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3.6 RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE

3.6.1 Modos de reconhecimento de filho

3.6.1.1 Reconhecimento voluntário

Segundo preleciona Venosa (2009, p. 145), “o reconhecimento é espontâneo quando alguém, por meio de ato e manifestação solene e válida, declara que determinada pessoa é seu filho”. Para Dias (2016), essa forma de reconhecimento independe de prova biológica do vínculo. Nas palavras da autora, é um ato espontâneo, solene, público e incondicional. Como gera o estado de filiação, é irretratável e indisponível.” (Dias, 2016, p. 410, grifo da autora).

O artigo 1.609 do Código Civil (BRASIL, 2002), por seu turno, regula o reconhecimento voluntário de paternidade:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: I - no registro do nascimento; II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório; III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado; IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Sobre o tema, leciona Washington de Barros Monteiro (2009) que a lei faculta aos pais reconhecerem seus filhos no próprio termo de nascimento; por escritura pública; por testamento; por escrito particular ou por manifestação perante o juiz.

3.6.1.2 Reconhecimento judicial

O reconhecimento judicial, também chamado de forçado ou coativo, é aquele que, diante da impossibilidade do reconhecimento voluntário, o filho – representado ou assistido pela mãe, em caso de menoridade civil – por meio de um processo de investigação de paternidade, tem sua verdade biológica2 declarada por sentença judicial (LISBOA, 2006). A legitimidade do filho para ingressar com a referida ação encontra respaldo no artigo 1.606 do Código Civil (BRASIL, 2002) in verbis: “art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz”.

Destarte, o direito à investigação de paternidade é personalíssimo e indisponível, conforme determina o art. 27 do ECA: “art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de justiça.” (BRASIL, 1990).

Dessa forma, o reconhecimento de paternidade, independentemente da forma como for obtido – por sentença judicial ou de forma voluntária – produzirá aos filhos o mesmo efeito,

2 Conforme visto no decorrer do presente estudo, é admitida a declaração de paternidade também quando o vínculo paterno-filial é decorrente da socioafetividade.

conforme previsão expressa do Código Civil, em seu artigo 1.616 (BRASIL, 2002), in verbis: “art. 1.616. A sentença que julgar procedente a ação de investigação produzirá os mesmos efeitos do reconhecimento; mas poderá ordenar que o filho se crie e eduque fora da companhia dos pais ou daquele que lhe contestou essa qualidade”.

Assim, percebe-se que o reconhecimento de paternidade é o ato que faz emergir, na esfera jurídica, os direitos inerentes à relação paterno-filial.

No próximo capítulo, passam-se a discutir os aspectos do direito sucessório, convergindo às possibilidades que ensejam ao filho o direito à participação no acervo hereditário do pai biológico diante de prévio registro de paternidade civil na modalidade socioafetiva.

4 DIREITO SUCESSÓRIO

No presente capítulo, serão abordados os principais aspectos do Direito Sucessório, sobretudo, no que tange à sucessão paterna biológica e socioafetiva.

4.1 CONCEITO

Na humanidade, nada possui caráter eterno, o mundo como conhecemos é finito em todos os aspectos materiais. O homem, como ser integrante desse universo, carrega consigo idêntica limitação. Ocorre que a sucessão, por sua vez, atenua o sentimento de finitude da existência humana, trazendo a sensação de prolongamento da pessoa, posto que permanece viva na memória dos bens que adquiriu em vida (RIZZARDO, 2015).

Nesse sentido, conforme leciona Venosa, (2009, p. 1):

O homem, pouco importando a época ou sua crença, sempre acreditou, ou ao menos esperou, poder transcender o acanhado lapso de vida. [...] a personalidade surge com o nascimento e extingue-se com a morte. No direito sucessório, porém, não se pode aplicar o brocado mors omnia solvit3, uma vez que as relações jurídicas permanecem

após a morte do titular.

Etimologicamente, a palavra “suceder” (sub + cedere) expressa uma ideia de sequência, isto é, uns virem depois dos outros (MONTEIRO, 2008). Nas palavras de Venosa (2009, p. 1), tem o sentido de “alguém tomar o lugar de outrem”. Assim, a sucessão é a substituição da titularidade de determinados bens (GONÇALVES, 2012).

Entretanto, o referido conceito não abrange somente a transmissão mortis causa, mas também os atos inter vivos. Ocorre que o Direito Sucessório restringe seu campo de atuação aos direitos transmitidos a terceiros em razão da morte do titular, por ato de vontade própria realizado em vida ou por força legal (WALD. 2007). Nesse sentido, leciona Gonçalves (2012, p. 19-20):

No direito das sucessões, entretanto, o vocábulo é empregado em sentido estrito, para designar tão somente a decorrente da morte de alguém, ou seja, a sucessão causa mortis. O referido ramo do direito disciplina a transmissão do patrimônio, ou seja, do ativo e do passivo do de cujus ou autor da herança e seus sucessores.

O Direito Sucessório, conforme a doutrina de Coelho (2012, p. 245), “contempla as normas que norteiam a superação de conflitos de interesses envolvendo a destinação do patrimônio de pessoa falecida. Sua matéria, portanto, é a transmissão causa mortis”. Também por este prisma é o entendimento de Venosa (2009, p. 1), que preleciona: “quando se fala, na

ciência jurídica, em Direito das Sucessões, está-se tratando de um campo específico do Direito Civil: a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte.

Nesse caso, o conteúdo e o objeto da relação jurídica permanecem estacionários, entretanto, altera-se o titular da referida relação, ocorrendo, assim, a transmissão de direito, isto é, a sucessão (VENOSA, 2009). Nesse sentido, “com a morte do autor da herança, o sucessor passa a ter a posição jurídica do finado, sem que haja qualquer alteração na relação de direito, que permanece a mesma, apesar da mudança de sujeito” (Diniz, 2007, p. 3).

Com a morte, os patrimônios, direitos e obrigações do falecido transmitem-se para outrem – transmissão causa mortis. A sucessão, por sua vez, é a transferência total ou parcial da herança por morte de alguém a seus herdeiros (DIAS, 2015). A corroborar o exposto, insta salientar o entendimento de Coelho (2012, p. 245-246), que preleciona:

Destaca-se, nessa abordagem, o caráter assistencial do direito das sucessões. Se para o morto não têm mais nenhuma serventia os bens que amealhou, eles são ainda úteis aos seus familiares (alguns dos quais eram dele dependentes ou haviam contribuído para a construção do patrimônio).

Nessa perspectiva, a sucessão “tem, pois, como pressuposto, do ponto de vista subjetivo, a morte do autor da herança” (Monteiro, 2008, p. 1). Por outro lado, as regras sucessórias são revestidas de vasta complexidade, considerando-se a multiplicidade de relações familiares que envolvem o de cujus, as quais exigem tratamento justo para seus sucessores (COELHO, 2012).

É de todo oportuno destacar a previsão constitucional do direito à herança, que no entendimento de Dias (2015), trata-se de direito fundamental, previsto no artigo 5º, XXX da Constituição Federal (BRASIL, 1988), in verbis: “é garantido o direito de herança”.

4.2 HERANÇA

Conforme sabiamente leciona Rizzardo (2015, p. 12), “a palavra herança envolve um conteúdo com significado de propriedade, já que proveniente de hereditas, que é formada por herus, que se traduz por dono”. Nesse sentido, “a herança é o conjunto de bens, direito e

obrigações, que se transmitem aos herdeiros e legatários. Assim, a herança transmite-se em

virtude de sucessão mortis causa; a sucessão mortis causa é o modo de transmitir a herança” (Wald, 2007, p. 8).

No entendimento de Dias (2015, p. 35):

O acervo hereditário, no âmbito judicial, recebe o nome de espólio. Não tem

personalidade jurídica, mas tem capacidade jurídica para demandar e ser

demandado (CPC, 75, VII). Trata-se de universalidade de bens de existência transitória. Não dispõe de patrimônio próprio e tem proprietários conhecidos. São

bens provisoriamente reunidos que pertencem aos herdeiros em condomínio. (grifo da autora)

Conforme preleciona Wald (2007), a herança é considerada bem imóvel, sendo aplicada a legislação vigente referente a esta espécie de bem. Nas palavras do autor, “quaisquer que sejam os elementos integrantes da herança, terá ela natureza imobiliária, dependendo, para a sua alienação, de escritura pública, e sujeitando-se às normas sobre transferência de imóveis” (Wald, 2007, p. 8).

4.3 TESTAMENTO

O Código Civil atualmente vigente prevê a sucessão legítima e a testamentária. A doutrina, cumpre citar Diniz (2009); Gonçalves (2012) e Dias (2015), define testamento como o ato de última vontade do de cujus. Nesse sentido, a transmissão dos bens ocorre, no que couber, da maneira que o de cujus determinou em vida. Nas palavras de Dias (2015, p. 339, grifo da autora), “testamento é o ato de última vontade pelo qual ocorre a sucessão testamentária”. É a partir do testamento que o titular dos bens tem a faculdade de estender sua própria vontade para além da vida, podendo, inclusive, dispor quanto à pessoa dos filhos menores no que tange à disposição de seus bens (RIZZARDO, 2015).

De acordo com o entendimento de Gonçalves (2012) e Diniz (2009), o testamento é ato personalíssimo; constitui negócio jurídico unilateral; é solene; gratuito; revogável e, por fim, é ato causa mortis. Nesse diapasão, testamento é o ato unilateral de vontade do titular do patrimônio, que dispõe, gratuitamente, sobre seus bens – total ou parcialmente – inclusive sobre os filhos menores, para valer após sua morte, de forma documental pública ou particular (RIZZARDO, 2015).

Embora seja ato de vontade do testador, obedecendo ao princípio da autonomia de vontade, o testamento precisa respeitar o princípio da supremacia da ordem pública, impondo- se, assim, restrições à liberdade de dispor (DINIZ, 2009). Nesse sentido, “o primeiro limite imposto à liberdade de testar é a necessidade de preservar a parte do patrimônio destinado aos

herdeiros necessários e que recebe o nome de legítima” (Dias, 2015, p. 340, grifo da autora).

Cumpre salientar que o titular do patrimônio não precisa, necessariamente, transmitir seus bens por meio de testamento, pode fazê-lo, de igual modo, a título de adiantamento de legítima, com base no artigo 544 do Código Civil, bem como por meio de partilha em vida, prevista no artigo 2.018 do mesmo dispositivo legal (DIAS, 2015).

A sucessão testamentária trata-se de ato unilateral de vontade, assim, o titular do patrimônio dispõe sobre a titularidade de seus bens em favor de terceiro, que passará a valer a partir de sua morte. Há, ainda, a possibilidade de revogação do ato (RIZZARDO, 2015).

4.3.1 Legado

Legado é um patrimônio determinado, próprio do testamento. Pode abranger todos os bens do de cujus, ou somente uma fração, conforme resultar de sua própria vontade (RIZZARDO, 2015). O testamento permite que se transmitam determinados bens a determinadas pessoas, o legado, por sua vez, são bens atribuídos a alguém, de acordo com a vontade do testador (DIAS, 2015).

Salienta-se que os valores testados não podem ultrapassar a legítima disponível aos herdeiros necessários, sob esse prisma, ainda segundo Dias (2015, p. 124), “[...] deixando o testador para o legatário mais do que podia dispor, nem por isso o testamento é inválido. Cabe simplesmente reduzir o valor do legado, atribuindo ao beneficiário menos bens ou fração do bem que lhe foi destinado”.

4.4 ABERTURA DA SUCESSÃO

Conforme determina o artigo 6º do Código Civil (BRASIL, 2002), in verbis: “a existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva”. A esse respeito, tem-se a verificação da morte como pressuposto para a abertura da sucessão. Também por esse prisma é o entendimento de Gonçalves (2012, p. 33) que assevera:

A existência da pessoa natural termina com a morte real (CC, art. 6º). Como não se concebe direito subjetivo sem titular, no mesmo instante em que aquela acontece abre- se a sucessão, transmitindo-se automaticamente a herança aos herdeiros legítimos e testamentários do de cujus, sem solução de continuidade e ainda que estes ignorem o fato.

Segundo Rizzardo (2015), são contempladas na abertura da sucessão todas as pessoas nascidas e já concebidas. A esse respeito, prevê o artigo 1.789 do Código Civil (BRASIL, 2002), in verbis: “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão”.

Conforme sabiamente lecionam Dias (2015) e Monteiro (2009), a morte do de cujus e a sobrevivência do herdeiro são pressupostos para a abertura da sucessão; em outras palavras, em caso de comoriência, não há comunicação entre heranças.

Verificado o evento da morte, a herança é transmitida de acordo com a ordem da vocação hereditária. Na falta dos herdeiros necessários e, posteriormente, legítimos, a herança é recolhida pelo Município, Distrito Federal ou União (GONÇALVES, 2012, p. 33).

Para corroborar o exposto acima, é de todo oportuno mencionar o artigo 1.844 do Código Civil (BRASIL, 2002), que determina:

Art. 1.844. Não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível, ou tendo eles renunciado a herança, esta se devolve ao Município ou ao Distrito Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território federal.

Conforme sabiamente leciona Rizzardo (2015, p. 22), “[...] a morte determina imediata abertura da sucessão. É a mesma um fato natural, enquanto rompe o liame da vida, desaparecendo inteiramente a pessoa”.

Em regra, é necessária a apresentação do atestado de óbito para que se possa abrir a sucessão de pessoa falecida, isto é, necessária se faz a prova de sua morte real (GONÇALVES, 2012, p. 43). Em contrapartida, para Gonçalves (2012) e Monteiro (2009), nas hipóteses de morte presumida devido a catástrofes como naufrágio e terremoto, tratam-se de exceção, assim, mesmo diante da impossibilidade de se encontrar o cadáver, é possível a abertura da sucessão.

Sendo assim, ato contínuo ao falecimento do de cujus, é aberta a sucessão, fato que enseja a transmissão da propriedade e da posse dos bens do falecido aos seus herdeiros. A respeito da abertura da sucessão, cumpre salientar o entendimento de Diniz (2012, p. 22), que preleciona: “[...] abre-se a sucessão, transmitindo-se, sem solução de continuidade, a propriedade e a posse dos bens do defunto aos seus herdeiros sucessíveis, legítimos ou testamentários, que estejam vivos naquele momento, independentemente de qualquer ato.

Nesse sentido, a abertura da sucessão significa a morte de um indivíduo, que enseja o nascimento do direito dos herdeiros de exercer a titularidade dos bens do falecido. A referida transferência, cumpre salientar, ocorre de maneira automática e, nas palavras de Diniz (2012, p. 109), “a titularidade do acervo patrimonial se transfere sem sofrer solução de continuidade. Isso porque a existência da pessoa natural termina com a morte (CC 6º), deixando de ser sujeito de direitos e obrigações. Daí a necessidade que alguém assuma seu lugar de forma tão imediata”.

Portanto, em momento algum o patrimônio do de cujus deixa de ter um proprietário, tendo em vista que, com a incidência do óbito, a titularidade jurídica dos bens passa, imediatamente, aos herdeiros (DINIZ, 2012). A esse respeito, conforme Rizzardo (2015, p. 24):

Há uma transatividade de direitos que precisa ser documentada mediante o inventário. O rompimento do elo entre a pessoa e os bens de imediato é sanado com a assunção

da titularidade por um novo indivíduo, restabelecendo-se o equilíbrio rompido, agora com mais de um sujeito, se vários os herdeiros.

Aberta a sucessão, o patrimônio do falecido passa a ser denominado de herança, sendo transmitido aos herdeiros legítimos e testamentários. O referido ato, contudo, não se confunde com a abertura do inventário, tendo em vista que ocorrem em momentos distintos, sendo a transmissão da herança autônoma, independendo do inventário (DIAS, 2015). Nas palavras de Rizzardo (2015, p. 23), “o inventário representa apenas a formalização da sucessão, a qual, no entanto, se dá com a morte. Não passa o mesmo de exteriorização administrativa da transmissão”.

Com a abertura do inventário, “nomeia-se o inventariante, descrevem-se os bens, são arrolados os herdeiros, e apontam-se as dívidas para que, sob controle judicial, se efetue a partilha, resgatando-se débitos porventura existentes” (Rizzardo, 2015, p. 24).

4.5 APLICAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO AOS DESCENDENTES EM PRIMEIRO

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