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A Revolução Bolivariana em 140 caracteres: o Twitter como nova arma do discurso chavista

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA CAMPUS V – MINISTRO ALCIDES CARNEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SOCIAIS APLICADAS CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS. PRISCILLA LEMOS QUEIROZ CAPPELLETTI. A REVOLUÇÃO BOLIVARIANA EM 140 CARACTERES: o Twitter como nova arma do discurso chavista. JOÃO PESSOA 2011.

(2) PRISCILLA LEMOS QUEIROZ CAPPELLETTI. A REVOLUÇÃO BOLIVARIANA EM 140 CARACTERES: o Twitter como nova arma do discurso chavista. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação do Curso de Relações Internacionais da Universidade Estadual da Paraíba - UEPB, como requisito parcial à obtenção da graduação em Relações Internacionais.. Orientador: Prof. Dr. Carlos Enrique Ruiz Ferreira. JOÃO PESSOA 2011.

(3) C247r. Cappelletti, Priscilla Lemos Queiroz. A Revolução Bolivariana em 140 caracteres: o Twitter como nova arma do discurso chavista / Priscilla Lemos Queiroz Cappelletti. – 2011. 55f.. Digitado. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Relações Internacionais) – Universidade Estadual da Paraíba, Centro de Ciências Biológicas e Sociais Aplicadas, Curso de Relações Internacionais, 2011. “Orientação: Prof. Dr. Carlos Enrique Ruiz Ferreira, Curso de Relações Internacionais”.. 1. Mídia Política. 2. Mídia Privada Venezuelana. 3. Revolução Boliviana. I. Título.. 21. ed. CDD 344.049.

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(5) AGRADECIMENTOS. À minha família, que sempre buscou me incentivar nas horas em que duvidei se deveria continuar no curso. Se me torno internacionalista, é devido ao sonho de meus pais de ver sua filha graduada e pronta para um futuro profissional, aos conselhos de meu irmão que acalmaram minhas incertezas e às conversas informais com minha irmã as quais mostraram que tenho um mundo de oportunidades em minha frente.. Ao meu namorado, Ricardo, que nunca fez questão de escutar minhas reclamações acadêmicas.. Aos meus amigos, pois compartilhar risadas sempre foi o melhor remédio para esquecer o nervosismo do seminário a apresentar no dia seguinte, a apreensão de ler as toneladas de apostilas em cima da cama e a ansiedade da prova que estava por vir.. Aos professores, que contribuíram em meu crescimento pessoal ao compartilhar seus conhecimentos. Em especial, ao professor Carlos Enrique, que dedicou seu tempo para ajudar em minha pesquisa monográfica.. À pós-modernidade, pois a racionalidade cansa.. Ao Posto 6..

(6) “Não é sabido pretender obter resultados distintos aplicando-se o mesmo comportamento” (Albert Einstein)..

(7) CAPPELLETTI, Priscilla Lemos Queiroz. A Revolução Bolivariana em 140 caracteres: o Twitter como nova arma do discurso chavista. Monografia de Conclusão de Curso da graduação em Relações Internacionais da Universidade Estadual da Paraíba, 2011.. RESUMO. A Venezuela é um Estado democrático desde 1958. A ascensão de Hugo Chávez ao governo a partir de 1999 representou, contudo, uma nova etapa na implementação da democracia no país, implicando no rompimento de conceitos e práticas antes consolidados. A esse cenário político, marcado por uma política de esquerdização e de mudança estrutural, o presidente venezuelano vem denominando Revolução Bolivariana. Nesse contexto, a mídia privada venezuelana tem se apresentado como um dos principais adversários políticos do governo chavista, desenvolvendo uma imagem negativa do presidente e das ações governamentais, o que culminou, inclusive, na promoção e no planejamento de um golpe de Estado e na convocação de uma paralisação nacional. Diante disso, este estudo monográfico busca analisar como o Twitter se insere na estratégia discursiva do presidente venezuelano Hugo Chávez de promoção da Revolução Bolivariana frente ao conflito informativo que este enfrenta perante a mídia privada do país. Para tanto, o estudo é norteado por uma pesquisa metodológica interdisciplinar, a qual envolve conceitos e premissas de Análise de Discursos, Relações Internacionais, Comunicação Social e História. Palavras-chave: Venezuela. Hugo Chávez. Revolução Bolivariana. Mídia privada venezuelana. Twitter..

(8) CAPPELLETTI, Priscilla Lemos Queiroz. The Bolivarian Revolution in 140 characters: Twitter as a new weapon of the chavista speech. Final Paper of International Relations Graduation at Universidade Estadual da Paraíba, 2011.. ABSTRACT Venezuela is a democratic state since 1958. The ascension of Hugo Chávez towards the government in 1999 represented, however, a new stage in the implementation of democracy in the country, implying the disruption of concepts and practices previously consolidated. This political scenario, which is marked by a more left-wing oriented policy of structural shift, has been called Bolivarian Revolution by the Venezuelan president. In this context, the private media of Venezuela has been presented as one of the major political opponents of the chavista government, developing a negative image of the president and the government actions, which ultimately caused the promotion and planning of a coup d'état (putsch) and the summon for a national strike. Given these facts, this study aims to analyze how Twitter fits in the discursive strategy of Venezuelan president Hugo Chávez in promoting the Bolivarian Revolution against the informative conflict that he faces before the country’s private media. For this matter, the study is guided by an interdisciplinary methodological research that involves concepts and premises from Speech Analyses, International Relations, Social Communication and History. Keywords: Venezuela. Hugo Chávez. Bolivarian Revolution. Venezuelan private media. Twitter..

(9) SUMÁRIO. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8 CAPÍTULO I: DO PUNTOFIJISMO AO REGIME CHÁVEZ: UMA MUDANÇA ESTRUTURAL NA VENEZUELA ...................................................................................... 12 1.1 Compreendendo o puntofijismo ................................................................................ 12 1.2 Nasce o fenômeno Hugo Chávez ................................................................................ 14 1.3 A Revolução Bolivariana ............................................................................................ 17 1.3.1 Mudança política .......................................................................................................... 19 1.3.2 Mudança econômica ..................................................................................................... 20 1.3.3 Mudança social ............................................................................................................. 22 1.3.4 Mudança de postura no cenário internacional .............................................................. 23 CAPÍTULO II: MÍDIA PRIVADA VEZENEZUELANA VS. HUGO CHÁVEZ: A INFORMAÇÃO EM CONFLITO ........................................................................................ 25 2.1 Mídia privada na Venezuela: um partido de oposição ao governo chavista ......... 25 2.1.1 O Golpe de 2002 e o Segundo Paro: a mídia privada como ferramenta de convocação e distorção ........................................................................................................................ 28 2.2 A consolidação do discurso bolivariano nos meios de comunicação ...................... 31 CAPÍTULO III: @CHAVEZCANDANGA ......................................................................... 36 3.1 Uma breve noção sobre o Twitter ............................................................................. 36 3.2 Hugo Chávez: um twitteiro da Revolução Bolivariana ........................................... 39 3.2.1 O contato direto com a população ................................................................................ 41 3.2.1.1 A provocação à oposição nacional............................................................................... 43 3.2.2 A defesa de um mundo multipolar................................................................................ 44 3.2.2.1 O ideal bolivariano de integração latino-americana ................................................... 46 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 48 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 51.

(10) 8. INTRODUÇÃO. A Venezuela é um Estado democrático desde 1958. A ascensão de Hugo Chávez ao poder a partir de 1999 representou, contudo, uma nova etapa na implementação da democracia no país, uma vez que implicou no rompimento de valores e práticas antes consolidados e na instauração de uma política de esquerda. Nesse cenário, os meios de comunicação se tornaram palco de um conflito informativo, em que a oposição constrói uma imagem negativa do governo, ao passo que este busca desconstrui-la. O puntofijismo foi o regime democrático vigente na Venezuela entre o período de 1958, ano em que se restabeleceu a democracia no país, e 1998, momento em que Hugo Chávez se elege pela primeira vez. Seu nome remonta ao Pacto de Punto Fijo, assinado em 31 de outubro de 1958, por três partidos venezuelanos- o Partido Social Cristão, a Ação Democrática e a União Republicana Democrática, os quais afirmavam firmar uma cultura de diálogo político visando assegurar a democracia recém-instaurada. O discurso puntofijista era marcado pela defesa da constitucionalidade e do processo eleitoral, em específico frisavam o direito de representatividade que o povo possuía nas eleições periódicas. Além disso, condenavam veementemente o Partido Comunista e davam ênfase à relação de cooperação com os EUA. O principal foco político-econômico era o petróleo, produto cuja venda propiciava uma grande entrada de divisas no país, o que possibilitou a estabilidade do regime durante 30 anos. A crise da dívida e a queda dos preços do petróleo na década de 1980, contudo, provocaram uma recessão econômica no país e um consequente abalo na legitimidade do puntofijismo. Diante disso, os sucessivos governos do regime decidiram adotar as recomendações dos países ocidentais, promovendo uma reestruturação interna de natureza neoliberal1, a qual provocou, no entanto, o decréscimo dos índices socioeconômicos na Venezuela.. 1. Neoliberalismo, segundo Boaventura (2008), diz respeito ao discurso predominante da globalização, caracterizado por quatro aspectos: economia liberal, política liberal, Estado mínimo e primazia do sistema legal e do Estado de Direito. Refere-se, assim, ao consenso baseado em um modelo social e econômico voltado para a liberalização, a privatização e as relações de mercado, em que o Estado deve intervir minimamente para diminuir seus efeitos nocivos sob a sociedade e pelo qual os direitos civis e políticos devem ter prioridade em face dos direitos sociais e econômicos..

(11) 9. Conforme expressa Uchoa (2003, p.156):. [A partir da crise], o país adota a ortodoxia econômica: juros altos, restrição monetária e creditícia, perda real nos salários e redução do gasto público. Até o fim da década, os resultados serão amargos. Entre 1980 e 1990, o PIB recuou 6,8%, com o desemprego chegando a 11%. O salário real se depreciou 39%, e a inflação saiu de 12% para 135%.. Nesse contexto, uma série de protestos, saques e distúrbios foi protagonizada pela população, culminando, em 1992, na tentativa de Golpe de Estado liderada por Hugo Chávez. De acordo com Bandeira (2002), apesar do fracasso, o golpe possibilitou a ascensão definitiva deste tenente-coronel no cenário político interno, tornando-o popular, principalmente, nas camadas sociais mais desfavorecidas. Em 1998, com a manutenção dos desequilíbrios socioeconômicos, o discurso de quebra do puntofijismo e de reestruturação interna era o que melhor interpretava as insatisfações e reivindicações do povo, o que tornou possível a eleição legítima de Hugo Chávez à presidência da Venezuela. Desenvolve-se, a partir de então, a Revolução Bolivariana. A Revolução Bolivariana representa, portanto, uma mudança estrutural na realidade venezuelana. No plano político é promulgada uma nova Carta Magna, a Constituição Bolivariana, que traz em seu seio uma série de inovações, como o Congresso unicameral e o alargamento da participação popular nas decisões políticas. No econômico, critica-se o neoliberalismo ao passo que paulatinamente se instaura um regime socialista voltado para a satisfação das necessidades fundamentais da população. O campo social é caracterizado pela implementação de programas que buscam reverter a situação de exclusão vivenciada pelas camadas menos favorecidas. No cenário internacional, por sua vez, o país tem progredido no intento de construir um mundo multipolar, menos influenciado pela política estadunidense. Diante desse quadro, a mídia privada na Venezuela, centrada e concentrada em uma rede restrita de grupos empresariais, que defendem os interesses capitalistas e buscam manter seu poder social e seu prestígio político resultantes do regime anterior, atuam como um forte partido opositor ao regime chavista2, constituindo-se, através do controle midiático, em “um instrumento chave de poder” (FEIJÓO, 2005, p.44).. 2. No presente estudo, adota-se o conceito de partido político como associação de pessoas em uma organização estável que possuem uma ideologia comum e que buscam exercer influência sobre a determinação política de um Estado. Com isso, busca desvencilhar-se do conceito moderno, intrinsecamente vinculado à personalidade jurídica, focando-se na finalidade dessas associações..

(12) 10. Desde o Golpe de Estado de 1992, seu editorial tem procurado desfigurar a imagem de Hugo Chávez, ao mesmo tempo em que busca reforçar a conveniência de um sistema voltado ao capitalismo neoliberal. Para tanto, manipulam a opinião pública por meio da seleção de temas e notícias. A tentativa de deposição do presidente Chávez através de um Golpe de Estado em abril de 2002 insere-se nessa perspectiva, uma vez que não teria sido possível sem o concurso dos meios de comunicação privados venezuelanos, que atuaram por meio da convocação popular e da distorção dos fatos. Nesse sentido, alguns autores afirmam ter se tratado de um “golpe de Estado midiático” (MARINGONI, 2004, p.32; ROVAI, 2007, p.17; UCHOA, 2005, p.73). De forma semelhante, a paralização nacional em dezembro de 2002, que buscou destituir o presidente venezuelano a partir da desestruturação econômica, não teria ganhado amplitude se não fosse a campanha midiática diária. Nesse período, foram ao ar mais de dezessete mil inserções do bloco oposicionista ao governo, a Coordenação Democrática (MARINGONI, 2004). Essa experiência vivenciada pelo presidente venezuelano refletiu em sua estratégia discursiva. A partir desse momento, tomado pelo o que ele denominou “obsessão comunicacional” (HARNECKER, 2002, p.69), o governo chavista tem procurado avançar e consolidar seu discurso nos espaços de comunicação. Nesse sentido, cria-se a rede estatal de televisão VIVE, em 2003. No ano seguinte, a base governamental aprova no Congresso a Lei de Responsabilidade Social de Rádio e TV. Em 2005, surge a Telesur e, em 2011, a União Latino Americana de Agência de Noticias, ambas baseadas em uma estratégia comunicacional multi-estatal. A partir de 2007, o governo consolida o investimento na mídia comunitária, tendo em vista que, no contexto do golpe e da paralização, foram eles que difundiram a informação real do que se passava (TAVARES, 2005). Por sua vez, o Programa Aló Presidente, existente desde 1999, consolida-se, na medida em que é transmitido por um número crescente de canais de TV e emissoras de rádio, além de estar disponibilizado na Internet. Diante do que foi exposto, o presente estudo monográfico se propõe a analisar como o Twitter se insere na estratégia discursiva chavista de promoção da Revolução Bolivariana frente ao conflito informativo que o governo enfrenta perante a mídia privada do país. Dessa forma, busca-se demonstrar como essa ferramenta comunicacional representa importante meio para a consolidação do discurso chavista, uma vez que o bolivarianismo é promovido sem interferência dos grupos opositores..

(13) 11. A escolha do tema partiu de um interesse pelos estudos incipientes a respeito do papel da mídia no cenário internacional, em especial àqueles que procuram discutir sua emergência como ator internacional. Entender como esta influencia em questões políticas, econômicas, culturais e sociais é primordial para as Relações Internacionais. Nesse sentido, a pesquisa está permeada por uma ótica construtivista modernistalinguista3 das Relações Internacionais, a qual combina hermenêutica subjetiva com um interesse cognitivo conservador em explicar a realidade (CAMARGO, 2011). Partindo da premissa de que o mundo é socialmente construído através de interações intersubjetivas, essa vertente busca compreender o mundo social a partir das práticas textuais e discursivas, criadas com o fim de promover e consolidar os significados e valores que orientam e formam a ação política. Enfatiza, assim, o papel das ideias para a legitimação do poder de um regime, considerando a identidade e os ideais como centrais para a constituição do mundo político. Os meios de comunicação, dessa maneira, tornam-se peças-chave na compreensão da realidade. Isso porque são instrumentos pelos quais os discursos se propagam e se desenvolvem, podendo promover o predomínio de uma narrativa sobre outra e, consequentemente, de um grupo de valores sobre os demais. A pesquisa está dividida em três partes.. O primeiro capítulo contextualizará o. surgimento da Revolução Bolivariana e apresentará as mudanças estruturais resultantes desse processo. O segundo capítulo é dedicado ao conflito informativo existente entre a mídia privada venezuelana e o governo chavista. Por fim, o terceiro capítulo analisará como o Twitter de Hugo Chávez se insere na estratégia discursiva chavista, apresentando inicialmente, porém, uma breve noção acerca dessa ferramenta comunicacional. Para a consecução dessa pesquisa foi realizado um estudo interdisciplinar, norteado por conceitos e premissas de Relações Internacionais, Análise de Discursos, Comunicação Social e História, de modo a oferecer uma explicação mais bem argumentada e coerente do tema em análise. Além disso, meu perfil no Twitter (@plqcappelletti) foi utilizado para aproximação e observação do objeto do estudo, qual seja o Twitter de Hugo Chávez (@chavezcandanga).. 3. A identificação das diferentes vertentes do construtivismo no presente estudo monográfico se baseia na classificação apresentada pela autora Júlia Camargo (2011). Ela divide o pensamento construtivista em quatro correntes: modernistas, modernistas-linguistas, radicais e críticos..

(14) 12. CAPÍTULO I: DO PUNTOFIJISMO AO REGIME CHÁVEZ: UMA MUDANÇA ESTRUTURAL NA VENEZUELA. Mudanças estruturais na realidade interna de um país são concretizadas quando os atores domésticos modificam suas identidades e crenças. Dessa forma, buscar entender em que consiste a Revolução Bolivariana é descobrir qual o contexto sócio-político-cultural que propiciou seu surgimento, assim como quais os atores e interesses políticos envolvidos. O presente capítulo, assim, busca compreender as transformações ocorridas na realidade venezuelana que provocaram a alteração dos valores e significados que orientam a ação política no país. Para tanto, será apresentado um panorama geral sobre o puntofijismo, destacando-se seu discurso e os fatores que contribuíram para seu declínio. Em seguida, será descrita a ascensão de Hugo Chávez na vida política. Por fim, serão analisadas as mudanças estruturais promovidas pela Revolução Bolivariana.. 1.1. Compreendendo o puntofijismo. A Venezuela, na década de 1950, experimentava um intenso processo de modernização e urbanização promovido pela renda petrolífera, o qual resultou na construção de vias expressas e edifícios, em obras de infraestrutura, na abertura de inúmeros estabelecimentos comerciais e na sensação de que o país era imune a crises. Esse cenário, porém, estava sendo constituído a partir de governos ditatoriais, pautados pelo enriquecimento individual dos governantes e funcionários, pela perseguição política, pela tortura e, não raro, pela suspensão de garantias constitucionais. Uma grave crise fiscal e uma população que ansiava exercer o voto tornaram a situação propícia para uma ação conjunta de parcelas da oposição, denominada Junta Patriótica. Constituída em 1956 pelos partidos clandestinos Ação Democrática (AD), Comitê de Organização Política Eleitoral Independente (Copei), União Republicana Democrática (URD) e Partido Comunista da Venezuela (PCV), essa aliança provocou uma ampla mobilização popular, que, após múltiplos confrontos com as forças repressivas oficiais, resultou na queda do regime ditatorial em 1958 (UCHOA, 2003). Instaurado um governo provisório, os partidos AD, Copei e URD se reuniram, em outubro de 1958, para discutir suas posições frente à conjuntura de então. O documento resultado da reunião ficaria conhecido como Pacto de Punto Fijo:.

(15) 13. O Pacto de Punto Fijo tinha a pretensão de reduzir as diferenças ideológicas e programáticas entre seus signatários e lançar as bases para uma convergência de interesses, tendo como ponto de apoio o domínio do aparelho de Estado. (MARINGONI, 2004, p.102). Nesse sentido, o documento estabelecia um Programa Mínimo Comum e um Governo de Unidade Nacional como forma de garantir a estabilidade do movimento democrático. Firma-se também que a política nacional deveria garantir que o processo eleitoral fortalecesse a frente unitária, mediante a trégua política, a despersonalização do debate e a distribuição equitativa dos cargos políticos entre eles4, ainda que se respeitasse a liberdade de nomeação de candidatos e o resultado eleitoral. A defesa da constitucionalidade e do direito de representatividade, tornou-se, assim, ponto fulcral para o discurso puntofijista desde sua primeira eleição, em 1958. Em decorrência, os ataques ao PCV eram constantes, já que eram “considerados como forças desestabilizadoras do nascente sistema democrático”. (VILLA, 2005, p.153). A política socioeconômica baseada no petróleo também é característica do puntofijimo desde seu início. A economia era voltada para produção e exportação desse produto (principalmente após sua estatização em 1976), que, por sua vez, gerava a renda necessária para implementação de políticas e obras públicas e para redução de preços e impostos. Isso conferia certa legitimidade ao regime, já que o subsídio do Estado aos diferentes setores político-sociais inibia qualquer possibilidade de crítica quanto a esse modelo de distribuição clientelista da renda petrolífera. Nessa perspectiva:. Nas primeiras duas décadas a partir de 1958, as condições gerais de vida da população melhoraram, a mortalidade infantil era declinante, as taxas de emprego seguiam em alta, enfim, havia a expectativa real de que o país caminhava rumo ao desenvolvimento econômico e que a ascensão social era uma possibilidade concreta. (LANDER apud MARINGONI, 2004, p.105). No entanto, na década de 1980, a Venezuela vivenciou a queda dos preços do petróleo no mercado internacional, o declínio da entrada de divisas no país, a fuga de investimentos e a disparada da dívida pública, “convertendo-se no quarto país mais endividado do continente e acentuando-se o processo de desorientação e estagnação de sua economia.” (MAYA, 2009, p.234). Diante disso, os sucessivos governos puntofijistas decidiram adotar as recomendações. 4. Com o tempo, a aliança se tornou bipartidária (AD e Copei). A URD e os partidos pequenos eram incorporados em cargos de segundo escalão e alguns representantes da esquerda eram inseridos na Central de Trabalhadores como forma de garantir a estabilidade institucional e reduzir críticas..

(16) 14. dos países ocidentais, em especial dos EUA que era seu principal parceiro políticoeconômico, promovendo uma reestruturação interna de natureza neoliberal, a qual incluía medidas como restrição do gasto fiscal e dos níveis salariais e redução dos subsídios.. [A partir da crise], o país adota a ortodoxia econômica: juros altos, restrição monetária e creditícia, perda real nos salários e redução do gasto público. Até o fim da década, os resultados serão amargos. Entre 1980 e 1990, o PIB recuou 6,8%, com o desemprego chegando a 11%. O salário real se depreciou 39%, e a inflação saiu de 12% para 135%. (UCHOA, 2003, p.156). A sucessão de reajustes neoliberais não mudou a realidade venezuelana permeada pelo aumento do desemprego e da pobreza, pela perda do poder de compra, pelo aprofundamento da exclusão social e pela redução de políticas sociais. Nesse sentido, surgiu uma “sociedade com fadiga de ajuste” (MAYA, 2009, p. 17), ou seja, uma sociedade que, em virtude dos reiterados fracassos dos reajustes, perdeu a confiança na capacidade do projeto neoliberal para alterar o cenário nacional, ao passo que percebeu o esgotamento do modelo de desenvolvimento pautado no clientelismo, questionando-o. Nesse contexto, a Venezuela presenciou um período de turbulências sociopolíticas, no qual o protesto popular, caracterizado por ações como saques, greves e manifestação nas ruas, tornar-se-ia constantes. A democracia de 1958, instaurada com um discurso de estabilidade democrática e justiça social promovido por um Estado paternalista, perdia sua legitimidade. Estava criado o ambiente em que um Golpe Militar contra o governo poderia ser intentado.. 1.2 Nasce o fenômeno Hugo Chávez. A política venezuelana tornou conhecida a figura de Hugo Chávez após tê-lo identificado como líder do Golpe de Estado de 1992. Desde o fim da década de 1970, contudo, este tenente-coronel já vinha discutindo acerca da necessidade de mudanças no sistema democrático adotado na Venezuela desde 1958. Hugo Chávez entrou na Academia Militar em 1970, aos dezessete anos. Ele pertence à primeira geração do Plano Andrés Bello, programa que buscou incentivar o aprimoramento da carreira militar através da transformação do ensino em curso superior. Desde então, os oficiais começaram a estudar ciências políticas, a conhecer os pensadores da democracia e a analisar a realidade nacional (HARNECKER, 2004). Três anos após o começo dessas discussões, Hugo Chávez foi enviado ao Peru e, em seguida, ao Panamá. Na ocasião, conheceu o governante peruano Juan Veslasco Alvarado e o.

(17) 15. presidente panamenho Omar Torrijos, ambos militares nacionalistas, os quais falavam abertamente sobre revolução social e intervenção militar. Para que os militares? […] Para servir a que tipo de governo: para estabelecer uma ditadura como Pinochet ou para governar como Velasco ou Torrijos ao lado do povo, enfrentando incluso correntes hegemônicas mundiais? Então, comecei a perceber ao militar não como um massacrador do povo nem para dar golpes de Estado, senão como um servidor social e a Força Armada como um ente social. (HARNECKER, 2002, p.15). Essa e outras experiências vivenciadas como oficial militar, assim como os estudos propiciadas pelo Plano Andrés Bello, tornaram Hugo Chávez um defensor da aliança cívicomilitar e crítico do regime puntofijista, considerado corrupto e causador da pobreza e da dependência internacional. Nesse sentido, em 1977, tentou articular um grupo político no interior das Forças Armadas, o Exército de Libertação do Povo Venezuelano, o qual não prosperou (ALMENDRA, 2005). Mais tarde, em 1982, ele, Jesús Urdaneta e Felipe Acosta fundaram o Exército Bolivariano Revolucionário 200 (EBR-200), sob o seguinte compromisso: Juro pelo Deus de meus pais, juro pela minha pátria, juro pela minha honra que não darei tranquilidade a minha alma nem descanso a meu braço até que não estejam rompidas as correntes que oprimem meu povo por vontade dos poderosos. Eleição popular, terra e homens livres, horror à oligarquia! (UCHOA, 2003, p. 136).. O EBR-200, inicialmente destinado ao debate interno nas Forças Armadas, foi incluindo progressivamente civis, o que provocou a mudança de nome para Movimento Bolivariano Revolucionário 200. Desde então, buscou-se discutir acerca do momento e da forma que um levante deveria se apresentar contra o regime puntofijiista, de forma a implementar um novo modelo político e econômico na Venezuela. O ano de 1992 foi a resposta encontrada. De um lado, a descrença da população frente ao Punto Fijo, devido às falsas promessas de desenvolvimento socioeconômico, provocou um fortalecimento da mobilização social, tendo sido registrados 925 protestos de rua entre setembro de 1991 e fevereiro seguinte pelo Ministério da Defesa (MARINGONI, 2004). Por outro lado, parte dos militares repudiava a reação violenta ordenada pelo regime frente às manifestações da sociedade. Assim, em 3 de fevereiro de 1992, o Grupo Comacate, como ficou conhecido o grupo de oficiais da insurreição militar (coronéis, majores, capitães e tenentes), colocaram em prática o plano Ezequiel Zamora, que ocorreria desde o noroeste do país, em Maracaibo, até o centro-.

(18) 16. norte, em Caracas. O principal objetivo do levante era deter o Presidente da República Carlos Andrés e convocar uma Assembleia Constituinte. O plano, contudo, não prosperou. O Ministro da Defesa foi avisado sobre a sublevação militar, o que possibilitou uma pronta reação governista, sufocando o movimento nos principais pontos estratégicos e impossibilitando a convocação da sociedade civil nos meios de comunicação pelos golpistas. Diante disso, Chávez decidiu apresentar a rendição, através de um pronunciamento na televisão, na manhã do dia 4:. Antes de mais nada, quero dar bom-dia a todo o povo da Venezuela, mas esta mensagem bolivariana é dirigida aos valentes soldados que se encontram no regimento de paraquedistas de Aragua e na brigada de Blindados de Valencia. Companheiros, lamentavelmente, por enquanto, os objetivos que nos colocamos não foram atingidos na capital. [...] Vocês o fizeram muito bem aí, mas agora é tempo de refletir. Novas situações aparecerão, e o país deve orientar-se definitivamente rumo a um destino melhor. [...] Agradeço-lhes a lealdade, a valentia, o desprendimento. Eu, ante o país e ante vocês, assumo a responsabilidade deste movimento militar bolivariano. Muito obrigado. (CHÁVEZ, 2011). Apesar de fracassado, o Golpe de Estado resultou positivo. O discurso de um minuto, conhecido como “por enquanto”, capturou a imaginação coletiva de insatisfação com o regime vigente e de anseio por mudanças. Segundo Uchoa (2003), desde então, quem almejasse derrubar o governo e lutar pela justiça social invocava essas duas palavras. Com isso, o MRB-200 se tornou uma organização de alcance nacional e Hugo Chávez, um ídolo. Surgiu, assim, o “Fenômeno Chávez” (SEABRA, 2010, p.215). Dessa forma, ainda que os insurgentes tenham sido presos, o MBR-200 não perdeu sua força reivindicativa. Dentro das prisões, as discussões continuaram, as estratégias se delinearam e os contatos com os setores sociais se intensificaram. Ao saíram dos cárceres, em 1994, por indulto concedido pelo presidente Caldera 5, os militares bolivarianos decidiram pela tática da abstenção pacífica: “não aos partidos, não às eleições e sim à proposta alternativa de constituinte popular” (HARNECKER, 2002, p.17). Nessa perspectiva, visitaram diversas regiões, promovendo a ideia da Constituinte e da soberania popular, e criticando o partidarismo político. Com a crescente união cívico-militar, em 1997, a estratégia mudou: era o momento de participar das eleições. Cria-se, assim, o Movimento V República (MVR):. 5. Rafael Caldera foi eleito em 1993. Concorrendo pela Convergência Nacional, foi o primeiro candidato presidencial a chegar ao poder sem pertencer aos partidos AD ou Copei desde 1958. Sua promessa de não se ater às medidas dos organismos internacionais neoliberais e não pactuar com os mencionados partidos, contudo, não foi concretizada, frustrando a sociedade civil que havia o eleito pretendendo mudanças..

(19) 17. O MVR nasceu em 1997 como uma estrutura eleitoral do MBR-200[…]. Naquele momento, a criação do MVR foi pensada como um passo tático dentro da estratégia geral do MBR-200 de valer-se do poder para uma nova fundação da República. Foi concebido para acolher todos os movimentos, agrupamentos políticos e personalidades que se iriam juntando à candidatura de Hugo Chávez. (MAYA, 2009, p. 169). No ano eleitoral de 1998, os partidos Pátria Para Todos (PPT), Movimento Al Socialismo (MAS) e Partido Comunista da Venezuela (PCV) se juntaram ao MVR e formaram a Junta Patriótica. Seu discurso antineoliberal, de reestruturação do sistema político, de resgate do papel protagônico do povo e de justiça social resultou em sua vitória: a aliança obteve 56,2% dos votos válidos na eleição presidencial e 53% das cadeiras do Congresso. Dava-se início à Revolução Bolivariana.. 1.3. A Revolução Bolivariana “A soberania do povo é a única autoridade legítima das nações” Simón Bolívar Hugo Chávez, desde o período do EBR-200, estava convencido que apenas uma. revolução poderia tirar a Venezuela da crise política, econômica e social. Nesse sentido, sua candidatura introduzia na política venezuelana um discurso de mudanças estruturais, pautado na aliança cívico-militar, em símbolos pátrios e no papel protagônico do povo. A essa conjuntura, o então presidente denomina Revolução Bolivariana. Segundo Harnecker (2004), a Revolução Bolivariana se apresenta como um processo sui generis, surgido com a eleição triunfante de um militar populista e orientado pelo ideal bolivariano de soberania popular, anti-imperialismo e antioligarquia. Por sua vez, Vieira (2005) a caracteriza como um processo peculiar de transformação interna da Venezuela rumo a uma mudança estrutural do nível político, condição necessária para a mudança dos níveis econômico e social, e que busca uma alternativa regional ao projeto de globalização ligado ao neoliberalismo. Assim, parte importante do discurso bolivariano está na construção do povo como sujeito protagônico da política venezuelana, capaz de transformar ou conformar a realidade. Na tomada de posse em 1999, Chávez frisou: “o único soberano aqui [...], na terra venezuelana, é esse povo, não há outro; esse é um princípio universal e elementar”.

(20) 18. (CHAVEZ, 2011). É nesse contexto que as forças chavistas têm buscado o fortalecimento da organização dos setores populares, como os círculos bolivarianos e os conselhos comunais6. Os militares também se tornam peças-chave da revolução. Desde o primeiro ano de governo, eles têm desempenhado um papel essencial na defesa do regime chavista, bem como na consecução de projetos sociais destinados à população. O Plano Bolívar 2000, por exemplo, representou um ponto decisivo na aliança cívico-militar, na medida em que alocou vinte mil soldados em ações que visavam suprir as deficiências nas áreas sociais sob responsabilidade do Estado, como saúde e educação (MARINGONI, 2004). O uso de símbolos da nacionalidade é proeminente no discurso bolivariano. A própria ideologia do MBR é pautada pela “árvore das três raízes”: “nossa ideologia se alimenta de muitas correntes, uma delas a corrente zamorana; a outra, a bolivariana; e a outra robinsoniana. São as três raízes que inspiram e alimentam o projeto bolivariano”. (CHÁVEZ, 2003, p.85). Zamora foi um general liberal que lutou na Guerra Federal e defendia a reforma agrária, o combate à oligarquia, a liberdade dos homens e as eleições populares. Segundo Chávez (2003), esse personagem deixou plantada as sementes da esperança, da igualdade e da dignidade na terra bolivariana. Bolívar, por sua vez, é reconhecido por ser o maior estrategista contra o domínio espanhol no continente latino-americano. Dele, o presidente venezuelano apreendeu que a região latina deve se integrar para reverter sua existência política dependente, a democracia deve ser o sistema político que proporcione a máxima felicidade ao povo e o militar nunca deve dirigir suas armas contra aquele. (HARNECKER, 2004). Simón Rodriguez, cujo pseudônimo era Robinson, foi um educador e poeta humanista, e mestre de Bolívar. Pregava pelo caráter igualitário da educação, sem qualquer discriminação entre brancos, negros e índios. Para ele, a América Latina deveria se apoiar nos poderes de criação do povo, de forma a desenhar sua própria identidade e não imitar as grandes potências (UCHOA, 2003). Dessa maneira, na Venezuela, o emprego de um discurso que resgata a história pátria torna-se articulado aos próprios atos da política, legitimando-os na medida em que invocam um passado nacional glorioso. Toda ação política está permeada por um significado 6. Os Conselhos Comunais representam o maior esforço do governo em incentivar a participação social e diz respeito a instâncias organizadas e articuladas no seio das comunidades que exercem diretamente a gestão de políticas públicas destinadas a sanar as necessidades locais. Os círculos bolivarianos, por seu turno, são organizações sociais promovidas pelo MBR que buscam difundir o pensamento bolivariano nos diversos âmbitos da sociedade (associações de bairros, grupos de mãe, paróquias etc)..

(21) 19. simbólico. A denominação MVR, por exemplo, corresponde à interpretação que há uma refundação da República, pela qual o regime republicano estabelecido desde 1830 e caracterizado pela oligarquia e desigualdade, fora suplantado. Por fim, ressalta-se que o ideal bolivariano pretende enfrentar a estrutura de poder ligada à elite, às oligarquias, consideradas corruptas e causadoras da exclusão social. Como Chávez enfatizou na sua posse em 1999, sua eleição representa o abrir de uma porta em direção a uma nova existência nacional, desconexa com as medidas tomadas pelo puntofijismo, que provocaram profundos problemas sociais (CHAVEZ, 2011). Em suma, a Revolução Bolivariana é a principal expressão do discurso chavista e diz respeito à ideia de que está incidindo no país uma revolução social, econômica, política e ética, em que se luta por uma democracia verdadeira, participativa e protagonista e na qual se tenta recuperar a identidade, a dignidade e a soberania do povo, ao passo em que se rompe com os conceitos e práticas antes consolidados pelo regime puntofijista. Trata-se, portanto, de uma nova etapa na democracia venezuelana.. 1.3.1 Mudança política. O primeiro ato realizado pelo governo Chávez se traduziu na concretização de uma promessa que vinha se manifestando desde o Golpe de Estado de 1992: a convocação de uma Assembleia Constituinte. A refundação do aparato estatal por meio de uma mudança institucional era conditio sine qua non para a consecução das demais transformações na realidade venezuelana. Nas palavras do presidente:. O desafio foi como convocar a Assembleia Constituinte pela via legal. A primeira coisa que tinha que fazer era ganhar a Presidência da República para, desse órgão de poder, convocar o referendo onde o povo pudesse se pronunciar. Baseamo-nos no art. 4º da velha Constituição [...]. Tiramos o ponto jurídico e interpretativo desse artigo que permite ao presidente convocar ao referendo para que a soberania que reside no povo se expresse por um órgão público. Ganhamos esse referendo com a bandeira da Constituinte [...]. A essa etapa chamamos etapa da convocação da Assembleia Constituinte. Depois veio a etapa das eleições para a Constituinte e nelas participaram não só candidatos dos partidos, como também jornalistas, indígenas, cantores [...]. Houve muitas nominações para eleger 130 constituintes. Uma vez eleitos os membros da Assembleia, passamos a etapa assembleísta: a Assembleia deliberando e elaborando o novo projeto de Constituição. [...] Depois passamos a fase aprovação da Constituição. Mais de 70% dos eleitores disseram sim a nova Constituição. Finalmente vem a fase maior e mais complexa: a fase executiva. Nesta nova fase, o primeiro passo era eleger as novas autoridades para transformar [...] o mapa político do país. Relegitimamos todos os poderes: presidentes, governadores, prefeitos e deputados. (HARNECKER, 2002, p.22).

(22) 20. A Constituição aprovada pelo citado processo, em vigor desde 1º de janeiro de 2000, trouxe inovações que repercutiram no plano político. Destaca-se a mudança do nome do país de República da Venezuela para República Bolivariana da Venezuela, o prolongamento do mandato presidencial para seis anos, a criação de dois novos poderes públicos (Cidadão e Eleitoral), a criação das Leis Habilitantes, que aufere força de lei aos decretos presidenciais, e a criação do Congresso unicameral (dissolução do Senado). A novidade mais salutar da Constituição Bolivariana foi, contudo, o alargamento da participação popular no processo político, mediante a formação, a execução e o controle da gestão pública. O texto legal apresenta quatro tipos diferentes de referendo: o consultivo, que submete à consulta os problemas de alcance nacional, como a nacionalização de empresas; o revocatório, que decide se um funcionário deve continuar ou não em seu cargo, passado a metade de seu mandato; o aprobatório; que trata da aprovação de acordos internacionais; e o abolitório, que diz respeito à possibilidade de abolir leis ou decretos com força de lei (HARNECKER, 2004). A reestruturação política também atingiu a base chavista. Em 2001, o MBR-200 foi refundado, visando fomentar uma organização popular de apoio ao bolivarianismo, formada por forças sociais que defendem o processo, mas que não são militantes em partidos. O Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV), por seu turno, foi fundado em 2006, com o intuito de não só organizar uma força eleitoral, como era o MVR, mas também preparar uma sustentação ideológica unificada que estabelecesse uma ligação complexa entre os diferentes atores políticos da base governamental (SEABRA, 2010). A mudança estrutural política, portanto, tomou impulso com a promulgação da Constituição da República Bolivariana da Venezuela. Mais do que mera expressão jurídica, seu texto preceitua uma nova forma de existência política.. 1.3.2 Mudança econômica. O governo Chávez, após ter se focado na mudança de ordem política em seu primeiro ano, buscou intensificar a transformação no plano econômico. Desde então, tem buscado se desvencilhar do modelo anterior, neoliberal e rentista. A crítica ao neoliberalismo, assim, constitui pauta essencial no regime chavista. Aqui, esse modelo econômico é associado ao neocolonialismo e visto como causador da pobreza e da situação de exclusão social, além de auxiliar na desestruturação da coesão social (CIVIDANES, 2007). Nesse sentido, Hugo Chávez já vociferou por diversas vezes que o.

(23) 21. processo revolucionário bolivariano se apresenta como uma proposta alternativa ao regime neoliberal e sua “receita do Diabo” (CHAVEZ, 2011). O termo “socialismo” tem sido publicamente mencionado desde 2006 para respaldar essa orientação econômica. No Plano de Desenvolvimento Econômico e Social formulado para os anos 2007-2013 fala-se em um Projeto Ético Socialista Bolivariano, que surge a partir da constatação de uma realidade caracterizada pela:. confrontação entre um sistema velho (o capitalismo) que não terminou de falecer, baseado no individualismo egoísta, na ganancia pessoal e no objetivo de lucro desmedido, e um novo sistema (o Socialismo) que está nascendo e [possui] valores éticos como a solidariedade humana, a realização coletiva da individualidade e a satisfação racional das necessidades fundamentais dos homens e das mulheres. (VENEZUELA, 2011d, p.7). O regime chavista tem buscado, então, desenvolver um projeto de Estado soberano e presente, que pretende corrigir a nocividade do mercado ao distribuir a riqueza e garantir o acesso de todos aos direitos fundamentais, como educação e saúde. Com isso, a economia passa a se vincular com noções relativas à dignidade, à justiça e à solidariedade (CIVIDANES, 2007). Nessa perspectiva, o petróleo continua sendo o principal produto venezuelano, porém deixa de se apresentar como instrumento garantidor de privilégios. O binômio concentraçãomonopolização, característico da relação EUA-Venezuela durante o puntofijismo (PAIVA, 2005), é paulatinamente substituído pela diversificação de parceiros7 e pelo fortalecimento de outros setores da economia8, como a agricultura e o setor terciário. Igualmente, há uma gradativa mudança de um modelo rentista para um produtivo, cujos recursos se voltam ao bem-estar dos venezuelanos e ao desenvolvimento do país (políticas assistencialistas, subsídios, reforma agrária, etc). A Petróleos de Venezuela (PDVSA), principal empresa do país, deixa a política de abertura petroleira, cuja estratégia de mercado era estipulada pelas companhias transnacionais, por uma baseada no fortalecimento de sua nacionalização. Nesse contexto se estabeleceu, por exemplo, o Decreto 1.892, que obriga a estatal a privilegiar a contratação de. 7. Entre janeiro de 2010 e agosto de 2011, o valor das exportações realizada por Venezuela aumentou 36% em relação à China, 249% em relação ao Brasil, 106% em relação a Colômbia, porém diminuiu 50% em relação aos EUA. Registra-se que o cálculo exclui o petróleo (VALOR, 2011). 8 Segundo Merentes (2007), baseado em dados do Banco Central da Venezuela, entre 1998 e 2007, o setor não petrolífero apresentou um crescimento do PIB superior em 10% em relação ao setor não petrolífero..

(24) 22. bens e serviços de empreendimentos nacionais em suas licitações, como forma de estimular a indústria interna venezuelana. (UCHOA, 2003). A Constituição Bolivariana traz em seu escopo diversos dispositivos acerca da política econômica. Dentre eles, está a proteção e a promoção pelo Estado da pequena e média empresa, das cooperativas e da empresa familiar (art. 308); a afirmação que o regime latifundiário é contrário ao interesse social (art. 307); e a previsão do desenvolvimento harmônico da economia entre Estado e iniciativa privada com o fim de gerar fontes de trabalho e alto valor agregado nacional, elevar o nível de vida da população e fortalecer a soberania econômica do país (art. 229). A mudança estrutural econômica na Venezuela se traduz, dessa forma, na implementação do socialismo como regime, tendo em vista um modelo com um conteúdo mais democrático, capaz de desenvolver as atividades econômicas em diversos setores e melhorar a distribuição de renda.. 1.3.3 Mudança social. O projeto bolivariano busca desenvolver uma cidadania ativa, ao passo que fomenta um modelo econômico que se esforça a corrigir a injusta distribuição de renda. Nesse diapasão, o bolivarianismo compreende a democracia não apenas como mero gozo das liberdades civis e políticas, mas também como sinônimo de igualdade social.. Na democracia protagônica revolucionária, o Estado garante os conteúdos materiais que exige a realização do bem comum: a justiça está acima do direito; e as condições materiais para garantir o bem-estar de todos, tais como educação, saúde e trabalho, que estão acima da simples formalidade da igualdade ante a lei e o despotismo mercantil. (VENEZUELA, 2011d, p.18). Na Venezuela chavista, portanto, a compreensão da desigualdade social se norteia pela acepção elaborada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, em que ela é vinculada com a exclusão social. Os objetivos das políticas nacionais se voltam, então, para a construção da inclusão das camadas desfavorecidas, de forma a restabelecer as pessoas como sujeitos sociais promotores e corresponsáveis por sua condição de vida (MAYA, 2009). Nesse sentido, o governo tem investido amplamente em políticas sociais e assistencialistas. Na maior parte dos discursos proferidos por Chávez e sua base aliada, enfatiza-se a melhoria dos índices, apresentando números sobre o progresso. Em 2002, o presidente afirmou: “Nós baixamos a desnutrição infantil em 10%, baixamos a mortalidade.

(25) 23. infantil [...]. Destinamos um orçamento muito maior à educação, passando de 3% a mais de 6%, o acesso à água potável aumentou bastante” (HARNECKER, 2002, p. 57). Já no informe de gestão de 2011, destacou que em 2010 a pobreza chegou a 26,8% e a pobreza extrema em 7,1%, enquanto que em 1998 as taxas eram 49% e 21%, respectivamente. Na ocasião, também frisou que aproximadamente 10% do PIB estavam sendo gastos em projetos sociais. (CHAVEZ, 2011). De fato, fontes oficiais confirmam o avanço nos indicadores sociais venezuelanos. Em 2010, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura reconheceu a Venezuela como território livre de analfabetismo e como o segundo país latino-americano com a maior inscrição do ensino superior (83%), atrás apenas de Cuba. O Sistema Integrado de Indicadores Sociais da Venezuela, por sua vez, auferiu que a taxa de investimento público real em saúde aumentou 11,9% entre 2009 e 2010, o número de habitações populares entregues no primeiro semestre de 2011 alcançou 45.000, o déficit nutricional nas crianças baixou 4% em dez anos e o índice de desigualdade social atingiu 0,3898 (zero significa distribuição igualitária de renda), o mais baixo da América Latina. O governo Chávez tem promovido ações que possibilitam aos setores antes excluídos um acesso a políticas e recursos que lhes oferecem oportunidades de superar os problemas de desigualdade socioeconômica, herdados da conjuntura puntofijiista. É nesse sentido que devemos perceber a mudança estrutural social na Venezuela.. 1.3.4 Mudança de postura no cenário internacional. A política externa chavista tem se baseado em dois eixos: minar a influência que os Estados Unidos exercem no cenário internacional e trabalhar para a consecução de uma ordem internacional multipolar. Há a busca, assim, da construção de um modelo equitativo de Relações Internacionais. Dessa forma, uma das medidas tomada pelo governo Chávez tem sido a recuperação do ideal bolivariano de união dos países latino-americanos como forma de confrontar a ditadura imperial, ou seja, o grupo de países que se acham superiores aos do Sul (CHAVEZ, 2011). A Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA) e a União das Nações Sul-americanas (UNASUL) são vertentes dessa ideia, constituindo-se com o objetivo de serem espaços integrados e participativos de diálogo político na região, voltados para colaboração dos Estados partícipes nas diversas áreas, à procura do fortalecimento da independência regional e.

(26) 24. da democracia social. O intenso intercâmbio com Cuba, as frequentes viagens aos países vizinhos e a entrada da Venezuela no Mercosul também são exemplificativos dessa postura. A ofensiva no campo internacional também abarca a política petroleira. Segundo Monteiro (2010), a Venezuela tem consciência de sua importância para a cena energética mundial e para a estabilidade regional, e, dessa forma, utiliza o petróleo como principal instrumento de ação no cenário internacional. Nesse sentido, tem se reaproximado das diretrizes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, baseadas no controle de preços do produto no mercado internacional, assim como tem investido na cooperação energética latino-americana, através do Petrosur, Petroandina e Petrocaribe, com o fito de aumentar a influência latino-americana na arena comercial. Por fim, registra-se que a estratégia internacional venezuelana de construção de uma ordem multipolar passa necessariamente pela atuação conjunta com os demais países que se apresentam contrários ao unilateralismo estadunidense. Sendo assim, o governo Chávez tem liderado iniciativas como o Grupo dos 15, de cooperação Sul-Sul, e o Grupo dos 77, constituído por países em desenvolvimento, tem promovido a ideia de alargamento do Conselho de Segurança, com o aumento do número de membros permanentes, e tem intensificado suas relações bilaterais com China e Rússia. A política externa chavista, assim, propõe uma ruptura que “se reflete no uso soberano dos recursos do petróleo, no projeto de integração bolivariana e num discurso de forte conteúdo de confrontação com os Estados Unidos” (MONTEIRO, 2010, p. 7), que imprimem um maior protagonismo da Venezuela no cenário internacional..

(27) 25. CAPÍTULO II: MÍDIA PRIVADA VEZENEZUELANA VS. HUGO CHÁVEZ: A INFORMAÇÃO EM CONFLITO. O mundo é socialmente construído e, sendo assim, podemos analisá-lo a partir das práticas textuais e discursivas que o permeiam. A comunicação, nesse sentido, deve ser entendida como “um processo simbólico pela qual a realidade é produzida, mantida, reparada e transformada” (CAREY apud LIMA, 1996, p. 247). Os meios de comunicação, dessa maneira, não se constituem em ferramentas que transmitem a realidade que lhes é externa de forma imparcial. Ao contrário, são agentes políticos que, através dos discursos que propagam e desenvolvem, promovem o predomínio de uma narrativa sobre outra e, consequentemente, de um grupo de valores sobre os demais, interferindo diretamente no jogo político. Na Venezuela, os meios de comunicação privados, enquanto setor empresarial com alto grau de coesão, vêm se apresentando como importante ator político do bloco oposicionista ao governo, a Coordenação Democrática. Junto ao setor empresarial organizado na Federação de Câmaras do Comércio e Produção (Fedecámaras), aos tecnocratas e trabalhadores da PDVSA, aos sindicalistas da CTV e aos segmentos de média e alta renda, têm planejado e incentivado ações que visam deslegitimar o processo bolivariano e seu principal líder, o presidente Hugo Chávez. O presente capítulo busca, portanto, expor como a mídia privada venezuelana vem se constituindo como um forte adversário político da base governamental e, nesse contexto, demonstrar como a estratégia discursiva chavista tem buscado consolidar e avançar o discurso bolivariano nos espaços de comunicação.. 2.1 Mídia privada na Venezuela: um partido de oposição ao governo chavista A Constituição Bolivariana, em seu artigo 579, garante a liberdade de imprensa e proíbe a censura, conquanto que não se vincule mensagens de guerra, discriminatórias ou que promovam a intolerância religiosa. Os meios de comunicação privados na Venezuela, contudo, parecem ignorar esse dispositivo legal. 9. Artigo 57: “Toda pessoa tem direito a expressar livremente seus pensamentos, suas ideias ou opinião de viva voz, por escrito ou mediante qualquer outra forma de expressão e de fazer uso para tanto de qualquer meio de comunicação ou difusão, sem que possa se estabelecer censura. Quem faz uso desse direito assume plena responsabilidade pelo expressado. Não se permite o anonimato, a propaganda de guerras, as mensagens discriminatórias ou que promovam a intolerância religiosa” (VENEZUELA, 2011a)..

(28) 26. A mídia privada venezuelana encontra-se centrada e concentrada em uma rede restrita de grupos empresariais, sendo praticamente dominada por quatro emissoras de televisão (Venevisión, Televen, Globovisión e Radio Caracas Televisión - RCTV) e três jornais privados (Últimas Noticias, El Universal e El Nacional). Compartilhando uma visão de mundo calcada nos interesses capitalistas neoliberais10, estes meios ganharam prestígio político e poder social durante o regime puntofijista, na medida em que assumiam “a tarefa de conseguir que o público em geral aceitasse o status quo” (FEIJOÓ, 2005, p.44) e atraiam investimentos de empresas transnacionais interessadas nesse processo. A ascensão do discurso de esquerda de Hugo Chávez no cenário nacional representou, assim, um desafio à sua posição estratégica. Dessa forma, desde o Golpe de Estado de 1992, a mídia comercial tem procurado deslegitimar a imagem de Hugo Chávez, ao passo que busca reforçar a conveniência de um sistema voltado ao capitalismo neoliberal. Assim, através do controle midiático, constitui-se em um “instrumento chave de poder” (FEIJÓO, 2005, p. 44). Diante disso, assim analisa o jornalista Fidel Canelón acerca da realidade midiática de seu país: Apenas acreditávamos que havíamos libertado do regime partidocrático que nos dominou por várias décadas, quando outra perversão política está mostrando suas garras em nosso país: o manejo abusivo da atividade política por parte dos meios de comunicação. [...] os meios de comunicação estão se convertendo em um exemplo proverbial do que poderíamos chamar de massmediocracia, isto é, etimologicamente falando, o governo dos meios de massa. Na Venezuela, os quatro principais canais de TV [...] acumularam um poder desmedido como em muito poucos países do mundo. Deslocaram os partidos políticos e mesmo a sociedade civil ao cumprir virtualmente as funções características destes: agitação e mobilização política, socialização e doutrinação, agregação e representação de interesses e, inclusive, recrutamento e preparação dos futuros governantes (não são por acaso Julio Borges e Alfredo Peña candidatos presidenciais de laboratório, formados nas ‘fileiras’ da Rádio Caracas e Venevisión?). (CANELÓN, 2011).. Portanto, os meios de comunicação privados assumem, na Venezuela, o papel de um verdadeiro partido político de oposição. Por um lado, adotam um discurso unificado, em que o tom editorial das emissoras de rádio e televisão, assim como dos jornais impressos, apresenta um mesmo enfoque, voltado à deslegimitação das ações de Chávez e sua base aliada, enfatizando os problemas socioeconômicos que a Revolução Bolivariana não conseguiu resolver. Por outro lado, ostentam uma postura de equivalentes da opinião pública,. 10. Segundo Mendes (2008), desde o advento da globalização e do neoliberalismo, a indústria de comunicação passou a se estruturar segundo o princípio de concentração oligopólica. Como resultado, o mercado de mídia está cada vez mais concentrado em um número menor de empresas internacionalizadas, as quais compartilham o compromisso com uma ordem capitalista neoliberal. Em consequência, de acordo com a autora, há a tendência a um noticiário uniforme, que procura manter a ideologia dominante..

(29) 27. considerando-se como “legítimos representantes da sociedade no debate político”. 11. (ROVAI,. 2007, p. 11). Nesse sentido, diariamente o povo venezuelano está sujeito às constantes adjetivações negativas acerca da figura do presidente, as quais buscam demonstrar que a Revolução Bolivariana é um mero discurso retórico e que não tem propiciado as mudanças estruturais que o povo necessita. Em 28 de setembro de 2011, por exemplo, a RCTV publicou: “Mediante leis, decretos e vias de fato, constitui-se um tecido perverso em que sucumbem a propriedade, os direitos humanos, a segurança jurídica e a liberdade. Uma rede de opressão destinada a absolver o crescente descontentamento popular” (LEÓN, 2011). Na campanha eleitoral de 1997, por sua vez, Chávez já era caracterizado como “autoritário, fascista, antidemocrático, promotor de violência, e um candidato que para ganhar não titubearia em varrer as instituições e impor um clima de terror próximo de uma guerra civil” (MAYA, 2009, p.196). O exemplo mais recente de ataque da mídia privada venezuelana em relação ao presidente Chávez tem sido explorar a doença que o acometeu, câncer na região pélvica. Tenta-se expor a imagem de um presidente debilitado, impossibilitado de governar e sem base aliada capaz de continuar o falso discurso de Revolução Bolivariana. Segundo o noticiário da Globovisión: A chegada do Presidente da República [do tratamento médico realizado em Cuba] deixa algumas reflexões. [...] podemos observar sumamente deteriorado, ofegante e cansado ao presidente, coisa natural em um doente de câncer. Ainda que não tenhamos informação exata do grau de sua doença, [...] suas condições físicas já o faz impossível continuar afrente de um governo que nada resolve, que tudo piora. Um país com problemas tão graves como o crime que acaba com a vida de mais de 50 venezuelanos semanalmente, a infraestrutura de hospitais, escolas, avenidas e rodovias em plena deterioração, a escassez de medicamentos e alimentos [...]. O país inteiro precisa de um presidente em plenitude de funções [...] em condições ótimas para empreender as ações necessárias que resolvam ou mitiguem os problemas em que estamos imbuídos. (OSUNA, 2011).. Esse discurso negativista construído pelos veículos de comunicação privados na Venezuela tem repercussão internacional, na medida em que são difundidos por emissoras e jornais comerciais de outros países que também defendem o status quo do cenário internacional, predominantemente neoliberal. A publicação do jornal americano The Economist em 5 de fevereiro de 2009 exemplifica esse posicionamento, assim retratando a Venezuela de Chávez:. 11. A essa postura dos meios de comunicação de equivalentes da opinião pública o autor Renato Rovai tem denominado “Midiático Poder” (ROVAI, 2007, p.11)..

(30) 28. O crime, o custo de vida e o problema da moradia pioraram substancialmente desde que o Sr. Chávez ascendeu ao poder. [...] a inflação em 2008 alcançou 31%, a maior da América Latina. O preço da comida em Caracas majorou em 50%. [...] Violência e intimidação aos opositores pelas forças de segurança e pelos grupos civis (abertamente vinculados ao governo) aumentou. (OBLIVIOUS, 2011).. Em suma, a mídia privada venezuelana tem se apresentado no cenário nacional como um forte e coeso partido de oposição frente à aliança chavista. Desde o golpe de 1992, o discurso diário das redes de TV e rádio e dos jornais impressos vem buscando construir uma imagem negativa de Hugo Chávez e da revolução que ele defende, sendo o bolivarianismo diariamente retratado como antidemocrático, opressor e demagogo.. 2.1.1 O Golpe de 2002 e o Segundo Paro: a mídia privada como ferramenta de convocação e distorção. A relação entre a base chavista e a oposição ganhou novos contornos em 2002, quando foi intentado um Golpe de Estado em abril e realizado a segunda paralização cívica nacional em dezembro, ambos com o objetivo explícito de destituir Chávez do poder. Nesses eventos, a partidarização dos meios de comunicação tornou-se evidente, tendo o discurso midiático exercido papel fundamental em seu desenvolvimento. O Golpe de Estado teve seu contorno delineado a partir de 7 de abril, quando Hugo Chávez anunciou em rede nacional a demissão de sete funcionários da diretoria do PDVSA, apresentando como motivo o fato destes apoiarem a greve geral da CTV por reclamação salarial. Esse ato, considerado arbitrário, tornou possível a convocação pelo presidente da empresa patronal, Pedro Carmona, e pelo presidente da central, Carlos Ortega, de uma greve nacional por tempo indeterminado a partir do dia 9 e de uma manifestação antichavista dois dias depois, com o fito de demandar mudanças nas políticas nacionais, principalmente em relação às estatizações, e exigir uma menor concentração de poder no Executivo. Começava, então, a campanha midiática de mobilização popular e distorção dos fatos. Nos dias anteriores ao golpe, os meios de comunicações privados da Venezuela convocaram intensamente a população de orientação anti-chavista para marchar entre as áreas do Parque del Este de Caracas e a sede da empresa PDVSA. Na televisão, todas as emissoras veiculavam constantemente a vinheta “Nem um passo atrás”, enquanto que seus programas, desde talk shows até os humorísticos, adotavam um discurso único, vinculado à necessidade de se pressionar a administração chavista por mudanças ou mesmo de exigir a renúncia de Chávez (MARINGONI, 2004)..

Referências

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