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CONTAS DO ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA CASO JULGADO

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 348/18.8T8AMT-J.P1 Relator: FILIPE CAROÇO

Sessão: 15 Abril 2021

Número: RP20210415348/18.8T8AMT-J.P1 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO

CONTAS DO ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA CASO JULGADO

RECURSO OBJECTO DE CONHECIMENTO

Sumário

I - Se as contas do Administrador da Insolvência, aprovadas por sentença

transitada em julgado, refletem apenas os valores parciais e totais das receitas e das despesas da massa insolvente, sem qualquer referência à dedução na despesa do valor da provisão adiantada ao administrador, não viola aquele caso julgado a consideração pela secretaria do valor dessa provisão nas operações de rateio final que lhe cumpre formalizar no respetivo mapa.

II - O recurso interposto ao abrigo do art.º 629º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil, com fundamento na violação de caso julgado deve ser admitido, mas será julgado improcedente se, apreciada essa questão, se concluir que não ocorre a violação do caso julgado.

III - Tal recurso visa apenas a verificação do caso julgado, não podendo ser nele suscitadas e conhecidas quaisquer outras questões, decisões ou

segmentos de decisão submetidos à regra geral da admissibilidade prevista no nº 1 do art.º 629º do Código de Processo Civil.

Texto Integral

Proc. nº 348/18.8T8AMT-J.P1 (apelação)

Comarca do Porto Este - Juízo de Comércio de Amarante – J 2 Relator: Filipe Caroço

Adjunto Desemb. Judite Pires

Adjunto Dsemb. Aristides Rodrigues de Almeida

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Acordam na Relação do Porto I.

No apenso de prestação de contas (apenso I) relativo ao processo de insolvência acima identificado, o Administrador da Insolvência, B…, aqui recorrente, prestou contas da sua administração[1], tendo indicado uma receita de € 10.000,00 e uma despesa de € 1.360,92; assim um saldo no valor de € 8.639,08.

Juntou aos autos documentos comprovativos das suas contas.

O Ministério Público promoveu então que a receita e a despesa fossem fixadas naquele valor, esta última acrescida das despesas com custas e da

remuneração do Administrador da Insolvência, e que se remetessem os autos à conta com vista ao cálculo da remuneração variável devida àquele órgão da insolvência e realização do rateio final.

Por sentença subsequente, proferida naquele mesmo apenso, no dia 8.9.2020 (pág. 53) o tribunal julgou validamente prestadas as contas e,

consequentemente, fixou a receita no total de € 10.000,00 e a despesa global no montante de € 1.360,92, a que disse acrescer a despesa com custas e remuneração do Administrador da Insolvência. Mais se determinou que os autos fossem à conta, fixando à ação o valor de € 10.000,00.

No processo principal, a 15.10.2020, foi calculado pela secretaria o valor da remuneração variável devida ao Administrador da Insolvência na quantia de € 357,79, acrescida de IVA, o que perfaz o total e € 440,08 e foi efetuada a conta de custas do processo.

A 9.12.2020, a secretaria efetuou o rateio final, com elaboração de respetivo mapa e distribuição de verbas, notificando o Administrador da Insolvência para eventual reclamação.

O Sr. Administrador entendeu que, de acordo com a sentença proferida no apenso I, transitada em julgado, o tribunal fixou a despesa global em € 1.360,92, havendo por isso lapso da secção na menção que faz ao valor de € 860,92 como sendo a despesa da massa insolvente.

A secretaria assinalou que o Sr. Administrador não atendeu à quantia de € 500,00 de provisão para despesas que lhe foram adiantadas pelo tribunal e já reembolsadas pela massa através da conta de custas, conforme mapa de rateio elaborado em conformidade.

O tribunal, por decisão de 13.1.2021, homologou o rateio elaborado pela

secretaria, considerando que foram aprovadas todas as despesas apresentadas pelo Administrador da Insolvência e que o valor da provisão tem por finalidade garantir que o administrador possa imediatamente, após a nomeação, fazer

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face às despesas necessárias ao andamento do processo de insolvência, as quais são dívidas da massa insolvente.

Considerou ainda o tribunal que, se a provisão se destina a pagar dívidas da massa insolvente, não é aceitável que existam dívidas resultantes da

liquidação da massa insolvente e que aquele valor da provisão não seja utilizado para o seu pagamento quando o administrador não comprova ter suportado despesas de igual valor.

Assim, o tribunal indeferiu a reclamação do Administrador da Insolvência e procedeu à homologação, ordenando que se notificasse aquele para proceder aos pagamentos.

É desta decisão que apela o Sr. Administrador da Insolvência, tendo apresentado alegações com as seguintes CONCLUSÕES:

«A) O Administrador de Insolvência, em 25 de Junho de 2020, prestou as Contas a que alude o artigo 629º, nº 3, do C.I.R.E., por apenso, das quais resulta que a receita foi de € 10.000,00 e a despesa de € 1.360,92.

B) No requerimento que as acompanhou, foram elencadas outras dívidas da massa insolvente que, à data, subsistiam por pagar, conforme previsto pelo artigo 172º, do C.I.R.E., nomeadamente, custas judiciais, remuneração variável do Recorrente e outras despesas devidamente documentadas.

C) Tais contas foram aprovadas pelo Tribunal “a quo”, não tendo sido objecto de nenhuma reclamação ou de qualquer reparo dos credores e do Ministério Público, como se infere do teor da sentença com a V. Ref.ª 83172285,

proferida, em 8 de Setembro de 2020, no Apenso l, na qual se pode ler, na parte final, o seguinte:

“Consequentemente:

- fíxa-se a receita total no montante de € 10.000,00;

- fixa-se a despesa global no montante de € 1.360,92, à qual deverá acrescer a despesa com custas e remuneração do administrador da insolvência;”

D) Em 19 de Outubro de 2020, a massa insolvente pagou a guia de custas judiciais, do valor de € 4.027,84.

E) A Secção, em 10 de Novembro de 2020, notificou o Administrador de Insolvência para apresentar proposta de rateio final, na esteira do despacho, de 8 de Maio de 2020, que se encontra no Apenso E.

F) No uso da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 182º, nº 3; do C.I.R.E., o Recorrente ofereceu aos autos principais, em 18 de Novembro de 2020, a proposta de rateio final, tendo, igualmente, indicado o saldo da conta bancária da massa insolvente (€ 4.611,24), bem como informado que ainda não tinha sido retirada a remuneração variável que lhe cabe.

G) Em 9 de Dezembro de 2020, a Secretaria, através de cota, veio sustentar

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que a proposta de rateio do Administrador Judiciai “padece de erro” e, no quadro que juntou, faz menção à quantia de € 860,92 como “Despesas da massa insolvente” (ao invés do montante correcto, de € 1.360,92, como devia).

H) Uma vez que o rateio final é uma mera operação aritmética é descabido o juízo, de suposta legalidade, emitido pela Senhora Oficial de Justiça.

I) Sucede que aquilo que o Tribunal de 12 instância decidiu – e bem! – fixar as despesas em € 1.360,92, “ … à qual deverá acrescer a despesa com custas (…)

”, que, no caso, se cifrou em € 4.027,84, pelo que é destituído de qualquer fundamento a pretensão da Senhora Funcionária Judicial em abater a provisão de despesas àquele montante.

J) O Recorrente, em 22 de Dezembro de 2020, reclamou do mapa de rateio efectuado pela Senhora Escrivã Adjunta, juntou o extracto da conta bancária da massa insolvente e deixou consignado o seguinte:

“Nessa conformidade, o montante disponível para ser distribuído pelos

credores é de € 4.165,44 e não de € 4.665,44, como consta do quadro que ora se impugna.

Acresce que, de acordo com a douta sentença proferida, no passado dia 8 de Setembro, no Apenso l (cfr. V. Ref.ª 83172285), pacificamente transitada em julgado, o Tribunal fixou a despesa global em € 1.360,92, peio que enferma de lapso a menção da Secção ao valor de € 860,92 como sendo o de despesas da massa insolvente.

Assim, vem requerer a V. Exa. que se digne determinar a correção do mapa de rateio com fundamento na factualidade atrás enunciada.”

K) Em 19 de Janeiro de 2021, o Administrador de Insolvência foi notificado do despacho que homologa o rateio da Secção, na sequência de cota da Senhora Escrivã Adjunta e da promoção do Senhor Procurador, ambas de 11 de Janeiro de 2021 e indefere a reclamação que o primeiro subscreveu.

L) Desse modo, a Secção, o Ministério Público e o Tribunal “a quo”, sem prejuízo de terem dissertado sobre o fim a que se destina a provisão para despesas que a lei atribui aos administradores judiciais, ignoraram e, em

simultâneo, fizeram tábua rasa do que ficou decidido na sentença que aprovou as Contas e que fixou a despesa global – nestes autos, em concreto – no valor de € 1.360,92 (e não em € 860,92 como entendeu, ao arrepio da lei, a Secção), a que acrescem aquelas que também identificou.

M) A sentença, de 8 de Setembro de 2020, proferida no Apenso I, transitou em julgado, pelo que, automaticamente, foram gerados os efeitos previstos no artigo 619º, nº l, do C.P.C..

N) A mencionada sentença foi violada – de forma flagrante – pelo despacho ora impugnado, na medida em que este homologou o rateio da Secção, o qual

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baseou a conta aritmética que fez numa parcela, no caso, do montante de despesas que, em vez de respeitar o valor de € 1.360,92 fixado na referida sentença, optou por o modificar para € 860,92, o que, naturalmente, lhe estava interdito.

O) Ora, o artigo 625º, nº l, do C.P.C., aplicável “ex vi” artigo 17º, do C.I.R.E., estabelece o seguinte:

“Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar.”

P) Assim, o despacho objecto de recurso viola caso julgado uma vez que foi proferido no processo onde tal matéria já tinha ficado assente, por força da sentença que aprovou as Contas ter fixado a despesa global em € 1.360,92, decisão essa transitada em julgado. Q) No caso julgado formal, a primeira decisão tomada tem força obrigatória dentro do processo, tal como prevê o artigo 620º, nº l, do C P.C. e visa evitar o que não se conseguiu nestes autos:

repetição de decisões judiciais sobre a mesma questão.

R) O caso julgado traduz a irreversibilidade da sentença, por esgotamento quanto à matéria da causa após a sua prolação, de harmonia com o que dispõe o artigo 613º, nº l, do C.P.C..

S) Independentemente do valor da causa e da sucumbência, o recurso é sempre admissível quando ocorre violação de caso julgado, de acordo com o que preceitua o artigo 629º, nº 2, alínea a), do C.P.C..

T) A sanção para a ofensa do caso julgado formal perpetrada pelo despacho recorrido é a de se considerar o mesmo juridicamente ineficaz, o que deve conduzir à respectiva revogação.

U) O montante que tem de servir de base para elaboração do rateio, no que concerne a despesas aprovadas, é o de € 1.360,82 (a que se somam as custas e a remuneração do administrador da insolvência, de acordo com a sentença com a V. Ref.ª 83172285 – Apenso I) e não o de € 860,92 encontrado pela Senhora Escrivã Adjunta, pelo que a operação aritmética que realizou tem de falecer por enfermar de vício insanável.

V) Consequentemente, o montante disponível para ser rateado pelos credores é de € 4.165,44, como demonstrou o Recorrente e não de € 4.665,44 como resulta do rateio – errado – da Secção.

W) O despacho impugnado não se encontra em consonância com a aplicação das normas legais que regem a matéria em apreço, desde logo, os artigos 46º, nº l, 51º, nº l 60º, nº l, todos do C.I.R.E., com o artigo 157º, nº 6, do C.P.C, e com os artigos 22º, 23º, nº 2 e 29º, nº 5, todos da Lei 22/2013.

X) O exercício da actividade de administrador judicial faz incorrer em despesas a pessoa que desempenha o cargo, em cada processo para que é indigitado, atenta a natureza das funções em causa, as quais estão

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genericamente enunciadas no artigo 55º, nº 1, do C.I.R.E., bem como no artigo 22, nº l, da Lei 22/2013.

Y) As despesas que o Recorrente comprovou nas Contas prestadas e que mereceram aprovação do Tribunal “a quo”, são inerentes a este processo judicial, indissociáveis do mesmo e estão intrinsecamente ligadas à presente acção de insolvência, motivo pelo qual devem ser imputadas à massa

insolvente e não ao Administrador de Insolvência.

Z) A complexidade do trabalho desenvolvido pelo Administrador de

Insolvência, motivada pelos vários entraves que foram sendo levantados pela gerência da devedora, os quais visaram obstar à apreensão do activo, está suficientemente comprovada nos autos, quer pelas peças processuais que subscreveu, quer pelas sentenças e despachos judiciais, que acompanham este articulado.

AA) Tal como se depreende das Contas aprovadas, o Recorrente absteve-se de juntar às mesmas a totalidade das despesas que suportou nestes autos, entre outras, com gasóleo e portagens, atento o facto da lei lhe atribuir a provisão de € 500,00 para o efeito.

BB) O rateio da Secção, homologado pelo despacho ora impugnado, não pode vingar (i) por, ao alterar o montante das despesas fixadas na sentença que aprovou as Contas, ter violado caso julgado e ficado inquinado de erro insanável, bem como (ii) por ser incorrecta a quantia que indica como disponível para distribuir pelos credores, em face das dívidas da massa insolvente que saem precípuas e que ainda têm de ser retiradas da mesma, nomeadamente, a remuneração variável do Administrador de Insolvência CC) O Recorrente, por força do seu Estatuto, é um servidor da Justiça e do Direito, tal como decorre do artigo 12º, nº l, da Lei 22/2013 e é nesse enquadramento que se estriba o presente recurso.» (sic)

Pretende assim o Administrador da Insolvência que seja revogada a decisão recorrida e proferida outra que substitua o mapa de rateiro emanado da secção pela proposta de rateio por ele elaborada.

O Ministério Público apresentou contra-alegações onde desde logo suscitou a questão prévia da inadmissibilidade do recurso, defendendo depois,

subsidiariamente, a sua improcedência.

*

Foram colhidos os vistos legais.

* II.

Questões a apreciar

(7)

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e

relacionadas com o conteúdo do ato recorrido, e não matéria nova, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 17º, nº 1, do CIRE[2]).

Está para decidir:

1. Se a decisão de 8.9.20202, proferida no apenso I, homologatória do mapa de rateio elaborado pela secretaria viola o caso julgado da sentença de apreciação e aprovação das contas prestadas pelo Administrador da Insolvência;

2. Se o mapa de rateio homologado deve ser reformulado de modo a que seja considerado montante de € 1.360,82, e não a quantia de € 860,92 indicada pela secretaria, como sendo as despesas aprovadas para o efeito (a que se somam as custas e a remuneração do administrador da insolvência).

A título de questão prévia, suscitada pelo Ministério Público, importa verificar desde já se a decisão é recorrível.

* III.

Os factos relevantes são essencialmente os seguintes, a conjugar com o relatório que antecede:

1. No dia 25.6.2020, o Administrador da Insolvência apresentou as contas da sua administração para efeito de rateio final;

2. Essas contas discriminam € 10.000,00 de receitas (provenientes da venda de bens apreendidos sob as verbas nºs 1 a 6 dos bens apreendidos) e € 1.360,92 de despesas (resultantes de trabalhos de remoção e transportes, serviços jurídicos, despesas com o processo e comissão de transferência);

3. Do respetivo resumo resulta o valor total da receita e o valor total da

despesa, com indicação do respetivo saldo, ou seja, o valor da receita deduzido do valor da despesa: a quantia de € 8.639,08.

4. O tribunal aprovou aquela relação de receitas e de despesas os seguintes termos:

«- fixa-se a receita total no montante de € 10.000,00;

- fixa-se a despesa global no montante de € 1.360,92, à qual deverá acrescer a despesa com custas e remuneração do administrador da insolvência;

- remetam-se os autos à conta.

*

Custas pela insolvente.

(…)». (sic)

*

(8)

IV.

Conhecendo…

A questão prévia da admissibilidade do recurso

Alega o Digno Magistrado do Ministério Público que não se verifica qualquer das situações previstas nos nºs 2 e 3 do art.º 629º do Código de Processo Civil que poderia justificar a admissibilidade do recurso independentemente do valor da causa e da sucumbência, designadamente o caso julgado (nº 2, al. a)).

Assim e porque o valor da ação é de € 10.000,00 e o valor da sucumbência é de € 500,00, o recurso não é admissível, devendo ser indeferido.

Por sua vez, logo nas alegações de recurso, o apelante considerou que a

decisão recorrida, que indeferiu a reclamação do Administrador da Insolvência e homologou o mapa de rateio viola o caso julgado relativo à sentença de

aprovação de contas proferida no apenso I, em 8.9.2020.

Invocado este fundamento, o recurso é admissível, nos termos do art.º 629º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil.

Saber se efetivamente há caso julgado é a primeira questão do próprio recurso, que passamos a analisar.

*

1. A decisão de 8.9.20202, proferida no apenso I, homologatória do mapa de rateio elaborado pela secretaria viola o caso julgado da sentença de

apreciação e aprovação das contas prestadas pelo Administrador da Insolvência?

Conforme resulta do relatório, pela sentença proferida no apenso I, no dia 8.9.2020 (pág. 53), o tribunal julgou validamente prestadas as contas e, consequentemente, fixou a receita no total de € 10.000,00 e a despesa global no montante de € 1.360,92, a que deverá acrescer a despesa com custas e remuneração do Administrador da Insolvência. Mais se determinou que os autos fossem à conta, fixando à ação o valor de € 10.000,00.

O art.º 62º, sob a epígrafe “apresentação de contas pelo administrador da insolvência”, estabelece:

«1- O administrador da insolvência apresenta contas dentro dos 10 dias subsequentes à cessação das suas funções, qualquer que seja a razão que a tenha determinado, podendo o prazo ser prorrogado por despacho judicial.

(…)

3- As contas são elaboradas em forma de conta corrente, com um resumo de toda a receita e despesa destinado a retratar sucintamente a situação da massa insolvente, e devem ser acompanhadas de todos os documentos

comprovativos, devidamente numerados, indicando-se nas diferentes verbas os números dos documentos que lhes correspondem.»

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As contas devem ser prestadas, designadamente, para efeito da realização do rateio final conducente ao encerramento do processo de insolvência (art.º 230º, nº 1, al. a)) que exprime o fecho em definitivo, da liquidação da massa.

Mas, seja qual for a causa e a oportunidade da prestação de contas, elas devem ser ordenadas e apresentadas em forma de conta-corrente,

independentemente da natureza do devedor insolvente. Sempre deve ser oferecido um resumo final dos totais da receita e da despesa, cumprindo-se assim o objetivo de permitir a perceção fácil, pelos destinatários, da situação da massa. É pela prevista junção dos documentos justificativos que se

sustentam e credibilizam tanto os lançamentos a crédito como a débito, para que seja possível uma análise e uma ponderação efetiva das contas.

Se as contas não forem apresentadas deste modo, a obrigação do administrador não fica cumprida.[3]

Os mesmos Professores explicam ainda[4]: “É fundamentalmente através da prestação de contas que se pode agora sindicar a razoabilidade das despesas efectuadas pelo administrador e a cujo reembolso ele tem direito, de acordo com o art.° 60.°, n.° 1 (…)”, com referência ao Estatuto do administrador da insolvência e à Portaria nº 51/2005.

Da sentença de 8.9.2020 extrai-se o seguinte:

«O julgamento das contas que o Tribunal terá de fazer recai sobre a real situação económica final da insolvência decretada, incidirá sobre a real consistência do saldo encontrado e resultante das receitas e das despesas comprovadas na conta-corrente exibida por quem as presta, assim como e também comportará um juízo sobre a exatidão ou insuficiência de cada uma das verbas que se incluem nas receitas ou débitos descritos --- a finalidade do processo de prestação de contas é a do apuramento do saldo das contas; para tal apuramento, se necessário, deve o julgador recorrer ao prudente arbítrio e à sua experiência.»[5]

Ratear significa distribuir proporcionalmente, podendo definir-se o rateio como a distribuição proporcional do valor total da massa, passível de distribuição pelos credores concorrentes, dada a retenção obrigatória em processo de insolvência de montante afeto às custas e encargos da massa, a saírem precípuas.

É certo que na distribuição e rateio final estão em causa operações aritméticas que não envolvem já, em princípio, a formulação de qualquer juízo de

legalidade, oportunidade ou probabilidade. Por isso se tem dito que a

secretaria está em condições de as fazer[6]. Mas, por tal razão, se não se pode desvirtuar o sentido das decisões judiciais com base nas quais se faz a referida execução material do mapa, entre elas as decisões relativas à graduação de créditos (seguindo a graduação inerente às prioridades de pagamento

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atendíveis) e à prestação de contas (seguindo as contas aprovadas)[7], nem por isso a secretaria deixa de dever observar a legislação aplicável na parte que está para além do âmbito da decisão em execução.

No caso, importa saber, não se a decisão final relativa à prestação de contas do Administrador da Insolvência dá satisfação correta aos comandos legais aplicáveis, mas se a decisão recorrida não viola o caso julgado já formado relativamente àquela decisão, ao confirmar o mapa de rateio elaborado pela secretaria.

A reclamação do mapa de rateio destina-se à correção desse mapa, ou seja, a obter a sua alteração em função de qualquer desvio relativamente às

sentenças a que dá execução, nunca, por nunca, a obter um resultado que contrarie aquelas decisões, transitadas em julgado, cuja observância se impõe no próprio processo (caso julgado formal – art.ºs 619º, nº 1 e 620º do Código de Processo Civil).

Nas contas da administração que o Administrador da Insolvência apresentou a 25.6.2020, em cumprimento do disposto no art.º 62º, nºs 1 e 3, sobre as quais se debruçou a sentença que as aprovou, estão transcritos em mapa,

discriminadamente, € 10.000,00 de receitas (provenientes da venda de bens apreendidos sob as verbas nºs 1 a 6 dos bens apreendidos) e € 1.360,92 (de despesas resultantes de trabalhos de remoção e transportes, serviços

jurídicos, despesas com o processo e comissão de transferência). Do respetivo resumo resulta o valor total da receita e o valor total da despesa, com

indicação do respetivo saldo, ou seja, o valor da receita deduzido do valor da despesa: a quantia de € 8.639,08.

Ao aprovar estas contas pela sentença de 8.9.2020, tal qual se encontram ali descritas, o tribunal está a determinar que as receitas e as despesas ali declaradas foram efetivamente obtidas e realizadas, devendo, como tal, ser traduzidas e concretizadas pela secretaria no mapa de rateio final a que se refere o art.º 182º.

Neste mapa de rateio final, a secretaria, ao considerar um valor de despesa de

€ 860,92 não está a negar o valor de despesa total (€ 1.360,92) indicado pelo Administrador da Insolvência nas suas contas, judicial e definitivamente

aprovadas, mas a deduzir-lhe, para efeito do rateio, a quantia de € 500,00 que o mesmo administrador havia recebido antecipadamente com vista a cobrir essas despesas. Isso mesmo foi atendido na conta de custas, conforme explicação dada pela secretaria registada no processo a 9.12.2020.

O dever de cumprimento pela secretaria das decisões judiciais não afasta o dever de aplicação dos comandos legais no momento desse cumprimento, desde que não estejam contrariados por tais decisões.

Ao abater a quantia de € 500,00 no valor das despesas indicado nas contas

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aprovadas, a secretaria não negou o valor dessas despesas. Aliás, considerou- as efetivamente realizadas pelo montante de € 1.360,92, fazendo recair sobre ele a referida dedução.

De acordo com o art.º 22º do Estatuto do Administrador Judicial, aprovado pela Lei nº 22/2013, de 26 de fevereiro, “o administrador judicial tem direito a ser remunerado pelo exercício das funções que lhe são cometidas, bem como ao reembolso das despesas necessárias ao cumprimento das mesmas”[8].

O nº 8 do art.º 29º do mesmo estatuto prevê uma provisão, ou seja, a entrega antecipada de uma quantia ao Administrador da Insolvência para despesas futuras, equivalente a um quarto da remuneração fixada na portaria referida no nº 1 do art.º 23º.

O diploma legal referido a propósito da remuneração do Administrador da Insolvência e das despesas é a Portaria nº 51/2005, de 20 de janeiro, em cujo art.º 1º se fixa em € 2.000,00 o valor da remuneração do administrador

nomeado pelo juiz, nos termos do atual art.º 23º, ainda do Estatuto do

Administrador Judicial (Decreto-lei nº 22/2013, de 26 de fevereiro). Daí que, equivalendo a ¼ da remuneração, seja de € 500,00 a provisão para despesas a entregar ao Sr. Administrador e que, no caso (ninguém nega), lhe foi

efetivamente entregue.

Foi pela aplicação desta legislação que a secretaria, na operação aritmética inerente à execução material do rateio final, abateu o valor da provisão no valor (superior) da despesa total realizada e aprovada. Ao tê-lo feito, a

secretaria não contrariou a sentença que aprovou as contas apresentadas pelo Administrador da Insolvência; antes aplicou legislação que aquela decisão também não contrariou.

Da sentença que aprovou as contas não se extrai que ao valor total da despesa não se deve deduzir o valor da provisão para despesas recebido pelo

Administrador da Insolvência.

A decisão recorrida, homologatória do mapa de rateio (pág. 75), não está em contradição com aquela decisão anteriormente proferida no apenso I que aprovou as contas apresentadas pelo Administrador da Insolvência.

Decorre necessariamente do exposto que a decisão recorrida não trata da mesma questão que foi objeto de apreciação na decisão anterior, não a contraria; antes a pressupõe, como é devido, e, por isso, não viola o caso julgado ali formado (art.ºs 580º, nºs 1 e 2, 619º, nº 1, 620º e 625º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Aqui chegados, impõe-se a conclusão de que a questão suscitada da violação do caso julgado deve ser julgada improcedente.

*

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2. O mapa de rateio homologado deve ser reformulado de modo a que seja considerado montante de € 1.360,82, e não a quantia de € 860,92 indicada pela secretaria, como sendo as despesas aprovadas para o efeito (a que se somam as custas e a remuneração do administrador da insolvência)?

Esta questão não cabe nos fundamentos da extensão especial de

recorribilidade previstos nos nºs 2 e 3 do art.º 629º do Código de Processo Civil[9] e jamais poderia integrar um recurso com tal fundamento, no caso, exclusivo da invocação da violação do caso julgado.

Com efeito, é insustentável a apreciação desta questão.

A apelação improcede.

*

*

SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)

………

………

………

* V.

Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas do recurso pelo recorrente, por nele ter decaído totalmente, sem prejuízo da taxa de justiça paga pela sua interposição.

*

Porto, 15 de abril de 2021 Filipe Caroço

Judite Pires

Aristides Rodrigues de Almeida ________________

[1] Pág. 141 do histórico do presente apenso de recurso (apenso a que respeitam todas as páginas que se citarem sem menção de origem).

[2] Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem

indicação de origem.

[3] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE anotado, Quid Juris 2009, pág. 285 e 286.

[4] Idem, pág. 286.

[5] Citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.05.1995, Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, 1995, Volume II, página 106.

(13)

[6] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit., pág. 601 (anot. ao art.º 182º).

[7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.2.2018, proc.

3157/12.4TBPRD-I.P1.S3, in www.dgsi.pt.

[8] O sublinhado é nosso.

[9] Cf. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, pág. 40.

Referências

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