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Balé da cidade de Santa Maria: uma análise cenográfica / Santa Maria city ballet: scenographic analysis one

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Academic year: 2020

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n. 6, p. 33942-33964 jun. 2020. ISSN 2525-8761

Balé da cidade de Santa Maria: uma análise cenográfica

Santa Maria city ballet: scenographic analysis one

DOI:10.34117/ bjdv6n6-082

Recebimento dos originais: 08/05/2020 Aceitação para publicação: 04/06/2020

Isadora Forner Stefanello

Especialista em Arquitetura e Cenografia Instituição: Centro Universitário Ritter dos Reis

Endereço: Rua Orfanatrófio, 555 - Alto Teresópolis, Porto Alegre – RS, Brasil E-mail: isastefanello@hotmail.com

RESUMO

Este artigo partiu da monografia para obtenção do título de Especialista em Arquitetura e Cenografia pelo Centro Universitário Ritter dos Reis de Porto Alegre. Baseado na vivência e experiência da autora com a dança na cidade de Santa Maria, onde a mesma reside, buscou-se fazer uma abordagem analítica de três trabalhos do grupo de dança Balé da Cidade de Santa Maria e através dessa análise, saber se houve uma preocupação estética com o design cenográfico e como a mesma se estabelece. Para isso, através de pesquisa bibliográfica, com o objetivo de explorar a temática, foi apresentado um histórico da cenografia na dança e a sua evolução, bem como, foram abordados os conceitos de percepção; o espaço e o corpo; o espaço e a luz; o espaço e a cor e o espaço e o som. Também foi apresentado um breve histórico da Cia., considerando a importância do Balé da Cidade de Santa Maria no fomento da dança no Rio Grande do Sul. Os trabalhos coreográficos analisados foram “Seres” de Eduardo Severino (POA) de 2001, “Desenhos e Rascunhos para uma Dança” de Tatiana da Rosa (POA) de 2002 e “Do Poeta à Dança” dos Intérpretes-Criadores de 2007. Foram descritos e analisados o cenário, o figurino, os desenhos compositivos de coreografia (distribuição dos artistas no espaço), a luz e a paisagem sonora/trilha sonora, por serem elementos que contribuem para a linguagem espacial e estética cenográfica, contando com fotografias e documentos audiovisuais.

Palavras-chave: Design Cenográfico, Cenografia, Dança, Santa Maria, Arquitetura. ABSTRACT

This article started from the monograph to obtain the title of Specialist in Architecture and Scenography by the Centro Universitário Ritter dos Reis in Porto Alegre. Based on the author's experience with dance in the city of Santa Maria, where she resides, we sought to make an analytical approach to three works by the dance group Balé in the City of Santa Maria and through this analysis, to know if there was a aesthetic concern with the scenographic design and how it is established. For this, through bibliographic research, with the objective of exploring the theme, a history of the scenography in dance and its evolution was presented, as well as, the concepts of perception were approached; space and body; space and light; space and color and space and sound. A brief history of the Company was also presented, considering the importance of the Ballet of the City of Santa Maria in promoting dance in Rio Grande do Sul. The choreographic works analyzed were “Seres” by Eduardo Severino (POA) from 2001, “Drawings and Drafts for a Dance ”by Tatiana da Rosa (POA) of 2002 and“ Do Poeta à Dança ”by the Interpreters-Creators of 2007. The scenery, the costumes, the compositional choreography drawings were described and analyzed (distribution of the artists in the space) , the light and the sound landscape / soundtrack, for being elements that

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contribute to the spatial language and scenographic aesthetics, with photographs and audiovisual documents.

Keywords: Scenographic Design, Scenography, Dance, Santa Maria, Architecture.

1 INTRODUÇÃO

O artigo busca apresentar uma análise perceptiva de alguns espetáculos de dança do Balé da Cidade de Santa Maria – RS, iniciando não só um provável registro histórico, perceptivo e fotográfico da companhia, mas também da expressão artística da dança no interior do estado na década de 2000, acreditando ser carente de registros não apenas da cenografia, mas também deste tipo de expressão artística. Busca apresentar, também, quais as percepções são produzidas no espectador, bem como quais tipos de recursos tecnológicos de iluminação e materialidade que foram utilizados.

2 METODOLOGIA

Para chegar a uma análise satisfatória, buscou-se um breve histórico do panorama cenográfico na dança, obtendo imagens, conceitos e pensamentos de cenógrafos como Appia e Svoboda e coreógrafos como Isadora Duncan, Martha Graham, Alvin Nikolais e Pina Bausch, além das percepções e a contribuição na forma como os espetáculos de dança são apresentados ao longo dos tempos. Após o histórico, buscou-se conceitos sobre a percepção estética e como essa percepção se relaciona com o espaço, o artista, a luz, a cor e o som.

O artigo apresenta um histórico da companhia, citando os espetáculos criados além das apresentações e premiações em diversos locais do país, também apresenta as motivações e a necessidade da criação de um grupo profissional na cidade de Santa Maria, no estado do Rio Grande do Sul, bem como a sua grande importância para a difusão da arte da dança no estado.

O artigo apresenta, também, uma análise sobre o uso da cenografia em alguns trabalhos do Balé da Cidade de Santa Maria, percebendo a escolha dos materiais e principalmente relatando a interação dos movimentos com o cenário, visando assim, através de bibliografia sobre o assunto, uma reflexão sobre a cenografia aplicada em dança no estado do Rio Grande do Sul, mostrando o quanto a cenografia participa, não mais como um elemento decorativo e de indicação de tempo e espaço, mas ativamente da composição estética e coreográfica.

Para essa análise, foram escolhidos três trabalhos coreográficos onde o cenário é um elemento existente e significativo, que compõe ou não os movimentos. O primeiro trabalho coreográfico analisado é “Seres” de Eduardo Severino (POA) em 2001, devido a interação dos

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movimentos com o cenário que é interativo e móvel. O segundo trabalho coreográfico analisado é “Desenhos e Rascunhos para uma Dança” de Tatiana Rosa (POA) em 2002, que é estático, mas que registra a memória dos deslocamentos executados no próprio cenário. E o terceiro e último trabalho coreográfico analisado é o espetáculo “Do Poeta à Dança” de 2008 que se divide em duas partes ambas coreografadas pelos próprios bailarinos intérpretes: “Na Busca... Um Encontro” de 2005 sobre algumas obras de Fernando Sabino e fragmentos de obras de Lya Luft e Paulo Leminski e “Retratos – Entre a Essência e a Aparência” de 2006 sobre a obra de Mário Quintana, onde foi escolhido devido a percepção de espaço que o cenário produz.

3 RELAÇÕES ESTÉTICAS NA HISTÓRIA ENTRE O DESIGN CENOGRÁFICO E A DANÇA

A cenografia tem o papel de contar sobre o tempo ou a época em que se passa a história, além de falar sobre o lugar ou ambiente, de modo a transportar o espectador para outras realidades. A cenografia identifica a personalidade dos personagens, como seu sexo, suas crenças e preferências estéticas.

A história da cenografia começa na Pré-História (até VI a.C) em espaços circulares e de terra batida onde o público se posicionava em torno nas chamadas Eiras (um local onde grãos eram triturados de acordo com o movimento dos bois). Nessa fase, as motivações para as festas eram espirituais e antropológicas. Os elementos utilizados eram o fogo, fumaça, ornamentos em penas e peles, totens, feixes de lanças cravadas no chão e montes de grãos.

Já na Antiguidade (séc. IV a.C - séc. IX) surgem dois tipos de teatros: o Teatro Grego e o Teatro Romano. As festas primitivas são transferidas para os teatros gregos que possuíam três áreas: o Théatron, lugar da platéia, semi-circular, que se localizava em aclives em colinas; a Orchestra, local de atuação, originária da Eira primitiva em formato de arena; e a Skéne, uma construção ao fundo onde eram feitas as trocas de figurino, sendo o ponto focal do espetáculo. Ainda nessa época surge o Proscênio que era uma espécie de palco ou plataforma que ligava a Orchestra à Skéne. Já os romanos percebem o teatro e os espetáculos como uma arma política e uma forma de manipulação das massas. Proporcionam espetáculos para manter a população entretida e ignorante. Os romanos eram ótimos em engenharia e criaram grandes teatros que não precisavam mais dos aclives das colinas. Os mesmos eliminam a Orchestra, passando à ação para o Proscênio que é ampliado formando um palco.

Na Idade Média (séc. X - séc. XV), as encenações passam a serem feitas dentro das igrejas, mas com o seu crescimento foram transferidas para as ruas e praças. Os temas eram religiosos como

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o Natal, a Páscoa, os Profetas e as Paixões. Surge, então, o carro-palco, onde os mesmos eram colocados lado a lado e cada um executava uma cena, permitindo que o público se movimentasse. Nessa época, o teatro era a principal fonte de informação e acaba ganhando um tom bastante popular com o surgimento dos palhaços, bufões, comediantes e domadores.

É no Renascimento (séc. XVI - séc. XIX) que a cenografia e a dança começam a se tornar protagonistas nos palácios da corte. De um lado havia uma tela pintada com um palácio e seu jardim e do outro sentava-se o rei e seus cortesãos. Montavam-se ainda no salão carruagens e carros alegóricos com fontes e florestas. Os espetáculos misturavam dança, música e poesia. Surgem, então, o Teatro Italiano, o Teatro Elisabetano e o Teatro Barroco. O Teatro Italiano surge dentro dos palácios com espetáculos para os nobres. O edifício era retangular, tornando o palco um local retangular também. Era dividido em três áreas: a Cavea, degraus construídos em madeira onde ficava a plateia; o Proscênio, palco onde acontece a cena; e a Scaenae Frons, que é um cenário fixo, construído em madeira que representa ruas em perspectiva e que permitiam ao espectador uma nova sensação de profundidade e de tridimensionalidade. Já o Teatro Elisabetano, na Inglaterra, possui um formato circular com telhado no local do público e vazado ao centro. Possuía um palco com uma cobertura de duas águas sustentadas por duas colunas, onde eram utilizados poucos objetos cênicos. Era um edifício de três andares, onde as galerias mais altas ficavam o público selecionado e as galerias mais baixas e o centro vazado ficava o público popular. Por fim, é com o Teatro Barroco que surgem as óperas que utilizavam múltiplos painéis pintados que possuíam grande mobilidade e permitiam a percepção de profundidade (Figura 01).

Figura 01: Teatro barroco do Palácio de Litomysl, República Tcheca, 1797, mostrando as diversas telas laterais formando a perspectiva de um palácio que se abre para um caminho externo representado na tela pintada ao fundo.

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Junto com as óperas surgem os ballets românticos, onde as histórias criam um clima de sonho e irrealidade. No 1º Ato o local representado era a aldeia ou o palácio e nos 2º e 3º Atos ganha características irreais com lagos encantados e reinos de sombras. Richard Wagner é o artista mais representativo dessa fase que com sua ideia de Arte Total, unia música, teatro, dança, arquitetura e pintura.

A partir do século XX, com a Dança Moderna, a cenografia toma outra proporção e passa a ser cada vez mais atuante. Adolphe Appia faz do espaço cênico um laboratório de possibilidades. Com o advindo da luz elétrica, dá profundidade à cena e trabalhando contrastes e sombras. Para ele, a cenografia e a iluminação deviam produzir sensações ao espectador. Através do simbolismo, os elementos não eram representados figurativamente. Usava planos horizontais, escadas, rampas, zonas de luz e sombras e formas puras. Era um espaço abstrato e geométrico. Edward Gordon Craig, que trabalhou com Isadora Duncan, pesquisa cenários flexíveis e modulares e enfatiza a plástica do corpo em contraponto com o cenário volumétrico. Buscou o uso de painéis que se deslocavam em linhas verticais, porém teve dificuldades com a movimentação. Isadora Duncan, Martha Graham e Doris Hamphrey usavam tela de fundo preta e iluminação de ciclorama. O escultor Isamu Noguchi juntamente com Graham, criam objetos que participavam ativamente da coreografia.

Com o surgimento da imprensa, do cartaz, da fotografia e do cinema, os movimentos artísticos modernistas entre os anos 20 e 30 passaram a utilizar a arte para instigar, provocar e estimular. Assim, a cenografia deixa de apenas decorar e ilustrar o ambiente, mas proporciona sensações e faz o espectador pensar e se questionar. O Expressionismo Alemão foi um movimento que trabalhava uma estética sombria, com um conteúdo pessimista e angustiante. Uso de sombras, contraste marcante, máscaras e tudo que representava o grotesco. Os coreógrafos mais relevantes do expressionismo alemão foram Mary Wigman e Kurt Jooss. O Construtivismo Russo foi um movimento artístico que surgiu em meio a revolução russa, como uma forma de expressão política, onde os comícios se transformavam em espetáculos, com motores, máquinas e estruturas de metal, representando um ambiente fabril, típico da revolução industrial. Seu maior representante foi o encenador Mayerhold. Já a Bauhaus, que foi uma escola de artes, arquitetura e design, se utilizava de formas geométricas e cores puras, principalmente as primárias. Tinha Oskar Schlemmer como coreógrafo que partia da anatomia humana e das formas geométricas para desenhar figurinos que restringissem ou interferissem nos movimentos dos bailarinos no seu “Ballet Triádico” (Figura 02).

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Figura 02: “Ballet Triádico”, 1922, montagem de Oskar Schlemmer, mostrando os figurinos baseados nas formas geométricas e na anatomia humana.

Fonte: https://triangulomag.files.wordpress.com/.

A partir dos anos 50, Merce Cunningham propõe que qualquer lugar pode ser dançado, usando estacionamentos, praças, topos de arranha-céus e galerias de arte. Na década de 60, Alwin Nikolais manipula objetos, tecidos, esculturas e iluminação e é criticado por descaracterizar o bailarino, fazendo com que estes parecessem esculturas e não corpos humanos. A partir de 1980, o grupo japonês Sankai Juku trabalha com o tempo, sensações, reflexões e espaços e materiais diversos, como o uso de fachadas de edifícios e a aplicação de areia que cai do teto do palco, trabalhando a alusão a uma ampulheta e um tempo hipnótico. Jiry Kylian, coreógrafo tcheco, usa um cubo de vidro em que um bailarino usa tinta para pintá-lo até que não se possa mais ver o bailarino. Pina Bausch, coreógrafa e bailarina alemã, desconstrói o palco simplista, preenchendo o chão com materiais diversos (Figura 03) para compreender a percepção dos bailarinos ao entrar em contato os mesmos, provocando-os emocionalmente.

Figura 03: “Nelken” de 1998, Tanztheater, grupo de dança de Pina Bausch, explorando inquietações através do preenchimento do chão do palco com um único material.

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Nos anos 90, no Brasil, o Grupo Corpo em seu espetáculo “21”, formava uma colcha de retalhos ao fundo do palco que se confundia com o figurino de seus bailarinos. Já no espetáculo “Bach”, uma homenagem artista clássico, o grupo faz uma alusão aos tubos do órgão através de tubos metálicos presos ao teto, onde os bailarinos se penduram em busca do divino em contraponto com a condição terrena do ser humano. Deborah Colker e seu cenógrafo, o arquiteto Gringo Cardia, montam uma estrutura de madeira que remonta aos cômodos de uma residência em seu espetáculo “Casa”.

Na cena contemporânea, há uma quebra na estrutura à italiana e a evolução dos edifícios proporciona novas formas de criação. Nos trabalhos de Peter Brook, os intérpretes se misturam junto à plateia que também participa, e cria um diálogo entre o performer e a tecnologia através do uso de projeção e computação. O edifício teatral passa a ser a cenografia de seus espetáculos. Josef Svoboda, precursor do uso do cenário tecnológico como forma de interação com os bailarinos, cria inovações nas áreas de projeção, iluminação e recursos audiovisuais.

Com isso, a pesquisa histórica possibilitou o conhecimento sobre a cenografia e sua relação direta com/para a dança em diferentes períodos históricos. Assim, destaca-se o contraste do próprio desenvolvimento da cenografia na dança de bidimensional e representativa, para tridimensional e simbólica, deixando seu caráter "figurante" e "decorativo" passando a elemento fundante da obra.

4 A PERCEPÇÃO DA CENOGRAFIA NA DANÇA

A primeira impressão que o público tem de um espetáculo, seja de teatro, dança, circo ou música, seja em locais de espetáculos ou espaços alternativos, é a composição do espaço cênico. Quando o público ocupa o local de apresentação ou quando a cortina se abre, a primeira percepção da identidade do trabalho é estabelecida através da captação visual dos elementos cênicos.

Esses elementos irão definir o espaço e, muitas vezes, o tempo em que ocorre a ação, seja de forma realista ou simbólica. Como se fosse uma pintura, uma tela ou uma fotografia, o local de atuação, sua arquitetura, a iluminação, a escolha e a manipulação de objetos, o figurino, a maquiagem e os cabelos, o desenho de som e a projeção de imagens e vídeos, são os elementos que vão propiciar a identificação, o contato e a troca de experiências e sensações entre o palco e a plateia. A função básica dessa composição cênica, é localizar no tempo e no espaço, materializar esse tempo e esse espaço, identificar visualmente a ação, e significar as escolhas dos elementos dramáticos, enfatizando o tema, o enredo e o ambiente emocional. Independente da natureza do espetáculo, seja de uma forma literária, como a ópera ou o teatro, ou ainda, a montagem de

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espetáculos que se baseiam em som e imagem, como a dança, a composição da cena sempre deve enfatizar a ação ou o movimento.

Segundo Eliana Rodrigues Silva em seu artigo intitulado “Encenação e Cenografia para Dança” (2007), no espaço cênico das peças de caráter naturalista, a cenografia deve recriar ao máximo a realidade dos personagens, ou seja, os elementos cênicos devem representar quase um espaço real, através de cheiros, materiais, sons e sensações. Já no espaço cênico das peças de caráter simbólico, a cenografia desmaterializa o lugar e usa esse lugar em universos subjetivos e fantasiosos, trazendo uma lógica diferente do que é real.

Assim, independentemente da escolha do caráter temático e do estilo do espetáculo, a estética é inseparável de uma abordagem visual. Eliana cita o exemplo das comédias, onde se usa o recurso de elementos cênicos de tamanhos muito maiores ou muito menores, em um jogo de proporções para trazer à tona a comicidade.

Por outro lado, a concepção cenográfica para espetáculos de dança precisa atender às questões específicas, uma vez que o espaço cênico é definido pela composição coreográfica, ou ainda a composição coreográfica poderá ser definida de acordo com o espaço cênico ou cenário, como poderemos ver na coreografia “Seres” do Balé da Cidade de Santa Maria. A concepção cenográfica precisa oferecer bastante espaço vazio para permitir a movimentação e o deslocamento dos bailarinos em cena. O cenógrafo precisa ajudar a criar a ilusão de liberdade e amplidão dos movimentos, e principalmente, de naturalidade com que os mesmos são executados.

Svoboda considerava de extrema importância o conhecimento e a análise do espaço arquitetônico teatral, para que se conseguisse propor uma cenografia adequada ao movimento dos bailarinos. Assim, (SVOBODA, 1993) considerava:

Antes de começar a criar um espaço dramático, sempre reflito sobre a fachada, a planta e os cortes do edifício teatral. (...) estou seguro que sem considerarmos as leis da arquitetura não será possível criar uma cenografia funcional. A cenografia deve expressar-se através dos conhecimentos fundamentais sobre as qualidades do espaço que se apresenta. (SVOBODA, 1993)

O palco, quando não há movimento, é percebido pela plateia apenas em suas dimensões de altura e largura. É o movimento que acontece nele que revela a profundidade, a terceira dimensão, dando volume e trazendo a percepção espacial.

Cenografia não é somente o cenário ou os elementos cênicos, mas também a iluminação, a paisagem sonora e os corpos vivos dos bailarinos que também fazem parte da composição. Appia e

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Craig defendiam que a composição cenográfica funciona como um corpo vivo no espaço, assim sendo, cenografia é um corpo vivo, logo um corpo vivo pode ser cenografia. “Appia e Craig, reformadores da mise em scène teatral, defendiam a concepção de cenografia como um corpo vivo no espaço, com um jogo rítmico próprio. ” (SILVA, E. R. 2007, p.24).

5 O CORPO CÊNICO

Como primeiro elemento de encenação, o corpo não se separa da ação e de seu significado. A cenografia não existe como uma arte autônoma. Ela estará sempre incompleta até a presença de um corpo em seu espaço, que possa dialogar e se conectar com seu espectador.

A cenografia deve compreender as necessidades dos bailarinos que irão interagir entre si diante de um público. Esses bailarinos interagem com informações físicas e simbólicas que compõe uma realidade poética. Esteticamente, a maquiagem, os cabelos e o figurino devem conversar com a cenografia, compondo uma atmosfera única, para poder transportar o espectador para esse espaço imaginário que é real (URSSI, 2006, p.78). A maquiagem do bailarino amplia as suas intenções e deixa mais claro as suas feições, escancarando os sentimentos do personagem. Por isso, nas artes performáticas, as cores são sempre muito vivas, usa-se muito o contorno dos olhos com lápis preto bem forte, para que de longe o público possa ter maior clareza da expressão do bailarino. A boca geralmente é pintada com cores vibrantes e fortes como o vermelho e o artifício de pós faciais é muito usado para o uso da iluminação e áreas de sombra do rosto, para que estas fiquem mais marcadas.

6 O ESPAÇO CÊNICO E A LUZ

A iluminação é um dos elementos de maior importância na composição cênica e um dos principais fatores é a visibilidade. A atual tecnologia e os seus novos equipamentos possibilitam efeitos e usos diversificados e inovadores e ajudam a definir o lugar e o tempo em que a ação acontece. Um projeto de iluminação cênica é pensado para cada momento e emoção que o espetáculo quer transmitir, definindo a luz como foco, recorte, geral ou banho. A configuração do espaço, seu tamanho, sua materialidade e texturas determinam que tipo de luz será empregada. O projeto de iluminação cênica sempre parte da necessidade comunicacional do diretor artístico/coreógrafo/cenógrafo e estes, junto ao iluminador definem quais mudanças serão feitas e quais efeitos serão produzidos no figurino, na maquiagem ou no próprio cenário. Os fatores que são consideráveis na nova tecnologia de iluminação cênica são a direção, a duração, a intensidade, o ritmo e o movimento luminoso e através dos gobos e filtros se pode produzir diversos efeitos que

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trabalham em conjunto com o som e a emoção do momento que o espetáculo quer produzir. Também existem hoje uma infinidade de alternativas que podem dialogar com a luz como as projeções, lanternas, espelhos para reflexão e até mesmo telas translúcidas.

Na dança, a luz é muito útil, pois é um elemento cênico que não interfere no espaço físico de dança, pelo contrário, ele ajuda a definir o espaço a ser utilizado. A iluminação para coreografia não só fornece a emoção, mas define espaços e os momentos com clareza, sendo através da luz que muitas vezes entendemos a troca de lugar ou a passagem do tempo, criando uma nova emoção. Nos espetáculos contemporâneos, a cor aplicada à iluminação cênica colabora com a grande diversidade de possibilidades na composição cênica.

7 O ESPAÇO CÊNICO E A COR

O olho humano é sensível às radiações eletromagnéticas que vão do ultravioleta ao infravermelho e que assim definem o nosso espectro visível de cores, através dos seus respectivos comprimentos de onda. As cores proporcionam diversas informações que, de acordo com nossas experiências e cultura, podem desencadear diversos processos psicológicos de acordo com a sensação que elas podem produzir. Os fatores que são consideráveis e podem ser medidos no espectro de cores são a matiz – que define cada cor, a saturação – que define quantidade de cor, e o valor – que define sua luminosidade. As cores-luz definidas como RGB (iniciais em inglês das palavras red, green e blue) são o vermelho, o verde e o azul e por definição física, são cores aditivas, ou seja, se somarmos ambas teremos o branco, ou seja, a luz total. As cores-luz são a cor de fato que é determinada através da matização. Já as cores-pigmento são apenas reflexos de luz nas superfícies. São definidas como CMYK (iniciais em inglês das palavras cyan, magenta, yellow e com a terminação da palavra black) o ciano, o magenta, o amarelo e o preto. A soma das três primeiras resulta no preto, ou seja, a pigmentação mais escura, sendo consideradas cores subtrativas. A percepção da cor na luz é sensorial e pode ser usada para intensificar e reforçar a informação estética que o espetáculo pretende passar. As composições cênicas usam das associações emocionais e estéticas atribuindo significados conforme a cultura, a época e as suas manifestações simbólicas. A cor trabalha diretamente com as emoções e isso proporciona uma infinidade de composições que colaboram para a cultura visual dos artistas e dos espectadores.

8 O ESPAÇO CÊNICO E O SOM

A composição cenográfica pode empregar uma grande variedade de sons, combinando-os para que se possa ambientar esteticamente o espectador. Além das palavras faladas, pode-se utilizar

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efeitos sonoros como ruídos e sons ambientais, a música e o silêncio. Os sons e a música podem indicar a estação ou tempo, um lugar, estabelecer emoções no espectador, proporcionar informações sobre o personagem e até estabelecer a mudança de cenas e ambientes. O compositor escreve as músicas e o sonoplasta planeja e produz os efeitos sonoros. Estes dois profissionais trabalhando em conjunto, determinam a paisagem sonora do espetáculo. O sonoplasta e o compositor combinam cinco fatores que são consideráveis para a combinação de sons: tom – a frequência de som; volume; qualidade; direção – a localização do som e como ele se propaga no espaço; e a duração – o comprimento do som no tempo (URSSI, 2006, p.92).

Na dança, o som é o elemento cênico principal, já que determina um ritmo e toda uma cultura através de estudos através de passos e movimentos específicos que foram contextualizados na história e possuem determinados gêneros musicais.

9 O BALÉ DA CIDADE DE SANTA MARIA

Mantido pela Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria, uma sociedade civil, de finalidade cultural, sem fins lucrativos, com personalidade jurídica, que busca recursos financeiros junto às pessoas físicas e jurídicas. Recursos esses aplicados na manutenção do Balé e em projetos de caráter social, desenvolvidos pelos integrantes.

Seus bailarinos desenvolveram o projeto “Dança Estudantes”, onde a dança é levada para mais de 1000 alunos por ano às escolas municipais, estaduais e filantrópicas, em um trabalho que durou 9 anos, tendo o Balé como responsável (1998 – 2006). Hoje o projeto segue com bailarinos de outros grupos ministrando as aulas do projeto.

O Balé da Cidade de Santa Maria nasceu da necessidade de criar uma companhia de dança que seria o centro de realizações do Rio Grande do Sul, de onde poderiam sair criações e talentos significativos não só para o estado, mas para todo o país. Ser o porto seguro onde se estimula o desenvolvimento de futuros talentos, fazendo-os acreditar que aqui há espaço para a dança, evitando a atual e constante evasão de nossos artistas para outros Estados, e levar a dança a todos os segmentos da sociedade de forma a desenvolver a cultura através de montagens modernas e contemporâneas que possam espelhar nossa terra, gente e crenças, seus principais objetivos.

No decorrer de seus nove anos de existência o Balé da Cidade de Santa Maria teve em seu currículo grandes montagens coreográficas e participação em Congressos e Festivais de grande expressão nacional e internacional, tais como: Festival Mundial de Publicidade de Gramado, Festa de Integração entre Culturas da América Latina “Assuncion Iberoamericana de Cultura de la Union de Ciudades Capitales Iberoamericanas – UCCI”, Congresso Nacional de Dança “CONDANÇA”,

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16º Dança Alegre Alegrete, Festival de Dança do CONESUL, Santa Maria em Dança, V Compasso Abraça Dom Pedrito; integrou as comemorações dos 500 anos do Brasil, com o espetáculo “Regressos”; Premiado em festivais como Festival Tápias (RJ) e convidado especial para a abertura do Festival de Inverno de Campina Grande (PB) nas comemorações do seu 30º aniversário (2005) e fazem parte de seu repertório as coreografias: “Cores: Uma Metáfora para o Espectador”, “Três Coreógrafos do Sul”, “O Consumidor do Próximo Milênio”, “Criador e Criatura”, “Seres”, “Desenhos e Rascunhos para uma Dança”, todos com coreógrafos de renome nacional como Ricardo Vinícius (MG), Eva Schul (POA), Jussara Miranda (POA), Charlie Linhares (SP), Caio Nunes (RJ), Eduardo Severino (POA) e Tatiana da Rosa (POA).

A partir de 2004, desfrutando de sua maturidade criativa, decidiu investir em seus talentos compondo seus próprios trabalhos reforçando assim a identidade da Companhia de Dança Contemporânea criando os trabalhos: “Na Busca... Um Encontro” de 2005 e “Retratos – Entre a Essência e a Aparência” composto sobre a obra de Mario Quintana em 2006. Espetáculo “Rede” de 2007 foi abertura do 14º Santa Maria em Dança e Abertura dos Jogos “Bom de Bola”. Foi premiado com pauta no Theatro Treze de Maio, no projeto “Treze: Palco da Cultura” com o espetáculo “Do Poeta à Dança” também em 2007.

10 “SERES” (2001)

“Seres” foi um trabalho coreográfico de Dança Contemporânea, coreografado por Eduardo Severino, apresentado pela primeira vez em 2001 (Figura 04). O trabalho tratava das relações entre os povos e suas diversas características que incluem a hierarquia, o poder, as diferenças e semelhanças, a luta e o estabelecimento de fronteiras.

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n. 6, p. 33942-33964 jun. 2020. ISSN 2525-8761 Figura 04: Coreografia “Seres”, de Eduardo Severino (POA), 2001.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Na concepção estética, essas fronteiras eram estabelecidas pela delimitação do cenário, ou seja, pelo andaime. Cercados pelo andaime, alguns bailarinos executavam movimentos quase mímicos representando nossas comunicações. As bailarinas no alto representavam o poder que poucos têm sobre muitos, enquanto os demais faziam a máquina toda girar, ou seja, a população que precisa trabalhar para que todo o sistema funcione.

O andaime era produzido em ferro, que é um material resistente permitindo com que os bailarinos pudessem escalar o cenário com segurança. O mesmo era composto por peças que se encaixavam e que permitiam a montagem e a desmontagem rápida, além de facilitar o transporte em ônibus. O andaime ainda contava com rodinhas para o fácil manuseio, movimento e deslocamento no palco, tornando-o mais leve, mesmo com bailarinos pendurados (Figura 05).

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Figura 05: Sistema de hierarquia, enquanto alguns estão no topo, outros fazem a máquina girar. Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Fonte: Arquivo pessoal STEFANELLO, I. F.

O figurino era simples, utilizando calça preta com recorte reto de alfaiataria, e blusas coloridas com recortes retos e ajustadas ao corpo. As cores representavam as semelhanças entre os seres e ao mesmo tempo a identidade de cada indivíduo (Figura 06).

Figura 06: Figurinos semelhantes em seu recorte, porém diferenciado em suas cores.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

O desenho de luz era simples, mas havia grande compensação na concepção cenográfica, em que o cenário era interativo e colaborava diretamente com a movimentação. Era adotada uma

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Geral de Frente branca e iluminação lateral branca, nas chamadas “escadas”. A iluminação central nos pontos focais era branca produzida por refletores Elipsoidais que permitem uma luz recortada ou refletor PC (Plano Convexo) que não possui o mesmo resultado do Elipsoidal, mas não permite uma luz tão difusa quanto os refletores Fresnéis. Já o Contra-Luz (luz que vem de trás para contorno dos corpos dos bailarinos) era feita nas cores verde e/ou azul, pois permitem uma luz mais natural e impactam menos nas cores do figurino em relação ao vermelho e ao âmbar. O Contra-Luz era produzido por refletores Par 64 foco um (um foco mais fechado) que permite uma luz desenhada quando há fumaça (Figura 07).

Figura 07: Iluminação produzida por Foco Central branco, Contra-Luz Azul percebida no braço da bailarina à frente e Escadas Laterais proporcionando volume ao cenário e salientando as formas dos corpos das bailarinas.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Possuía trilha sonora de John Cale e Cirque du Soleil, além de uma extensão musical executada ao vivo pelos músicos santa-marienses Daniel Rosa (guitarrista) e Deborah Rosa (cantora), e se caracterizava como uma paisagem sonora forte e impactante. Quando os bailarinos subiam no alto do andaime a música atingia seu ápice modificando para a música de maior impacto do Cirque du Soleil, intitulada Ninkou Latora, produzida originalmente para o espetáculo “Dralion” do próprio circo e composta por Violaine Corradi.

Tecnicamente, esse trabalho permitia com que o cenário influenciasse diretamente no tema, atribuindo significados subjetivos como hierarquia, manipulação, fronteiras e comunicação, e principalmente influenciando a movimentação, que interagia com o cenário e adaptava o movimento ao que o cenário permitia. É um caso de ação e reação, onde o cenário influencia o movimento e ao

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mesmo tempo o movimento dos bailarinos influencia o cenário, percebido quando os bailarinos giram o mesmo ou trocam o mesmo de lugar no palco.

11 “DESENHOS E RASCUNHOS PARA UMA DANÇA” (2002)

“Desenhos e Rascunhos para Uma Dança” foi um trabalho coreográfico de Dança Contemporânea, coreografado por Tatiana da Rosa, apresentado pela primeira vez em 2002 (Figura 08). O trabalho tratava das tentativas de criação, erros e acertos.

Figura 08: Coreografia “Desenhos e Rascunhos para uma Dança”, de Tatiana da Rosa (POA), 2002.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Na concepção estética, o registro da criação é estabelecido pelo cenário que exibe cada passo efetuado necessário para a criação dos movimentos que compõe a obra coreográfica. Toda a coreografia é baseada em tentativas, erros e acertos, onde sempre um dos integrantes erra, desiste ou para no meio do processo, impedindo que todos atinjam o objetivo proposto. Em alguns momentos os bailarinos observavam um grupo e em outros, eram observados, como se estivessem em um ateliê. Também eram carregados como se fossem esculturas ou cavaletes.

O cenário era feito em tecido branco com pinturas em preto de pegadas de sapatos. Inicialmente, esse tecido era localizado no chão, funcionando como um tapete, onde os bailarinos caminhavam saltitando como se deixassem suas pegadas. Após, o tecido preso em cordas de aço, era hasteado com a ação de força humana ou em vara de cenário (Figura 09). Possuía um trecho plastificado onde sofria pintura vermelha, permitindo a fácil limpeza e a reutilização (Figura 10). Sua montagem e desmontagem exigia infraestrutura específica ou tempo considerável, sendo ideal

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para aberturas de eventos ou espetáculo específico. Era de fácil manuseio por ser flexível. A forma mais adequada de se transportar era em rolo para evitar marcas de dobras. No palco, este cenário era estático, ou seja, fixo, e seu único movimento era o hasteamento.

Figura 09: Tecido sendo hasteado por cabos de aço, mostrando as pinturas de pegadas de sapatos.

Fonte: Arquivo pessoal de STEFANELLO, I.F.

Figura 10: Tecido com parte plastificada sendo manchada de vermelho com tinta nos pés da bailarina que está sendo carregada, simulando um pincel.

Fonte: Arquivo pessoal de STEFANELLO, I.F.

O figurino trabalhava bem com o cenário, sendo discreto e tornando o trabalho esteticamente monocromático, adotando na cena a cor da luz. As bailarinas usavam blusas de manga curta, justas ao corpo na cor branca e macacão mais folgado na cor cinza. Já os bailarinos usavam

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calça cinza e suspensório preto por cima da blusa branca. O figurino caracterizava a roupa dos pintores, sendo casual e confortável para o trabalho da pintura, além de possuir bolsos para a acomodação de flanelas.

Na coreografia havia uma preocupação maior com a luz, provavelmente pelo fato de o cenário ser estático. O cenário conversava bem com o tema e a proposta de falar de um ateliê e seus artistas. O vermelho da tinta que sujava o cenário era o ápice do trabalho, sendo impactante através do destaque que o vermelho tinha no cenário totalmente branco. Na iluminação, além da Geral de Frente, Iluminação Lateral (Escadas), Iluminação Central (Focos), apareciam Diagonais produzidas por Par 64 brancas, Canhão Seguidor, Blackouts e Contra-Luz nas cores âmbar, vermelho e azul.

A trilha sonora no ritmo Jazz, com composições de Dave Brubeck, John Coltrane e Charles Mingus, era uma constante e indicava uma rotina, sendo propícia para um local de trabalho como um ateliê.

Tecnicamente, o trabalho permitia com que o cenário, mesmo estático, atribuísse significados subjetivos e o espaço ficasse livre para a execução dos desenhos formados pelos bailarinos, ao exemplo das diagonais e círculos.

12 “DO POETA À DANÇA” (2007)

“Do Poeta à Dança” foi um trabalho coreográfico de Dança Contemporânea, coreografado pelos próprios Bailarinos/Intérpretes, apresentado pela primeira vez em 2005 (segunda parte), 2006 (primeira parte) e em 2007 de forma completa. Tratava de temas e reflexões baseados em poemas e poesias de grandes autores.

A primeira parte, “Retratos – Entre a Essência e a Aparência” partia das obras e da vida do poeta e jornalista gaúcho Mario Quintana, e tratava da infância e de temas como a rotina, a velhice e a morte.

Na concepção estética, foram usadas três janelas brancas em MDF, presas na vara central, que representavam um limite físico, mas que permitiam a observação. As mesmas faziam uma alusão às janelas dos hotéis onde Quintana passou parte de sua vida, ao exemplo do Hotel Majestic, atual Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre e tombada em 1990 pelo Patrimônio do Estado. O dentro e o fora era estabelecido através de uma mesa posta ao fundo esquerdo e um banco posto em frente à janela direita, sendo dois elementos opostos equilibrando a cena (Figura 11).

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Figura 11: Janelas em MDF brancas e a oposição entre a mesa ao fundo e o banco à frente, tornando dois espaços distintos.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

O cenário também era estático, mas por estar preso em varas de cenário localizadas próximo ao centro do palco, o mesmo permitia a passagem dos bailarinos entre eles, dividindo bem o palco em dois ambientes.

Já na segunda parte “Na Busca... Um Encontro”, os temas eram a inquietude e a busca por um sentido na vida. Partia do silêncio para demonstrar as sensações humanas. Para esse trabalho serviram de estímulos obras do escritor e jornalista mineiro Fernando Sabino, fragmentos de textos da escritora gaúcha Lya Luft e do escritor e poeta curitibano Paulo Leminski.

Na concepção estética, os elementos cênicos cilíndricos, com pinturas abstratas, permitiam uma linguagem que instigava o espectador ao questionamento, à busca do entendimento da sua existência através da solidão. A linha amarela representava uma delimitação imaginária, como se se bastasse ignorá-la para que o ser humano pudesse se expressar livremente (Figura 12).

Figura 12: Delimitação no chão com a linha amarela e os cilindros nas laterais e ao fundo.

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É interessante destacar, que os cilindros possibilitavam a sua alteração de lugar, tornando-os mais interativtornando-os e não fixtornando-os no espaço.

Por exibir um tema mais profundo e diverso, adotava também vários figurinos e trocas de roupa durante a apresentação. Isso permitia, juntamente com o plano de luz mais elaborado, um maior dinamismo do espetáculo, que não era proporcionado pelo cenário. A roupa justa destacava a forma corporal dando ênfase para a técnica da dança (Figura 13) e os vestidos exibiam a leveza, através do movimento e do ar que incidia sobre o tecido (Figura 14).

Figura 13: Roupas justas que destacam a forma do corpo.

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Figura 14: Tecido leve e transparente dá a sensação de leveza e permite fluidez aos movimentos.

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O espetáculo era o mais trabalhado no sentido da iluminação, onde se percebiam pontos focais com maior clareza (Figura 15), além do uso de cores variadas como o âmbar, o ciano e o magenta. A fita amarela colada no chão era uma barreira bastante visível, mas que fisicamente não interferia no espaço livre necessário para a movimentação em cena.

Figura 15: Luz recortada com auxílio de Bandoors (bandeiras que .

Fonte: Acervo da Associação dos Amigos do Balé da Cidade de Santa Maria.

Possuía trilha sonora composta pelo santamariense Gerson Rios Leme. O compositor tem experiência em composições para trilhas-sonoras de filmes e espetáculos de teatro e dança. Sua sonoridade traz sons de piano, strings e guitarras. A trilha também conta com a música “Higher” do guitarrista americano Jason Becker, um coral de sonoridade leve e lenta.

13 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É possível notar que as coreografias analisadas possuem o design cenográfico como um instrumento importante para o entendimento do tema e principalmente da composição coreográfica. Na coreografia “Seres” há pouca preocupação com o desenho de luz, mas há grande compensação na concepção cenográfica, em que o cenário é interativo e colaborava diretamente com a movimentação, em uma espécie de ação e reação, onde o cenário gera a movimentação dos bailarinos e o movimento dos bailarinos gera o movimento do cenário. A trilha sonora é adequada e impactante, tanto quanto o cenário e os movimentos dos artistas. E o figurino é simples mas trabalha bem com o impacto causado pelo cenário e a trilha, não competindo com os mesmos.

Na coreografia “Desenhos e Rascunhos para uma Dança” já uma preocupação maior com a luz, provavelmente pelo fato de o cenário ser estático. O cenário conversa bem com o tema e a proposta de falar de um ateliê e seus artistas, além das tentativas e erros. O vermelho da tinta que

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suja o cenário é o ápice do trabalho, sendo impactante através do destaque que o vermelho tem no cenário totalmente branco. A trilha sonora é propícia para um local de experimentação como um ateliê. O figurino trabalha bem com o cenário, sendo bem discreto e tornando um trabalho esteticamente monocromático.

Já no último trabalho, a coreografia “Do Poeta à Dança”, que é dividida em duas partes, é a mais trabalhada no sentido da iluminação, onde se percebem pontos focais com maior clareza, além do uso de cores variadas como o âmbar, o ciano e o magenta. O cenário também é estático, mas por estar preso em varas de cenário localizadas próximo ao centro do palco, o mesmo permite a passagem dos bailarinos entre eles, dividindo bem o palco em dois ambientes. Na segunda parte do espetáculo, o uso dos cilindros como elementos cênicos permitem uma interação maior do movimento do bailarino com o mesmo, e a fita amarela colada no chão é uma barreira bastante visível, mas que fisicamente não interfere no espaço livre necessário para a movimentação em cena. Por exibir um tema mais profundo e diverso, adota também vários figurinos e trocas de roupa durante a apresentação. Isso permite, juntamente com o plano de luz mais elaborado, um maior dinamismo do espetáculo, que não é proporcionado pelo cenário.

Assim, fica claro o quanto é importante considerarmos que um espetáculo não se faz somente pelo cenário, mas que outros elementos, como a luz, as cores, o figurino, a música e os elementos cênicos, colaboram para que a estética seja um instrumento que transporte o espectador para outras realidades, proporcionando sempre novas experiências, mas também instigando o pensamento e o questionamento a respeito de determinados temas. A arte da dança não pode se limitar apenas à técnica do movimento, mas deve sempre buscar uma conexão e o uso de outras artes para que se possa passar a informação que o artista deseja.

Também foi observada a importância da função do Designer Cenográfico como desenhista da paisagem cenográfica, sendo um profissional capaz de traduzir ideias e pensamentos de diversos artistas, oriundos de diferentes conhecimentos artísticos, em espaços físicos visíveis, sendo então, um tradutor do espaço cênico.

A arquitetura cenográfica é um campo de atuação novo e ainda muito desconhecido dos profissionais de arquitetura, que dominam o desenho da paisagem urbana, arquitetônica e de interiores, mas que por vezes desconhecem as infinitas possibilidades do campo do projeto para a Paisagem Cenográfica.

O Balé da Cidade de Santa Maria, nos seus dez anos de existência, buscou através da pesquisa e do fomento da dança, junto ao festival Santa Maria em Dança, tornar essa arte acessível

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e popular, produzindo uma verdadeira cultura da dança em Santa Maria, projetando Santa Maria como cidade cultura.

É lamentável que a municipalização deste projeto não tenha ocorrido e por falta de estrutura o grupo tenha sido desfeito em 2009, deixando um buraco cultural na história da dança do Rio Grande do Sul, mas que através de registros e análises dos trabalhos produzidos, pode-se manter a história dessa arte e possivelmente resgatá-la ao longo dos anos.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, André S. Cenografia: uma história em construção. Arterevista. São Paulo: Faculdade Paulista de Artes, Vol.1, N. 1, pp 1-25.

DEL NERO, Cyro. Máquina para os Deuses. São Paulo: Senac, 2009.

MACHADO, José C. Três Paradigmas para a Cenografia: instrumentos para a cena contemporânea. Revista Cena. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, N. 5.

RATTO, Gianni. Antitratado de Cenografia: variações sobre o mesmo tema. São Paulo: Senac, 2001.

SILVA, Eliana R.. Encenação e Cenografia para Dança. Diálogos Possíveis. Salvador: Faculdade Social da Bahia, pp 21-32.

URSSI, Nelson J. A Linguagem Cenográfica. Dissertação de Mestrado em Artes Cênicas – Universidade de São Paulo. São Paulo, 2006.

ANEXOS

SEVERINO, Eduardo. Seres – Balé da Cidade de Santa Maria. Santa Maria: 2001. Disponível em: <https://youtu.be/ULOjpXJB0xs> Acesso em: jun. 2019.

DA ROSA, Tatiana. Desenhos e Rascunhos para uma Dança – Balé da Cidade de Santa Maria. Santa Maria: 2002. Disponível em: <https://youtu.be/_ahZMaqVZFU> Acesso em: jun. 2019.

Imagem

Figura  01:  Teatro  barroco  do  Palácio  de  Litomysl,  República  Tcheca,  1797,  mostrando  as  diversas  telas  laterais  formando a perspectiva de um palácio que se abre para um caminho externo representado na tela pintada ao fundo.
Figura  02:  “Ballet  Triádico”,  1922,  montagem  de  Oskar  Schlemmer,  mostrando  os  figurinos  baseados  nas  formas  geométricas e na anatomia humana
Figura 04: Coreografia “Seres”, de Eduardo Severino (POA), 2001.
Figura 06: Figurinos semelhantes em seu recorte, porém diferenciado em suas cores.
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