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Uma análise sobre a influência do cenário urbano no município de São Thomé das Letras, MG
Lucas de Lima Fernandes Padoan1
Lucas Gabriel de Oliveira Gonçalves2
Victor Lisboa da Cunha3
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo primordial realizar uma análise das transformações espaciais ocorridas no ambiente onde se situa o município de São Thomé das Letras, localizada ao sul de Minas Gerais. É importante caracterizar que a cidade foi construída sobre depósitos minerais de quartzito, conhecidas na região como pedra são tomé, as quais sua extração é utilizada na construção e decoração de casas, artesanato local e produto de exportação. Dessa maneira, a atividade extrativista contrapõe-se a atividade turística na região, uma vez que os turistas buscam a beleza natural presente na região, gerando, desse modo, um conflito de peso que acaba criando e alimentando interesses adversos.
Palavras chave: Administração ambiental; Paisagem; Transformação espacial.
1 Mestrando em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais.
2 Graduando em Ciências Socioambientais pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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Introdução
O município de São Thomé das Letras, localizado ao sul do estado de Minas Gerais, possui uma população estimada de 6.700 habitantes inseridos em uma área total de aproximadamente 369.800 km² (IBGE, 2010). A cidade está situada em uma região tipicamente montanhosa, sendo o ponto mais alto o Pico do Gavião, com 1.430 metros.
A história do município remonta ao erguimento de uma capela para a imagem
divina de São Toméa pedido do Padre Francisco Alves Torres pelo fazendeiro João Francisco
Junqueira que achou a pequena estátua em sua propriedade, próximo a uma gruta onde mais tarde seria erguida a Igreja Matriz de São Thomé das Letras, localizada no centro da cidade.
É importante caracterizar que a cidade foi construída sobre depósitos minerais de quartzito, conhecidas na região como pedra são tomé, as quais sua extração é utilizada na construção e decoração de casas, artesanato local e produto de exportação. A economia do município é baseada no setor primário: no mercado extrativista (quartzito são tomé), agricultura e pecuária; bem como no setor terciário: marcada pelo comércio e em especial o turismo.
Uma vez que as principais atividades econômicas concentram-se na extração intensiva do quartzito são tomé e turismo, podemos afirmar que acaba-se entrando em um contraponto de peso, visto que a extração mineral modifica a paisagem do município ocasionando influências negativas nas atividades turísticas, já que os turistas procuram São Thomé das Letras pelas belas paisagens naturais.
Metodologia
O percurso metodológico para a elaboração deste trabalho se deu em três etapas, onde: (i) levantamento bibliográfico; (ii) trabalho de campo; (iii) construção do estudo.
Na primeira etapa realizamos uma pesquisa documental de todas as informações importantes acerca da história do município e das atividades econômicas que rodeiam a cidade.
Em um segundo momento, foi realizada uma atividade de campo que consistiu em uma pesquisa in situ no município, caracterizada pela nossa estadia por quatro dias colhendo dados importante para a análise das transformações espaciais ocorridas em São Thomé.
Por fim, na terceira etapa, temos a compilação dos dados para realizar nossas reflexões e desenvolver o estudo em sua forma final.
Resultados e discussão
Para entender a influência da paisagem urbana em um contexto do município de São Thomé das Letras (Minas Gerais), torna-se necessário, primeiro, discutir o conceito e as possibilidades de reflexão da ideia de paisagem em si.
Desse modo, considera-se que a paisagem está intrínseca a nossa trajetória como seres humanos, presente em nossa essência muito antes da elaboração de seu conceito (MAXIMIANO, 2004). Nesse sentido, a paisagem sempre esteve inserida em toda e qualquer tipo de expressão cultural que, a princípio, retratava um conjunto particular de elementos.
3 Posto isso, é fato que ao se discutir paisagem, estamos dialogando com um conceito multidimensional e passível de inúmeras interpretações.
Milton Santos (1988), por sua vez, define paisagem como tudo aquilo que nós vemos, até onde nossa vista alcança, sendo possível considerar também aquilo que sentimos, ouvimos e percebemos, se tratando, portanto, da interpretação e percepção de elementos visíveis ou não. Cosgrove (1998) propõe uma abordagem similar à de Milton Santos, afirmando que paisagem é uma maneira de ver, uma forma de compor e harmonizar o mundo externo em uma unidade visual.
Dessa maneira, vemos as inúmeras possibilidades de óticas possíveis de serem adotadas para a interpretação de paisagem. Assim, no caso de nosso estudo, optaremos por observar a influência da paisagem urbana e cultural sobre as transformações e dinâmicas espaciais de São Thomé das Letras ao longo das dimensões de tempo e espaço.
Segundo Adam (2008), a paisagem urbana pode ser definida como a arte de tornar coerente e organizado, visualmente, o emaranhado de construções, ruas e espaços que constituem um ambiente urbano. Já a abordagem pela paisagem cultural segundo a UNESCO (1999), se trata da diversidade de manifestações da interação entre o homem e seu espaço natural, uma vez que o ser humano modifica o espaço através de suas possibilidades culturais.
Desse modo, o núcleo urbano situado em São Thomé das Letras revolve a seu contexto histórico, onde no século XVII houve a construção de uma capela em homenagem ao São Thomé (D’ÁURIA, 2000). A partir desse momento, temos a formação de uma pequena comunidade, que, com o tempo, transformou-se e expandiu-se sobre o espaço natural.
Segundo Perna et al (2012), a peculiar formação rochosa da região permitiu a presença das construções locais através da técnica de edificação em pedra são tomé e, posteriormente, possibilitando a instalação de mineradoras que hoje possuem uma dimensão industrial, configurando-se em atividade geradora de renda para boa parte da população.
Desse modo, a atividade mineradora acabou se tornando um polo atrativo, uma vez que garantia a oportunidade de emprego e renda. As construções em pedra são tomé, representativas de uma técnica estrangeira, suscitaram no sucesso em adaptar o homem ao ambiente, sendo as edificações tombadas na segunda metade do século XX como patrimônio histórico do estado de Minas Gerais (PERNA et al, 2012).
Posto isso, temos hoje uma configuração da paisagem que choca e evidencia um claro contraste entre o espaço urbano e as manchas proveniente das atividades mineradoras na região (figura 1).
4 A dimensão do espaço urbano tem cerca de 1 km de extensão, contrastando com as cavas de atividades extrativistas, que possuem cerca de 9 km de uma ponta a outra. Assim, observamos que o espaço urbano acaba se delineando a partir da atividade mineradora, uma vez que a cidade se torna um pequeno miolo dentro de toda a mineração desenvolvida ao redor da cidade.
Desse modo, percebe-se que a expansão da malha urbana se deu através de uma maneira não planejada e desordenada, acompanhando o processo de expansão da atividade mineradora, a qual, também aleatória, acaba descaracterizando a paisagem natural da cidade (ZOLINI, 2007).
Na década de 70, o turismo passa a ser uma atividade econômica presente, juntamente com a agricultura e a extração de quartzito. Os turistas, ao seguir para São Thomé, são atraídos pelas belezas naturais e o misticismo que a região apresenta, contudo, a extração da pedra são tomé acaba descaracterizando justamente o que mais fomenta as atividades turísticas na região (PERNA et al, 2012).
Seguindo o foco do nosso estudo, a influência das ações antrópicas deve ser vista como fator extremamente significante para a configuração da paisagem em São Thomé das Letras ao longo do tempo. Segundo Perna et al (2012), até as primeiras décadas do século XVIII, a influência humana na paisagem natural de São Thomé era extremamente pequena, passando-se a acentuar com o início das atividades de extração do quartzito são tomé, a partir do século XX, deflagrando o conflito espacial na região. Observa-se em uma margem na figura 2 a limitação da cidade em função das cavas de mineração, formando uma barreira física a ocupação humana, enquanto na outra margem localiza-se o Parque Municipal Antônio Rosa, possivelmente ameaçado pelo fenômeno da expansão urbana.
5 A fronteira física (figura 3) entre a ocupação urbana e as cavas provenientes da atividade extrativista pode ser considerada um potencial problema socioambiental, uma vez que se não houver ordenamento territorial adequado, torna-se o espaço suscetível e vulnerável a processos erosivos e acidentes envolvendo a população.
6 Segundo Zolini (2007), a cidade de São Thomé das Letras apenas existe devido ao quartzito são tomé, assim, por ele a cidade cresce e por ele a cidade perecerá, gerando, portanto, uma antítese para os moradores da região, principalmente para a população consciente da importância do patrimônio arquitetônico e ambiental.
Assim, retornando a ideia de paisagem cultural, devemos lembrar da possibilidade de adoção de diversas perspectivas e possibilidades analíticas de uma mesma paisagem, uma vez que o conceito se faz multidimensional, corroborando e evidenciando uma dinâmica espacial através do tempo.
Sendo assim, Perna et al (2012), evidencia uma possibilidade de analisar a composição da paisagem urbana e cultural de São Thomé das Letras, caracterizando e categorizando algumas unidades paisagísticas possíveis, chamando-as de áreas de percepção, onde são adotadas diversas percepções acerca do espaço para a configuração do modelo (figura 4).
7 Dessa maneira, vemos a Igreja Matriz e Igreja do Rosário como unidades paisagísticas mais antigas e, de tal modo, expressivas na região. Observa-se também a periferia circundada pela cava da mineração e pelos limites territoriais do Parque Municipal Antônio Rosa, suscitando, portanto, em uma paisagem contendo elementos heterogêneos.
Por fim, fica o questionamento face ao contexto sócioespacial e cultural presente em São Thomé das Letras: qual será o futuro da paisagem, em seu sentido amplo, frente ao fenômeno de urbanização e as atividades extrativistas da pedra são tomé? O entendimento da dinâmica da paisagem e a compreensão das transformações ao longo do tempo se fazem fundamental para que os gestores consigam, de fato, conciliar o crescimento econômico e, ao mesmo tempo, valorizar a importância das dimensões culturais e ambientais da região.
Conclusões
O município de São Thomé das Letras, caracterizado pela sua diversidade paisagística - tanto no sentido ambiental, quanto cultural -, apresenta indícios claros da trajetória humana no espaço, evidenciado pelas marcas e consequências de sua ocupação.
8 Observa-se a influência do quartzito são tomé na história da cidade, hoje indicada pelas enormes cavas deixadas pela atividade mineradora na região. Torna-se conflitante o fato de que, ao passo que a extração mineral serve com uma fonte de renda para alimentar o turismo, também se coloca como uma atividade predatória, visto que invade o espaço natural, principal atrativo turístico para o município.
Cabe ressaltar, portanto, que a atividade mineradora está intrinsecamente atrelada as relações socioespaciais estabelecidas na região, tanto no meio urbano, onde as mazelas deixadas pela mineração estão nítidas, quanto no meio rural, visto que a vocação agrícola do pequeno produtor se expressa em uma ordem de subsistência, fazendo com que grande parte da renda que chega para as famílias rurais venha através de aposentadoria e do trabalho que ocorre na mineração.
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Referências bibliográficas
ADAM, Roberto. Analisando o conceito de paisagem urbana de Gordon Cullen. In: Da Vinci. Curitiba, v.5, n.1, p.61-68, 2008.
COSGROVE, D.(1998). A Geografia está em toda parte: Cultura e simbolismo nas
Paisagens Humanas. In: CORRÊA, R.L. et al. (Org.) Paisagem, Tempo e Cultura. Rio de Janeiro: EdUERJ, pp. 92-123.
D’AURIA, Carla Alfonsina. 2000. São Thomé das Letras na Encruzilhada das Fontes, dos Tempos e dos Saberes: um estudo sobre etnografia e historicidade com registros audiovisuais. Dissertação de mestrado. Departamento de Multimeios, Instituto de Artes, UNICAMP, 2000. MAXIMIANO, Liz. Considerações sobre o conceito de Paisagem. R. RA´E GA, Curitiba, n. 8, p. 83-91, 2004. Editora UFPR
PERNA, Stefânia; SIMÃO, Karina; CARVALHO, Renata; COSTA, Stael. Paisagem cultural de São Thomé das Letras, Minas Gerais. In: Espacios. Vol. 33 (3), pg. 16, 2012.
SANTOS, Milton. Metamorfose do espaço habitado, fundamentos teórico e metodológico da geografia. Hucitec.São Paulo 1988.
ZOLINI, Gustavo Pimenta de Pádua. A inflexão do conceito gentrificação em conjuntos urbanos patrimoniais em cidades de pequeno porte: os casos mineiros de São Thomé das Letras e Tiradentes. (tese de mestrado do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais) 2007. 181 f.
