ 41,00, mas cada família pode acumular somente até cin-co benefícios variáveis.

Existe ainda o Benefício para Superação da Extrema Pobreza, cujo valor depende da ren-da de caren-da integrante. Como o nome sugere, é destinado para famílias em extrema pobre-za. Além dele, há o Benefício Variável Jovem, destinado para adolescentes entre 16 e 17 anos, com valor mensal de R$ 48,00 e limi-te de dois benefícios por família. Atualmenlimi-te, aproximadamente 14 milhões de famílias são beneficiadas pelo programa.

As prefeituras são responsáveis por cadas-trar as famílias na base de dados do Cadas-tro Único (CadÚnico), onde a elegibilidade depende do cálculo de renda per capita de cada família, a partir da renda autodeclara-da. O CadÚnico foi criado em 2001, em meio ao período de estabilização macroeconômi-ca. Completará 20 anos em 2021 e funciona como base de dados também para o Minha Casa, Minha Vida, Bolsa Verde, Fomento, en-tre outros programas.

O objetivo geral do programa é atingir fa-mílias em situação de miséria, garantindo a inclusão social. Almejava também melhorar indicadores na saúde e na educação, para romper com o ciclo intergeracional de repro-dução da pobreza (CAMPELLO, 2013)3.

Sua condicionalidade funciona pelo acom-panhamento do estado de saúde, como o

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cumprimento do calendário de vacinação, e a matrícula e acompanhamento da frequên-cia escolar das crianças. A sistematização e o resultado do acompanhamento das condi-cionalidades é hoje de responsabilidade do Ministério da Cidadania.

Como um programa de transferência de ren-da que tem como objetivo o combate à ex-trema pobreza e à pobreza, é de se esperar que os impactos mais notáveis dessa política girem em torno dos indicadores relaciona-dos a esse problema. Além disso, devido aos moldes de funcionamento do programa, os índices que medem a desigualdade também podem ser afetados. Por isso, nesta seção fa-laremos dos impactos do Bolsa Família sobre indicadores-chave de pobreza e desigualda-de.

Antes de apresentar as evidências, vale res-saltar que programas de transferência de renda condicional foram estudados e avalia-dos massivamente em vários países. Com o

4 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD Contínua. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho/17270-PNAD-continua.html?=&t=o-que-e>. Acesso em: 01 de fev. de 2021

Bolsa Família não foi diferente. O nosso foco é na política brasileira, contudo, muitos dos achados ao redor do mundo tendem, apesar de algumas particularidades, a ter similarida-des com os achados no Brasil.

Além disso, para avaliar o impacto do Bol-sa Família sobre os indicadores já citados, muitos estudos usam bases de dados em comum. Por isso, vamos citar algumas. Ge-ralmente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), especificamente a Pes-quisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD)4 são as principais fontes.

Já o recorte temporal varia de acordo com a avaliação, mas são usados com

frequên-Henrique Castilho Del'Esposti

Impactos do Bolsa Família

:

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cia dados anteriores (antes de 2003) e pos-teriores à implementação do PBF. Por fim, grande parte das produções relacionadas também fazem revisão de literatura, ou seja, expõe algumas das evidências produzidas antes de sua contribuição e expõe resulta-dos relacionaresulta-dos à sua pesquisa, para situar o leitor no tema.

Os impactos

Em primeiro lugar, e alinhado com os de-bates mais recentes sobre os repasses do PBF, sabe-se que a eficácia do programa está fortemente ligada ao alívio da pobreza, mas que retira famílias da linha da pobreza somente se a referência de linha da pobreza for baixa5. Em suma, os efeitos sobre as taxas

de pobreza são menores do que os efeitos sobre a intensidade da pobreza. Se um refe-rencial maior for adotado, as famílias conti-nuam sendo pobres, mas um pouco menos que antes. Isso pode estar ligado às quantias relativamente pequenas das transferências (Ipea, 2019).

Para o caso da desigualdade, é possível en-contrar análises dentro de diferentes janelas de tempo. Mesmo assim, todas elas sinali-zam para uma melhora nos indicadores. Dessa forma, sabemos então que o Bolsa Fa-mília teve impacto notável na vida dos bra-sileiros mais pobres. Para uma política que atende um número considerável de famílias e que não ocupa um grande espaço no or-çamento, esses resultados são interessantes. Mas qual a intensidade deles? Isso fica para a próxima subseção!

5 DE SOUZA, Pedro HG et al. Os efeitos do Programa Bolsa Família sobre a pobreza e a desigualdade: Um balanço dos primeiros quinze anos. Texto para discussão, 2019.

Bolsa Família e pobreza

Uma das formas de compararmos os impac-tos sobre a pobreza é comparar dois cenários básicos: a realidade, ou seja, com a interven-ção do Bolsa Família versus o contrafactual, isto é, um diferente contexto sem a imple-mentação da política. Com isso em mente, os gráficos abaixo podem nos ajudar a entender melhor.

Podemos observar que, entre 2003 e 2004, as taxas de pobreza começam a cair de for-ma notável. Esse movimento perde a inten-sidade e se estabiliza. Mais adiante, perto da crise recente iniciada em 2016, a pobreza aumenta novamente. Mas, em resumo, o que esses gráficos e números nos mostram?

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Em suma, esses resultados nos mostram que o Bolsa Família tem um impacto significativo: cerca de 3,4 milhões de pessoas saíram da extrema pobreza e 3,2 milhões superaram a linha da pobreza, em 2017.

Outro fato relevante é que 70% dos mais po-bres e extremamente popo-bres participaram do programa em 2017, segundo a PNAD. Para esse mesmo ano, verificou-se uma redução na pobreza e na extrema pobreza em 15% e 25%, respectivamente.

Mesmo que esses sejam efeitos significa-tivos, esses valores ainda podem ser insufi-cientes para grande parte das famílias, o que implica que as reduções nos índices pode-riam ser mais consideráveis (Ipea, 2019)6.

As famílias pobres costumam vivenciar maior volatilidade de renda, fazendo com que, no caso de uma perda de renda, o benefício seja insuficiente ou, no caso de ganho, a não in-clusão como população pobre, dependendo do momento em que o IBGE realiza as pes-quisas.

Vale ressaltar também que é possível existir desigualdade de renda na própria categoria da pobreza. Assim, outro ponto positivo do programa é reduzir também o nível de desi-gualdade entre as próprias pessoas de baixa renda.

Para entender melhor esse tipo de desigual-dade, podemos tomar como base alguns outros indicadores. Por exemplo, a renda

6 DE SOUZA, Pedro HG et al. Os efeitos do Programa Bolsa Família sobre a pobreza e a desigualdade: Um balanço dos primeiros quinze anos. Texto para discussão, 2019. pp. 10

média dos pobres se encontra abaixo da li-nha da pobreza, mas a distância entre a ren-da média e a linha ren-da pobreza é conheciren-da como hiato de pobreza, medida que indica a intensidade e que varia de 0% a 100%.

Contudo, como o hiato está relacionado à média, ele diz respeito à intensidade da po-breza, mas não à distribuição. Essa, está liga-da à desigualliga-dade entre os próprios pobres. Nesse sentido, o PBF consegue retirar famí-lias da pobreza, amenizar a intensidade dela e reduzir as desigualdades entre os pobres. Existem muitos indicadores na literatura que ajudam a mensurar esses fenômenos. Os in-dicadores P0, P1 e P2 estão entre os mais po-pulares. O primeiro é equivalente à taxa de pobreza, o segundo informa a taxa de pobre-za conjuntamente ao hiato da pobrepobre-za, e o terceiro auxilia na mensuração da desigual-dade entre os pobres.

Vamos exemplificar a interpretação da mes-ma formes-ma que o Ipea faz: os três indicadores são equivalentes se os pobres, em sua tota-lidade, não possuírem renda. À medida que os pobres começam a ter renda, P1 e P2 se distanciam de P0.

Quanto mais a renda média dos pobres au-menta e menos desigual é essa distribuição, P1 e P2 se aproximam de zero e se distan-ciam de P0. Os gráficos abaixo nos mostram como P0, P1 e P2 evoluíram no decorrer do programa, comparando o cenário real com o

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contrafactual (da mesma forma que nos grá-ficos acima).

Em resumo, o Bolsa Família reduz o hiato de pobreza, ou seja, a intensidade da pobreza e também a desigualdade entre as próprias pessoas abaixo da linha da pobreza.

7 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 152. 2013 8 WOLFFENBÜTTEL, Andréa. O que é? - Índice de Gini. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Disponível em: <https:// www.Ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2048:catid=28>. Acesso em: 01 de fev. de 2021

9 IBGE divulga o rendimento domiciliar per capita 2019. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 28 de fev. de 2020. Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/26956-ibge-divulga-o-rendimento-domiciliar-per-capita-2019#:~:text=O%20rendimento%20domiciliar%20per%20capita%20

%C3%A9%20a%20divis%C3%A3o%20dos%20rendimentos,pelo%20peso%20anual%20da%20pesquisa.>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

As evidências apontam mais uma vez o papel fundamental do PBF: taxa de pobreza, inten-sidade da pobreza e a própria desigualdade entre os pobres teriam números mais expres-sivos num cenário de ausência do programa. Outro estudo7 do Ipea também estima que,

entre 2003 e 2011, a pobreza e a extrema po-breza juntas teriam caído de 23,9% para 9,6% da população.

Bolsa Família e desigualdade

Assim como no caso da pobreza, também existem parâmetros para estimar o impacto do PBF sobre a desigualdade. Um dos mais conhecidos é o coeficiente de Gini.8 Também

conhecido como índice de Gini, esse indica-dor varia de 0 a 1 e é usado, geralmente, para medir desigualdades nas distribuições de renda.

Em outras palavras, ele mede a concentra-ção de renda de acordo com as diferenças entre os mais ricos e os mais pobres.

Nesse sentido, o gráfico abaixo auxilia na ob-servação dos efeitos do Bolsa Família sobre a desigualdade tomando como referência estimações dos coeficientes de Gini para a renda domiciliar per capita 9, ou seja, a renda

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total do domicílio dividida pelo número de pessoas no domicílio, comparando cenários com e sem programa.

Essas estimativas incluíram a participação dos programas que antecederam o Bolsa Família. Pode-se observar que eles geraram ligeiros efeitos, mas que, com a presença do PBF e, principalmente após 2004, foram intensificados. Para mais: de acordo com os pesquisadores do Ipea, o Bolsa Família po-deria ter um efeito redistributivo ainda maior, caso o valor das transferências fosse mais generoso.

O estudo do Ipea tentou ainda responder à seguinte questão: “qual a contribuição do PBF para a queda da desigualdade vista nas PNAD?”. Ou seja, ao longo dos anos de reali-zações de PNAD, qual foi a contribuição do Bolsa Família?

Os pesquisadores destacam que, para essas estimativas, não existe contrafactual. Ou seja, se hipoteticamente o PBF tivesse reduzido a desigualdade em 20%, não necessariamente a desigualdade seria 20% maior sem o pro-grama.

Eles também alertam que os resultados são sensíveis ao período de tempo analisado. En-tre 2001 e 2015, por exemplo, a política teria sido responsável por diminuir o coeficiente de Gini em pouco menos de 10%. Contudo, no período de maior expansão do Bolsa Família, entre 2001 e 2006, o programa teria contribu-ído com a queda de, aproximadamente, 17% no índice.

O mais interessante desses resultados é que o PBF tem, em alguns casos, resultados e im-pactos maiores que outras políticas sociais que têm um peso orçamentário muito maior. Diversos outros estudos mostram impactos secundários do PBF sobre a educação, saú-de, mercado de trabalho e taxa de fecundi-dade, por exemplo.

Será que as crianças vão mais à escola e as famílias frequentam mais os postos de saú-de e se vacinam com mais frequência saú-devido ao PBF? As mães querem ter mais filhos para aumentarem seus benefícios com o progra-ma? Os pais e as mães param de trabalhar ou trabalham menos por receberem o bene-fício?

Essas e algumas outras questões serão ex-postas em uma seção à parte.

O Bolsa Família e o cenário de

pandemia

Em 2019, a Medida Provisória 898/2019 de-terminou que a parcela de benefício relativa a dezembro de 2019 fosse paga em dobro, uma espécie de “décimo terceiro” do progra-ma.

A medida, aparentemente positiva, não foi acompanhada do aumento do montante to-tal destinado ao programa no Orçamento. Em 2020, o número de pessoas habilitadas para participar do programa, mas que não rece-beram os recursos devido à falta de dotação orçamentária, cresceu significativamente.

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Mais de 3 milhões de brasileiros chegaram a ficar na “fila” para ter acesso ao PBF10.

Um segundo acontecimento marcante no ano de 2020 para o PBF foi a substituição temporária do programa pelo Auxílio Emer-gencial. Como o novo benefício tinha um valor significativamente superior ao do PBF e como os beneficiários do PBF eram, em sua maioria, também elegíveis para o auxílio emergencial, boa parte do gasto que seria realizado no orçamento do PBF acabou mi-grando para o auxílio emergencial entre abril e agosto.

As tabelas retiradas do Resultado do Tesouro Nacional (RTN)11 abaixo nos ajudam a

10 ROUBICEK, Marcelo. A fila do Bolsa Família. E a redução de beneficiários. Nexo Jornal, 23 de fev. de 2020. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/02/23/A-fila-do-Bolsa-Fam%C3%ADlia.-E-a-redu%C3%A7%C3%A3o-de-benefici%C3%A1rios>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

Bolsa Família já tem fila de 3,5 milhões de pessoas. Exame, 19 de fev. de 2020. Disponível em: <https://exame.com/brasil/ bolsa-familia-ja-tem-fila-de-35-milhoes-de-pessoas/>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

Fila para obter o Bolsa Família já chega a quase 500 mil pessoas. G1 - Globo, 27 de jan. de 2020. Disponível em: <https:// g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2020/01/27/fila-para-obter-o-bolsa-familia-ja-chega-a-quase-500-mil-pessoas. ghtml>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

11 Resultado do Tesouro Nacional (RTN). Tesouro Nacional, 16 de abr. de 2020. Disponível em: <https://www.gov.br/ tesouronacional/pt-br/estatisticas-fiscais-e-planejamento/resultado-do-tesouro-nacional-rtn>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

12 RESENDE, Thiago. Após redução do auxílio, fila do Bolsa Família volta ter 1 milhão. Valor Econômico, Brasília, 4 de dez. de 2020. Disponível em: <https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/12/04/apos-reducao-do-auxilio-fila-do-bolsa-familia-volta-ter-1-milhao.ghtml>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

visualizar em números os movimentos citados acima.

Pela tabela podemos observar um ligei-ro aumento nos recursos destinados ao Bolsa Família no começo de 2020, se-guido da substituição temporária do PBF pelo Auxílio Emergencial, política esta que recebeu grande volume de recursos. Já no fim de 2020, as filas começaram a to-mar proporções notáveis novamente. Cerca de um milhão12 de brasileiros estava na

espe-ra paespe-ra receber os recursos.

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Um dos impactos mais impressionantes do PBF está na saúde,13 a qual está relacionada

às condicionalidades impostas pelo progra-ma. Com isso, se evidencia a necessidade de acesso à saúde e renda caminharem juntas, de modo que a superação da desigualdade também seja incluída no debate de saúde pública com o fim de extinguir o ciclo inter-geracional da pobreza, ou seja, aquela po-breza que ocorre em uma hierarquia familiar. Antes de mostrar as principais evidências le-vantadas, é imprescindível conhecer quais são as principais condicionalidades no sen-tido da saúde: famílias com crianças de até sete anos precisam de acompanhamento da carteira de vacinação e vigilância nutricional, além de, no caso de gestantes, se atentar à assistência pré-natal.

13 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 93-107. 2013.

Para todos os indicadores monitorados se-gundo as condicionalidades definidas, o go-verno federal estabeleceu uma meta nacio-nal de 73% de acompanhamento das famílias beneficiárias do PBF. Vale ressaltar que a co-leta das condicionalidades de saúde é feita semestralmente e a cada período é captado mais famílias com o chamado perfil saúde, que corresponde a famílias com crianças de até 7 anos ou mulheres, com a intenção de identificar possíveis gestantes.

O PBF conta ainda com diversas ações para-lelas para auxiliar na diminuição da carência econômica. Um exemplo é o Benefício Variá-vel à Gestante, que tem objetivo de elevar a renda familiar em um momento de vulnera-bilidade que é a gravidez.

Ana Clara Souza Del Monte

Os impactos secundários do

Bolsa Família

.

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Para ilustrar, um resultado base que influen-ciou muitas das demais métricas é a com-paração entre gestantes acompanhadas e gestantes com pré-natal em dia. Devido às condicionalidades, notou-se uma tendência entre esses dois fatores, ou seja, as mulhe-res acompanhadas devido ao PBF passaram a ter um pré-natal seguro, e, diante disso, di-versos impactos foram coletados.

Com base no artigo Causas do declínio da desnutrição infantil no Brasil, 1996-2007 (Monteiro et al., 2009)14, foram coletados

da-dos que permitiram observar o declínio da desnutrição no país. E é justamente aqui que se entende a primeira grande evidência das contribuições de condicionalidades do Bolsa Família.

A partir da análise dos dados, ficou notável que a prevalência da desnutrição reduziu em 50%. Dessa redução, dois terços se explicam a partir da evolução de alguns indicadores, e desses, 21,7% corresponde ao aumento do poder aquisitivo das famílias, explicado

pe-14 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 100. 2013. 15 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 101. 2013.

los programas de transferência de renda, e, assim, deixando clara a participação do PBF. Outra evidência relevante no debate se re-fere a pesquisa AIBF - Avaliação de Impacto do Bolsa Família15. Essa pesquisa foi

realiza-da em duas etapas, aplicarealiza-da em 2005 e pos-teriormente em 2009, visando reentrevistar famílias e coletar diversos dados sobre as condicionalidades. Aqui, foi possível sanar dois questionamentos fundamentais: as fa-mílias entrevistadas melhoraram de situação no período entre 2005 a 2009? Se estão em condições melhores, o PBF é uma causa? Foi possível responder essas questões, prin-cipalmente, devido ao fato da AIBF traçar comparações entre famílias beneficiárias e não beneficiárias. E quais foram os resulta-dos encontraresulta-dos? Nesse ponto, o programa se mostrou responsável por grande parte das contribuições no que tange a período de amamentação exclusiva, diminuição na des-nutrição crônica e aumento nos índices de vacinação.

Comentando especificamente cada um dos pontos citados: sobre a amamentação, o dado mais pertinente foi que a proporção de filhos de mães beneficiárias do programa é 8 pontos percentuais maior que a de filhos de não beneficiárias - 61% para 53%. Já a desnu-trição em crianças teve queda de 15% para 10% em um período de quatro anos.

Ainda, levando em conta os índices de vaci-nação, foi possível notar que, no geral, houve um aumento na cobertura de vacinação no

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país, de maneira que a proporção de crian-ças menores de seis anos que nunca rece-beu vacina caiu de 21% para 18% no período. Com efeito, a vacinação tende a ser maior em famílias beneficiárias, e um exemplo disso é a diferença de 11 pontos percentuais entre crianças beneficiárias que receberam a ter-ceira dose de poliomielite com relação às não beneficiárias.

Outra métrica analisada partindo de famílias beneficiárias e não beneficiárias foi o baixo peso ao nascer. Mais uma vez as condiciona-lidades do programa se mostraram necessá-rias e coletaram bons resultados, de acordo com o estudo Peso ao nascer entre crianças de famílias de baixa renda beneficiárias e não beneficiárias do Programa Bolsa Família da região Nordeste (Santos et al., 2010)16, a

prevalência do baixo peso ao nascer em fi-lhos de mães beneficiárias foi menor que o de mães não beneficiárias na menor camada de renda.

Mais estudos demonstraram os impac-tos positivos do PBF no acesso à saúde pública. Em síntese, segundo a pesqui-sa Perfil epidemiológico dos beneficiários do Programa Bolsa Família e o desempe-nho dos serviços de atenção básica à saú-de nas regiões Norsaú-deste e Sul do Brasil (Facchinni et al., 2013),17 crianças de até 7

anos beneficiárias frequentavam mais

16 SANTOS, L. M. P. et al. Peso ao nascer entre crianças de famílias de baixa renda beneficiárias e não beneficiárias do Programa Bolsa Família da Região Nordeste (Brasil): pareamento entre CadÚnico e Sinasc. BRASIL. Saúde Brasil, 2010 17 Perfil epidemiológico dos beneficiários do bolsa família e desempenho dos serviços básicos de saúde: relatório final / Luiz Augusto Facchini ... [et. al.] (organizador).

18 RASELLA, Davide et al. Effect of a conditional cash transfer programme on childhood mortality: a nationwide analysis of Brazilian municipalities. The lancet, v. 382, n. 9886, p. 57-64, 2013.

unidades básicas de saúde em relação às outras.

Agora, talvez o resultado mais notável esteja em Effect of a conditional cash transfer pro-gramme on childhood mortality: a nationwide analysis of Brazilian municipalities (Rasella et al., 2013).18 Aqui, são detalhados dados que

demonstram o efeito das condicionalidades na mortalidade infantil de crianças com até 5 anos, levando em conta situações em que a causa da mortalidade é relacionada com a desigualdade de renda, como a desnutrição e diarreia, com isso, chega-se a um resulta-do de redução de 17% da mortalidade infantil alusivo ao PBF.

Impactos sobre educação

A educação é um dos fatores que demons-tram o abismo social entre as classes, de modo que a dificuldade de completar o ensi-no básico sempre foi eensi-norme em famílias de baixa renda, dentre vários motivos, isso pode ser explicado por uma inserção precoce no mercado de trabalho para auxiliar na renda do lar. Dessa maneira, a educação, por ser um instrumento de redução das desigualda-des, também se enquadra nas condicionali-dades do Bolsa Família.

A partir disso, a condicionalidade que se en-quadra à educação é a de acompanhamento da frequência escolar, que é coletada

(17)

bimes-tralmente. Nesse sentido, crianças e adoles-centes de 6 a 15 anos devem ter 85% de fre-quência mínima mensal, enquanto para ado-lescentes de 16 e 17 anos o mínimo

é 75%. Ao que importa, quais impactos essa condicionalidade trouxe na área educacio-nal? A situação melhorou?

O INEP realizou uma pesquisa para ava-liar os resultados, O impacto do Programa Bolsa Família sobre a frequência escolar: uma análise de diferenças, a partir da PNAD19

que nos diz que o acompanhamento das condicionalidades trouxe avanços para os in-dicadores de educação, como por exemplo, houve a redução de 36% de crianças de 6 a 16 anos que não frequentavam escola. Entretanto, continuam os desafios na educa-ção, pois não é apenas os dados de acesso à escola que importam. Compreender a per-manência e evasão, desempenho, conclusão na idade-série adequada também é essen-cial.

Um sinal de esperança é que pouco a pouco os dados mostram melhoria quando se trata dos beneficiários do programa, mas isso não exclui a necessidade de estudar e aplicar po-líticas públicas para atender essa problemá-tica.

Comparando dados de 2001 a 2011, é possí-vel identificar melhoria no percentual de es-tudantes com o ensino fundamental comple-to até os 16 anos - enquancomple-to em 2001 a taxa de conclusão para os 20% mais pobres, que corresponde aos beneficiários do programa,

19 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 114. 2013.

era 17,4%, em 2001 houve um avanço para 43%.

Ainda, quando são visualizados os dados de estudantes de até 15 anos concluintes do en-sino básico regular, quando consideradas as regiões mais carentes socioeconomicamen-te, os beneficiários do PBF se saem melhor, de modo que no Nordeste, 71,3% desses es-tudantes conseguem terminar o ensino fun-damental até os 15 anos, em contramão dos 64% demais estudantes da rede pública. Ou-tros dados podem ser analisados nas tabe-las retiradas do livro Programa Bolsa Família: Uma década de inclusão e cidadania, capí-tulo 6: Desafios e perspectivas para a uni-versalização da educação básica no Brasil.

(18)

Os mitos que não se concretizaram

É comum escutar mitos sobre programas de transferência de renda em geral. No Brasil, esses mitos incidem sobre o Bolsa Família, distorcendo a opinião pública. Dois deles são mais comuns, o primeiro diz que, por receber auxílio do governo os beneficiários não te-riam incentivo para trabalhar e se acomoda-rão, e o outro, ainda mais perverso, dissemina a ideia de que as mulheres teriam mais filhos para, consequentemente, conseguir receber mais dinheiro do PBF. Mas será que isso real-mente aconteceu?

A respeito da oferta de trabalho20, utilizando

dados disponibilizados pela PNAD, um traba-lho feito pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), para fins de comparação entre posição na ocupação, horas trabalhadas e atividades desempenhadas pelos trabalha-dores coletou informações que comparam médias.

Aqui, chegou-se à conclusão que benefi-ciários do PBF tendem a se inserir mais no mercado de trabalho, e ainda, notou-se que beneficiários pobres com idade ativa res-ponderam ter realizado alguma atividade na semana da PNAD em 4 pontos percentuais maior que não beneficiários.

20 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 341. 2013 21 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 348. 2013

Outra informação encontrada foi o alto ní-vel de desalento (segundo o IBGE, defi-nem-se como desalentos pessoas que não tem realizado busca por trabalho) en-tre ambos grupos - beneficiários ou não, que demonstra que isso não tem relação com o programa, contradizendo o dis-curso de diversas pessoas no país. Para conduzir melhor a análise, outro estu-do analisa os efeitos estu-do programa a partir de décimos de distribuição de renda, ou seja, primeiro, segundo, terceiro, (...), décimo mais pobre. Assim, notou-se que a inclusão no mercado de trabalho por beneficiários para o primeiro, segundo e terceiro décimo mais pobre é, respectivamente 73%, 74% e 76%, enquanto para não beneficiários é de 67%, 68% e 71%.

Além dessas evidências, é importante salien-tar que não necessariamente efeitos negati-vos da participação no mercado de trabalho sejam ruim para beneficiários, pois, existem casos onde o efeito ocorre em ocupações de condições extremamente precárias.

Outra conclusão interessante está presente no trabalho de Tavares (2010), que estuda o efeito do PBF em relação às decisões de oferta de trabalho das mães21, já que aqui a

oferta tende a ser mais elástica devido à to-das questões envolvito-das nas duplas jornato-das de trabalho de diversas mulheres - cuidado com os filhos, casa, o momento da gravidez, etc.

(19)

Em seu trabalho, Tavares, utilizando dados da PNAD, segmenta as mulheres em grupos de tratamento e de controle - nas amostras, os grupos de tratamento são aqueles que foram expostos à uma política, por exemplo, como o BF, enquanto os de controle são os não expostos. Conforme os resultados, a au-tora expõe que “mães ampliam sua oferta de trabalho por haver maior tempo disponível, enquanto seus filhos frequentam a escola, e pela necessidade de substituir a redução da oferta de trabalho familiar provocada por eles”.

Agora, levando em conta a discussão sobre o impacto do programa sobre a taxa de fe-cundidade22 - O PBF conta com um auxílio

básico, porém as variações que aumentam o benefício se dão pelo número de filhos de 0 a 15 anos, então, cada um dos filhos tem direito a um benefício variável, de modo que uma família com 4 filhos, por exemplo receba 1 benefício básico mais 4 vezes o benefício variável.

Além disso, existe o benefício variável vin-culado ao adolescente, que fornece renda adicional aos indivíduos de 16 e 17 anos. E é a partir de todas essas informações que sur-ge o discurso crítico ao programa que argu-menta que mulheres tendem a ter mais filhos para conseguir maiores benefícios e consi-derando o PBF como pró-natalista.

22 CAMPELLO, Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa Bolsa Família: uma década de inclusão e cidadania. pp. 348. 2013 23 SIGNORINI, Bruna Atayde et al. The impact of Bolsa Família Program in the beneficiary fertility. Texto Para Discussão Cedeplar, v. 439, 2011.

Diversas pesquisas analisam essa possível causalidade, por exemplo, com dados PNAD até 2006, Bruna Signorini e Bernardo Quei-roz (2011)23 também identificaram grupos de

tratamento e controle e não concluíram ne-nhum efeito significativo do PBF para a deci-são de ter filhos.

Outro trabalho interessante corresponde a Alves e Cavenaghi (2011) que, com base em uma pesquisa na cidade de Recife, foi identi-ficado que não existem impactos relevantes do programa nesse quesito, entretanto, foi levantado que, geralmente, famílias benefi-ciárias têm fecundidade maior. Porém, isso pode corresponder, na verdade, a um efeito inverso, visto que mais filhos vulnerabilizam a renda familiar de modo que famílias essas famílias adentram no programa por esse mo-tivo, e não o contrário.

(20)

Os desafios postos pela pandemia de Covid-19, seja no Brasil ou no mundo, têm consequências que vão além da crise sanitá-ria. Com a paralisação imediata da atividade econômica, milhões de brasileiros, mais vul-neráveis ou não ao trabalho formal, passam por uma redução parcial ou total de sua ren-da.

Em maio de 2020, quando haviam sido de-cretadas as medidas restritivas e de distan-ciamento social para mitigação dos efeitos da pandemia, o rendimento efetivamente re-cebido no país foi apenas 82% do rendimen-to habitual. Quando analisamos os mesmos microdados da Pesquisa Nacional por Amos-tras de Domicílio (PNAD) Covid-19 também de maio de 2020, mas para os trabalhadores do setor privado sem carteira assinada, a ren-da efetivamente recebiren-da foi apenas 76% do habitual.

24 FERNANDO, Canzian. Brasil começa 2021 com mais miseráveis que há uma década. Folha de S.Paulo, São Paulo, 30 de jan. de 2021. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/01/brasil-comeca-2021-com-mais-miseraveis-que-ha-uma-decada.shtml>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

Além disso, vale ressaltar que o impacto na renda dos brasileiros não foi homogêneo. Se-gundo levantamento24 publicado pelo jornal

Folha de São Paulo, utilizando de base da-dos das PNAD Contínua e Covid-19, no geral, os jovens (-34%), sem escolaridade (-30,6%) e negros (-22,8%) foram os que mais perde-ram renda do trabalho na pandemia. Os nove estados da região nordeste também regis-tram uma forte queda na renda do trabalho: -22,9%.

Nesse contexto, discutiu-se a necessidade de uma rede de proteção que atenue a que-da de renque-da e a forte incerteza na ativique-dade econômica e no mercado de trabalho. Entre as medidas adotadas, a principal foi a criação do Auxílio Emergencial pela Lei nº 13.982, de 2020.

O programa, que disponibilizou inicialmen-te benefícios de R$ 600,00 para quem tinha

Renan Rodrigues Torres

A pandemia e o Auxílio

Emergencial

:

uma rede de

proteção necessária

.

(21)

renda por pessoa na família de meio salário mínimo (R$ 520,00) e R$ 1.200,00 para mães solo, esteve presente em cerca de 40% das residências brasileiras, atingindo o pico de 44,1% dos lares do país em junho, segundo pesquisa PNAD Covid-19 do IBGE.

Com uma política tão ampla, seja pelo nú-mero de beneficiários, seja pelo peso fiscal (o programa custou em um ano o equivalente ao BF em uma década), analisar os impactos dessa política é imprescindível para enten-der a resposta do Brasil à pandemia.

Dessa forma, as próximas seções farão, res-pectivamente, uma revisão do programa ins-tituído, passando pelo público-alvo, impac-tos socioeconômicos, impacimpac-tos fiscais e o debate sobre a sua continuação, ou não, no ano de 2021.

O desenho do programa e a

análise do público-alvo do Auxílio

Emergencial

Muito mais do que uma resposta a diminui-ção da renda e a paralisadiminui-ção da atividade econômica, o Auxílio Emergencial pode ser considerado uma medida sanitária. A criação de uma rede de proteção de renda durante uma pandemia é importante para que prin-cipalmente os mais vulneráveis ao trabalho formal possam realizar as medidas de saúde necessárias, como é o caso do distanciamen-to social.

Assim, entre a declaração do público-alvo do programa, o conceito de “trabalhadores informais” foi utilizado previamente para de-limitar os possíveis beneficiários da política. Contudo, dado que a identificação nessa ca-tegoria é muito mais complexa do que possa

parecer de antemão, a lei que institui o pro-grama aborda dois tipos de beneficiários. O primeiro grupo está inscrito no Cadastra-mento Único para Programas Sociais do Go-verno Federal, conhecido como CadÚnico. Criado ainda em 2001, por meio do decreto n° 3.887, o CadÚnico é uma importante ferra-menta para identificar e caracterizar famílias brasileiras em situação de pobreza ou extre-ma pobreza.

Na prática, o CadÚnico funciona como uma gigantesca base de dados que serve como uma “ponte” para que programas sociais possam ser operacionalizados. Atualmente com dados de mais de 77 milhões de cida-dãos, esse arranjo possui uma grande abran-gência censitária e de identificação dos mais vulneráveis, tornando-se uma ferramenta imprescindível para políticas sociais como o Bolsa Família. O mesmo, portanto, ocorreu com o Auxílio Emergencial.

Nesse sentido, há uma relação muito forte entre a estrutura que torna o PBF possível e a estrutura que permitiria a existência do Auxílio Emergencial. Por isso, a implementa-ção do Auxílio, realizada com a urgência que o momento exigia, foi de alguma forma ace-lerada a partir da existência de outras políti-cas sociais e arranjos preexistentes, como os cadastros de famílias no PBF e no CadÚnico. Por outro lado, a construção do Auxílio Emer-gencial abordaria, também pela urgência do momento, um grupo de beneficiários muito mais amplo do que o abordado pelo PBF e o CadÚnico. Assim, o outro grupo disponível para receber os benefícios é aquele que, me-diante autodeclaração, cumprir os requisitos que tratam sobre renda e trabalho.

(22)

Dado esse contexto de estruturas institu-cionais existentes e a forma como o Auxílio Emergencial foi instituído, a subdivisão de público-alvo deu-se em: beneficiários do PBF; inscritos no CadÚnico e que não são beneficiários do PBF; e demais cidadãos não inscritos no CadÚnico (CARDOSO, 2020).25

Essa separação, de perfil mais didático, é importante para demonstrar como o Auxí-lio Emergencial tem um perfil muito amplo quando comparado a outras políticas sociais existentes no Brasil.

A despeito dos beneficiários do PBF serem contemplados automaticamente no novo programa, aproximadamente metade do público-alvo do Auxílio Emergencial era até então desconhecido, dado que seus dados socioeconômicos não faziam parte tanto da base do PBF como do CadÚnico.

Dessa forma, pôde solicitar o benefício o ci-dadão maior de 18 anos, ou mãe com menos de 18, que atendeu os requisitos abaixo: 1) Desempregado ou que exerça ativida-de na condição ativida-de Microempreenativida-dedor Indi-vidual (MEI), contribuinte indiIndi-vidual da Previ-dência Social ou trabalhador informal;

2) Pertence à família cuja renda mensal por pessoa não ultrapasse meio salário míni-mo (R$ 522,50), ou cuja renda familiar total seja de até três salários mínimos (R$ 3.135,00). Assim, a grande abrangência do público-alvo que recebeu o Auxílio Emergencial ocorreu

25 FERNANDO, Canzian. Brasil começa 2021 com mais miseráveis que há uma década. Folha de S.Paulo, São Paulo, 30 de jan. de 2021. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/01/brasil-comeca-2021-com-mais-miseraveis-que-ha-uma-decada.shtml>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

principalmente porque o projeto definiu “tra-balhador informal” da forma mais ampla pos-sível. Entre os critérios colocados pelo pro-grama, “informal” é o cidadão que não têm um emprego formal, ou seja, com carteira assinada.

Na prática, o “informal” seria um grupo que alcançaria aqueles que não têm emprego, mas procuram um; aqueles que não têm em-prego, não procuram um, mas aceitariam um emprego e aqueles que tanto não têm em-prego, não procuram um e não aceitariam um.

Contudo, esse desenho, com parcelas de R$ 600 e R$ 1.200, ocorreu nos primeiros cinco meses do Auxílio Emergencial. Em setem-bro de 2020, com a Medida Provisória (MP) 1.000/2020, o benefício recebeu uma pror-rogação de três meses, porém com um valor reduzido pela metade (R$ 300 e R$ 600). A MP também trouxe novos critérios para determinar quem poderia receber as qua-tro parcelas até o mês de dezembro, como a redução do público-alvo. Ou seja: aquele público que recebeu as cinco parcelas de R$ 600, mas que tenha conseguido retornar ao mercado de trabalho formal, não teria direito às novas parcelas.

Além disso, a medida introduziu ao Auxílio Emergencial o monitoramento contínuo dos beneficiários da política. De acordo com a publicação, seriam realizados monitoramen-tos mensais para verificar se o trabalhador que recebeu o auxílio de R$ 300 voltou, ou

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não, ao mercado formal, ou se obteve acesso a outro benefício social.

O beneficiário com acesso ao trabalho for-mal ou outros benefícios sociais, como se-guro-desemprego, teria o seu pagamento suspenso. A despeito disso, as regras gerais de renda para ter direito ao Auxílio Residual, como ficou conhecido as parcelas de R$ 300 entre setembro e dezembro, foram mantidas. A redução pela metade da parcela paga aos beneficiários, de forma conjunta à redução do público-alvo do programa, também re-duziu o impacto fiscal do programa entre se-tembro e dezembro.

Para efeito de comparação, utilizando dados do Siga Brasil, entre junho e agosto o gasto mensal médio foi de R$ 45,3 bilhões. Em se-tembro, com a publicação do Auxílio Residu-al, o gasto foi reduzido para R$ 24,2 bilhões. A queda também continuou para os meses de outubro (R$ 20,9 bilhões) e novembro (R$ 17,8 bilhões).

O impacto do Auxílio Emergencial

nos indicadores socioeconômicos

Uma política tão robusta em público-alvo e custo para os cofres públicos têm, cer-tamente, fortes impactos em indicadores socioeconômicos como renda, pobreza e desigualdade. Para muitos brasileiros, a exis-tência de uma transferência monetária por

26 NERI, Marcelo C. “Qual foi o Impacto Imediato da Pandemia do Covid sobre às Classes Econômicas Brasileiras?”. FGV Social, 2020

27 BARBOSA, Rogério Jerônimo; PRATES, Ian. Efeitos do desemprego, do Auxílio Emergencial e do Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (MP nº 936/2020) sobre a renda, a pobreza e a desigualdade durante e depois da pandemia. 2020.

um período de tempo determinado repre-sentou, na verdade, um aumento de renda. Segundo levantamento realizado pela Fun-dação Getúlio Vargas, conduzido pelo pro-fessor Marcelo Neri, o número de pessoas com renda per capita abaixo de meio salário mínimo no país caiu 13,1 milhões entre 2019 e julho de 2020.

O estudo26 Qual foi o Impacto Imediato da

Pandemia do Covid sobre as Classes Eco-nômicas Brasileiras? aponta também que esse contingente representa uma queda de 20,69% nessa faixa de renda da população. De acordo com a análise, à faixa de até meio salário mínimo somaram-se 52,1 milhões de brasileiros em julho de 2020, cerca de 24,62% da população total. Em 2019, eram 65,2 mi-lhões de pobres, correspondentes a 31,04% da população, o que comprova a queda identificada na taxa de pobreza durante a pandemia.

Outro estudo27, elaborado pelos

pesquisa-dores Rogério Jerônimo Barbosa e Ian Pra-tes, mostra que 23,5 milhões de brasileiros deixaram de entrar para a pobreza durante a pandemia. Além disso, mais 5,5 milhões de pessoas viram sua renda aumentar com a política.

Vale ressaltar, nesse sentido, que por ques-tões metodológicas é considerada pobre a pessoa com renda domiciliar per capita

(24)

in-ferior a um terço do salário mínimo, ou seja, cerca de R$ 348.

O trabalho de Barbosa e Prates, portanto, é importante para entender o papel do Auxílio Emergencial em servir como uma rede de proteção para mitigar os efeitos da pandemia na queda de renda da população mais vulne-rável. Sem o benefício de R$ 600, a taxa de pobreza teria chegado a 29,8% da população: 63,1 milhões de brasileiros.

Além disso, a política, que chegou a 80% dos domicílios mais pobres do país e a 85,2% da-queles com renda domiciliar per capita de até R$ 242,15, levou a extrema pobreza ao menor patamar desde 1980. A análise28 foi

feita pelo economista Daniel Duque, do Ins-tituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

28 BOAS, Bruno Villas. Auxílio reduz extrema pobreza ao menor nível em 40 anos, diz Ibre/FGV. Valor Econômico, Rio de Janeiro, 28 de set. de 2021. Disponível em: <https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/07/28/auxilio-reduz-extrema-pobreza-ao-menor-nivel-em-40-anos-diz-ibre-fgv.ghtml>. Acesso em: 01 de fev. de 2021.

O gráfico, elaborado a partir de dados da FGV Social e microdados da PNAD Contínua Anual e PNAD Covid/IBGE, mostra a redução da taxa de pobreza no país durante o paga-mento do Auxílio Emergencial. Vale ressaltar, também, que após aredução do pagamento médio pela metade, em setembro, o índi-ce voltou para a trajetória de crescimento. A taxa de pobreza não foi o único indicador fortemente impactado pelo Auxílio Emergen-cial: o benefício pago reduziu drasticamente a desigualdade de renda no país. O coeficien-te de Gini, um dos indicadores mais utilizados para calcular a desigualdade, caiu de 0,543 em 2019 para 0,492 em 2020, ao ponto que sem as políticas de contenção o índice teria chegado a 0,569, mesmo patamar registrado durante a década de 1980. Vale ressaltar que os valores deste coeficiente são representa-dos entre 0 e 1, sendo que, quanto mais pró-ximo de zero, menor é a desigualdade social. Nesse ponto, é importante ressaltar que a análise de Barbosa e Prates também leva em consideração o Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (Medi-da Provisória 936/2020). Isso ocorre porque a medida, que visa estimular que emprega-dores e empregados entrem em acordo para redução da jornada de trabalho e do salário, apesar de mais restritiva que o Auxílio Emer-gencial, também possui impactos no Gini. No entanto, a trajetória de redução na pobre-za e desigualdade foi levemente interrompi-da com a redução interrompi-da parcela de R$ 600 para

(25)

R$ 300, como mostra outro levantamento29,

realizado por Daniel Duque.

Analisando dados da última edição da PNAD Covid-19, do IBGE, Duque mostra que a taxa de pobreza e extrema pobreza registraram aumentos nas últimas duas par-celas depagamento do benefício, chegando respectivamente a 23,9% e 5%. A desigualda-de, assim como a pobreza, também registrou mudança em sua trajetória. O Índice de Gini aumentou de 0.474, em setembro, para 0,494 em novembro.

Nesse sentido, o Auxílio Emergencial serviu como um catalisador da redução da pobre-za e desigualdade, que de alguma forma já possuía uma trajetória de queda no período anterior à pandemia, ainda que extremamen-te gradual.

Os custos fiscais do Auxílio

Emergencial

O alto custo da política emergencial afetou consideravelmente as despesas públicas. Dessa forma, a existência de uma política de transferência de renda que atingiu um terço da população brasileira, de forma conjunta a outras medidas custeadas pelo Governo Federal, apenas foi possível dado a vigência do decreto de calamidade pública, aprovado pelo Congresso Nacional em 20 de março de 2020 a partir do Decreto Legislativo n° 6 do mesmo ano.

29 DUQUE, D. Pobreza e desigualdade aumentam de novo: PNAD Covid mostrou impacto do Auxilio Emergencial nos indicadores sociais. Blog do IBRE, 2020

De acordo com dados do Tesouro Nacional, o decreto de calamidade pública permitiu des-tinar, até dezembro de 2020, R$ 539,4 bilhões de despesas em resposta à pandemia. Desse total, o Auxílio Emergencial custou aos cofres públicos aproximadamente 54% de todos os recursos extraordinários gastos em 2020: R$ 293,1 bilhões.

Para efeito de comparação, o peso fiscal do Auxílio Emergencial, em 2020, foi o equiva-lente a 10 anos de Bolsa Família. Comparan-do com outra rubrica conhecida dentro das contas públicas, o benefício emergencial pago aos vulneráveis custou algo similar ao déficit anual do Regime Geral da Previdência Social (RGPS).

No acumulado até dezembro de 2020, con-tra o mesmo período de 2019, a despesa total do Governo Central cresceu R$ 477,6 bilhões (31,1%) em termos reais. O efeito imedia-to aparece no resultado da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), que subiu 15 pontos percentuais em 2020, chegando ao patamar de 89,3% do PIB, segundo dados do Banco Central.

A despeito do caráter emergencial desses gastos, que tiveram o objetivo de atenuar os efeitos sociais, econômicos e sanitários da pandemia, é importante salientar que o gasto com o Auxílio Emergencial não foi linear du-rante o ano de 2020.

Como mencionado anteriormente, entre ju-nho e agosto o gasto mensal médio foi de R$ 45,3 bilhões. Em setembro, com a redu-ção das parcelas, o gasto foi reduzido para

(26)

R$ 24,2 bilhões, com quedas também para outubro (R$ 20,9 bilhões) e novembro (R$ 17,8 bilhões).

Além disso, como apontou o Relatório de Acompanhamento Fiscal do mês de janei-ro de 2021, elaborado pela Instituição Fiscal Independente do Senado, o gasto do auxí-lio emergencial no ano foi inferior ao orça-mentoautorizado, que estava em R$ 321,8 bilhões.30

Por fim, o debate fiscal ao redor da política de transferência adotada durante 2020 está intimamente ligado à própria prorrogação, ou não, do programa para 2021. Como os seus gastos apenas existiram devido ao estado de calamidade, que terminou em 31 de de-zembro de 2020, uma possível continuação da medida depende de um novo arranjo ins-titucional.

O Auxílio Emergencial para 2021

O benefício emergencial, que atingiu mais de 67 milhões de brasileiros em 2020, che-gou em 2021 apenas com os saques finais do auxílio residual programados. Com o fim do estado de calamidade em 31 de dezembro, o debate sobre a continuidade do programa está ligado à própria manutenção do Teto de Gastos, que impede que as despesas públi-cas cresçam acima da inflação do ano ante-rior.

Ou seja: dado que as despesas para atenu-ar as consequências econômicas, sociais e sanitárias da pandemia só foram possíveis devido à possibilidade dos gastos

extraor-30 DUQUE, D. Pobreza e desigualdade aumentam de novo: PNAD Covid mostrou impacto do Auxilio Emergencial nos indicadores sociais. Blog do IBRE, 2020

dinários, o espaço fiscal para um novo pro-grama de transferência de renda em 2021 é reduzido.

O ponto, ao menos, é que o Auxílio Emergen-cial foi extremamente importante para evitar que um grande número de famílias ficasse sem qualquer fonte de renda. Assim, mes-mo que o estado de calamidade tenha sido encerrado em dezembro, a pandemia, junto das consequências na renda e no trabalho, continua.

Na prática, a falta de uma rede de proteção robusta já apresentou efeitos. O país regis-trou no primeiro mês de 2021 a maior taxa de extrema pobreza dos últimos nove anos: 12,8%, ou seja, quase 27 milhões de brasilei-ros sobreviveram com menos de R$ 246 ao mês. A título de comparação, o país atingiu um índice de 4,52% em agosto de 2020. Em 2019, a taxa medida pela FGV Social ficou em 10,97% da população brasileira.

Com o fim do programa, esse público, sem carteira assinada e abaixo da linha de pobre-za, deve retornar ao Bolsa Família, mas rece-bendo valores mais modestos de R$ 41 por mês. Dessa forma, o aumento da pobreza e desigualdade são esperados, dado que em 2021 toda parcela que deixou de entrar para a extrema pobreza e pobreza estará sem a rede de proteção criada durante a pandemia.

(27)

AMARAL, Luciana. Bolsonaro assina 13º salário a beneficiários do Bolsa Família. UOL, Brasília, 15 de out. de 2019. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/noticias/reda-cao/2019/10/15/bolsonaro-assina-13-salario-a-beneficiarios-do-bolsa-familia.htm>. Aces-so em: 01 de fev. de 2021.

BARBOSA, Rogério Jerônimo; PRATES, Ian. Efeitos do desemprego, do Auxílio Emergencial e do Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (MP nº 936/2020) sobre a renda, a pobreza e a desigualdade durante e depois da pandemia. 2020.

BOAS, Bruno Villas. Auxílio reduz extrema pobreza ao menor nível em 40 anos, diz Ibre/FGV.

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