Análise de O CORTIÇO
Naturalismo
Aluísio Azevedo
Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em São Luís, capital do Maranhão, em 1857. Considerado
o maior nome do Naturalismo brasileiro, tornou-se o primeiro escritor profissional da Literatura Brasileira. Aluísio também foi jornalista, caricaturista (estudara na Imperial Academia de Belas-Artes) e um dos sócios fundadores da Academia Brasileira de Letras.
Ao tornar-se adido cultural, abandonou a literatura, passando os seus dezessete últimos anos sem sequer escrever uma obra. Aluísio Azevedo morreu em 1913, em Buenos Aires.
NATURALISMO:A APROXIMAÇÃO
ENTRE LITERATURA E CIÊNCIA
DETERMINISMO:
o ser humano como
produto do meio em que
se encontra, da herança
(cultural,
social
e
biológica) recebida e das
condições
históricas
características
do
momento em que vive.
POSITIVISMO:
apontava o saber
positivo,
baseado
nas leis cientificas,
como superior ao
teológico
ou
ao
metafísico.
ROMANCE EXPERIMENTAL
•
Emile Zola define o Naturalismo como uma
aplicação na Literatura, do método de
observação e de experimentação.
•
Literatura de tese porque desenvolve uma
estrutura pensada para provar a visão
determinista da sociedade.
•
O aviltamento e a perda da dignidade dos
indivíduos é a grande tese exposta nos
romances naturalistas.
É na literatura Naturalista do
século XIX que, pela primeira
vez, o papel principal será
destinado à classe
trabalhadora
.Constituídos como grupo, os
operários são seres anônimos.
São a força de trabalho que
movem a sociedade, mas vivem
em condições indignas.
Personagens reais
As personagens das obras realistas e naturalistas são tipos vivos, retirados do cotidiano, portanto não mais lineares como os românticos, que se dividiam em heróis e vilões. No Realismo, as personagens são complexas, inusitadas, surpreendentes, esféricas.
Contemporaneidade
As histórias das obras realistas e naturalistas são contemporâneas ao autor, ou seja, têm como pano de fundo a época em que foi escrita. Por essa razão, a crítica social é bastante presente nessas obras, caso contrário, perderia seu sentido.
Atenção!
Como vimos, a época realista-naturalista é uma reação ao Romantismo. Para fixar as características dessa época, traçaremos um paralelo entre elas e o Romantismo:
Romantismo Realismo–Naturalismo • Subjetivismo • Objetivismo
• Sentimentalismo • Racionalismo
• Personagens idealizadas • Personagens reais
• Volta ao passado • Contemporaneidade • Temática fugaz, irrelevante,
dramas amorosos pessoais
• Universalismo
• Valorização da burguesia • Crítica à burguesia • Religiosidade • Ceticismo, crítica
Zoomorfismo
As personagens são caracterizadas com
instintos
animalescos,
ou
seja,
são
rebaixadas ao nível animal.
Exemplos dessas características na obra
são Bertoleza, descrita como
“besta de
carga” e “anta bravia”; Botelho (“abutre”);
Leônie
(“égua”); Rita Baiana (“cadela no
cio”); Florinda (“olhos luxuriosos de
macaca”); e Libório (“naquela fome de cão
sem dono”).
Botelho
Parasita que vivia às custas do Miranda, Botelho foi quem teve a ideia de oferecer a João Romão a mão de Zulmira, fazendo com que o Miranda percebesse o ótimo negócio que fazia ao unir as duas fortunas.
Henrique
Rapazote que vivia no sobrado do Miranda, Henrique era filho de um fazendeiro de Minas Gerais. Viera recomendado pelo pai de Estela para cursar os preparatórios para o ingresso na faculdade de medicina.
Era cuidado por Estela com tanto zelo, que um dia os dois foram flagrados por Botelho:
Encaminhou-se para lá em bicos de pés, sem ser percebido, descobriu Estela entalada entre o muro e o Henrique. Deixou-se ficar espiando, sem tugir nem mugir, e, só quando os dois se separaram, foi que ele se mostrou. (p. 27)
Isaura , Leonor e Valetim
Esse três personagens eram criados que viviam no sobrado da família Miranda. Nesta passagem,
destaca- -se a predileção de Estela por Valentim:
A mulher do Miranda tinha por este moleque uma afeição sem limites: dava-lhe toda a liberdade, dinheiro, presentes, levava-o consigo a passeio, trazia-o bem vestido e muita vez chegou a fazer ciúmes à filha, de tão solícita que se mostrava com ele. Pois se a caprichosa senhora ralhava
com Zulmira por causa do negrinho! Pois, se quando se queixavam os dois, um contra o outro, ela nunca dava razão à filha! Pois, se o que havia de melhor na casa era para o Valentim! Pois, se quando foi este atacado de bexigas e o Miranda, apesar das súplicas e dos protestos da esposa, mandou-o para um hospital, dona Estela chorava todos os dias e durante a ausência dele não tocou piano, nem cantou, nem mostrou os dentes a ninguém? E o pobre Miranda, se não queria sofrer impertinências da mulher e ouvir sensaborias defronte dos criados, tinha de dar ao moleque toda a consideração e fazer-lhe humildemente todas as vontades. (p. 24)
Paula
Benzedeira do cortiço, a quem todos chamavam de “Bruxa”, Paula acaba morrendo no incêndio do cortiço, por ocasião da invasão dos “Cabeças-de-Gatos”.
Seguia-se a Paula, uma cabocla velha, meio idiota, a quem respeitavam todos pelas virtudes de que só ela dispunha para benzer erisipelas e cortar febres por meio de rezas e feitiçarias. Era extremamente feia, grossa, triste, com olhos desvairados, dentes cortados à navalha, formando ponta, como dentes de cão, cabelos lisos, escorridos e ainda retintos apesar da idade. Chamavam-lhe “Bruxa” (p. 33)
Leandra, a machona; Das Dores e Nenen
Lavadeiras do cortiço, suas principais características são descritas nesta passagem:
Ninguém ali sabia ao certo se a Machona era viúva ou desquitada; os filhos não se pareciam uns com os outros.
A das Dores, sim, afirmavam que fora casada e que largara o marido para meter-se com um homem do comércio; e que este, retirando-se para a terra e não querendo soltá-la ao desamparo, deixara o sócio em seu lugar. Teria vinte e cinco anos.
Nenen dezessete. Espigada, franzina e forte, com uma proazinha de orgulho da sua virgindade, escapando como enguia por entre os dedos dos rapazes que a queriam sem ser para casar. Engomava bem e
Augusta Carne-Mole e Alexandre; Juju e Leônie, a francesa
Augusta Carne-Mole e Alexandre são casados.
Ela lavadeira, ele soldado. Vale a pena ressaltar o comportamento de Alexandre que, quando fardado, era sério e exigia respeito, e sem a farda, era simpático com os moradores.
O casal tinha filhos ainda pequenos. Um deles, a Juju, vivia na cidade sob a proteção da madrinha, a francesa Leônie, cafetina e cocote (prostituta).
Albino
Albino era o lavadeiro do cortiço. Afeminado, era tratado pelas outras lavadeiras como se realmente fosse mulher.
Com relação à análise comportamental das personagens, diferencie Aluísio de Azevedo de Machado de Assis.
ANÁLISE DE O CORTIÇO,
DE ALUÍSIO AZEVEDO
1.
NARRADOR EM TERCEIRA PESSOA, ONISCIENTE.2. ANÁLISE DO ENREDO E DOS PERSONAGENS
2.1.
TRAMA CENTRAL:
JOÃO ROMÃO x MIRANDA
O CORTIÇO x O SOBRADO
Ponto de Partida
A vizinhança (João Romão) é aquilo que viria a ser o
cortiço x Miranda e seu novo sobrado.
Definição dos elementos da trama central
O narrador, nos três capítulos, apresenta os elementos
básicos que irão constituir a trama central da narrativa;
Assim:
CAPÍTULO – I
– foco central: João Romão e Bertoleza
Contraponto: Miranda e Estela
A história e as características de João Romão:
Bertoleza
O CONTRAPONTO
TENSÃO PESSOAL DE MIRANDA
Miranda
“Prezava, acima de tudo, a sua posição social e tremia só com a idéia de ver-se novamente pobre”. Conflitos de Miranda: posição social, atração sexual por Estela, a quem devia odiar pelas infidelidades.
Estela, “senhora pretensiosa e com fumaça de nobreza” “mulherzinha levada da breca”, que adultera desde “antes de terminar o segundo ano de matrimônio”
Primeiro conflito Romão x Miranda
Miranda quer comprar parte do terreno de Romão.
Projeto de Romão: construir a estalagem. “Destinada a
matar toda aquela miuçalha”.
A Construção do muro
Primeira tensão: vitória de Romão: Miranda constrói o
muro. “Muro – símbolo da diferença, limite.”
CAPÍTULO – II
Foco central: “Miranda e seu sobrado”.
Contraponto: João Romão e a estalagem
Personagens do sobrado: Miranda
– Estela
Zulmira
Henrique
IDÉIAS DE BOTELHO
“Isso é uma imprudência.. Numa casa, em que há tantos quartos, é preciso vir meterem-se neste canto de quintal. A senhora está moça, está na força dos anos; seu marido
não a satisfaz, é justo que o substitua por outro! Ah! Isto é o mundo e, se é torto, não fomos nós que o fizemos torto!”.
O narrador insinua agrados homossexuais de Botelho a Henrique, que se afasta do velho “com um gesto de
repugnância e desprezo”.
Compõe ainda a casa de Miranda; o moleque Valentim, filho de uma escrava que foi de Dona Estela, a mulata Isaura, a negrinha virgem Leonor.
VERDADE DAS RELAÇÕES MIRANDA – ESTELA
DEFINIÇÃO DA TRAMA SOCIAL: OS CONFLITOS SOCIAIS DE MIRANDA: ANTE O SUCESSO
ECONÔMICO DE ROMÃO. MIRANDA QUESTIONA O SEU PRÓPRIO MODO DE VIDA.
A “escandalosa fortuna” de Romão incomoda a Miranda, ( Romão fizera fortuna, “sem precisar roer nenhum
chifre” )
Incomodava-o “grosseiro rumor que vinha da estalagem numa exalação forte de animais cansados”
A SAÍDA PARA OS CONFLITOS: a idéia do baronato
“Foi da supuração fétida destas idéias que se formou no coração vazio de Miranda um novo ideal – o título” o
baronato.
VIABILIDADE DA LUTA PELO TÍTULO
Para conseguir o título, contava com a vaidade de Estela.
DESENVOLVIMENTO DA TRAMA ROMÃO x MIRANDA
Visconde Proprietário da avenida Proprietário da estalagem Proprietário do cortiço Proprietário do terreno vendeiro
falseia a alforria de Bertoleza rouba material
rouba Domingos e Libório
AGRAVAMENTO DA TENSÃO DE ROMÃO
O título de Miranda faz Romão questionar seu modo de viver Saídas: mudanças de hábitos, de roupas, transformação do
cortiço, casamento com Zulmira, título de visconde.
Comparar Cap. II com o cap. X
“Fui uma grandíssima besta
Uma grande besta...”
A partir do cap. XIII, o narrador nos dá notícias das mudanças de João Romão
Botelho começa a trabalhar para que Romão se case com Zulmira. Miranda já o tratava de forma diferente, convidando-o, até, para jantar.
TENSÃO PESSOAL
Romão mudava, mas “tinha de estirar-se ali, ao lado
daquela preta fedorenta a cozinha e bodum de peixe!”. E lhe surge a ideia da morte de Bertoleza.
Cabeça de Gato. “O cortiço aristocratizava-se”.
CLÍMAX E DESFECHO
CAPÍTULO – XXIII
Chega o filho mais velho do antigo senhor de Bertoleza. Ao mandar prender Bertoleza, esta, “com ímpeto de anta bravia,” rasga o ventre de lado a lado. Romão foge até o canto mais escuro, tapando o rosto com as mãos. Nesse momento, uma comissão de abolicionistas vem entregar a Romão o diploma de sócio benemérito da causa abolicionista.
O CORTIÇO x SOBRADO DE MIRANDA
Ponto de partida: Apresentação dos elementos da trama
No capítulo III, o narrador nos apresenta o outro elemento central da trama: o cortiço e seus moradores
A linguagem identifica homem, animal, inseto (visão monista).
PERSONAGENS DO CORTIÇO Leandra Augusta Carne-Mole Léonie Leocádia Paula Marciana
Dona Isabel e Pombinha
Albino Rita Baiana Domingos e Manuel Jerônimo Jerônimo – Piedade e a filha Marianita ( Senhorinha ) Firmo Libório
Conjunto 1 – Cortiço – coletivismo tribal ( cortiço= abelhas )
Conjunto simples, constituição primária Natureza, instinto, horizontal, violência. Sensualismo – sensíveis a impressões sensoriais
Conjunto 2 – Casa de Miranda
Conjunto complexo Vertical, trocas
No conjunto complexo há um regime de trocas necessárias à sua própria sobrevivência: Estela / Miranda. Botelho,
Henrique, Zulmira
João Romão X Miranda
Personifica a falta de escrúpulos e a exploração do homem pelo homem
Representa a simulação, forçada pelas convenções sociais.
TRAMAS SECUNDÁRIAS
a) Jerônimo – Piedade- Rita Baiana – Firmo. b) Leocádia – Bruno – Henrique.
c) Léonie, Pombinha, Senhorinha. d) O JUDEU – o velho Libório.
e) Marciana – Florinda.
FUNÇÃO DA MULHER:
Mulher-objeto
Mulher sujeito-objeto
Mulher sujeito que regula os regimes de troca, capaz de Impor condições e manobrar o macho em beneficio próprio.
ESPAÇO
O espaço físico retratado é o microcosmo de uma
sociedade em formação: o cortiço x sobrado. Os dois locais ressaltam o engalfinhar constante de forças econômicas e sociais.
O espaço físico é urbano, pois o proletariado e a classe média ganharam campo e a mão-de-obra –
principalmente de italianos e portugueses era muito necessária.
TEMPO
“Situa-se alguns anos antes da publicação do romance (1890).” O tempo do realista-naturalista é mesmo o agora. O enredo é linear: segue os passos do vendeiro João
Romão desde a juventude pobre até a maturidade abastada e inescrupulosa. O tempo do romance é cronológico..
LINGUAGEM
“A língua de Aluísio Azevedo em sua plurivalência de nacionalidades mostra como o Francês, o Italiano, o Português de Portugal, o falar do cortiço se mesclam, constituindo conjuntos que integralizam a língua brasileira num sentido mais amplo. Sua língua é mestiça como seus personagens e se espalha pelo simples e pelo complexo.”
Embora tenha, em vários momentos, ousado infringir as normas prescritas pela gramática normativa, no nível do narrador, a linguagem é sempre cuidada e presa aos
cânones tradicionais.
Linguagem coloquial brasileira: (alguns exemplos)
Ao apresentar-nos Estela, o narrador diz que ela era uma “mulherzinha levada da breca”, “com fumaça de nobreza.”
Miranda, ao pensar nas infidelidades de Estela, percebe que Romão progredira, sem precisar roer nenhum chifre”.
Estela se refere a Miranda como “aquele traste do senhor meu marido” , “uma besta daquela ordem!”
Ao descrever os movimentos do cortiço, o narrador nos diz que os homens “esfregavam com força as ventas e as
barbas, fossando e fungando contra as palmas da mão.”, que “as portas das latrinas não descansavam.”.
Observe os comentários que os moradores do cortiço fazem sobre Rita Baiana:
– E não é que o demo da mulata está cada vez mais sacudida?...
– Então, coisa-ruim! por onde andaste atirando esses quartos?
– Desta vez a coisa foi de esticar, hein?! [...] E a fala de Rita:
– Ora, nem me fales, coração! Sabe? Pagode de roça! Que hei de fazer? é a minha cachaça velha!...
Com quem te esfregavas tu, sua vaca?! Bradou ele a botar os bofes pela boca.
Vá à pata que o pôs! Exclamou ela, com a cara que era um tomate. Já lhe disse que não quero saber de você pra nada, seu bêbado!
“Sai daí, safado! Toca lá no que quer que seja, que te arranco a pele do rabo!”.
“Eu quero saber quem lhe encheu o bandulho! E ela há de dizer quem foi ou quebro-lhe os ossos.
E, após saber que Florinda fugira, diz Rita a Marciana: “Fugiu-lhe, é bem feito! Que diabo! Ela é de carne, não é de ferro! Agora chore na cama, que é lugar quente.”
Pula cá pra fora, perua choca, se és capaz.
Toma pro teu tabaco! Toma, galinha podre! Toma pra não
te meteres comigo! Toma!Toma! Baiacu da praia!
“Qualquer pé-rapado”
Linguagem coloquial portuguesa. Diz Jerônimo:
Ó filha! “Por que não experimentas tu fazer uns pitéus à moda de cá.”. ... Pede a Rita que to ensino. Os
camarões souberam-me tão bem”.
Um diálogo rápido, conciso, sugestivo e uma precisão descritiva extremamente aguda são os traços marcantes da personalidade literária de Aluísio
Questões
• 1. (ITA) Leia as proposições acerca de O Cortiço.
• I. Constantemente, as personagens sofrem zoomorfização, isto é, a animalização do comportamento humano, respeitando os preceitos da literatura naturalista.
• II. A visão patológica do comportamento sexual é trabalhada por meio do rebaixamento das relações, do adultério, do lesbianismo, da prostituição etc.
• III. O meio adquire enorme importância no enredo, uma vez que determina o comportamento de todas as personagens, anulando o livre-arbítrio.
• IV. O estilo de Aluísio Azevedo, dentro de O Cortiço, confirma o que se percebe também no conjunto de sua obra: o talento para retratar agrupamentos humanos.
• Está(ão) correta(s) a) todas b) apenas I c) apenas I e II. d) apenas I, II e III. e) apenas III e IV.
V
2. (UFV-MG) Leia o texto abaixo, retirado de O Cortiço, e faça o
que se pede:
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo.
[…].
O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sanguínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.
Assinale a alternativa que NÃO corresponde a uma possível leitura do fragmento citado:
a) No texto, o narrador enfatiza a força do coletivo. Todo o cortiço é apresentado como um personagem que, aos poucos, acorda como uma colméia humana.
b) O texto apresenta um dinamismo descritivo, ao enfatizar os elementos visuais, olfativos e auditivos.
c) O discurso naturalista de Aluísio Azevedo enfatiza nos personagens de O Cortiço o aspecto animalesco, “rasteiro” do ser humano, mas também a sua vitalidade e energia naturais, oriundas do prazer de existir.
d) Através da descrição do despertar do cortiço, o narrador apresenta os elementos introspectivos dos personagens, procurando criar
correspondências entre o mundo físico e o metafísico.
e) Observa-se, no discurso de Aluísio Azevedo, pela constante
utilização de metáforas e sinestesias, uma preocupação em apresentar elementos descritivos que comprovem a sua tese determinista.
Bertoleza, que havia já feito subir o jantar dos caixeiros, estava de cócoras no chão, escamando peixe, para a ceia do seu homem, quando viu parar
defronte dela aquele grupo sinistro.
Reconheceu logo o filho mais velho do seu primitivo senhor, e um calefrio percorreu-lhe o corpo. Num relance de grande perigo compreendeu a situação: adivinhou tudo com a lucidez de quem se vê perdido para sempre. Adivinhou que tinha sido enganada; que a sua carta de alforria era uma mentira, e que o seu amante, não tendo coragem para matá-la, restituía-a ao cativeiro.
Seu primeiro impulso foi de fugir. Mal, porém, circunvagou os olhos em torno de si, procurando escapula, o senhor adiantou-se dela e segurou-lhe o ombro.
- É esta! Disse aos soldados que, com um gesto, intimaram a desgraçada a segui-los. -- Prendam-na!
É escrava minha ! A negra, imóvel, cercada de escamas e tripas de
peixe, com uma das mãos espalmada no chão e com a outra segurando a faca de cozinha, olhou aterrada para eles, sem pestanejar. Os policiais, vendo que ela se não despachava, desembainharam os sabres. Bertoleza então, erguendo-se com ímpeto de anta bravia,
• recuou de um salto, e antes que alguém conseguisse alcançá-la, já de um só golpe certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lado.
E depois emborcou para a frente, rugindo e esfocinhando moribunda numa lameira de sangue. João Romão fugira até o canto mais escuro do armazém, tapando o rosto com as mãos.
Nesse momento parava à porta da rua uma carruagem. Era uma comissão de abolicionistas que vinha, de casaca, trazer-lhe respeitosamente o diploma de sócio benemérito. Ele mandou que os conduzissem para a sala de visitas.
Questão discursiva
O Texto I corresponde à cena em que a escrava fugida Bertoleza comete suicídio, quando se depara com os policiais que vêm capturá-la, após denúncia de seu paradeiro feita por João Romão, o amante. Leia-o atentamente e responda às questões propostas em "a" e "b".
a) Explique uma característica do realismo-naturalismo expressa no trecho compreendido entre as linhas 13 e 16 . ("Os policiais...de sangue")
Possibilidades de resposta
Resposta:
Serão aceitas respostas que, de algum modo, revelem as seguintes ideias:
O comportamento humano é determinado por forças biológicas (o instinto, a herança genética), sociológicas e históricas. Os fatos psicológicos e sociais são vistos, pelo realismo-naturalismo, como manifestações naturais e, portanto, nada tendo a ver com fenômenos transcendentais. As circunstâncias externas determinam a natureza dos seres vivos, inclusive a do homem.
A realidade passa por um processo evolutivo, dentro de um sistema de leis naturais totalmente definidas.