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O excesso de prazo na prisão preventiva e o princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do estado

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO

GABRIELA MAGALHÃES DE FREITAS

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE POR PARTE DO ESTADO

FORTALEZA 2019

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GABRIELA MAGALHÃES DE FREITAS

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE POR PARTE DO ESTADO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Processual Penal. Direito Penal.

Orientador: Prof. Dr. Raul Carneiro Nepomuceno.

FORTALEZA 2019

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GABRIELA MAGALHÃES DE FREITAS

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE POR PARTE DO ESTADO

Monografia apresentada ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Processual Penal. Direito Penal.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Dr. Raul Carneiro Nepomuceno (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________

Prof. Dr. Sérgio Bruno Araújo Rebouças Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________

Mestranda Jéssica Maria Rodrigues de Lima Universidade Federal do Ceará (UFC)

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho representa a realização de um sonho antigo, que não seria possível sem a “tanta, muita, diferente gente” que me ajudou até aqui. Assim, só me cabe agradecer.

Aos meus pais, Vera e Eduardo, pelo apoio incondicional ao longo de toda a minha vida escolar e acadêmica, por sempre me proporcionarem as melhores oportunidades possíveis, acreditando, encorajando e orientando. Ao meu irmão, Gustavo, pelo companheirismo e pelos alívios cômicos. Obrigada pelo cuidado e pela dedicação de vocês.

Aos meus avós, Roberto e Vera Lúcia, José Zito e Maria da Conceição, por cultivarem nos meus pais a importância da educação, e aos meus padrinhos, Rejane e George, pelo incentivo e apoio desde sempre. Agradeço especialmente à tia Vládia, pelo carinho e pelas oportunidades, além dos ensinamentos para a vida profissional.

Aos amigos da Faculdade de Direito, por terem tornado mais leve a caminhada nesses cinco anos de graduação, entre risadas, conselhos, derrotas e conquistas. Dedico esse trabalho à Andressa, Ayra, Bárbara, Carmen, Hélio, Igor, Jarlan, Josy, Larissa, Naiana, Samuel, Thales e Viviane, pois nele há muito do que foi construído ao lado deles, seja na Faculdade, no estágio, nas saídas, nas caronas ou na rota.

Aos meus amigos, em especial à Oriana, Ícaro, Samir, Mateus e Ylana, testemunhas do meu crescimento até aqui, obrigada por permanecerem, por me apoiarem e pelas inúmeras histórias divididas nesses anos de amizade.

Ao Curso Pré-Vestibular Paulo Freire, pelo seu propósito, pelo privilégio de fazer parte da sua equipe e pela oportunidade de colaborar com o seu desenvolvimento enquanto membro da Administração. Agradeço principalmente pelos laços criados nas diretorias do projeto nos anos de 2015, 2016 e 2017 e pela confiança dos seus alunos.

Aos desembargadores Antônio Pádua Silva e Sérgio Luiz Arruda Parente, pelas oportunidades e por seus exemplos. Às equipes que tive a honra de fazer parte nesse período de estágio no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, obrigada pela confiança e pelo tanto compartilhado, desde os almoços aos aprendizados profissionais e pessoais. Em especial, agradeço à Beatriz, Piero, Carol, Filipe e Fabrício, à Daniela, Laís, Carla, Ian, Jéssica, Natasha e Tatiana por criarem um ambiente de trabalho do qual eu realmente sentirei saudade. Ao querido professor Raul Carneiro Nepomuceno, que me acompanha desde o segundo semestre nessa saga que é a Faculdade de Direito e de quem recebi a mais solícita orientação na elaboração deste trabalho. Agradeço pela colaboração neste trabalho, por todos os ensinamentos e por estar no meu time.

Ao professor Sérgio Bruno Araújo Rebouças, pela sua competência enquanto docente, e à mestranda Jéssica Maria Rodrigues de Lima, uma grata surpresa em meio as

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intempéries, e por ambos terem prontamente aceitado o convite para compor a banca avaliadora desta monografia.

Por fim, agradeço à Universidade Federal do Ceará, que com seu ambiente único e democrático, proporcionou a mim uma educação eclética, gratuita e de qualidade, me ensinando a trilhar o meu próprio caminho e semeando novos sonhos. Que a Universidade pública siga no seu papel de possibilitar as mudanças e o crescimento da sua comunidade, desenvolvendo-se junto aos seus alunos, professores e funcionários.

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“Nos barracos da cidade Ninguém mais tem ilusão No poder da autoridade De tomar a decisão E o poder da autoridade Se pode, não faz questão

Mas se faz questão, não consegue Enfrentar o tubarão”

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RESUMO

Diante da generalização da prisão preventiva sobre os direitos fundamentais dos acusados, prejudicando seu status libertatis, a presente monografia busca analisar o excesso de prazo da prisão preventiva e o princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado, observando os princípios relacionados a esse instituto e tendo como principal objetivo a análise crítica de decisões de Tribunais Estaduais e do Superior Tribunal de Justiça, em sede de habeas corpus. Assim, faz-se necessário o estudo, assim como a pesquisa jurisprudencial e bibliográfica, incluindo-se, como material de apoio, livros, artigos científicos e consultas a sítios eletrônicos, além da legislação brasileira referente ao tema. Primeiramente, são destacados os princípios envolvidos na aplicação das medidas cautelares pessoais e alguns aspectos da prisão preventiva. Posteriormente, é analisando o princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado, a sua influência em conflitos entre direitos fundamentais e no excesso de prazo da prisão preventiva. Por fim, busca-se estudar e averiguar as decisões dos Tribunais de Justiça e do STJ em relação ao tema, a partir do reconhecimento do excesso de prazo da medida cautelar mais gravosa e o consequente constrangimento ilegal do acusado.

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ABSTRACT

In the light of the widespread use of pre-trial detention on the fundamental rights of the accused, which particularly undermine their liberating status, this present monograph seeks to analyze the excessive term of pre-trial detention and the principle of prohibition of insufficient protection by the State, observing the related principles and having as its main objective the critical analysis of few decisions of the State Courts and the Superior Court of Justice, at the habeas corpus headquarters. Thus, it is necessary to study a jurisprudential and bibliographical research, including supporting material, books, scientific articles and consultations with electronic filters, in addition to the Brazilian legislation on the subject. First, the principles involved in the application of personal precautionary measures and aspects of pre-trial detention are highlighted. After, the principle of prohibition of insufficient protection by the State, its influence on conflicts between fundamental rights and the excess of the period of pre-trial detention, is analyzed. Finally, it seeks to study and verify the decisions of the Courts of Justice and STJ in relation to the subject, based on the acknowledgment of the excessive term of the most serious precautionary measure and consequent illegal embarrassment of the accused.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CPP Código de Processo Penal

CP Código Penal

CNJ Conselho Nacional de Justiça CF Constituição Federal

ONU Organização das Nações Unidas STJ Superior Tribunal de Justiça STF Supremo Tribunal Federal

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 13

2 MEDIDAS CAUTELARES E PRISÃO PREVENTIVA... 15

2.1 O princípio da presunção de inocência e a prisão cautelar... 15

2.2 O princípio da proporcionalidade em face das medidas cautelares... 18

2.3 As medidas cautelares diversas da prisão... 24

2.4 Aspectos da prisão preventiva... 26

3 O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE DO ESTADO... 35 3.1 Circunstâncias processuais... 35

3.2 Os conflitos entre direitos fundamentais... 38

3.3 A justificativa pelo princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado... 42 3.4 O excesso de prazo na prisão preventiva e a vedação da proteção insuficiente por parte do Estado... 49 4 ANÁLISE DAS DECISÕES EM SEGUNDA INSTÂNCIA E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SOBRE EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA... 53 4.1 Habeas Corpus 510.197 – CE (2019/0137534-4) ... 53 4.2 Recurso em Habeas Corpus 114.227 – PB (2019/0171357-7) ... 55 4.3 Recurso em Habeas Corpus nº 109.857 – AL (2019/0078026-3) ... 57 4.4 Habeas Corpus 454.520 – CE (2018/0143071-5) ... 59 4.5 Habeas Corpus 485.832 CE (2018/0342562-0) ... 60 4.6 O afastamento da Súmula nº 691 do STF pelo STJ... 63 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 65

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1 INTRODUÇÃO

A prisão preventiva é uma das medidas cautelares previstas no CPP, mais especificamente no Título IX, Capítulo III, e que tem por objetivo garantir à sociedade a segurança dos seus bens jurídicos, bem como o fiel seguimento da ação penal. Apesar de ser considerada uma medida excepcional, essa ultima ratio do sistema processual penal brasileiro é uma das medidas mais comumente utilizadas pelo judiciário quando diante da necessidade de acautelamento do meio social e do processo-crime.

Cabe, então, destacar que o prazo da prisão preventiva não tem um limite temporal definido em lei, podendo se prolongar de acordo com a necessidade de acautelamento no caso concreto. Contudo, por diversas vezes, o elastecimento do prazo desse tipo de prisão vem a gerar o constrangimento ilegal do acusado, que passa, em alguns casos mais graves, a cumprir antecipadamente a pena de um crime que sequer passou por toda a instrução processual, muito menos transitou em julgado.

Daí compete aos tribunais estaduais ou regionais analisarem o caso concreto por meio de habeas corpus, impetrado pela parte e, em alguns casos, mesmo demonstrado o constrangimento ilegal do paciente pelo excesso de prazo, a prisão preventiva não é relaxada para que sejam impostas medidas cautelares diversas da prisão. Isso porque a decisão do colegiado muitas vezes têm como base o dever estatal de proteger a sociedade, conforme o princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado.

Dessa forma, o princípio da presunção de inocência é violado quando essas condições de abuso de autoridade são delineadas, assim como o princípio da proporcionalidade, princípios esses intrínsecos à aplicação das medidas cautelares pessoais, pois devem ser necessárias e adequadas para cada caso, sem suportar exageros.

Nesse contexto, surge o conflito entre direitos fundamentais individuais e coletivos que, muitas vezes, logo após a negativa da liberdade pelos tribunais de segunda instância, passam para a análise dos tribunais superiores, como o STJ, que, por vezes, vem a considerar o caso concreto de forma diversa e relaxam a prisão do paciente.

Diante disso, é necessária a observância aos parâmetros de conflito entre direitos fundamentais a fim de que se legitime a imposição da prisão preventiva, nos termos previstos pela legislação penal e processual penal e em conformidade com o próprio sistema constitucional. É importante também levar em consideração o princípio da proporcionalidade relacionado às medidas cautelares, com o intuito de evitar que esse instituto perca a sua natureza cautelar e passe a ter características de penalização antecipada.

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A análise do excesso de prazo da prisão preventiva e o seu conflito com os direitos fundamentais, junto ao princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado, é o objetivo principal do presente trabalho.

Quanto aos aspectos metodológicos, esta monografia foi desenvolvida com base em um exame jurídico-doutrinário sobre o assunto, por meio de pesquisas jurisprudenciais, no âmbito dos tribunais estaduais, em especial, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, e do Superior Tribunal de Justiça, e bibliográficas, envolvendo o conteúdo de livros, artigos científicos e consultas a sítios eletrônicos, além da legislação brasileira sobre o tema.

Assim, apoiada em nesse acervo, este estudo foi dividido em três capítulos, que tratam, respectivamente, das medidas cautelares e da prisão preventiva, do princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do estado e a análise do tema à luz da jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça.

No primeiro capítulo, discorrer-se-á sobre o princípio da presunção de inocência, o princípio da proporcionalidade em face das medidas cautelares, bem como as medidas cautelares diversas da prisão admitidas no CPP e, finalmente, os aspectos relevantes sobre a prisão preventiva para o tema.

No segundo capítulo, tratar-se-á da aplicação do princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado nas decisões de segunda instância e as suas circunstâncias processuais, bem como dos conflitos entre os direitos fundamentais individuais e coletivos e da sua relação com o excesso de prazo da prisão preventiva.

Por fim, no terceiro capítulo, será realizada exposição de casos julgados do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, analisando-se também a decisão que denegou o habeas corpus ainda em segunda instância. Em tal análise, observar-se-á a decisão do STJ quanto a constatação do constrangimento ilegal do paciente por parte da corte superior e a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão.

Portanto, diante de tais considerações, pretende-se formalizar um posicionamento crítico acerca dos parâmetros legais e constitucionais da decretação e manutenção da prisão preventiva, bem como da imprescindibilidade de observância dos ditames do princípio da presunção de inocência e do princípio da proporcionalidade nas medidas cautelares. Isso faz-se necessário tendo em vista a prefaz-servação da cautelaridade do referido instituto, impedindo que o seu emprego se torne uma punição antecipada do indivíduo presumidamente inocente.

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2 MEDIDAS CAUTELARES E PRISÃO PREVENTIVA

2.1 O princípio da presunção de inocência e a prisão cautelar

De início, é necessário destacar que a presunção de inocência está expressamente prevista no art. 5º, LVII, CF1, e é consagrada como um dos princípios reitores do ordenamento jurídico brasileiro, sendo a partir dele possível verificar a natureza de um sistema processual penal, por meio da observância desse fundamento na sua organização processual.

Em síntese, a presunção de inocência pode ser definida2 como o direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença transitada em julgado, ao término do devido processo legal, após o acusado ter utilizado todos os meios de prova pertinentes para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação (contraditório).

Entende-se desse princípio3 que a formação do livre convencimento do juiz deve ser construída com base no contraditório, orientando o processo pela estrutura dialética, que mantém o julgador alheio, não sendo mais admitida a figura de um juiz inquisidor, com poderes investigativos e instrutórios, estando, enfim, convencionado o magistrado como um instrumento preservador das garantias constitucionais.

Tal princípio também está presente no art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 17894 e na Declaração Universal de Direitos Humanos5, aprovada pela ONU, em 1948, que dispõe que toda pessoa acusada de algum delito tem direito a que se presuma a sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa.

No mesmo sentido, afirma Aury Lopes Jr.6:

(…) a) É um princípio fundante, em torno do qual é construído todo o processo penal liberal, estabelecendo essencialmente garantias para o imputado frente a atuação punitiva estatal;

1 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. Acesso em: 10 out 2019. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição>.

2 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. E atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018, p. 43.

3 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Acesso em: 10 out 2019. Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 96.

4 BRASIL. Presidência da República. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Brasília, DF: Casa Civil, 1789. Acesso em: 10 out 2019. “Artigo 9º – Todo o acusado se presume inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor não necessário à guarda da sua pessoa, deverá ser severamente reprimido pela Lei.” Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf>.

5 Ibidem. Declaração Universal de Direitos Humanos, ONU, 1948. UNIC/Rio/005, Janeiro 2009. (DPI/876). Acesso em: 10 out 2019. Disponível em <https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf>. 6 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Acesso em: 10 out 2019. Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 96.

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b) É um postulado que está diretamente relacionado ao tratamento do imputado durante o processo penal, segundo o qual haveria de partir-se da ideia de que ele é inocente e, portanto, deve reduzir-se ao máximo as medidas que restrinjam seus direitos durante o processo (incluindo-se, é claro, a fase pré-processual);

c) Finalmente, a presunção de inocência é uma regra diretamente referida ao juízo do fato que a sentença penal faz. É sua incidência no âmbito probatório, vinculando à exigência de que a prova completa da culpabilidade do fato é uma carga da acusação, impondo-se a absolvição do imputado se a culpabilidade não ficar suficientemente demonstrada. (destaquei)

Dessa forma, entende-se a presunção de inocência como um dever de tratamento para com o réu, para que seja tratado como inocente até a sentença transitar em julgado, e que esse princípio atua em duas dimensões, interna e externa ao processo.

Numa dimensão interna7, observa-se que é um dever imposto a todos e, inicialmente, ao juiz, determinando que a carga da prova seja inteiramente do acusador e que a dúvida conduza irremediavelmente à absolvição (in dubio pro reo). Nessa dimensão, diversas restrições se aplicam para evitar o abuso das prisões cautelares, numa perspectiva que impõe regras de tratamento e de julgamento ao magistrado.

Por outro lado, de forma externa ao processo8, a presunção de inocência exige a proteção contra a publicidade abusiva e a rotulação precoce do réu, ressaltando as garantias constitucionais da imagem, da dignidade da pessoa humana e de privacidade, sendo utilizadas como limites democráticos à exploração midiática em torno do acusado, do fato e do processo judicial.

Nesse contexto, as medidas cautelares surgem com o objetivo, mesmo se considerando e respeitando o princípio da presunção de inocência, de garantir o normal desenvolvimento do processo e a aplicação eficaz do poder de punitivo do Estado. A corrente doutrinária9 que defende o caráter instrumental das medidas cautelares sustenta que:

(…) las medidas cautelares son, pues, actos que tienem por objeto garantizar el normal desarrollo del proceso y, por tanto, la eficaz aplicación del jus puniendi. Este concepto confiere a las medidas cautelares la nota de instrumentalidad, en cuanto son medios para alcanzar la doble finalidad arriba apuntada.

Quanto as medidas cautelares e o sistema processual penal brasileiro, Basileu Garcia10 afirma:

(…) A necessidade da prisão preventiva, segundo o entendimento comum, está sujeita a duplo ajuizamento. Deve o legislador limitar-lhe os casos ao estritamente 7 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca].

Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. Acesso em: 10 out 2019. p. 96.

8Ibidem p. 97.

9 MARTINEZ, Sara Aragoneses et al. Derecho Procesal Penal. 2. ed. Madrid, Editorial Centro de Estudios Ramon Areces, 1996, p. 387apud LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva

Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em

<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 583. Acesso em: 10 out 2019.

10 GARCIA, Baliseu. Comentários ao Código de Processo Penal, v. III, p. 145 apud NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal – 16. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530984854/>. Acesso em: 10 out 2019.

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indispensável e deve o magistrado proceder, em cada hipótese, a prudente verificação, para impor a medida só quando efetivamente o exijam os superiores interesses da justiça. (destaquei)

Assim, as medidas cautelares exigem estrita observância dos princípios da legalidade e da tipicidade do ato processual, tendo em vista as restrições que vêm a gerar na esfera dos direitos fundamentais do imputado. O art. 5º, LIV, CF, dita que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal11. Portanto, para haver privação de liberdade, necessariamente deve preceder o processo judicial.

Quanto as espécies de prisão cautelar presentes no sistema processual penal brasileiro, é necessário destacar o seu cabimento e a sua ocorrência. Assim, os três tipos de prisão cautelar admitidas no processo penal pátrio são: prisão em flagrante, prisão temporária e prisão preventiva. Dentre elas, a prisão preventiva é a forma mais gravosa de aplicação da coerção e do poder estatal.

Segundo Guilherme Nucci12, a prisão é a privação da liberdade, vedando-se o direito de ir e vir, através do recolhimento do indivíduo ao cárcere. Nesse sentido, o Código Penal regula a prisão proveniente de condenação, estabelecendo as suas espécies, formas de cumprimento e regimes de abrigo do condenado e o Código de Processo Penal cuida das prisões cautelares e provisórias, destinadas unicamente a vigorar, quando necessário, até o trânsito em julgado da decisão condenatória.

Nesse contexto, é necessária a observância do dever do magistrado de fiscalizar a legalidade da prisão cautelar que impor ao réu, conforme está o art. 310, I, CPP, ao ditar que o juiz deverá fundamentadamente relaxar prisão ilegal13. No mesmo sentido, a própria Constituição Brasileira destaca esse ponto no seu art. 5º, LXI a LXVI, regulando a maneira pela qual a prisão deve ser formalizada, bem como declara que a prisão cautelar deve ser baseada em decisão de magistrado competente, devidamente motivada e reduzida a termo ou decorrida de flagrante delito.

Veja-se:

LXI – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

[…] LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

LXVI – ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança; (destaquei)

11 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

12 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal – 16. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530984854/>. Acesso em: 10 out 2019.

13 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I – relaxar a prisão ilegal; ou”.

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Além disso, a determinação da prisão de natureza cautelar ficará sempre sob a observância das autoridades superiores ao juízo competente, tais como os Tribunais de Justiça estaduais e o Superior Tribunal de Justiça. O cabimento da utilização de remédios constitucionais como o habeas corpus em favor da liberdade provisória do acusado está estipulado no art. 5.º, LXVIII, CF, ao afirmar que conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder14.

No mesmo sentido, Aury Lopes Júnior15 afirma que, no processo penal, forma é garantia. Logo, não há espaço para “poderes gerais”, pois todo poder é estritamente vinculado aos limites e à forma legal, sendo o processo penal o instrumento limitador do poder punitivo estatal, de modo que ele somente pode ser exercido e legitimado a partir do estrito respeito às regras do devido processo.

Assim, analisado o princípio da presunção de inocência, será apreciado o princípio da proporcionalidade na aplicação das medidas cautelares, bem como as espécies de medidas cautelares previstas na organização processual brasileira, destacando-se, ao final, a sua medida mais gravosa, a prisão preventiva.

2.2 O princípio da proporcionalidade em face das medidas cautelares

Em sede processual penal, o Poder Público não pode agir de forma desmedida, pois a atividade do Estado deve ser condicionada pelo princípio da proporcionalidade. Daí tal princípio16 se qualifica enquanto meio para avaliar a razoabilidade dos atos estatais, como postulado básico de contenção dos seus excessos, junto ao princípio da legalidade.

Especificamente sobre a prisão cautelar, Roxin17 sustenta:

(…) entre as medidas que asseguram o procedimento penal, a prisão preventiva é a ingerência mais grave na liberdade individual; por outra parte, ela é indispensável em alguns casos para uma administração da justiça penal eficiente. A ordem interna de um Estado se revela no modo em que está regulada essa situação de conflito; os Estados totalitários, sob a antítese errônea Estado-cidadão, exagerarão facilmente a importância do interesse estatal na realização, o mais eficaz possível, do procedimento penal. Num Estado de Direito, por outro lado, a regulação dessa situação de conflito não é determinada através da antítese Estado-cidadão; o Estado mesmo está obrigado por ambos os fins: assegurar a ordem por meio da persecução penal e proteção da esfera de liberdade do cidadão. Com isso, o princípio Constitucional da proporcionalidade exige restringir a medida e os limites da prisão preventiva ao estritamente necessário. (destaquei) 14 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

15 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha

Biblioteca]. Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. Acesso em: 10 out 2019. p. 586.

16 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 85.

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A partir disso, entende-se que o princípio da proporcionalidade tem natureza constitucional e demanda como resultado a imposição de limites, além de conduzir as medidas das prisões cautelares para o nível estritamente necessário. Isso confirma a existência do Estado Democrático de Direito, no qual todos devem estar cientes dos prejuízos que qualquer encarceramento, em especial o provisório, produzem no acusado18.

Dessa forma, na situação em que se decreta a prisão cautelar, o magistrado deve avaliar os malefícios gerados pelo ambiente carcerário, agravado pelas más condições e superlotação do sistema, ponderando com a proteção dos legítimos interesses da sociedade e da eficácia da persecução penal. Isso demonstra a presença da dualidade do princípio da proporcionalidade, que é representado por um âmbito negativo – da proteção do excesso contra o indivíduo – e por um âmbito positivo – aquele da proibição da ineficiência do poder de repressão estatal, também chamado de vedação da proteção insuficiente por parte do Estado, a ser analisado de forma mais aprofundada.

Então, ao lado do garantismo negativo19, traduzido na proibição de excesso das medidas cautelares por parte do Estado em relação ao acusado, existe como contraponto o garantismo positivo, identificado na proibição da proteção insuficiente da coletividade pelo mesmo Estado. Nessa ponderação de valores está a busca pela legitimação da prisão cautelar, que deve ser usada como ultima ratio na busca da eficácia da persecução penal. Caso sua decretação acarrete em consequências mais danosas que o propósito buscado pelo processo penal, a prisão cautelar perde sua razão de ser, transformando-se uma forma indevida de antecipação da pena.

Nesse contexto, surgem discussões a respeito dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, que, ainda que tenham origens diferentes, guardam uma relação de fungibilidade entre si, como explica Souza de Oliveira20, para quem o princípio da razoabilidade pode ser classificado em razoabilidade interna e externa, na qual a primeira diz respeito à lógica do ato em si mesmo, enquanto a segunda exige concordância com a Constituição. O autor ainda divide o princípio da proporcionalidade em três subprincípios: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Segundo Renato Brasileiro21, o primeiro requisito relacionado ao princípio da proporcionalidade em sentido amplo é o da adequação, também denominado de princípio da idoneidade ou da conformidade. Devido ao requisito da adequação, a medida cautelar será considerada adequada quando for apta a atingir o fim proposto, qual seja, a proteção da

18 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 838.. p. 838.

19 Ibidem. p. 838.

20 SOUZA DE OLIVEIRA, Fábio Corrêa. Por uma Teoria dos Princípios – O Princípio Constitucional da Razoabilidade. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2003. p. 321. apud LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 983.

21 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 839.

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sociedade, baseando-se nos fundamentos presentes no art. 312 do CPP. Desse modo, não se deve permitir o ataque ao direito fundamental à liberdade se o meio adotado, ou seja, a medida cautelar, não se mostrar apropriada à consecução do resultado pretendido, tendo em vista também a pessoalidade de cada processo-crime.

A adequação22, prevista expressamente no art. 282, II, CPP23, determina que a medida cautelar deve ser apta aos seus motivos e fins, ou seja, caso as medidas previstas no art. 319 do CPP se apresentem igualmente aptas e menos onerosas para o imputado, devem ser adotadas, reservando-se a prisão cautelar apenas para os casos realmente graves, como verdadeira ultima ratio do sistema.

No mesmo sentido, o art. 283, § 1º, CPP24, afirma que as medidas cautelares previstas não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, o que significa dizer que o juiz deve atentar para a relação existente entre a sanção imposta com o crime em tese praticado, bem como à relação existente em sede cautelar, de modo a impedir que acusado seja submetido a uma medida cautelar mais gravosa do que a sanção que pode ser aplicada ao final do processo-crime, caso seja condenado.

Nesse sentido, Gustavo Badaró25 afirma:

(…) O juiz deverá também verificar a probabilidade de que ao final se tenha que executar uma pena privativa de liberdade.

[…] Se a prisão preventiva, ou qualquer outra prisão cautelar, for mais gravosa que a pena que se espera ser ao final imposta, não será dotada do caráter de instrumentalidade e acessoriedade inerentes à tutela cautelar. Mesmo no que diz respeito à provisoriedade, não se pode admitir que a medida provisória seja mais severa. (destaquei)

O segundo requisito (ou subprincípio) da proporcionalidade é o da necessidade. A partir dele, entende-se que dentre as várias medidas restritivas de direitos adequadas a atingir o fim proposto, o Poder Público deve escolher a menos gravosa, que menos interfira no direito fundamental à liberdade e que, ao mesmo tempo, seja capaz de proteger o interesse público para o qual foi instituída.

22 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha

Biblioteca]. Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. Acesso em: 10 out 2019. p. 598.

23 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: (…) II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.”

24 Ibidem. “Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1o As medidas cautelares

previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.”.

25 BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro, Elsevier, 2007. t. II, p. 150 152 apud LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. Acesso em: 10 out 2019. p. 599.

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Daí surgiram as novas medidas cautelares de natureza pessoal introduzidas ao CPP por meio da Lei nº 12.403/1126. Ao ampliar o rol de medidas cautelares de natureza pessoal à disposição do juiz criminal, previstas nos art. 319 e 320, CPP, a Lei nº 12.403/11 dá realidade ao requisito da necessidade, possibilitando ao juízo que utilize a prisão cautelar apenas em casos nos quais as demais medidas cautelares não sejam suficientes. A partir disso, a decretação da prisão cautelar, seja ela preventiva ou temporária, somente será possível quando as medidas cautelares diversas da prisão, adotadas de forma isolada ou cumuladas, mostrarem-se inadequadas ou insuficientes para assegurar a eficácia do processo penal (art. 282, § 6°, CPP27).

O terceiro subprincípio ou requisito da proporcionalidade trata-se da proporcionalidade em sentido estrito, que, segundo Renato Brasileiro28, impõe um juízo de ponderação entre o ônus imposto ao acusado e o benefício trazido à coletividade, a fim de se constatar se é justificável a interferência decretada em juízo na esfera dos direitos individuais e fundamentais do acusado. Por meio desse requisito, verifica-se a relação de custo-benefício da medida cautelar, ou seja, a ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos.

Dessa forma, após um conflito de valores, deve preponderar o de maior relevância, após o seu sopesamento e por força do requisito da proporcionalidade em sentido estrito. Há de se indagar se o imposto ao titular do direito fundamental tem relação de proporcionalidade com a relevância do bem jurídico que se pretende tutelar, pois há a gravidade de se submeter alguém, presumidamente inocente, a uma pena de prisão, sem processo e sem sentença. Por outro lado, também existe a necessidade da prisão com base nos elementos probatórios existentes, sendo então necessário se considerar a incidência do princípio da proporcionalidade – relacionado ao valor dignidade da pessoa humana – quando da aplicação da medida cautelar, especialmente a prisão preventiva.

Nesse cenário, o juiz, em uma situação concreta, na qual já estejam delineados os requisitos da adequação e da necessidade, precisa analisar se a privação a ser imposta ao acusado tem uma relação razoável e proporcional com o interesse estatal a ser protegido. Devem, então, ser utilizadas técnicas de contrapeso de bens e valores29, de forma a escolher a medida mais justa para as circunstâncias do caso em concreto, o que significa resolver a

26 BRASIL. Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12403.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. 27 Ibidem. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: (…) § 6o A prisão

preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).” 28 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 88.

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tensão entre os interesses estatais relacionados à persecução penal e as garantias individuais do acusado.

A doutrina30 também destaca que, nas medidas cautelares, observa-se a provisionalidade como um princípio básico, pois as medidas cautelares são situacionais, isto é, se relacionam e tutelam uma situação fática. Uma vez desaparecido o suporte fático que legitima tal medida, seja o fumus commissi delicti ou o periculum libertatis, cessam os motivos para a manutenção da medida cautelar. Caso a provisionalidade, presente no art. 282, §§ 4º e 5º, CPP31, seja desprezada, conduzirá a uma constrição cautelar ilegal, pela falta de fundamento que a legitime.

O requisito da proporcionalidade em sentido estrito destaca-se diante das modificações que vêm alterando a legislação penal e processual penal brasileira, com a inclusão de leis com conteúdo despenalizador, como a Lei nº 9.099/9532 e a Lei nº 9.714/9833. Nesse contexto, às contravenções penais e aos crimes cuja pena máxima não seja superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa, sujeitos ou não a procedimento especial (art. 61 da Lei nº 9.099/95, com redação determinada pela Lei nº 11.313/0634), podem ser concedidos benefícios despenalizadores como a composição civil dos danos (Lei nº 9.099/95, art. 7435) e a transação penal (Lei n° 9.099/95, art. 7636). Resta claro, portanto, que não faz sentido a decretação de uma prisão cautelar para assegurar a aplicação da lei penal em relação a tais delitos, haja vista a ausência de proporcionalidade entre a medida de constrição cautelar e a solução de mérito do processo.

30 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 590. 31 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: (…) §4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5o O juiz poderá revogar a medida

cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”

32 Ibidem. Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 1996. Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Brasília, Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

33 Ibidem. Lei n° 9.714, de 25 de novembro de 1998. Altera o Código Penal Brasileiro. Brasília, Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9714.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

34 Ibidem. Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 1996. Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Brasília, Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 10 out 2019. “Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.”

35 Ibidem. “Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.”

36 Ibidem. “Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. (…) § 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz. § 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. (…) § 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.”

(23)

No mesmo sentido, destaca-se a provisoriedade37, princípio distinto do princípio anterior, relacionado ao fator tempo, de modo a prever que toda prisão cautelar é temporária, já que é apenas uma tutela de uma situação fática (provisionalidade) e não pode assumir contornos de pena antecipada.

Com a entrada em vigor da Lei n° 12.403/11, a observância do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito passa a constar expressamente do Título IX, que se refere à prisão, às medidas cautelares e à liberdade. Consoante a nova redação do já mencionado art. 282, II, CPP, as medidas cautelares previstas nesse Título deverão ser aplicadas se observando a adequação da medida à gravidade do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do acusado, sendo esses parâmetros também válidos para as cautelares relacionadas à prisão preventiva, mencionadas também nos casos de prisão temporária, constantes na Lei nº 7.960/8938.

Então, verificada a necessidade de adoção de medidas cautelares de natureza pessoal para a aplicação da lei penal, investigação ou instrução criminal, ou até mesmo para evitar a prática de infrações penais (art. 282, I, CPP), a intensidade e a qualidade da medida cautelar de natureza pessoal deverá ser estabelecida segundo os critérios fixados no já mencionado art. 282, II, CPP: a gravidade do crime, as circunstâncias do fato e as condições pessoais do indiciado ou acusado.

Ademais, a partir da observância dos parâmetros impostos pela presunção de inocência, bem como pelos princípios basilares do Processo Penal brasileiro, resta claro, a partir da sanção da Lei nº 13.86939, de 5 de setembro de 2019, e pelo que afirma a doutrina40, que constitui abuso de autoridade efetuar prisão ilegal, bem como mantê-la, na situação da prisão preventiva, caso não estejam respeitados os parâmetros do art. 312, CPP. A Lei de Abuso de Autoridade evidencia em seu texto o combate à tal afronta que viola o direito à liberdade de locomoção.

Veja-se:

Art. 9º Decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais:

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena a autoridade judiciária que, dentro de prazo razoável, deixar de:

I – relaxar a prisão manifestamente ilegal;

II – substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível;

37 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 591. Acesso em: 10 out 2019.

38 BRASIL. Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Lei de Prisão Temporária. Brasília, Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

39 Ibidem. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13869.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

40 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal – 16. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530984854/>. Acesso em: 10 out. 2019.

(24)

III – deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabí-vel. (destaquei)

Nesse contexto, caberá ao magistrado, obrigatoriamente, a observância a esses parâmetros a fim de que as ilegalidades sejam combatidas, equilibrando-se a imposição de qualquer medida cautelar de natureza pessoal com o princípio da proporcionalidade. O objetivo da medida cautelar não é o de se emprestar a ela função punitiva, concluindo que a sua decretação é possível somente quando, além de necessária e adequada, não resulte na imposição de ônus superior ao decorrente de eventual condenação.

2.3 As medidas cautelares diversas da prisão

As medidas cautelares são limites que não podem ser impostos sem a presença do fumus commissi delicti e do periculum libertatis e que visam o equilíbrio de interesses opostos do sistema processual penal, quais sejam, o respeito ao direito de liberdade e a eficácia na repressão dos delitos.

Inclusive, se durante uma prisão preventiva desaparecer completamente o requisito ou o fundamento para a sua manutenção, deverá o agente ser libertado sem a imposição de qualquer medida alternativa, conforme o disposto no art. 316, CPP41, pois a decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada (art. 315, CPP42). Não subsistindo o fundamento, a prisão deve ser relaxada imediatamente.

Daí entende-se que a medida alternativa somente deve ser utilizada quando cabível a prisão cautelar, mas, em razão da proporcionalidade, da necessidade e da adequação, houver restrição menos onerosa que sirva para tutelar a situação do acusado de maneira semelhante.

Como já destacado, observa-se que Lei n° 12.403/11 gerou uma alteração significativa no rol de medidas cautelares pessoais diversas da prisão, proporcionando ao magistrado a escolha da providência mais ajustada ao caso concreto, respeitando os princípios da legalidade e da proporcionalidade, levando ao jurisdicionado uma tutela diferenciada e razoável.

A aplicação da medida cautelar, portanto, é uma forma de adaptar a própria prestação jurisdicional e seus instrumentos ao objetivo desejado. Como este varia em cada

41 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”

42 Ibidem. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada.”

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situação apresentada ao órgão jurisdicional, não se justifica manter-se inalterável o tipo de tutela43.

Renato Brasileiro44 afirma que na busca de alternativas para o cárcere cautelar foram previstas legalmente outras medidas coercitivas que substituam a prisão, encontrando-se uma forma de coerção estatal que gere um dano menor para o acusado, porém com similar garantia da eficácia do processo. O art. 319, CPP45 passou a elencar 09 (nove) medidas cautelares diversas da prisão, tendo o art. 320, CPP46 passado a autorizar expressamente a possibilidade de retenção do passaporte. Destaca-se:

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:

I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX – monitoração eletrônica.

§ 4º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.

Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

Nesse contexto, considerando-se o princípio da individualização da pena, a perspectiva da aplicação das medidas cautelares não poderá ser adotada de forma automática, após o cometimento de determinado crime, pois estão condicionadas ao fumus commissi delicti e ao periculum libertatis, além das hipóteses que autorizam a prisão cautelar.

Dessa forma, deve-se buscar a forma menos gravosa à liberdade do indivíduo para atingir o fim proposto, que é a proteção da sociedade, necessitada de uma ação positiva do

43 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: Influência do Direito Material sobre o Processo. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 53 apud LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 1029.

44 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018. p. 1029.

45 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. 46 Ibidem.

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Estado com base em algumas das hipóteses do art. 312, CPP. Reitera-se que, caso a liberdade plena do agente esteja colocando em risco a eficácia das investigações, a instrução processual ou a própria segurança social, não é possível a imposição de medidas cautelares substitutivas ou alternativas à prisão cautelar.

De nada adianta a imposição de determinada medida cautelar caso ela não venha a imprimir a necessária força coercitiva sobre o acusado, já que é necessário que esta norma imponha deveres, sob pena de se transformar em mera recomendação do juízo prolator. A aplicação dessas medidas cautelares diversas da prisão se torna inútil caso não seja paralelamente trabalhada uma estrutura adequada e eficiente para sua operacionalização e fiscalização, tutelando o acusado e a sociedade.

Caso isso não ocorra, juízes e membros do Ministério Público continuarão a desacreditar da aplicação de tais medidas, imprimido resistência em suas decisões e pareceres ao preferirem a decretação da prisão cautelar, por considerarem ser o instrumento mais adequado para tutelar a eficácia do processo, a despeito do sacrifício da liberdade do agente.

Ademais, caso não se fiscalize a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, significa que tais medidas são ineficiente para neutralizar as situações de perigo indicadas no art. 282, I, CPP, que levaram à imposição da coerção estatal em primeiro lugar. Assim, de modo a evitar a imposição de medidas sem efeito e inadequadas para resguardar a aplicação da lei penal e evitar a prática de novas infrações, ao magistrado não restará outra opção senão decretar a prisão preventiva do acusado, pois busca-se preservar o princípio da proporcionalidade em sua visão positiva, a partir do princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado.

Então, apesar de o legislador ter se limitado a prever que o descumprimento de qualquer das obrigações impostas poderá resultar a substituição da medida, a imposição de outra em cumulação, ou, em último caso, a decretação da prisão preventiva, é necessário que para cada medida cautelar diversa da prisão sejam pensados instrumentos a fim de assegurar sua operacionalidade, que garantem e promovem a liberdade do indivíduo em meio a persecução penal.

2.4 Aspectos da prisão preventiva

Sobre a prisão preventiva e o seu cabimento no processo penal brasileiro, admitem-se algumas considerações. Trata-se de uma medida cautelar de constrição à liberdade do indiciado ou réu por razões de necessidade, respeitados os requisitos estabelecidos em lei. A prisão preventiva47 é uma medida imposta aos acusados diante da

47 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal – 16. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530984854/>.

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necessidade de acautelar ou assegurar a administração da justiça, aplicada com base em uma suspeita de periculosidade sólida o suficiente que justifique a implementação a ultima ratio sobre a liberdade do indivíduo. Magalhães Noronha48 sustenta:

(…) A custódia preventiva apresenta aspectos negativos. Por muitos é até chamada mal necessário. No regime das liberdades individuais, seria de rejeitar-se a privação da liberdade de quem ainda não foi julgado. Todavia, ainda que medida excepcional, não pode ser menosprezada. Com efeito, ela se justifica por sua finalidade que é tríplice: é providência de segurança, é garantia de execução da pena e asseguradora da boa prova processual. (destaquei)

No caso, a prisão preventiva é considerada como um meio viável de medida de urgência para a “manutenção da paz social”, tendo em vista o princípio da vedação da proteção insuficiente por parte do Estado, ao garantir a segurança da sociedade e a efetividade do processo penal. Contudo, é necessário observar a vulgarização desse instituto no processo penal brasileiro, que não o aplica como ultima ratio, e sim como regra. Cabe ainda ressaltar que uma parcela considerável da sociedade acredita que a prisão preventiva é indispensável para “acabar com a impunidade” e “fazer justiça”. Como reflexo, observam-se presídios superlotados com presos sem condenação definitiva, que respondem por crimes de mínima periculosidade, sem representar grave ameaça à sociedade, e que podem cumprir medidas cautelares diversas.

Sobre isso, importa destacar que o Brasil tem 602.217 (seiscentos e duas mil duzentos e dezessete) pessoas presas, e 40,17% (quarenta vírgula 17 por cento) delas ainda não foram julgadas. É o recorde registrado pelo CNJ, que reúne dados de tribunais de todo o país no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões49, em relatório apresentado em agosto de 2018. A estatística considera presos que ainda aguardam julgamento — no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, a porcentagem de presos sem condenação cresce para 53,31% (cinquenta e três vírgula trinta e um por cento), representando cerca de 11.061 (onze mil e sessenta e uma) pessoas que estão nesta categoria de prisão, cautelar. Ademais, o estudo afirma que 28,71% (vinte e um vírgula setenta e um por cento) das prisões sem condenação superam o período de 180 (cento e oitenta) dias.

Continuando quanto aos aspectos legais da prisão preventiva, a partir do art. 311, CPP50, tem-se que essa constrição cautelar poderá ser decretada em qualquer fase da

Acesso em: 10 out 2019.

48 NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. 6a. ed. São Paulo: Saraiva, 1973 apud NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal – 16. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530984854/>. Acesso em: 10 out 2019.

49 BRASIL. Banco Nacional de Monitoramento de Prisões – BNMP 2.0: Cadastro Nacional de Presos, Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Brasília, agosto de 2018. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2018/01/57412abdb54eba909b3e1819fc4c3ef4.pdf>. Acesso em: 10 out 2019.

50 BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. “Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do

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investigação policial ou do processo penal, a partir de requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou mediante representação da autoridade policial. Ademais, o juiz pode decretá-la, de ofício, desde que no curso da ação penal, bem como poderá revogá-la, de acordo com o art. 316, CPP51.

Destaca-se ainda o art. 5º, LXVI, CF52, que afirma que ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança53, a fim de indicar que a prisão no Brasil deverá ser realmente a exceção e a liberdade, a regra, enquanto o processo não transitar em julgado, resultando ou não na condenação do acusado.

O art. 282, § 6º, CPP54 promove a prisão preventiva como último instrumento a ser utilizado, enfatizando a necessidade de análise sobre a adequação e suficiência das demais medidas cautelares. Igualmente importante é o disposto no art. 310, II, CPP55, ao afirmar que a prisão em flagrante poderá ser convertida em preventiva quando presentes os requisitos legais e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.

Destaca-se que o periculum da ação imputada ao réu não será o requisito das medidas cautelares, mas sim o seu fundamento. De forma paralela, no processo civil, Calamandrei56 entende que o periculum in mora, próprio de medidas cautelares reais, é visto como o risco derivado do atraso inerente ao tempo que deve transcorrer até que recaia uma sentença definitiva no processo.

Já no processo penal, na aplicação da prisão preventiva em casos específicos57, o fator determinante será o risco de frustração da função punitiva (fuga) ou graves prejuízos ao processo-crime, tendo em vista a ausência do acusado, ou o risco ao normal desenvolvimento do processo criado por sua conduta (em relação à coleta das provas, oitiva de testemunhas), não se tratando do simples decurso do tempo por si só. Logo, o fundamento será o periculum libertatis, enquanto perigo decorrente do estado de liberdade do imputado.

Assim, toda decisão que determine a prisão do sujeito passivo deve estar amparada em um fundado temor de fuga (ou de qualquer dos outros fundamentos do art. 312

assistente, ou por representação da autoridade policial.”

51 Ibidem. “Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

52 Ibidem. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10 out 2019.

53 Ibidem.

54 Ibidem. Decreto-lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 10 out. 2019. 55 Ibidem.

56 CALAMANDREI, Piero. Introduzione allo Studio Sistematico dei Provedimenti Cautelari. Pádova, CEDAM, 1936, p. 18 apud LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 584. Acesso em: 10 out 2019.

57 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 584. Acesso em: 10 out 2019.

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do CPP). Deve se apresentar um fato claro, determinado, que justifique o ‐ periculum libertatis. Como sustenta o Min. Eros Grau58:

(…) a custódia cautelar voltada à garantia da ordem pública não pode, igualmente, ser decretada com esteio em mera suposição – vocábulo abundantemente usado na decisão que a decretou – de que o paciente obstruirá as investigações ou continuará delinquindo. Seria indispensável, também aí, a indicação de elementos concretos que demonstrassem, cabalmente, a necessidade da medida extrema.

Nesse contexto, é necessário um juízo apoiado na prova existente nos autos, pois não basta à decisão que decreta a prisão preventiva a invocação genérica dos fundamentos legais. O juiz deve demonstrar, por meio das provas dos autos, a real probabilidade do fumus commissi delicti e do periculum libertatis. Ainda de acordo com o art. 312, CPP, verifica-se que o fumus commissi delicti é requisito da prisão preventiva e, seguindo uma interpretação sistemática e constitucional, entende-se que a “fumaça” da existência de um crime não significa juízo de certeza, mas de probabilidade razoável.

Dessa forma, o fumus commissi delicti exige a constatação de sinais externos, com suporte fático real, extraídos de uma investigação e que permitam deduzir, com maior ou menor grau de certeza, a consumação do delito cuja realização e consequências apresentam como responsável um sujeito concreto. Para que uma prisão preventiva seja decretada, é necessário um juízo de probabilidade com o predomínio das razões positivas.

Aury Lopes Jr.59 afirma:

(…) o requisito para a decretação de uma medida coercitiva não é a probabilidade de existência do direito de acusação alegado, mas sim de um fato aparentemente punível. Logo, o correto é afirmar que o requisito para decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus commissi delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito (e não de um direito), ou, mais especificamente, na sistemática do CPP, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

Portanto, a prisão preventiva somente deverá ser decretada quando inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão, aplicadas de forma isolada ou cumulativa. Observa-se que na lei processual penal brasileira não há prazo determinado para a duração da prisão preventiva, como ocorre com a prisão temporária, que tem sua temporalidade máxima definida em lei. Entende-se, pela jurisprudência e pela doutrina, que a regra é que a prisão preventiva dure o tempo que for necessário para que finde o fumus commissi delicti e o periculum libertatis durante a instrução processual, não podendo ultrapassar a sentença do juiz de primeiro grau, pois essa decisão de caráter absolutório faz cessar os motivos que levaram à decretação da prisão preventiva. No mesmo sentido, assim

58 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 95.009-4. Relator: Ministro Eros Grau. Diário da

Justiça Eletrônico. Brasília, 23 jul 2008. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/hc95009EG.pdf. Acesso em: 10 out 2019.

59 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. - 15. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018. [Minha Biblioteca]. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788547230180/>. p. 583. Acesso em: 10 out 2019.

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