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Participação do filho no acervo hereditário de genitor biológico diante de prévio registro de paternidade civil na modalidade socioafetiva

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ANA CLAUDIA SOUZA RIBEIRO

PARTICIPAÇÃO DO FILHO NO ACERVO HEREDITÁRIO DE GENITOR BIOLÓGICO DIANTE DE PRÉVIO REGISTRO DE PATERNIDADE CIVIL NA

MODALIDADE SOCIOAFETIVA

Tubarão 2018

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ANA CLAUDIA SOUZA RIBEIRO

PARTICIPAÇÃO DO FILHO NO ACERVO HEREDITÁRIO DE GENITOR BIOLÓGICO DIANTE DE PRÉVIO REGISTRO DE PATERNIDADE CIVIL NA

MODALIDADE SOCIOAFETIVA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade

Orientadora: Profª. Maria Nilta Ricken Tenfen, Me.

Tubarão 2018

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Este trabalho é dedicado aos meus maiores amores: minha mãe e meus avós.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente a Deus, por guiar meus passos e conceder toda a força necessária para superar as adversidades da minha trajetória.

Agradeço também aos meus avós maternos, Milton Clóvis Justo Ribeiro e Nancy Maria Souza Ribeiro, por serem meus maiores exemplos e por significarem minha vontade de ir além.

À minha mãe, Carla Souza Ribeiro, a quem eu devo tudo, sobretudo o dom da vida. À minha orientadora, Maria Nilta Ricken Tenfen, pelo suporte e significativas contribuições tanto para o presente estudo, quanto para meu aprendizado pessoal.

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A justiça sustenta numa das mãos a balança que pesa o direito e, na outra, a espada de que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal; a balança sem a espada é a impotência do direito (Rudolf Von Ihering).

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RESUMO

A presente monografia tem o objetivo de analisar, com base em aspectos legais e doutrinários, a viabilidade do direito à herança paterna biológica, quando o indivíduo tiver sido registrado por pai socioafetivo. Para tanto, foi analisada a legislação existente no ordenamento jurídico vigente, bem como o entendimento doutrinário a respeito do tema. Quanto aos métodos utilizados, o nível de pesquisa foi exploratório; quanto à abordagem, foi utilizada pesquisa qualitativa; quanto ao procedimento de coleta de dados, foi bibliográfico e documental. No referido estudo, restou evidente que o filho registrado sob o viés da paternidade socioafetiva, caso opte, tem direito à busca da própria ancestralidade biológica, culminando com o reconhecimento da paternidade consanguínea. Por outro lado, é de suma importância o papel do afeto nas relações paterno-filiais, o que possibilita ao filho o direito à dupla paternidade, isto é, o registro civil paterno socioafetivo concomitante ao biológico, tendo acesso, nesse caso, o filho, a todos os direitos inerentes à filiação, advindos de ambas as paternidades – biológica e socioafetiva – em igualdade de condições. Assim, a partir do referido estudo, concluiu-se que o filho pode auferir participação no acervo hereditário de genitor biológico de três formas distintas: pela substituição da paternidade socioafetiva pela biológica; pelo acréscimo da paternidade biológica ao registro civil, concomitantemente à socioafetiva; ou, por fim, na falta de reconhecimento de paternidade, por testamento voluntário, lavrado pelo genitor biológico, destinando parte dos bens ao indivíduo.

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ABSTRACT

The monograph goal is to analyze, based on legal and doctrinal aspects, the viability of the right to heritage of biological paternity, when the individual has been registered by an affective father. In order to do so, it analyzed the existing legislation in the current legal system, and the doctrinal understanding on the subject. The methods used, the level of research was exploratory; the approach was qualitative; the data collection procedure, was bibliographic and documentary. In the mentioned study, it was evident that the child registered under the socio-affective paternity has the right to know its biological truth, culminating in the recognition of the paternity. On the other hand, affection in the parent-child relationships is very important, allowing the child the right to dual paternity, that is, the paternal civil registration with the biological concomitant, in this way the child has access to all inherent rights to membership, from both paternities - biological and affective - on equal terms. This monograph concluded that the son can participate in the hereditary process of biological parent in three different ways: by replacing affective paternity with biological; by the addition of biological paternity to the civil registry, concomitantly to the affective one; or, in the absence of recognition of paternity, by voluntary will, made by the biological parent, allocating part of the assets to the individual.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art. – artigo CC – Código Civil

CF – Constituição Federal da República de 1988 CPC – Código de Processo Civil

IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça TJ – Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

1.1 TEMA ... 11

1.2 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA ... 11

1.3 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 13 1.4 JUSTIFICATIVA ... 13 1.5 OBJETIVOS ... 14 1.5.1 Objetivo geral ... 15 1.5.2 Objetivos específicos ... 15 1.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 15

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS .. 16

2 ASPECTOS DA FAMÍLIA ... 18

2.1 CONCEITO ... 18

2.2 PANORAMA HISTÓRICO DO MODELO FAMILIAR ... 19

2.3 VÍNCULO DE PARENTESCO ... 24 2.3.1 Linha reta ... 25 2.3.2 Linha colateral ... 26 2.4 MULTIPARENTALIDADE ... 26 2.5 PODER FAMILIAR ... 28 2.5.1 Conceito ... 28 2.5.2 Características e abrangência ... 29

2.5.3 Competências dos pais quanto à pessoa dos filhos menores... 31

2.5.4 Competências dos pais quanto aos bens dos filhos menores ... 34

2.5.5 Suspensão do poder familiar ... 35

2.5.6 Extinção do poder familiar ... 36

3 IDENTIDADE JURÍDICA PATERNA ... 38

3.1 SUBJETIVIDADE DO VÍNCULO PATERNO ... 38

3.2 ESPÉCIES DE PATERNIDADE ... 39

3.2.1 Paternidade Biológica ... 39

3.2.2 Paternidade Socioafetiva ... 41

3.2.2.1 Posse do estado de filho ... 42

3.2.3 Paternidade Registral ... 43

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3.4 REPRODUÇÃO ASSISTIDA ... 46

3.4.1 Homóloga ... 46

3.4.2 Heteróloga ... 47

3.4.3 Gestação por substituição ... 47

3.5 PRESUNÇÃO LEGAL DE PATERNIDADE ... 48

3.5.1 A presunção pater is est ... 48

3.6 RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE ... 49

3.6.1 Modos de reconhecimento de filho ... 50

3.6.1.1 Reconhecimento voluntário ... 51 3.6.1.2 Reconhecimento judicial ... 51 4 DIREITO SUCESSÓRIO ... 53 4.1 CONCEITO ... 53 4.2 HERANÇA ... 54 4.3 TESTAMENTO ... 55 4.3.1 Legado ... 56 4.4 ABERTURA DA SUCESSÃO ... 56

4.5 APLICAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO AOS DESCENDENTES EM PRIMEIRO GRAU ... 58

4.6 DIREITO À HERANÇA DE GENITOR BIOLÓGICO AO INDIVÍDUO COM REGISTRO PATERNO SOCIOAFETIVO ... 60

5 CONCLUSÃO ... 72

REFERÊNCIAS ... 75

ANEXOS ... 82

ANEXO A – RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 898.060-SC ... 83

ANEXO B – RECURSO ESPECIAL N. 1.168.230-RS (2016/0204124-4) ... 95

ANEXO C – APELAÇÃO CÍVEL N. 0302674-93.2015.8.24.0037 ... 105

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1 INTRODUÇÃO

Ao presente capítulo, incumbe expor os aspectos preliminares da produção acadêmica. Na primeira seção, é apresentado o tema; na segunda e terceira, o problema é delimitado e formulado; na quarta, justificado; na quinta, discorre-se sobre os objetivos gerais e específicos; na sexta, são identificados os procedimentos metodológicos utilizados; e, por fim, na sétima, é descrita a estrutura dos capítulos do estudo.

1.1 TEMA

Direito à herança paterna biológica.

1.2 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA

Indiscutivelmente, o Direito possui ampla necessidade de adaptar-se à realidade social em que suas normas estão inseridas. Assim, é indispensável que esteja em constante transformação, de forma a solucionar os percalços que lhe são demandados.

Considerando-se seu intuito de regular de maneira eficaz as relações formais e materiais existentes, deve empenhar-se, principalmente, em “[...] abarcar todas as situações fáticas em seu âmbito de regulamentação.” (Dias, 2016, p. 32).

Não seria díspar com o Direito de Família, posto que a atuação temporal afeta diretamente a instituição familiar, trazendo alterações estruturais tanto intrínsecas quanto extrínsecas, à medida que a sociedade evolui. Essas transformações culminam com a ampla pluralidade de estruturações familiares.

Nesse ínterim, “a ideia de família é um tanto quanto complexa, uma vez que variável no tempo e no espaço. Em outras palavras, cada povo tem sua ideia de família, dependendo do momento histórico vivenciado.” (FIÚZA, 2003, p. 795).Buscando adequar-se à realidade familiar atual, “o Código Civil veio a sofrer consideráveis alterações no campo do Direito de Família.” (LUZ, 2002, p. 24).

A respeito do Código Civil de 1916, “[...] regulava a família do início do século passado. Em sua versão original, trazia estreita e discriminatória visão da família, limitando-a ao casamento.” (DIAS, 2016, p. 36). Além disso, fazia clara distinção entre os filhos havidos dentro e fora da relação conjugal, denominando-os, sob um viés preconceituoso, de filiação

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legítima, para os havidos dentro da constância do casamento, e ilegítima, para os havidos fora da constância do casamento.

No que tange à filiação, segundo Gonçalves (2011, p. 110) o atual Código Civil:

[...] estabelece absoluta igualdade entre todos os filhos, não admitindo mais a retrógrada distinção entre filiação legítima ou ilegítima, segundo os pais fossem casados ou não, e adotiva, que existia no Código Civil de 1916. Hoje, todos são apenas filhos, uns havidos fora do casamento, outros em sua constância, mas com iguais direitos e qualificações.

É garantia Constitucional a indistinção entre os filhos, conforme prevê o artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição Federal: “os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação” (BRASIL, 1998). A mesma redação está presente no artigo 1.596 do Código Civil em vigor.

Assim, para Gonçalves (2011), filiação pode ser conceituada como a relação de parentesco consanguíneo que liga uma pessoa àquelas que a geraram biológica ou afetivamente. No que tange à filiação biológica é, “[...] como o nome indica, decorrente das relações sexuais dos pais. O filho tem o sangue dos pais – daí ser filho consanguíneo.” (RIZZARDO, 1994, p. 570). Os avanços científicos permitiram constatar a existência de laços genéticos, os quais podem ser comprovados por meio de exame laboratorial de DNA, visando comprovar se a relação existente possui consanguinidade.

Contudo, dada a necessidade de adequação social, “a afetividade entrou nas cogitações dos juristas, buscando explicar as relações familiares contemporâneas.” (LÔBO, 2003, p. 56).

Segundo Dias (2016, p.132), à respeito da socioafetividade:

O novo referencial que identifica os vínculos interpessoais e parentais mais pelo afeto do que pela verdade registral ou biológica fez surgir um novo conceito, tanto de conjugalidade como de filiação. Não é mais exclusivamente o casamento que identifica a família. Também não é a identidade genética que marca a relação de parentesco. Tanto os vínculos extramatrimoniais como a filiação socioafetiva conquistaram espaço no âmbito jurídico. (grifo da autora)

O elo da paternidade socioafetiva caracteriza-se, essencialmente, pela relação afetiva envolvendo pai e filho, independente de vínculo sanguíneo ou imposição legal. Assim, “a paternidade não é um fato de natureza, mas, antes, um fato cultural. Em outras palavras, paternidade é uma função exercida, ou um lugar ocupado por alguém, não, necessariamente, o pai biológico.” (PEREIRA, 2004, p.387).

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Indispensável o entendimento de que a paternidade “[...] só pode vingar no terreno da afetividade, da intensidade das relações que unem pais e filhos, independente da origem biológico-genética.” (LEITE, 1994, p. 121).

No que tange aos requisitos fundamentais à paternidade socioafetiva, leciona Dias (2016, p. 456):

Para sua configuração, devem ser levados em conta três aspectos: tratamento (tractatus), nome (nominatio) e fama (reputatio). O primeiro aspecto diz respeito à forma como o filho é tratado perante a família. O nominatio, por sua vez, analisa se o nome da família é utilizado por ele e, por fim, a reputatio se refere à opinião pública e ao reconhecimento da sociedade de que aquele filho, de fato, integra a família de seus pais.

O ordenamento jurídico prevê a existência de duas formas de reconhecimento da paternidade: voluntário e forçado. Sobre tais formas distintas de reconhecimento, Silva (2001, p. 21) afirma: “voluntário é o ato jurídico mediante o qual o pai assume a paternidade do filho; o reconhecimento forçado, ao revés, é ato de força de Estado, por meio do qual o juiz declara na sentença o autor filho do réu.”.

Dentre as consequências do reconhecimento da paternidade está o direito sucessório, que em relação ao filho, “[...] é a capacidade por ele adquirida para herdar ab

intestato do pai e dos parentes deste” (PEREIRA, 2006, p. 335).

Fundamentando-se nesses aspectos, bem como considerando a lacuna existente no ordenamento jurídico, a presente monografia, tem por objetivo analisar a possibilidade de o indivíduo com registro de paternidade socioafetiva, receber, de igual modo, a herança referente à paternidade biológica.

1.3 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

É possível exercer o direito à herança paterna biológica após ter reconhecida no registro civil a paternidade socioafetiva?

1.4 JUSTIFICATIVA

Trata-se de estudo com importância de elevada monta no contexto atual do Direito, uma vez que as modificações seculares trouxeram significativas alterações estruturais nas instituições familiares.

Nessa perspectiva, Ferrari e Kaloustian (2002, p. 11) lecionam:

A família, da forma como vem se modificando e se estruturando nos últimos tempos, impossibilita identificá-la como um modelo único ou ideal. Pelo contrário, ela se

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manifesta como um conjunto de trajetórias que se expressam em arranjos diversificados e em espaços e organizações domiciliares peculiares.

As alterações, tanto na estrutura, quanto no conceito de família, obrigaram o Direito a moldar-se de maneira a abranger não só as famílias convencionais, mas, igualmente, diversificadas espécies de família que vêm se tornando cada vez mais frequentes com o transcorrer das décadas.

A esse propósito, faz-se mister o entendimento de Luz (2002, p. 25) ao asseverar que “este novo ordenamento, a toda evidência, permitiu o surgimento do que vem sendo denominado de nova família, ou da família moderna, calcada muito mais no suporte emocional do indivíduo do que no formalismo dos cartórios [...]”.

A referida alteração, inevitavelmente, criou certa dificuldade na identificação de determinados direitos inerentes à paternidade, filiação e direitos sucessórios.

Para Gonçalves (2011), o reconhecimento de paternidade gera efeitos patrimoniais e morais, constituindo relação de parentesco entre pai e filho.

Por outro lado, o reconhecimento da paternidade socioafetiva não deve privar o filho de sua identidade biológica, conforme discorre Madaleno (2008, p. 139):

A origem genética é direito impregnado no sangue que vincula, por parentesco, todas as subsequentes gerações, inexistindo qualquer fundamento jurídico capaz de impedir que o homem investigue a sua procedência e que possa conhecer a sua verdadeira família e saber quem é seu pai.

É pacífico, no entendimento doutrinário, a possibilidade de o filho ser registrado pelo pai biológico e afetivo, simultaneamente. Contudo, o objetivo da presente monografia, não é abordar a multiparentalidade, mas sim, a prevalência do direito sucessório consanguíneo, mesmo diante de prévio registro civil de paternidade socioafetiva.

Somando-se ao fato de que a lei não possui norma específica capaz de responder tal questionamento, o resultado é uma considerável lacuna existente entre a lei e o caso concreto.

Assim, percebe-se a importância, no contexto atual, de dirimir as principais questões a esse respeito, garantindo que qualquer indivíduo, por mais particular que seja sua situação, possa ter acesso à tutela de seus direitos, bem como identificar suas consequências no âmbito jurisdicional.

1.5 OBJETIVOS

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1.5.1 Objetivo geral

Analisar, no ordenamento jurídico vigente, bem como no entendimento doutrinário, a possibilidade de exercício de direitos sucessórios provenientes de herança paterna com vínculo biológico posterior ao reconhecimento de paternidade socioafetiva.

1.5.2 Objetivos específicos

Abordar a evolução histórica do direito de família.

Analisar os direitos sucessórios no tocante à herança de ascendente em primeiro grau.

Verificar as normas, bem como entendimentos doutrinários a respeito do direito sucessório no que tange à paternidade socioafetiva.

Analisar a existência de lei específica no tocante ao exercício do direito à herança paterna biológica posterior ao reconhecimento de paternidade socioafetiva.

Identificar o posicionamento das correntes doutrinárias sobre o direito à herança paterna biológica nas hipóteses em que fora reconhecida a paternidade socioafetiva.

Analisar a possibilidade da dupla paternidade registral, quais sejam: biológica e socioafetiva.

Abordar os requisitos, se houver, para o exercício do direito à herança paterna biológica nos casos em que o filho já tem reconhecida a paternidade socioafetiva.

Comparar a argumentação favorável ao direito à herança paterna biológica posterior ao reconhecimento de paternidade socioafetiva com sua impossibilidade.

1.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

De acordo com Gil (2002, p.70), o delineamento da pesquisa diz respeito ao seu planejamento, utilizando-se ampla dimensão.

No presente projeto, quanto ao nível, a pesquisa será exploratória, posto que “[...] tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de instituições.” (GIL, 2002, p. 41).

No desenvolvimento da pesquisa, sua aplicação ocorrerá de modo a garantir uma maior proximidade bibliográfica com os conceitos do direito sucessório, no que tange à herança

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paterna biológica, e sua predominância nos casos em que a paternidade constante no registro do filho é a socioafetiva.

Quanto à abordagem, a pesquisa será qualitativa, que segundo Gil (2002, p. 44) “é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído, principalmente, de livros e artigos científicos”.

Nesse sentido, a pesquisa extrairá suas análises do próprio ordenamento jurídico e entendimento doutrinário, por meio de obras que abordam o Direito Civil, no que tange ao direito de família, bem como aos direitos sucessórios.

Assim, serão analisados significados de palavras, suas aplicações e entendimentos a partir de sua colocação.

Quanto ao procedimento de coleta de dados, a pesquisa será bibliográfica e

documental, a qual é explicada como a pesquisa que “[...] se desenvolve tentando explicar um

Problema a partir das teorias publicadas em diversos tipos de fontes: livros, artigos, manuais, enciclopédias, anais, meios eletrônicos, dentre outros.” (LEONEL; MOTTA, 2007).

Grande parte do material usado para o desenvolvimento da pesquisa será a legislação vigente, bem como o entendimento doutrinário referente ao assunto abordado.

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS

A presente monografia teve seu desenvolvimento adstrito a mais três capítulos, que culminaram com o capítulo final, qual seja, a conclusão. O segundo capítulo introduz alguns conceitos indispensáveis ao entendimento deste estudo, bem como aborda a evolução histórica da família, salientando os contrastes basilares entre o Código Civil de 1916 e o de 2002, atualmente vigente. No mais, aborda importantes aspectos referentes às características e estruturações da instituição familiar estabelecida na sociedade atual, como os principais aspectos da multiparentalidade.

O terceiro capítulo faz a distinção entre as três formas de paternidade aceitas na atualidade, quais sejam: a biológica, a socioafetiva e a registral. Ainda, traz as consequências legais da declaração de paternidade, seja ela biológica ou afetiva. O referido capítulo estuda aspectos da adoção, bem como da reprodução assistida.

No quarto capítulo, abordam-se as questões relevantes ao caso particular objeto do presente estudo, sobre o prisma do Direito Sucessório, verificando-se a existência de normas ou de entendimentos doutrinários que possibilitem o direito à herança paterna biológica, ainda que com o registro civil da paternidade socioafetiva.

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2 ASPECTOS DA FAMÍLIA

Neste capítulo, subdividido em cinco seções principais, passa-se a expor o conceito de família, sua evolução histórica e seus principais desdobramentos na atualidade.

2.1 CONCEITO

Indispensável se faz, no presente trabalho, a conceituação do termo “família”. Nesse sentido, segundo Viana (2000, p.22), a palavra “[...] etimologicamente, deriva do latim

família ae, designando o conjunto de escravos e servidores que viviam sob a jurisdição do pater famílias”.

Por ser uma instituição tão antiga, que acompanha o desenvolvimento da sociedade, a família sofre contínuas alterações ao longo do tempo. Nesse sentido, como bem leciona Venosa (2009, p. 3):

Entre os vários organismos sociais e jurídicos, o conceito, a compreensão e a extensão da família são os que mais se alteram no curso dos tempos. Nesse alvorecer de mais de um século, a sociedade de mentalidade urbanizada pelos meios de comunicação pressupõe e define uma modalidade conceitual de família bastante distante das civilizações do passado. Como uma entidade orgânica, a família deve ser examinada, primordialmente, sob o ponto de vista exclusivamente sociológico, antes de o ser como fenômeno jurídico.

Avançando-se para a conceituação doutrinária do termo, em sentido estritamente genético e biológico, o termo “família” compreende o conjunto de pessoas descendentes do mesmo tronco ancestral, acrescentando-se o cônjuge, enteados, genros e noras, bem como cunhados (PEREIRA, 2017).

Tal conceito pode, ainda, ser ampliado, quando consideradas como familiares não só as pessoas ligadas pelo vínculo sanguíneo, mas também pelo afetivo (GONÇALVES, 2007). A nova estrutura da família brasileira tem considerável respaldo nos laços afetivos, não sendo mais suficiente tão somente a descendência genética ou civil, mas sim, a integração entre pais e filhos por meio do sublime sentimento da afeição. Tanto a maternidade quanto a paternidade transcendem a verdade biológica. Seus significados são muito mais profundos e é o amor o principal responsável por revelar a verdade afetiva (DELINSKI, 1997). Conforme o entendimento de Nogueira (2001), na família, devem prevalecer os laços afetivos, bem como a solidariedade entre seus membros. Os responsáveis pela família assumem o encargo de educar e proteger o menor, independentemente da existência de vínculo jurídico ou biológico entre eles, caracterizando-se, assim, a família sociológica.

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A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), atualmente vigente, prevê em seu artigo 226, parágrafos 3º e 4º, que a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes é aceita como entidade familiar, ampliando esse conceito, assim, para as famílias em que os laços matrimoniais entre os pais não figuram, ou foram rompidos, bem como aos casais que vivem em união estável, com ou sem a existência de filhos.

A esse propósito, conforme leciona Maluf (2010, p.99):

Com o desenvolvimento das sociedades e alteração dos costumes, modificou-se também a conceituação da família, retirou-se a primazia da família matrimonial como sendo “a família legítima” e estendeu-se proteção a outras modalidades de família protegidas pela Constituição Federal em seus artigos 226 e seguintes.

Segundo Engels (2002, p. 34), a família “[...] nunca permanece estacionária, mas passa de uma forma inferior a uma forma superior, à medida que a sociedade evolui de um grau mais baixo para outro mais elevado”.

Portanto, a conceituação de família tem seu alicerce tanto nas relações biológicas quanto nas relações pautadas tão-somente na afetividade, uma vez que sua estrutura ganhou considerável flexibilidade com o passar do tempo e consequente alteração dos costumes.

Sabe-se, contudo, que a acepção do vínculo afetivo nem sempre figurou no Direito de Família, como será a seguir exposto.

2.2 PANORAMA HISTÓRICO DO MODELO FAMILIAR

A família é a “base da sociedade”, conforme trata o caput do artigo 226 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e, segundo Grisard Filho (2010, p. 37), “suas origens são tão remotas que transcendem as fronteiras das culturas mais conhecidas [...]”.

Atualmente, pode estar ligada pela descendência ou pela adoção. Contudo, uma vez que a ideia de família está calcada de acordo com a construção de tempo e espaço em que se insere, vem sofrendo profundas alterações ao longo das décadas. Nesse sentido, Engels, (2002, p. 34) leciona que “a família é o elemento ativo; nunca permanece estacionária, mas passa de uma forma inferior a uma forma superior, à medida que a sociedade evolui de um grau mais baixo para outro mais elevado”.

Para Pereira (2012, p. 3), a base do modelo familiar no Brasil tem respaldo, principalmente, no direito romano, seguindo seu padrão de organização institucional. No mais, sofreu influência do direito canônico e germânico ao longo do tempo (LUZ, 2002).

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A afetividade, outrora presumida pela relação de consanguinidade, carecia de suficiente ímpeto para engendrar discussão. Nesse aspecto, sua relevância era omitida, uma vez que o real conceito de família estava calcado na relação consanguínea existente entre os familiares. A esse propósito, impende destacar o entendimento do ilustre Daros (2006, p. 14) que preconiza, in verbis:

A relevância do afeto nas relações familiares mostrou-se variável no decorrer da história jurídica do ser humano. Em um primeiro momento, a presença do afeto era presumida nas relações familiares e sua relevância jurídica consistia em ser tomado como existente, excluindo sua discussão. No entanto, a partir do momento em que a presença do afeto se tornou responsável e essencial para dar visibilidade jurídica às relações familiares, ele passou a ter outro sentido, ocupando um maior espaço no Direito. A transformação na importância da noção de afeto nas relações familiares está intimamente ligada à mutação ocorrida com a própria noção de família.

O Direito brasileiro anterior ao Código Civil de 2002 sempre teve reconhecido como alicerce da família a união matrimonial entre homem e mulher, regulada pelo Estado e que dava origem a uma prole (PEREIRA, 2012). Assim, somente eram aceitas como família, os núcleos de pessoas em que figuravam laços matrimoniais, recebendo integral proteção do Estado. Por outro lado, as estruturações em que não se faziam presentes os laços matrimoniais ficavam às margens do direito, sem receber a proteção devida.

O Direito de Família estava pautado na figura do homem, que detinha o poder sobre a família, na pessoa da esposa e dos filhos, os quais, obrigatoriamente, deveriam se submeter aos seus arbítrios. Recorda Rizzardo (2008, p. 10) que no direito romano, entendia-se como família o grupo de pessoas, quais sejam os descendentes e a mulher – na qualidade de esposa, que se submetiam ao poder do pater familias.

O termo pater famílias, em um sentido literal da palavra, significa “pai de família” e, obrigatoriamente, deveria ser exercido por um homem, que era a maior autoridade existente no lar. (PEREIRA, 2006). O pater era responsável pela função de sacerdote, juiz, chefe político, dirigindo tais poderes à esposa, descendentes e escravos (NOGUEIRA, 2001).

A família atuava como uma unidade de produção, uma vez que os lares comportavam escravos – esses, responsáveis quase, integralmente, pela produção e confecção de bens dentro da família. Todos estavam sujeitos aos poderes do pater, responsável por qualquer tomada de decisão dentro dos limites do lar. Nesse contexto, em que as famílias eram carregadas de atribuições, é de todo oportuno trazer à baila o entendimento de Coelho (2012, p. 17), que assevera:

Comidas, roupas, móveis e tudo de que se necessitava para viver eram produzidos, em

princípio, pela família. O trabalho acontecia dentro da família; nela incluíam-se os

escravos. Além disso, era também o núcleo religioso. Cada família adorava seus próprios deuses e o pater era o sacerdote dos rituais. A cura das enfermidades e o amparo na velhice eram atribuições exclusivas da estrutura familiar. Era na família

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que se desenvolvia, do início ao fim, a educação dos pequenos e a preparação do filho primogênito para a vida pública; não havia escolas ou universidades naquele tempo. Esposa e concubinas, assim como os filhos, irmãs solteiras e a mãe do pater moravam todos na mesma casa e estavam, a exemplo dos escravos, sob o pleno domínio dele. Os filhos podiam ser vendidos como escravos ou mortos, se assim o pater quisesse.

Nesse aspecto, a morte do pater garantia personalidade aos filhos varões, que constituíam, assim, suas próprias famílias, assumindo nelas, por sua vez, a condição de pater. Essas famílias eram chamadas communi jure, pois eram constituídas por descendentes de um mesmo pater, desconsiderando-se, para efeitos jurídicos, o parentesco materno (NADER, 2015).

A família tradicional dentro do modelo romano era centrada na monogamia, no patriarcalismo e no patrimonialismo, pouco importando a individualidade e o afeto existentes entre os familiares, “consagrando como família-modelo o pai, a mãe e o filho” (Barros, 2002, p. 7).

Cumpre salientar que a família sofreu considerável alteração na estrutura familiar em razão da perda da função educacional, quando esta passou a ser função da Igreja Católica. Outrossim, é este o entendimento de Coelho (2012, p. 18):

[...] importante função perdida pela família foi a educacional. [...] a Igreja Católica encarregou-se de educar seus sacerdotes, criando instituições que estão na origem das escolas. As corporações de ofício cuidavam do treinamento de seus membros. Também, naquele tempo, surgiram as primeiras universidades. A família ficou encarregada, então, das primeiras letras e introjeção dos valores fundamentais. A formação técnica e superior, contudo, por sua complexidade, só podia ser alcançada fora de casa.

Nos preceitos da família patriarcal, estavam presentes os vínculos jurídicos e sanguíneos de maneira muito mais significativa do que os laços afetivos. Essa ideia estava muito presente desde o casamento, que era realizado, sobretudo, em virtude de interesses econômicos e políticos (NOGUEIRA, 2001). Dentro da estrutura do casamento, muitas vezes, restava inexistente o afeto entre os cônjuges. As famílias mais poderosas realizavam matrimônios com o intuito único de proteger suas riquezas e garantir o prestígio social pelas próximas gerações (MEDEIROS, 2003).

As mulheres, enquanto não se casassem, pertenciam à família do pai; contraído o casamento, passavam a fazer parte da família do marido. Quando acometidas pela viuvez, tinham situação indefinida: sem ascendentes masculinos, livres do pátrio poder, porém com limitação em seus direitos (MALUF, 2010).

Cumpre salientar que o Código Civil de 1916 fazia clara e discriminatória distinção entre os tipos de filiação. Os filhos advindos na constância do casamento eram chamados de legítimos – a esses, eram garantidos todos os direitos inerentes à filiação. À margem do direito

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estavam os filhos gerados fora do matrimônio, classificados como ilegítimos, podendo ser

naturais, nascidos de pais desprovidos de impedimentos matrimoniais ou espúrios, nascidos de

pais impedidos de se casar, seja pelo parentesco consanguíneo, por afinidade ou por casamento anterior, podendo, ainda, serem subdivididos em adulterinos e incestuosos (GONÇALVES, 2012).

No que tange à organização familiar anterior ao atual Código Civil, segundo Dias (2016, p. 34):

Em uma sociedade conservadora, para merecer aceitação social e reconhecimento jurídico, o núcleo familiar dispunha de perfil hierarquizado e patriarcal. Necessitava ser chancelado pelo que se convencionou chamar de matrimônio. A família tinha formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Tratava-se de uma entidade patrimonializada, cujos membros representavam força de trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência a todos (grifo do autor).

A referida estrutura rural e fundada no patriarcado foi, pouco a pouco, sofrendo alterações, principalmente, em razão da influência direta da Revolução Industrial, que culminou com a urbanização das famílias, considerando-se a forte emigração sofrida em decorrência da mencionada revolução. Conforme as relações familiares foram se modificando, sua estrutura passou a sofrer flexibilização, o que agregou visibilidade às relações afetivas no ambiente doméstico.

Nader (2015, p. 11) leciona de maneira exemplar a respeito do impacto da Revolução Industrial na estrutura das famílias:

Na Idade Contemporânea, a característica da família, seu formato interno, variou em função do regime econômico da quadra histórica. Assim, na sociedade eminentemente agrária, em que o trabalho era desenvolvido pela célula familiar, a autoridade dos pais era preservada, bem como a convivência entre pais e filhos e a própria unidade da família. À medida, porém, que se efetiva a Revolução Industrial, ocorre a emigração para as cidades e verifica-se a desconcentração dos membros da família.

Antes da Revolução Industrial, outros fatores contribuíram para a retirada da função econômica das famílias, como a revitalização do comércio, invenção dos bancos e seguradoras e formação das cidades – até então, o espaço de trabalho figurava dentro do lar. A Revolução Industrial, por sua vez, culminou com o distanciamento entre o lar e o espaço laboral (COELHO, 2012).

Com isso, a família, antes vista tão somente como unidade de produção, perde sua função econômica e o pater tem sua hegemonia familiar descentralizada, uma vez que a mulher se lança no mercado de trabalho (VENOSA, 2005).

Nesse sentido, despende-se que surgiu a necessidade da integração feminina no mercado de trabalho, e, consequentemente, a mulher passou a contribuir, financeiramente, com

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a renda familiar, fato decisivo para que pudesse adquirir importância não só na seara domiciliar, mas também como responsável por gerar circulação de renda na sociedade. Assim, gradativamente ocorre a emancipação da mulher, que se desprende das amarras pelas quais, por muitos séculos, esteve condicionada – modificou-se a condição feminina em cinquenta anos, muito mais do que em cinco mil anos (FERRY, 2007).

A mulher encontrou seu espaço em atividades antes somente exercidas por homens, ao passo que aumentava sua participação dentro do lar, perdendo, aos poucos, seu caráter passivo na sociedade (ZAMBERLAM, 2001).

A primeira grande ruptura que permitiu colocar em evidência a questão do afeto no seio familiar foi, sem dúvidas, a transição entre o casamento por conveniência – orquestrado pela família dos cônjuges, com base em critérios estritamente econômicos – para o casamento firmado com base no sentimento de afeto entre os cônjuges e sob seu próprio arbítrio (FERRY, 2007).

Diante do referido contexto e consequente à maior atuação econômica da mulher, os casais passaram a gerar uma quantidade menor de filhos e as famílias, que antes eram compostas por vultuosa descendência, passou a sofrer um processo minguante na quantidade de integrantes.

Seguindo o percurso histórico, com o fim da Segunda Guerra Mundial, ocorreram novas mudanças drásticas no modelo familiar, uma vez que, segundo Calderón (2017, p. 43):

[...] foi possível perceber mais claramente uma alteração na família brasileira, com o crescimento da família nuclear (formada apenas pelos cônjuges e seus filhos) e a consequente aproximação entre seus integrantes, o que passou a abrir espaço para o aumento do aspecto subjetivo destas relações. Em um processo contínuo, houve crescimento da valoração afetiva nos relacionamentos, tanto entre os cônjuges como entre pais e filhos. Nesse estágio, cresceu o distanciamento entre o Direito, que restava com a formação codificada conservadora, e a sociedade, que inequivocamente transmitia sinais de mudança. Diante de tal clivagem, a doutrina e a jurisprudência procuraram – de algum modo – dar respostas a essa realidade que insistia em se apresentar, contexto no qual se passou a sustentar de forma crescente a relevância dos laços afetivos.

Segundo Lôbo (2008, p. 3), a função econômica, de elevada importância na família, foi perdendo o sentido à medida que os filhos deixaram de ser uma unidade produtiva e um seguro contra a velhice de seus pais, função esta que passou a ser atribuída à previdência social. Para Pereira (2012, p.3), a modificação desse paradigma significou:

[...] uma evolução no conceito de família. Até então, a expressão da lei jurídica só reconhecia como família aquela entidade constituída pelo casamento. Em outras palavras, o conceito de família se abriu, indo em direção a um conceito mais real, impulsionado pela própria realidade.

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Outra grande transformação no modelo familiar foi proporcionada pela Constituição de 1988, que deixou de trazer adjetivações discriminatórias entre os filhos, segregados em legítimos e ilegítimos – nasce a hegemonia entre as filiações que, agora, têm seus direitos igualados. Ainda, admitiu a existência não só do vínculo consanguíneo, mas também do vínculo afetivo como forma de unir os familiares (PEREIRA, 2010).

Nesse sentido, Hironaka (2008, p. 190) ensina que:

Todos são filhos perante a lei, pouco importando a sua origem, se resultantes de um matrimonio, de uma união estável, de uma relação adúltera, incestuosa e, até mesmo, eventual. A distinção que se fazia num passado não muito remoto – entre filhos legítimos, legitimados, ilegítimos e adotivos – deu lugar a uma regra de isonomia, preconizada pela Constituição Federal que, em seu art. 227, § 6º, igualou os direitos de todos os filhos e proibiu a designação discriminatória entre eles.

Sob esse novo prisma, em que o valor econômico foi deixado de lado e a afetividade ganhou espaço nas relações familiares, perceptível se faz que a “[...] família é um caleidoscópio de relações que muda no tempo de sua constituição e consolidação em cada geração, e que se transforma com a evolução da cultura, de geração para geração”. (GROENINGA, 2003, p. 125).

Sobre tal aspecto, Rizzardo (2008, p. 8) explana que:

[...] o direito de família passou a seguir rumos próprios, com as adaptações à nossa realidade, e inspirado na secularização dos costumes, perdendo aquele caráter canonista e dogmático intocável. Predomina, evidentemente, a natureza contratualista, numa certa equivalência quanto à liberdade de ser mantido ou desconstituído o casamento.

Consequentemente à nova estrutura, os casais passaram a valorizar as relações de afeto, ao passo que a questão patrimonial, bem como as formalidades do casamento foram perdendo o foco dentro do caleidoscópio que é a relação familiar (MEDEIROS, 2003). Nesse passo, à medida que o matrimônio perdia sua função meramente econômica, os laços afetivos passaram a predominar nas relações familiares, modificando sua estrutura e trazendo consigo importantes valores, quais sejam: educação, afeto, diálogo etc. outrora pouco cultivados dentro da seara familiar.

2.3 VÍNCULO DE PARENTESCO

Com relação ao vínculo de parentesco, segundo leciona Monteiro (2007, p. 296), o “parentesco consanguíneo [...] constitui relação existente entre pessoas que procedem do mesmo tronco ancestral”. Assim, o vínculo de parentesco está relacionado com a consanguinidade, resultando da relação de parentesco entre pessoas de uma mesma família.

O referido vínculo estabelece-se por linhas, podendo ser em linha reta ou colateral, sendo a contagem feita por graus (GONÇALVES, 2012), conforme prevê o artigo 1.594 do

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Código Civil (BRASIL,2002), in verbis: “contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até o ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente”.

Nesse sentido, começa-se a contar os graus a partir do primeiro ascendente comum, sendo assim, um avô paterno, por exemplo, seria ascendente em segundo grau, considerando-se que o primeiro ascendente comum entre neto e avô é o pai.

2.3.1 Linha reta

O vínculo em linha reta está previsto no artigo 1.591 do Código Civil, que precisamente dispõe: “são parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes” (BRASIL, 2002). A esse respeito, leciona Gonçalves (2012, p. 312) que parentes “em linha reta são as pessoas que descendem umas das outras [...]”. Isto é, são parentes em linha reta os avós, pais, filhos, netos, bisnetos etc.

O parentesco em linha reta não encontra limitação de graus, é infinito; assim, não importa o distanciamento, serão parentes – por óbvio, enquadrando-se aos limites que a natureza impõe à sobrevivência humana (DIAS, 2016). Nesse diapasão, impende destacar o entendimento de Venosa (2009, p. 212) que perfilha o mesmo pensar ao asseverar que “nessa linha, a contagem de graus é infinita, cada geração referindo-se a um grau. Desse modo, o pai é parente em primeiro grau do filho, em segundo grau do neto, em terceiro grau do bisneto, etc. e vice-versa”.

A linha reta divide-se, ainda, em ascendência e descendência. Dessa forma, todos os parentes em linha reta que se encontram acima do indivíduo na árvore genealógica – seus antepassados – são os ascendentes. Em contrapartida, a linha reta é descendente quando se desce de um indivíduo para seus descendentes (GONÇALVES, 2012).

A ascendência bifurca-se no sentido de que todos possuem um parentesco ascendente paterno e um materno (avós paternos e avós maternos, e, assim, sucessivamente). A esse propósito, conforme preleciona Dias (2016, p. 377):

Todas as pessoas, sob o prisma de sua ascendência, têm duas linhas de parentesco, pois descendem de duas pessoas. A linha de ascendência bifurca-se sucessivamente entre os ascendentes paternos e maternos. Chama-se linha paterna o parentesco com o genitor e com os ascendentes dele, daí avós e bisavós paternos (grifo da autora).

A importância de conhecer o parentesco em linha reta consubstancia-se, sobretudo, nos direitos e deveres dos ascendentes para com seus descendentes, ou vice-versa. Nesse ínterim, a Constituição Federal determina o dever de assistência entre os parentes em linha reta,

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em seu artigo 229, in verbis: “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade” (BRASIL, 1988). Ademais, o artigo 1.845 do Código Civil determina que “são herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge” (BRASIL, 2002).

2.3.2 Linha colateral

O parentesco em linha colateral encontra respaldo no artigo 1.592, do Código Civil (BRASIL, 2002), in verbis: “são parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra”.

Nesse diapasão, consolida-se o vínculo de parentesco na linha colateral quando duas pessoas provêm de um tronco ancestral comum, isto é, descendem de um mesmo ancestral (GONÇALVES, 2012). Assim, segundo Dias (2016, p. 377), “[...] não existe parente colateral de primeiro grau. A contagem se faz indo até o ascendente comum, por exemplo, o mesmo pai, mesmo avô” (grifo da autora).

2.4 MULTIPARENTALIDADE

A multiparentalidade consiste na paternidade ou maternidade biológica e socioafetiva concomitantemente reconhecidas pelo Direito, posto que a socioafetividade vem sendo valorizada e sua importância é tamanha, a ponto de ser reconhecida juntamente com a biológica (GONÇALVES, 2015). O Direito acolhe as situações em que existam uma realidade biológica e uma afetiva coexistentes, de maneira a flexibilizar o interesse dos pais e filho envolvidos, evitando a necessidade de escolha de um em detrimento do outro. Assim, resta como uma decisão justa e adequada a aceitação da multiparentalidade, uma vez que tanto os pais biológicos quanto os socioafetivos podem registrar-se como genitores, constituindo ao filho todos os direitos inerentes à filiação (PÓVOAS, 2012).

Cumpre citar como exemplo a relação entre padrasto ou madrasta e enteado, passível de registro concomitante com o genitor biológico quando há o desenvolvimento do sentimento paterno/filial em relação ao filho do cônjuge que possui sua guarda, tornando imperioso o reconhecimento da nova parentalidade (CASSETARI, 2015).

A multiparentalidade é o efetivo exercício do princípio da dignidade humana e da afetividade, posto que reconhece no campo jurídico, a filiação pré-existente no campo fático, que embora não seja biológica, está calcada no amor e no afeto. Diverge da adoção unilateral,

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uma vez que não exclui a filiação biológica. No mais, estabelece entre pais e filhos todos os efeitos decorrentes da filiação (KIRCH; COPATTI, 2013). Nesse sentido, impende destacar o entendimento de Shikicima (2014, p. 73), no sentido de que:

A multiparentalidade é um avanço do Direito de Família, tendo em vista que efetiva o princípio da dignidade da pessoa humana de todas as pessoas envolvidas, demonstrando que a afetividade é a principal razão do desenvolvimento psicológico, físico e emocional.

Representa, ainda, a proteção ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, posto que as necessidades afetivas do menor são tratadas como protagonistas da tutela do direito. Segundo preleciona Lôbo (2015, p. 69), o princípio do melhor interesse significa “que a criança – incluindo o adolescente, [...] – deve ter seus interesses tratados com prioridade, pelo Estado, pela sociedade e pela família”. Ainda, para o autor, o referido princípio traz à tona os interesses do menor, bem como trata a criança como protagonista da relação familiar afetiva.

Recente decisão do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, reconheceu a multiparentalidade, negando prosseguimento ao recurso e fixando a seguinte tese: "a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais" (BRASIL, STF, 2016).

Nesse sentido, cumpre salientar a importância do reconhecimento da multiparentalidade no que tange ao respeito à dignidade humana e da afetividade entre pais e filhos, independentemente do vínculo biológico envolvido. Os laços familiares passam a ser identificados pela existência do vínculo afetivo, do carinho, atenção e cuidados concedidos à criança (KIRCH; COPATTI, 2013).

Ocorre que na multiparentalidade, os pais afins exercem papel complementar, e não excludente em relação aos pais biológicos, auxiliando na criação, assistência e educação do menor. As novas organizações familiares trazem na prática esses fenômenos, cabendo à legislação e à doutrina adaptar o direito para se adequar a essa nova realidade (TEIXEIRA; RODRIGUES, 2010). O papel social dos pais ultrapassa o fator meramente biológico, compreendendo as relações de afeto no âmbito familiar (ALMEIDA, 2001). Assim, não gera prejuízos à criança a existência de mais de uma pessoa com função paterna ou materna, contanto que esteja presente o afeto nas referidas relações, fator essencial para o desenvolvimento do menor (TEIXEIRA; RODRIGUES, 2010).

A multiparentalidade nada mais é do que a flexibilização do direito, de modo a reconhecer e prestar tutela jurídica ao fenômeno da desconstituição familiar e formação de

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famílias reconstituídas, tutelando os interesses do menor, posto que gera os mesmos efeitos do parentesco. Não reconhecer o vínculo paterno-filial puramente calcado na prévia existência de outro vínculo significa não tutelar o interesse do menor, excluindo do direito pessoas que exercem papéis parentais em sua vida (TEIXEIRA; RODRIGUES, 2010). Portanto, é possível a existência cumulativa de dois vínculos materno ou paterno-filiais, principalmente, tratando-se de um vínculo referente à paternidade biológica e outro à socioafetiva, de forma a respeitar, em especial, os interesses do menor (ALMEIDA; RODRIGUES JÚNIOR, 2010).

2.5 PODER FAMILIAR

O poder familiar, outrora denominado pátrio poder, uma vez que decorria somente do poder paterno (pater famílias), sofreu alteração em sua nomenclatura pelo Código Civil de 2002, atualmente vigente, intitulando-o de poder familiar. O termo pátrio poder, dentro dos parâmetros da sociedade atual, foi interpretado de maneira pejorativa, posto que confere ao homem soberania perante à mulher, circunstância demasiadamente coibida no contexto atual. Assim, tem-se os mesmos direitos e deveres tanto para a figura paterna quanto para a figura materna, na tentativa de igualar seus direitos inseridos na seara familiar. Nesse sentido, segundo leciona Gonçalves (2012, p. 413), a denominação “poder familiar é mais apropriada que ‘pátrio poder’ utilizada pelo Código de 1916, mas não é a mais adequada, porque ainda se reporta ao poder”.

São os pais incumbidos de instruir os filhos para a vivência em sociedade, zelando por sua saúde, educação, segurança e atendendo às suas necessidades básicas nos limites do lar e fora dele. Nesse diapasão, é de todo oportuno trazer à baila o entendimento de Coelho (2012, p. 202), no sentido de que “aos pais cabe preparar o filho para a vida. Consciente ou inconscientemente, transmitem-lhe seus valores, sua visão do mundo. O comportamento e atitudes deles servem de modelo, que o filho tende a reproduzir”.

2.5.1 Conceito

O poder familiar tem sua previsão legal no artigo 1.630 do Código Civil, in verbis: “os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores” (BRASIL, 2002). Insta salientar que o conceito de poder familiar, segundo preleciona Maluf (2015, p. 651), “pode ser entendido como o conjunto de direitos e obrigações atribuído igualmente ao pai e à mãe, no tocante à

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pessoa e aos bens dos filhos menores, com o intuito de proporcionar o desenvolvimento de sua personalidade e potencialidades”.

Nesse contexto, ao poder familiar sujeitam-se a pessoa e os bens do filho que ainda não atingiu a maioridade, consequentemente, enquanto o filho for menor, sua pessoa e seus bens estarão subordinados ao poder familiar, sendo seus pais incumbidos de zelar por suas necessidades e bens (LUZ, 2002).

A esse propósito, segundo leciona Gonçalves (2012, p. 412) depreende-se que o “poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores”. Também por este prisma, é o entendimento de Monteiro (2007, p. 348), que assevera: “debaixo de seu [do poder familiar] manto protetor, colocam-se todos os filhos menores, sem exceção, independentemente da origem da filiação”. Resta claro que o Código Civil não fez distinção entre os tipos de filiação abrangidos pelo artigo 1.630, bastando estar inserido na família para integrar o poder familiar.

Esse poder é de titularidade conjunta dos genitores durante o casamento ou união estável. Assim dispõe o artigo 1.631 do Código Civil, in verbis: “durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade” (BRASIL, 2002).

Quando os filhos atingem a maioridade, passam a ser integralmente responsáveis por seus atos e desatrelam-se do poder familiar, não sendo necessário que deixem de residir com seus pais. (COELHO, 2012).

2.5.2 Características e abrangência

O poder familiar não é passível de alienação, renúncia, delegação ou substabelecimento, uma vez que faz parte do estado das pessoas e comporta uma obrigação de ordem pública, isto é, não está à disposição ou livre arbítrio das partes (GONÇALVES, 2012). Cumpre salientar que Diniz (2012, p. 603) corrobora o mencionado entendimento, ao lecionar que o poder familiar “é inalienável ou indisponível, no sentido de que não pode ser transferido pelos pais a outrem [...]”.

Ao Poder Público, por sua vez, incumbe a fiscalização complementar, ao passo que é apto a resolver eventuais desavenças dos genitores no exercício do poder familiar, desde que não trate de questão personalíssima (MONTEIRO, 2007). É o que dispõe o parágrafo único do artigo 1.631 do Código Civil de 2002, in verbis: “divergindo os pais quanto ao exercício do

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poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo” (BRASIL, 2002).

A não intromissão do Estado no poder familiar tem previsão constitucional, em seu artigo 226, parágrafo 7º (BRASIL, 1988), que determina:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]

§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

Tal previsão também é regulada pelo artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), que estabelece:

Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

Nesse sentido, o texto legislativo não faz qualquer distinção entre os genitores no tocante ao exercício do poder familiar, sendo este igualmente exercido pelo pai e pela mãe, ou, em caráter de exceção, pelo Estado, no que couber. A esse propósito, cabe mencionar o entendimento de Monteiro (2007, p. 349), no sentido de que: “[...] nenhuma distinção ou preferência existe entre os genitores no exercício do poder familiar, cabendo a eles, em igualdade de condições, os respectivos direitos e deveres”.

Cabe ressaltar que existe a previsão de filho não reconhecido ou cuja mãe não possa exercer o poder familiar. Nesse caso, o Código Civil regula o poder familiar em seu artigo 1.633, no sentido de que: “o filho, não reconhecido pelo pai, fica sob poder familiar exclusivo da mãe; se a mãe não for conhecida ou capaz de exercê-lo, dar-se-á tutor ao menor” (BRASIL, 2002). A esse respeito, filhos gerados fora da constância do casamento, cujo reconhecimento paterno não foi obtido, ficam sob o poder exclusivo da mãe; por outro lado, não sendo conhecida a mãe ou não sendo ela apta a exercer o poder familiar, fica o filho sujeito à adoção ou à tutela (MONTEIRO, 2007).

O artigo 1.690 do Código Civil corrobora o artigo 1.633, supramencionado, uma vez que, em caráter excepcional, determina quando o poder familiar será exercido somente por um dos genitores, ao proclamar que: “compete aos pais, e na falta de um deles ao outro, com exclusividade, representar os filhos menores de dezesseis anos, bem como assisti-los até completarem a maioridade ou serem emancipados” (BRASIL, 2002).

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2.5.3 Competências dos pais quanto à pessoa dos filhos menores

O artigo 1.634 do atual Código Civil enumera taxativamente os direitos e deveres relativos ao poder familiar, que devem ser exercidos pelos pais na pessoa dos filhos, conforme passa a expor:

Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I - dirigir-lhes a criação e a educação;

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (BRASIL, 2002).

Nesse ínterim, compete aos pais, em relação à pessoa dos filhos menores:

I – Dirigir-lhes a criação e a educação. Segundo o entendimento da doutrina

dominante, é o mais importante direito dos filhos. Nesse sentido, cabe citar o entendimento de Gonçalves (2012, p. 418) que leciona: “é o mais importante de todos. Incumbe aos pais velar não só pelo sustento dos filhos, como pela sua formação, a fim de torná-los úteis a si, à família e à sociedade”. Assim, pode-se dizer que está associado à preparação dos filhos para a vida, tornando-os úteis à sociedade (COELHO, 2012).

O referido dever possui previsão constitucional, em seu artigo 226 (BRASIL, 1988), que determina in verbis: “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. Nesse sentido, resta claro que os filhos também possuem o dever assistencial para com a pessoa dos pais, sendo um dever de natureza mútua entre os ascendentes e descendentes.

A gravidade do referido dever encontra respaldo no aspecto de que violado tal dever, a punição dos pais é a perda da titularidade do poder familiar. Nesse aspecto, segundo leciona Diniz (2012), a inobservância ao dever moral e legal de educar e prestar assistência aos filhos acarreta na perda dos pais do poder familiar, conforme dispõe o artigo 1.638, inciso II do Código Civil: “Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: [...] II – deixar o filho em abandono; [...]” (BRASIL, 2002).

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No mais, sofrerá as sanções impostas pelo Código Penal, previstas no artigo 244,

in verbis:

Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho

menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou

maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo:

Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. (BRASIL, 1940). (grifo nosso)

Incidem, ainda, as penalidades previstas no artigo 246, também do Código Penal, que dispõe: “deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa” (BRASIL, 1940).

II – Tê-los em sua companhia e guarda. Conforme preleciona Diniz (2012, p. 607):

[...] direito de guarda é, concomitantemente, um poder-dever dos titulares do poder familiar. Dever porque aos pais, a quem cabe criar, incumbe guardar. Constitui um direito, ou melhor, um poder, porque os pais podem reter os filhos no lar, conservando-os junto a si, regendo seu comportamento em relações com terceiros, proibindo sua convivência com certas pessoas ou sua frequência a determinados lugares, por julgar inconveniente aos interesses dos menores.

Nesse sentido, os pais podem, arbitrariamente, decidir os lugares que seus filhos menores poderão frequentar, se podem ou não viajar sozinho, com quais companhias podem se relacionar, ou seja, possuem competência para dar ordens, objetivando decidir o melhor para o desenvolvimento e educação de sua prole (COELHO, 2012).

Segundo o entendimento de Rodrigues (2002, p. 403), “[...] sendo o pai responsável pelos atos ilícitos praticados pelo filho menor, o direito de guarda é indispensável para que possa, sobre o mesmo, exercer a necessária vigilância”. Assim, já que a responsabilidade sobre os filhos menores atinge a esfera pessoal dos pais, estes devem manter o controle sobre a guarda dos filhos.

No mais, devem os pais considerarem a idoneidade do indivíduo cuja guarda do menor será entregue, sob pena de incidir o previsto no artigo 245 do Código Penal, in verbis: “entregar filho menor de 18 (dezoito) anos a pessoa em cuja companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente em perigo” (BRASIL, 1940).

III – Conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem. Está previsto no

artigo 1.517 do Código Civil que é necessário consentimento dos pais ao casamento dos filhos com idade entre dezesseis e dezoito anos, conforme segue: “o homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil” (BRASIL, 2002).

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Nesse aspecto, porém, segundo preleciona Rodrigues (2002, p. 404), “essa prerrogativa conferida aos pais, [...], não tem, no direito brasileiro, uma importância transcendental, porque o consentimento paterno pode ser suprido judicialmente”. A argumentação doutrinária encontra respaldo no artigo 1.519 do Código Civil, in verbis: “a denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz” (BRASIL, 2002).

IV – Nomear-lhes tutor, por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobrevier, ou sobrevivo, não puder exercer o poder familiar pela incapacidade.

Esse poder só pode ser exercido se um dos cônjuges vier a falecer ou, por motivo de incapacidade, não puder exercer o poder familiar (RODRIGUES, 2002). Os pais podem, na falta deles próprios, nomear tutor aos filhos, transmitindo a responsabilidade pela criação dos menores. Nesse sentido, cumpre mencionar o entendimento de Diniz (2012, p. 608), no sentindo de que: “[...] ninguém melhor do que o genitor para escolher a pessoa a quem confiar a tutela dos filhos menores.

V – Representá-los, até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento. O Código Civil, em

seu artigo 1.690, regula a participação dos pais quanto à representação ou assistência, no sentido de que: “compete aos pais, e na falta de um deles ao outro, com exclusividade, representar os filhos menores de dezesseis anos, bem como assisti-los até completarem a maioridade ou serem emancipados” (BRASIL, 2002).

VI – Reclamá-los de quem ilegalmente os detenha. É permitido aos genitores

reclamar a devolução dos filhos caso alguém os detenha ilegalmente. Esse direito é concedido, inclusive, para um dos pais quando o outro desrespeitar seus direitos no tocante à companhia e guarda (COELHO, 2012).

VII – Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. A formação social do indivíduo está diretamente ligada aos valores que

aprende em casa, cumpre citar o respeito aos pais e demais familiares. Assim, parte dessa prerrogativa é que os pais possam exigir dos filhos menores o devido respeito e obediência, constituindo esse, um meio de educá-los para que possam conviver melhor em sociedade (RODRIGUES, 2002).

No tocante aos serviços próprios de sua idade e condição, insta salientar o entendimento de Coelho (2012, p. 208), no sentido de que:

Como qualquer outra manifestação do poder familiar, o direito de exigir a prestação de serviços próprios de sua idade e condição só existe se destinado à adequada preparação do filho para a vida adulta. Quer dizer, os pais não têm o direito de exigir que os filhos trabalhem fora para contribuir com a renda familiar, por mais

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necessitados que sejam ou estejam. Podem, é certo, estimulá-los a tais atitudes, que são sadias e contribuem para a formação do caráter.

No mais, a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 403, veda o trabalho do menor de dezoito anos, no sentido de que: “é proibido qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos quatorze anos” (BRASIL, 1943). Assim, ao menor de dezesseis anos, só é permitido o trabalho, a partir dos quatorze anos, na condição de aprendiz.

Segundo o entendimento de Coelho (2012, p. 210):

Quando a lei menciona a exigência de prestação de serviços como direito associado ao poder familiar, ela está se referindo unicamente aos que podem contribuir para a preparação do filho para a vida adulta. Isto é, à ajuda que todos os membros da família devem dar para as tarefas cotidianas. Os pais podem exigir dos filhos, por exemplo, que enxuguem a louça do jantar, ponham a mesa, levem o cão ao passeio, reguem o jardim ou outros afazeres semelhantes. Não é, aliás, despropositado que os pais remunerem modicamente tais serviços domésticos, sempre que o objetivo for de contribuir para a formação de um adulto ciente de suas responsabilidades (e não o de economizar dinheiro com empregados ou trabalhadores autônomos).

Nesse sentido, os pais podem considerar importante a introdução do menor ao mercado de trabalho, com o intuito de prepará-los para a vida adulta. De igual modo, podem incentivar o menor a realizar pequenos serviços domésticos, podendo esses serem ou não remunerados. O propósito é claro: inserir da maneira mais dinâmica possível o menor nos afazeres da vida doméstica e social, que terá de ser enfrentada na vida adulta. Assim, a preparação começa desde cedo e o filho, ao atingir a maioridade, terá alcançado maior independência e estará devidamente preparado para as responsabilidades da vida adulta.

2.5.4 Competências dos pais quanto aos bens dos filhos menores

Segundo leciona Rodrigues (2002, p. 405), “dentro da esfera patrimonial, o primeiro dever imposto aos pais, no exercício do pátrio poder [poder familiar], é o de administrar os bens dos filhos”.

Nesse sentido, dispõe o artigo 1.689 do Código Civil (BRASIL, 2002), in verbis: “o pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: I - são usufrutuários dos bens dos filhos; II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade”.

Os pais estão, em igualdade de direitos, legalmente autorizados ao exercício administrativo no que tange aos bens de seus filhos menores, sendo vedados, contudo, atos que ultrapassem a simples administração (GONÇALVES, 2012). Muito embora, nesse aspecto,

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