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III AGRAVO DE INSTRUMENTO

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Academic year: 2022

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Nº CNJ : 0020880­98.2012.4.02.0000

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO

PEREIRA DA SILVA

AGRAVANTE : FUNDACAO CULTURAL PALMARES

PROCURADOR : MAIRA CALDAS TABOADA DIOS CARVALHO

AGRAVADO : PEDRO JOSE DE MOURA LIMA

ADVOGADO : PAULO EDUARDO FRANCO DE VILHENA E

OUTRO

ORIGEM : 2A. VARA FEDERAL ­ SAO PEDRO DA ALDEIA/RJ (201251080013697)

RELATÓRIO

Trata­se de agravo de instrumento interposto pela Fundação Cultural Palmares (fls. 02/12), contra a sentença de fls. 369/371, que extinguiu o feito, sem resolução de mérito, com relação à ora Agravante, na forma do Artigo 267, VI, do CPC.

Em suas razões recursais, sustenta a Agravante, em síntese, que "O objeto da lide, por si só, permite caracterizar­se o interesse na intervenção na lide tanto da Fundação palmares quanto do INCRA, pois o caso versa sobre território ocupado por grupo remanescente quilombola, atraindo a legitimidade das autarquias para ingresso no feito", bem como que "a mera manifestação das entidades no sentido de haver interesse na lide ­ mormente a Fundação Cultural Palmares que ora se representa ­ demonstra que a causa versa sobre situação que enseja sua presença no feito. Isto é, basta fundado interesse para legitimar a FCP a agir como assistente da parte autora. A simples emissão de vontade nesse sentido, em sendo fundação competente para o resguardo dos interesses das minorias remanescentes quilombolas, caracteriza a legitimidade para agir na causa". Por fim, alega que "A inexistência de Decreto que reconheça definitivamente o interesse público na causa não afasta o interesse da Fundação Cultural Palmares em ingressar na lide".

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Informações prestadas pelo Juizo a quo (fls. 420/422), sem apresentação de contrarrazões, conforme certidão à fl. 423.

O Ministério Público Federal se manifestou às fls. 425/428, opinando pelo provimento do agravo, ao fundamento de que "em consonância com o entendimento jurisprudencial mais abalizado, a simples instauração pelo INCRA de um procedimento administrativo para a identificação e reconhecimento da referida comunidade, por si só, demonstra o interesse da autarquia fundiária no resultado da ação possessória em que se discute a posse de área ocupada pela comunidade, sendo inexigível, portanto, o decreto presidencial de declaração de interesse público sobre a área objeto de litígio".

É o relatório. Passo a decidir.

MARCELO PEREIRA DA SILVA Desembargador Federal

VOTO

Em primeiro lugar, cabe destacar que o presente recurso ­ e não a apelação ­ é o cabível no caso de sentença que extingue o feito, sem resolução de mérito, apenas em relação a um dos litisconsortes, prosseguindo a ação em relação aos demais.

Tal é, com efeito, o entendimento que prevalece no eg. STJ, conforme os seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA.

SENTENÇA QUE

EXTINGUE O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, EM RELAÇÃO A UM DOS PEDIDOS. ART. 267 DO CPC.

PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO QUANTO AOS PLEITOS REMANESCENTES. INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA. NATUREZA

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INTERLOCUTÓRIA DO DECISUM. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO. ART. 522, DO CPC. APELAÇÃO INCABÍVEL.

1. O caso vertente merece exame mais acurado, pois, o pronunciamento do juízo singular se enquadra em um dos incisos  dos arts. 267 ou 269, ambos do CPC, por isso, a priori, uma sentença (Lei n. 11.232/05).

2. A construção interpretativa em questão deve considerar o escopo metodológico das alterações no processo de conhecimento, por meio da Lei n. 11.232/05, isto é, simplificação do feito e sua agilização, em síntese, primou­se pelo binômio efetividade e tutela jurisdicional.

3. Sentença desvela­se como ato do juiz cujas implicações são previstas nos arts. 267; e 269, ambos do CPC. (Lei n. 11.232/05).

4. Apelação representa o recurso adequado contra a sentença (art. 513, do CPC); em relação à decisão interlocutória, cabível o agravo, o qual tem como regra a forma retida (Lei n. 11.187/05).

5. No caso, trata­se de ação ordinária por meio da qual se almeja, em síntese: a) reforma das fileiras do Exército; b) indenização de ajuda de custo; c) danos morais; e d) isenção de imposto de renda.

6. O cerne da controvérsia circunvolve­se ao estabelecimento do recurso para impugnar decisum que, ao acolher a prefacial de falta de interesse de agir, extinguiu o processo, sem resolução de mérito, exclusivamente quanto a um dos pedidos relativos à pretensão, isto é, acerca da isenção de imposto de renda, com o prosseguimento do feito em relação aos demais pleitos (art. 267, inciso VI, do CPC).

7. Sobreleva notar a finalidade da manifestação judicial, ou seja, caso paralise o processo ou evidencie a solução de continuidade da demanda, cabível a apelação. Caso contrário, adequado o agravo de instrumento ou retido, vinculado à pretensão do recorrente em relação à sua

imediata ou oportuna apreciação.

8. Para determinar a apelação como recurso adequado, impõe­se o critério híbrido acerca da classificação da manifestação judicial, qual seja: a) ato relativo ao disposto nos arts. 267 ou 269, ambos do CPC; e b) ultimar­se o processo.

9. In casu, a despeito da adequação a uma das hipóteses arts. 267 ou 269, ambos do CPC, o pronunciamento do juízo singular controvertido não tem caráter jurídico de sentença, porque não interrompeu a

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tramitação da ação no Primeiro Grau; consequentemente, em razão da necessária interpretação sistêmica e da efetividade da tutela

jurisdicional, revela natureza interlocutória, a ensejar a interposição de agravo (art. 522, do CPC).

10. Sob pena de transmudar a sistemática recursal imposta pela

legislação de regência, indevida a interpretação unicamente formal do decisum, por conseguinte, o acórdão regional merece reforma, nesse aspecto.

11. Recurso especial provido, para estabelecer, contra decisum de teor interlocutório, o recebimento do recurso na forma de agravo de

instrumento. (STJ, 6a T., REsp 1.117.144/RS, Relator: Min. CELSO LIMONGI, DJe 14.06.2010) (g.n.)

PROCESSO CIVIL. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. DECISÃO QUE EXCLUI O DEVEDOR. CONTINUAÇÃO DO PROCESSO ENTRE OS CREDORES. ATO JUDICIAL. NATUREZA JURÍDICA.

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. SISTEMÁTICA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ART. 162, CPC. EXEGESE. INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE.

APLICABILIDADE. PRAZO MENOR. IRRELEVÂNCIA.

PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. MAIORIA.

I ­ O sistema do Código de Processo, calcado no art. 162, conceitua os atos do juiz, a cada ato correspondendo um recurso cabível. A sentença, nesse contexto, se caracteriza como o ato que põe termo ao processo, com ou sem exame do mérito.

II ­ Se efetivamente houve extinção do processo, sem prosseguimento do feito, foi proferida uma sentença. Se, ao contrário, se ensejou a continuação do processo, resolvida situação incidente, ainda que tenha sido extinto o feito em relação a um dos litisconsortes, ou quando

extinta a reconvenção, a decisão tem natureza jurídica de interlocutória, sendo agravável, portanto.

III ­ O ato pelo qual o juiz exclui um dos participantes do litígio tem natureza jurídica de decisão interlocutória, uma vez que o processo continua no tocante às partes remanescentes. Nesse caso, a decisão sujeita­se à interposição do recurso de agravo.

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IV ­ Aplica­se no caso o princípio da fungibilidade, uma vez presente dúvida objetiva a respeito do recurso cabível, e também por inocorrer erro grosseiro e má­fé, sendo dispensável o pressuposto do prazo menor como requisito. (STJ, 4a T., REsp 113.443/PR, Relator: Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJ 01.07.2004, p. 195) (g.n.)

Este é também o entendimento adotado por este Eg. Tribunal, conforme exemplifica, por todos, o julgado desta col. Turma, colacionado a seguir:

Trata­se de Agravo, na modalidade de Instrumento, com pleito de tutela antecipada recursal, interposto por CELSO DA SILVA GUIMARÃES em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ­ CEF, objetivando cassar a decisão do Juízo da 15a Vara Federal ­ Seção Judiciária do Rio de Janeiro, nos autos da Ação Ordinária nº 2001.51.01.002199­3, assim vertida: """Deixo de receber a apelação de fls. 212/19, por não ser o recurso próprio para impugnação das decisões interlocutórias, conforme art. 522 do CPC. Desentranhe­se a referida peça, certificando­se e

devolvendo­se ao peticionário."""O Agravante alega, em suma, como causa de pedir, que:"""(...) Ao julgar """extinta a execução"""(ou tecnicamente melhor, o processo de execução), a decisão apelada sustenta que oAgravante carece de interesse para processá­la e, para tanto, buscaamparo no inciso II do art. 794 do Código de Processo Civil (traslado nº 13). Trata­se, induvidosamente, de decisão apelável porque, pelos efeitos que produz, tem a natureza e características de sentença.

Põe fim ao processo em relação ao Agravante ...(...) É importante ressaltar que, embora não seja requisito indispensável para a admissão da fungibilidade, a apelação foi interposta no mesmo prazo do agravo.

A decisão que julgou extinta a execução foi publicada no dia 5 de abril (traslado nº 13) e o recurso de apelação foi apresentado no dia 17, uma segunda­feira (traslado nº 14) ,antes, portanto, de decorrido o prazo de 10 dias, fixado para o agravo. Diante do exposto, espera e confia seja reformado o r. despacho agravado para o fim de ser determinado o regular processamento da apelação e seu oportuno encaminhamento à Egrégia Superior Instância ou, se assim não for entendido, seja a

mesma recebida como Agravo Retido, que deverá permanecer nos autos

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para eventual exame."""Analisando os autos, entendo ausentes os

requisitos peculiares para a concessão de tutela antecipada recursal, que possui o requisito do """convencimento de verossimilhança"""que é mais rigoroso do que o do fumus boni juris (STF, Pet 2644, DJ 10/05/02), especialmente a teor da fundamentação da decisão objurgada, que incorporo à presente. A título de esclarecimento, transcrevo a decisão objeto da apelação interposta pelo ora Agravante (fls. 56):"""1. Tendo em vista que o autor CELSO DA SILVA

GUIMARÃES aderiu ao acordo de que trata a LC 110/01 (Termo de Adesão juntado á fls. 207/209), tem­se que carece a mesma de interesse no que se refere ao processamento da execução.Isso posto, julgo extinta a execução em relação ao citado autor, nos termos do art. 794, II do CPC.2. Intime­se pessoalmente a CEF para, no prazo de 30 (trinta) dias, fornecer os documentos solicitados pela Contadoria Judicial (fls. 210).

Vindo os documentos, prossiga­se nas demais diligências do despacho de 201."""Portanto, como bem salientou o ínclito magistrado na decisão ora objurgada, a decisão apelada caracteriza­se como interlocutória, eis que não pôs fim ao processo; sendo cabível o recurso do Agravo de Instrumento, conforme art. 522 do CPC.Neste sentido:. TRF 2a Região, AC 216812/RJ, 2a Turma, Rel. Des. Fed. Antonio Cruz Netto, DJU 30.09.2004:"""PROCESSUAL CIVIL. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, COM RELAÇÃO A ALGUNS AUTORES. ATO QUE NÃO PÕE FIM AO PROCESSO. RECURSO CABÌVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRINCÍPIO DA

FUNGIBILIDADE.INAPLICABILIDADE. I ­ Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo (art. 162, § 1º, CPC), de modo que, tendo o magistrado se limitado a excluir da lide alguns litisconsortes, o processo prossegue com relação aos demais. Precedentes do Eg. STJ no sentido de que o recurso cabível, na hipótese é  o Agravo de

Instrumento."""Quanto ao princípio da fungibilidade recursal, comungo do entendimento adotado pelo Eg. STJ, quando do julgamento do REsp 427786/RS, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, 2a Turma, julgado em 15.04.2003, DJ 04.08.2003 p. 265:"""RECURSO ESPECIAL ­ ALÍNEAS """A"""E """C"""­ PROCESSO CIVIL ­ AÇÃO DE

CONHECIMENTO ­ EXCLUSÃO DE LITISCONSORTEPASSIVO ­

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INDEFERIMENTO DA INICIAL EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS

­ EXTINÇÃO DA AÇÃO E NÃO DO PROCESSO ­ DECISÃO INTERLOCUTÓRIA ­ RECURSO CABÍVEL ­ AGRAVO DE INSTRUMENTO­ APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA

FUNGIBILIDADE RECURSAL. É firme a orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de que o ato judicial que exclui litisconsorte passivo não põe termo ao processo, mas somente à ação em relação a um dos réus. Por essa razão, o recurso cabível é o agravo de

instrumento, e não apelação (cf. REsp n. 164.729/SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 01.06.1998, REsp n. 219.132/RJ, rel. Min.

Ruy Rosado de Aguiar, DJU 01.11.1999 e REsp n. 14.878/SP, rel. para o acórdão Min. Eduardo Ribeiro, DJU 16.03.1992, dentre outros).Se inexiste dúvida objetiva acerca do recurso cabível, não se admite a aplicação do princípio da  fungibilidade recursal."""(sem grifo no original).Isto posto, indefiro o pedido de antecipação da tutela recursal.Solicitem­se informações ao Juízo a quo. Intime­se a

Agravada, nos termos do artigo 527, inciso V do CPC. (TRF­2a Reg., 8a T.E., AG 200602010064653, Relator: Des. Fed. POUL ERIK

DYRLUND, DJU 26.07.2006, p. 243) (g.n.)

Posto isso, admissível o presente recurso, impondo­se a sua análise.

Conforme relatado, a parte agravante se insurge contra a decisão juntada por cópia às fls. 369/371 destes autos, proferida pelo MM. Juízo da 02a Vara Federal de São Pedro da Aldeia/RJ, nos seguintes termos:

"Inicialmente, insta observar que as comunidades quilombolas são grupos étnicos ­ predominantemente constituídos 0ela população negra rural ou urbana ­, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias.

O Decreto no 4.887, de 20 de novembro de 2003, regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das

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comunidades dos quilombos de que trata o artigo 68, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A partir do decreto4883/03 ficou transferida do Ministério da Cultura para o INCRA a

competência para a delimitação das terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos, bem como a determinação de suas demarcações e titulações.

Conforme o artigo 2o do Decreto 4887/2003, "consideram­se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico­raciais, segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações terrotoriais

específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida".

Em 12 de março de 2004, o Governo Federal lançou o Programa Brasil Quilombola (PBQ) como uma política de Estado para as áreas remanescentes de quilombos. O PBQ abrange um conjunto de ações inseridas nos diversos órgãos governamentais, com suas respectivas previsões de recursos, bem como as responsabilidades de cada órgão e prazos de execução. Dessas ações, a política de regularização é

atribuição do INCRA.

É a própria comunidade que se autoreconhece "remanescente de quilombo". O amparo legal é dado pela Convenção 169, da

Organização Internacional do Trabalho, cujas determinações foram incorporadas à legislação brasileira pelo Decreto Legislativo 143/2002 e Decreto no 5.051/2004.

Cabe `FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES emitir uma certidão sobre essa autodefinição. O processo para essa certificação obedece norma específica desse órgão (Portaria da Fundação Cultural

Palmares no 98, de 26/11/2007).

Para acessar a política de regularização de territórios quilombolas, as comunidades devem encaminhar uma declaração na qual se

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identificam enquanto comunidade remanescente de quilombo à Fundação Cultural Palmares, que expedirá uma Certidão de Autoreconhecimento em nome da mesma.

Por força do Decreto no 4.887, de 2003, o INCRA é o órgão

competente, na esfera federal, pela titulação dos territórios quilombola.

Os estados, o Distrito Federal e os municípios têm competência comum e concorrente com o poder federal para promover e executar esses procedimentos de regularização fundiária. Para cuidar dos processos de titulação, o INCRA criou, na sua Diretoria de Ordenamento da Estrutura Fundiária, a Coordenação geral de Regularização de

Territórios Quilombolas (DFQ) e, nas Superintendências Regionais, os Serviços de Regularização de Territórios Quilombolas.

Com base na Instrução Normativa 57 do INCRA, de 20 de outubro de 2009, cabe às comunidades interessadas encaminhar à

Superintendência Regional do INCRA do seu estado uma solicitação de abertura de procedimentos administrativos visando à regularização de seus territórios.

Para que o INCRA inicie os trabalhos em determinada comunidade, ela deve apresentar a Certidão de Registro no Cadastro Geral de

remanescentes de Comunidades de Quilombos, emitida pela Fundação Cultural Palmares. A primeira parte dos trabalhos do INCRA consiste na elaboração de um estudo da área, destinado à confecção do

Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do território.

Uma segunda etapa é a de recepção, análise e julgamento de eventuais contestações. Aprovado em definitivo esse relatório, o INCRA publica uma portaria de reconhecimento que declara os limites do território quilombola.

A fase seguinte do processo administrativo corresponde à regularização fundiária, com desintrusão de ocupantes não

quilombolas mediante desapropriação e/ou pagamento de indenização e demarcação do território. O processo culmina com a concessão do

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título de propriedade à comunidade, que é coletivo, pró­indiviso e em nome da associação dos moradores da área, registrado no cartório de imóveis, sem qualquer ônus financeiro para a comunidade beneficiada.

No caso de áreas, em que estão previstos atos de desintrusão (retirada de ocupantes não quilombolas), a ação só poderá ter início após

publicação de decreto presidencial decretando toda a área do território quilombola como de interesse social, com base na Lei 4.132/1962.

É que somente com a publicação do decreto presidencial pode o INCRA iniciar o processo judicial de desapropriação/desintrusão e requerer sua imissão na posse do imóvel em apreço, viabilizando a concessão do título de propriedade à comunidade.

Assim, inexistente decreto presidencial de declaração de interesse público sobre a área objeto do litígio, após regular procedimento perante o INCRA, incabível falar­se em reintegração de posse de suposto território quilombola e, evidentemente, legítimo interesse da FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES para integrar a relação

processual que versa, até o presente momento, sobre disputa de posse entre particulares.

Nesse diapasão, extingo o processo, sem resolução do mérito, com relação à FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES, nos termos do art.

267, VI, do CPC e, remanescendo, até o momento, interesse entre particulares, determino a remessa dos autos, com as homenagens de estilo, ao MM. Juiz de Direito da 1a Vara Cível da Comarca de Cabo frio, na forma do verbete no 150 da súmula do STJ.

P.R.I.

Preclusa a decisão, dê­se baixa na Distribuição e encaminhem­se os autos."

(11)

Nessa perspectiva, trata­se de agravo de instrumento interposto nos autos de ação de reintegração de posse (processo no

0001369­19.2012.4.02.51.08), ajuizada em 27.09.1973 junto ao Juízo

Estadual (fl. 14), originariamente por Maria Romano da Conceição, em face de José Caetano Alves (fl. 15), na qual narra a Autora original ter adquirido a posse da propriedade em 02.02.1925, e que o Réu original teria lhe

esbulhado a referida posse.

Posteriormente, as partes foram substituídas pelos respectivos Espólios (fl. 38), sendo que, em petição protocolada em 28.07.2011 (fl. 257), a parte autora alegou que a área objeto do litígio "abriga a Comunidade Quilombola denominada QUILOMBO MARIA ROMANA", bem como que havia aberto procedimento administrativo, junto à Fundação Cultural Palmares, ora Agravante, em 20.06.2011, com vistas à emissão de certidão de

autodefinição como comunidade quilombola remanescente ­ o que ocorreu em 23.09.2011, conforme a referida certidão, acostada à fl. 398 ­, com subsequente regularização fundiária. (fl. 258). Por essa razão é que a Agravante requereu o seu ingresso na lide (fls. 295/296), com base em parecer acostado às fls. 297/315, o que determinou o declínio de

competência para a Justiça Federal (fl. 316).

Nessa perspectiva, o que se depreende do exame dos autos é que, estando o procedimento administrativo em suas etapas iniciais, não há, ainda, conforme ofício do INCRA, datado de 05.11.2012, "relatório antropológico ou plantas do local. Por outro lado, os documentos

encaminhados não apresentam indicação precisa de localização, de forma que não temos meios de determinar com precisão a sobreposição das terras em disputa judicial com as terras pleiteadas pelos quilombolas" (fl. 376, grifo nosso).

Sendo este o caso, não há nos autos elementos suficientes para

determinar se a área que constitui objeto da ação de reintegração de posse está ou não incluída na área reclamada pela associação de autodenominados como quilombolas.

(12)

Por essa razão, e embora não tenha, ainda, sido definido se a área em litígio seria ou não passível de declaração de interesse social, afigura­se prematura a exclusão da Agravante do feito, pois, caso confirmadas as declarações, constantes do ofício do INCRA (fl. 376), no sentido de que

"temos informações da existência de litígio judicial sobre as terras do quilombo de Maria Romana, considerando o nome da adquirente Maria Romana da Conceição e a localização do terreno em disputa ­ Araçá", bem como que "o presidente da Associação dos Remanescentes do Quilombo Maria Romana (ARQMAR), Lamiel Leopoldino Barreto, confirmou se tratar efetivamente da mesma terra", o interesse e a legitimidade da Agravante em participar da lide serão evidentes, tendo em vista o que dispõe o Artigo 2o, VII, do Decreto no 6.853/2009,in verbis:

"Art. 2o: A FCP, nos termos dos arts. 1o e 2o da Lei no 7.668, de 1988, tem por finalidade promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira e exercer, no que couber, as responsabilidades contidas no art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais

Transitórias, regulamentado pele Decreto no 4.887, de 20 de novembro de 003, com competência para:

[...]

VII ­ garantir assistência jurídica, em todos os graus, aos

remanescentes das comunidades dos quilombos tituladas na defesa da posse e integridade de seus territórios contra esbulhos, turbações e utilização por terceiros;

[...]" (grifos nossos)

Por essa razão, impõe­se a manutenção da Agravante como assistente litisconsorcial, já que, conforme entendimento jurisprudencial prevalente nesse Eg. Tribunal, a simples instauração de procedimento administrativo com vistas à identificação e reconhecimento de comunidade quilombola enseja o seu interesse em prestar assistência jurídica aos seus remanescentes.

Nesse sentido, por todos, veja­se:

(13)

AGRAVO DE INSTRUMENTO ­ COMPETÊNCIA ­ JUSTIÇA FEDERAL ­ AÇÃO POSSESSÓRIA ­ COMUNIDADE

QUILOMBOLA ­ INTERESSE DO INCRA E DA FUNDAÇÃO PALMARES ­ INQUESTIONÁVEL INTERESSE JURIDICO DA UNIÃO FEDERAL I ­ A Súmula 150 do E. STJ dispõe que "compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas”. II ­ A simples instauração, pelo INCRA, de um procedimento administrativo para a identificação e reconhecimento da referida comunidade, por si só demonstra o interesse da autarquia fundiária no resultado da ação possessória em comento. III ­ Se os órgãos competentes do Estado se convencem de que uma comunidade constitui remanescente de quilombos, por satisfazer os critérios da legislação interna e internacional que rege a matéria ­ notadamente o Decreto 4.887/03 e a Convenção 169 da OIT ­ eles não só podem como devem agir para assegurar o direito da comunidade de continuar

existindo, mesmo antes de qualquer reconhecimento oficial definitivo.

IV ­ Agravo de Instrumento improvido. (TRF­2a Reg., 7aT.E., AG 200802010093844, Relator: Des. Fed. REIS FRIEDE, DJU 15.01.2009, p. 183) (g.n.)

Observe­se, no entanto, que é essencial verificar­se se a área objeto do litígio originário (ação de reintegração de posse) está ou não inserida na área reclamada pelos autodenominados remanescentes quilombolas e que ensejou a instauração do procedimento administrativo junto ao INCRA e à ora

Agravante ­ o que, conforme admitido pelo próprio INCRA, não havia ocorrido até novembro de 2012 (fl. 376).

Por conseguinte, impõe­se garantir a permanência da Agravante na lide, na qualidade de assistente litisconsorcial, até que sejam realizados os

procedimentos necessários, pelo INCRA, para determinar, inequivocamente, se a área em litígio se sobrepõe ou não à área pleiteada pelos

autodenominados quilombolas ­ o que deve ocorrer em um prazo razoável, a ser determinado pelo Juízoa quo, mais próximo da realidade da demanda,

(14)

após o qual deverá este último ter subsídios suficientes para reanalisar a questão da necessidade da permanência da Agravante e do INCRA na lide.

Por conseguinte, do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao agravo de instrumento da Fundação Cultural Palmares, para, reformando a sentença de fls. 369/371, determinar que esta última seja mantida na lide, na qualidade de assistente litisconsorcial da parte autora, até que sejam

realizados os procedimentos necessários, pelo INCRA, para determinar, inequivocamente, se a área em litígio se sobrepõe ou não à área pleiteada pelos autodenominados quilombolas ­ o que deve ocorrer em um prazo razoável, a ser determinado pelo Juízoa quo, após o qual deverá este último ter subsídios suficientes para reanalisar a questão da necessidade da

permanência da Agravante e do INCRA na lide.

É como voto.

MARCELO PEREIRA DA SILVA Desembargador Federal

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SENTENÇA QUE EXCLUI APENAS

UMA DAS PARTES. RECURSO CABÍVEL. ENTENDIMENTO

JURISPRUDENCIAL PREVALENTE. MÉRITO. AÇÃO DE

REINTEGRAÇÃO DE POSSE, ORIGINARIAMENTE ENTRE

PARTICULARES, EM CUJOS AUTOS CONSTA ALEGAÇÃO DE SER A ÁREA EM LITÍGIO PARTE DE COMUNIDADE REMANESCENTE DE QUILOMBO. FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES E INCRA.

PEDIDO DE INGRESSO NA LIDE, NA QUALIDADE DE

ASSISTENTES LITISCONSORCIAIS. CABIMENTO. ARTIGO 2o, VII, DECRETO No 6.853/2009. RECURSO PROVIDO EM PARTE.

1. É cabível a interposição de agravo de instrumento ­ e não de apelação ­ em face de sentença que extingue o feito, sem resolução de mérito, na forma do Artigo 267, VI, do CPC, apenas em face de um dos litisconsortes,

(15)

prosseguindo a ação em relação aos demais. Precedentes do STJ e deste Tribunal.

2. Ação de reintegração de posse, originariamente ajuizada entre particulares, na qual consta, em data bem posterior, alegação de que a área em litígio constitui abrigo de comunidade de remanescentes de quilombolas, com procedimento administrativo instaurado junto à Fundação Cultural Palmares, ora Agravante, com vistas à emissão de certidão de autodefinição como comunidade quilombola remanescente ­ já alcançado ­ e, ao final, de regularização fundiária, com emissão de título de propriedade coletivo.

3. A simples instauração de procedimento administrativo para a identificação e o reconhecimento da autodenominada comunidade enseja, por si só, o interesse da Fundação Cultural Palmares em ingressar na lide, na qualidade de assistente, na forma autorizada pelo Artigo 2o, inciso VII, do Decreto no 6.853/2009.

4. Estando o procedimento administrativo do INCRA e da Fundação Cultural Palmares em seus estágios iniciais, não há, conforme informado pelo INCRA, confirmação se a área em litígio está ou não incluída naquela pleiteada pelos autodenominados remanescentes quilombolas, o que impõe a determinação inequívoca desta questão em um prazo razoável, a ser determinado pelo Juízo a quo, mais próximo da realidade da controvérsia, com a consequente reavaliação da necessidade da permanência da Agravante e do INCRA na lide.

5. Agravo de instrumento provido em parte, para, reformando a decisão agravada, determinar a permanência da Fundação Cultural Palmares na lide, na qualidade de assistente litisconsorcial, até que sejam realizados os procedimentos necessários, pelo INCRA, para determinar, inequivocamente, se a área em litígio se sobrepõe ou não à área pleiteada pelos autodenominados quilombolas ­ o que deve ocorrer em um prazo razoável, a ser determinado pelo Juízo a quo, após o qual deverá este último ter subsídios suficientes para reanalisar a questão da necessidade da permanência da Agravante e do INCRA na lide.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:

(16)

Acordam os membros da 8ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, em dar parcial provimento ao agravo de instrumento da Fundação Cultural Palmares, na forma do voto do Relator.

Rio de Janeiro, ___ de __________ de 2014.

MARCELO PEREIRA DA SILVA Desembargador Federal

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