• Nenhum resultado encontrado

A adoção do regime de contabilidade misto para o setor público segundo a Lei 4.320/64 e Lei de Responsabilidade Fiscal diante do Princípio da Transparência

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A adoção do regime de contabilidade misto para o setor público segundo a Lei 4.320/64 e Lei de Responsabilidade Fiscal diante do Princípio da Transparência"

Copied!
69
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PATRICIA DANIELE DOS SANTOS PITA

A ADOÇÃO DO REGIME DE CONTABILIDADE MISTO PARA O SETOR PÚBLICO SEGUNDO A LEI 4.320/ 64 E LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL DIANTE DO

PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA.

NITERÓI 2013

(2)

PATRICIA DANIELE DOS SANTOS PITA

A ADOÇÃO DO REGIME DE CONTABILIDADE MISTO PARA O SETOR PÚBLICO SEGUNDO A LEI 4.320/ 64 E LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL DIANTE DO

PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Marco Antônio Ferreira Macedo

NITERÓI 2013

(3)

RESUMO

O trabalho que se propôs desenvolver tem como eixo fundamental o estudo da técnica do regime misto de contabilidade direcionado às contas públicas, previstos na Lei 4.320/64 e Lei de Responsabilidade Fiscal, e a incompatibilidade que este apresenta sobretudo com o princípio da transparência, extraído do art. 37 da Constituição Federal. A análise não se limita, porém, ao texto constitucional, visa também verificar a harmonia do método contábil previsto em lei com as características do Estado Fiscal Social Democrático de Direito, da nova administração pública e com os procedimentos que vem sendo praticados nesse campo em âmbito mundial. Assim, pretende-se discutir a coerência da opção legislativa por aqui instituída como um fenômeno não apenas normativo, e sim em sentido amplo que nos permita alcançar as dimensões políticas, econômicas e administrativas da determinação legal.

Palavras-chave: Orçamento Público, Transparência Fiscal, Regime de

(4)

ABSTRACT

The following article has as core fundamentals the study of the modified cash accounting basis in the public sector, foreseen in the Law N. 4320/64 and Fiscal Responsability Law, and the compatibility that it presents when compared to the transparency principle, extracted from Sector 37 of Brazilian’s Constitution. The analysis is not limited to the constitutional text, but also to verifying the harmony of the accounting method prevailed by Law in our country and the characteristics of the Fiscal State we are following as role model in Brazil, the New Public Management, and the accountancy proceedings practiced in the whole world, mainly those classified as leading countries in the field. In this manner, we intend to discuss the coherence of the legislative option as phenomenon not only normative, as well as to observe its political, economical, and administrative perspectives.

Key words: Public Budget, Fiscal Transparency, Accounting Basis, Law N. 4.320/64,

(5)

Ofereço este trabalho aos meus pais, Helena e Martinho, que me ensinaram o valor do compromisso e a imensidão da dedicação paternal. Este é o fim de uma trajetória continuada somente pelo amor.

(6)

AGRADECIMENTOS

Deus, eu Lhe agradeço diretamente a bondade com que cuidaste de mim durante a vida. Agradeço por minha antiga e estéril falta de fé, pela posterior revelação. Agradeço, meu Deus, por ter me renovado, por ter me sustentado e ter feito das minhas vivências unicamente Teus projetos. Apesar da nossa humanidade, Deus é amor, se consubstancia pelo amor e pelo amor insiste em se fazer presente nas fronteiras de nosso conhecimento tão ingênuo diante da Sua imensidão.

Agradeço ao orientador, Marco Antônio, pelas observações sempre coerentes, acertadas e positivas, pela motivação que me demonstrou e por me renovar o desejo de dedicação integral ao que se acredita.

Agradeço à minha família, aos meus avós e ao meu avô João, já falecido, por ter me ensinado a necessidade do conhecimento, o amor ao trabalho, a beleza do perdão, o reconhecimento dos próprios erros e a virtude da gratidão. Seu discurso eram seus atos e seus olhos. Aprendi a ser humana com suas lições. Aprendi o respeito por suas cicatrizes e sorriso caridoso. Obrigada, meu avô. Sinto sua falta.

Aos meus pais, Helena e Martinho, agradeço a paciência e o amor incondicional. E tive a sorte de nascer em uma grande família, de ter dois pais, duas mães e dois irmãos extraordinários. Meus tios Valter e Goreti são meus pais e não há mais discussões ou adjetivos aditivos. São meus pais. Sou filha de Helena, Martinho, Valter e Goreti. Ao passo que a cobrança é dupla, o amor é quádruplo. Vocês são a minha família, rochedo e proteção. Estou aqui pelo exemplo e continuo a caminhar pelo amor demonstrado, que é força e sentido das minhas ações.

Aos meus irmãos Karine e Wille, companheiros eternos, amigos perenes, somos um. Crescemos juntos, erramos juntos e aprendemos o cuidado mútuo. Minha irmã, agradeço sua bondade, seu ouvido, sua compreensão e grande sabedoria de vida que, talvez, eu nunca consiga alcançar. Sua personalidade é firme e inteligente. Convivo com a raridade, com a delicadeza e com a doçura de seus traços. Obrigada pela compreensão única e pela paciência nos dias cinza de perspectiva vazia. Meu irmão, agradeço seu jeito forte de me contrariar, sua inteligência viva e sagacidade brutal. Agradeço por me surpreender com informações, perspectivas e conhecimentos novos a cada reencontro de fim de semana. Acredito na sua força. Você é brilhante e descobrirá isso com o tempo.

(7)

Aos meus amigos, daqui e de lá, aos amigos perdidos, aos encontrados e desencontrados. Àqueles com quem tenho a graça de dividir a rotina, agradeço às risadas, aos sábados de conversa banal, às calorosas discussões sobre nada, aos diálogos sobre futuro e ao compartilhamento de planos de vida. Aos distantes, agradeço a presença na minha vida, às mudanças que provocaram no tempo em que aí estiveram, ao processo de completa reconfiguração pessoal e à felicidade proporcionada. Pessoas aleatórias que me fizeram sorrir no frio e no calor, que permanecem ou foram transitórias, que me ensinaram a profundidade da experiência.

(8)

“Amar, amar, amar, amar siempre y con todo El ser y con la tierra y con el cielo, Con lo claro del sol y lo obscuro del lodo. Amar por toda ciencia y amar por todo anhelo.”

(9)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 1

1.1 CAPÍTULO I – DA PUBLICIDADE E TRANSPARÊNCIA... 3

1.2 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE E TRANSPARÊNCIA... 3

1.3 A CONSCIÊNCIA DO CONTRIBUINTE QUANTO AO SEU PAPEL POLÍTICO E O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO FINANCEIRO... 7 1.3.1 DO ESTADO PATRIMONIAL AO ESTADO FISCAL... 8

1.3.2 DO ESTADO FISCAL E SEUS DESDOBRAMENTOS AO ESTADO SOCIAL FISCAL... 10 1.4 O PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA COMO GARANTIA AO CONTRIBUINTE... 13 2.1 CAPÍTULO II – DAS RELAÇÕES ENTRE DIREITO E CONTABILIDADE... 15 2.2 DIREITO E CONTABILIDADE EM PROL DA TRANSPARÊNCIA FISCAL... 15 2.3 O REGIME CONTÁBIL NO BRASIL... 19

2.3.1 DEFINIÇÃO DE REGIME CONTÁBIL... 20

2.3.2 REGIME DE CAIXA... 22

2.3.3 REGIME DE COMPETÊNCIA... 24

2.3.4 REGIME MISTO E A CONTABILIDADE PÚBLICA... 25

2.4 INOBSERVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS PRÓPRIOS DA CONTABILIDADE E DOS PADRÕES DE REGISTRO CONCERNENTES AO SETOR PRIVADO... 26 2.5 ANÁLISE DA LEI 4.320/64 E LRF NO QUE TANGE ÀS DISPOSIÇÕES SOBRE AS INFORMAÇÕES CONTÁBEIS... 30 3.1 CAPÍTULO III – MODELOS ADMINISTRATIVOS E PANORAMA GLOBAL... 36 3.2 OS MODELOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, SUAS PRIORIDADES E PRÁTICAS... 36 3.3 PREOCUPAÇÃO GLOBAL... 43

(10)

3.3.1 A NOVA ZELÂNDIA... 45

CONCLUSÃO... 49 BIBLIOGRAFIA... 53

(11)

Introdução

O trabalho a ser desenvolvido versa, essencialmente, sobre a temática da transparência na administração das contas públicas e o questionamento sobre o método de registro dos lançamentos contábeis previstos na Lei 4.320/64 e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Colocaremos em análise até que ponto o tratamento técnico financeiro desses lançamentos é, de fato, idôneo e em harmonia com a realidade patrimonial do ente público e se ele atende, por fim, aos dispositivos constitucionais e legais que zelam pela transparência.

No primeiro capítulo, traremos a delimitação do sentido de transparência do art. 48 da LRF e de publicidade, previsto pelo art. 37 da Constituição Federal. A fim de esclarecer o surgimento da demanda por esclarecimento informacional no núcleo das necessidades do contribuinte, seguiremos as classificações do professor Ricardo Lobo Torres e estabeleceremos uma comparação entre o grau de relevância dado à transparência e o perfil do Estado existente em um dado contexto político.

O segundo passo consistirá no aprofundamento do estudo do ordenamento jurídico nacional e na análise mais precisa das previsões legais específicas ao tema. Buscaremos, então, uma reflexão integrada dos dispositivos da Lei 4.320/64, Lei Complementar Nº. 101/00 e Portarias expedidas pela Secretaria do Tesouro Nacional no que se refere à contabilização dos recursos públicos. Assim, a análise não ficará restrita ao art. 35 da Lei do Orçamento Público, sob qual se embasava o administrador para justificar o regime misto de competência na Contabilidade Pública, mas abrangerá os demais artigos que regulamentam as demonstrações financeiras públicas e procedimentos de contabilidade aplicadas ao setor.

Por fim, avançaremos à crítica sobre a coerência do regime misto, hoje em processo de transição no Brasil, e o modelo de gestão pública adotado no país. Demonstraremos a incompatibilidade que o método contábil apresenta quando contraposto aos princípios e finalidades da New Public Management, de tal sorte que o alinhamento entre as práticas é essencial para a consolidação de um projeto de Estado verdadeiramente democrático.

Com objetivo de demonstrar a viabilidade e necessidade de avanço nesse campo, traremos ao debate o caso neozelandês notadamente reconhecido pela

(12)

excelência em responsabilidade fiscal, tendo inclusive servido como parâmetro para a criação da Lei Complementar Nº. 101/00.

A importância do tema reside na apreensão da validade do Direito Financeiro como ramo da ciência jurídica que visa à tutela do orçamento público para a promoção do alcance daquelas finalidades dispostas pelo povo que o poder representa. Logo, a efetivação da transparência não pode ser tratada como simples discurso teórico. É preciso classificá-la como elemento chave para a promoção do bem estar e justiça social.

Para tanto, a presente monografia não se limitou ao ambiente jurídico, buscamos estudar o fenômeno financeiro e seus efeitos tanto a partir da perspectiva legal, como política, administrativa e contábil. Ao nosso ver, somente a partir de uma análise ampla e também técnica do aparato legal é que se pode aferir o grau de eficiência da norma que regulamenta a atividade financeira e contábil do Estado.

Há de se acrescentar que o Direito Financeiro é um dos campos da ciência jurídica que não está restrito à disposição normativa, mas, ao contrário, pressupõe uma análise econômica da realidade fática. Ele tem como finalidade abranger determinada conclusão técnica estranha ao Direito ao sistema normativo, oferecendo assim segurança jurídica ao tema das finanças públicas.

Assim, o fenômeno pré-jurídico, que é o fato econômico, passa a preocupar o jurista quando o seu mau implemento impede o bom desenvolvimento da atividade pública e quando em seu seio são comportadas práticas que desviam ou promovem uma atividade fiscal inexata e obscura. Para questioná-lo cabe ao jurista entendê-lo na totalidade e, tendo em vista tal necessidade, a seguir será desenvolvida uma proposta interdisciplinar de compreensão do eixo temático do presente trabalho.

(13)

1.1 – CAPÍTULO I – DA PUBLICIDADE E DA TRANSPARÊNCIA

O primeiro capítulo trará como ponto inicial a definição de transparência, baseado na sua distinção do conceito da publicidade. Calcado sobre este, aquela configura-se como uma garantia do cidadão ao acesso amplo aos documentos financeiros produzidos pelos órgãos públicos, que, por sua vez, devem ser claros e precisos ao máximo.

Em um segundo momento, abordaremos a formação da consciência do contribuinte em face das transformações observadas no Estado Fiscal. De tal modo que o grau de fiscalização e controle no que tange ao uso do erário provêm do nível de legitimidade política que um povo demanda de seu governo. Nesse sentido, buscaremos remontar a construção histórica do Estado Financeiro, com intuito de justificar o surgimento da transparência nesse processo como um instrumento de efetivação da democracia.

Tendo em vista facilitar a exposição da temática, este capítulo foi dividido em três tópicos: o primeiro trata do aspecto conceitual da transparência; o segundo, do viés histórico e político na compreensão do papel do cidadão quanto às atividades orçamentárias do Estado, e o terceiro vai dimensionar a relevância que tem a transparência financeira dentro do contexto sócio-econômico contemporâneo.

1.2 – Princípio da Publicidade e Transparência

No Brasil, a publicidade surge por meio da Emenda Constitucional nº.19 de 1998 que introduziu o caput do art. 37 da CRFB e harmonizou o país à tendência mundial da configuração de um Estado aberto aos seus interessados e legítimo politicamente. A partir desse momento, ela torna-se, portanto, um dos pressupostos para o pleno desenvolvimento do Estado Democrático de Direito.

A constitucionalização do princípio corrobora para a relevância a ser dada à sua aplicação na atuação do poder público. Em conceituação interessante, Fernando Filgueiras, professor de Ciências Políticas da UFMG, define:

“A publicidade exige que as políticas e as normas emanadas do governo ocorram em um processo aberto de decisão democrática e que as instituições sejam controladas por outras instituições e pelos próprios cidadãos. A publicidade significa atrelar as decisões do governo à autoridade da cidadania, seja por meio de instituições, seja por meio da

(14)

participação da própria sociedade nos processos de escolha e decisões públicas. No contexto de sociedades democráticas, a publicidade é a realização de decisões balizadas em uma razão pública, que é a razão da própria cidadania (Rawls, 2002).”1

Dessa forma, a publicidade é meio de fornecer garantias ao cidadão quanto ao bom exercício administrativo. Através do conhecimento pela coletividade dos atos praticados no setor público, temos a certificação de que o poder público submete-se à demanda coletiva e não se utiliza de meios escusos ou nebulosos de apropriação da coisa pública e de prevalência dos interesses particulares, facilitados quando considerados um contexto institucional que dificulta o controle e favorece a imoralidade administrativa.

Ela é um processo de abertura da Administração Pública que não pode ser tomado como simples procedimento burocrático ao qual está submetido o servidor do Estado, mas também deve ser implementado pelo prisma da utilidade, “isso

porque uma informação pode ser pública mas não ser relevante, confiável, oportuna e compreensível”2.

Nesse ponto é que a publicidade diferencia-se da transparência. A transparência preocupa-se com o caráter útil, compreensível e confiável da informação a ser transmitida ao seu usuário. Na lição de Ricardo Lobo Torres:

“A transparência fiscal é um princípio constitucional implícito. Sinaliza no sentido de que a atividade financeira deve se desenvolver segundo os ditames da clareza, abertura e simplicidade. Dirige-se assim ao Estado como à Sociedade, tanto aos organismos financeiros supranacionais quanto às entidades não-governamentais. Baliza e modula a problemática da elaboração do orçamento e da sua gestão responsável, da criação de normas antielisivas, da abertura do sigilo bancário e do combate à corrupção.”3

1 FILGUEIRAS, Fernando. Além da Transparência: Accountability e Política da Publicidade. São

Paulo: Revista Lua Nova, 2011, p. 85. Sobre a publicidade afirma John Rawls: “Concretizar a publicidade plena é concretizar um mundo social em que o ideal de cidadania pode ser aprendido e, assim, despertar um desejo efetivo de ser esse tipo de pessoa.” RAWLS, John. O Liberalismo Político. 2ª Edição. São Paulo: Editora Ática, 2000, p. 116.

2 PLATT NETTO, Orion Augusto; CRUZ, Flávio da; ENSSLIN, Sandra Rolim; ENSSLIN, Leonardo. Publicidade e Transparência das Contas Públicas: obrigatoriedade e abrangência desses princípios na administração pública brasileira. Belo Horizonte: Contabilidade vista e revista, v. 18, n.1., 2007, p. 75.

3 TORRES, Ricardo Lobo Torres. O Princípio da Transparência no Direito Financeiro. Rio de Janeiro,

(15)

Para Filgueiras4, considerando uma perspectiva econômica do Estado é que

se consolida a transparência, como conseqüência da confiabilidade proveniente e essencial na realidade privada. A condição da confiança, então, invade o espaço público, impondo ao funcionamento das atividades administrativas requisitos mais exigentes de abertura, o que restringiria o conceito de cidadania, tendo o indivíduo papel de consumidor e sendo insuficiente para atender à complexidade da atuação pública5.

Discordamos do entendimento, ao menos quanto à gestão financeira dos recursos públicos, primeiro porque tendo em vista a temática do presente trabalho, estamos inseridos majoritariamente dentro da realidade contábil que, por sua natureza e finalidade, exige grau de severidade mais alto para a produção de informações a serem divulgadas ao público e preocupa-se com sua integridade e coerência com a realidade.

Em segundo lugar, há de se considerar as mudanças decorrentes da reforma política ao qual o país se submeteu em 19956, que introduz no núcleo do

funcionamento da atividade administrativa do Estado, o conceito de governança, responsável por estender o espaço de discricionariedade do agente à serviço da Administração Pública7.

Na iniciativa privada, a governança corporativa representa a capacidade de uma instituição aplicar políticas e ferramentas de gerenciamento idôneas, promovendo o relacionamento confiável com o acionista e demais interessados que venham a manter negócios com a mesma. Atenta aos princípios da “equidade

(fairness), transparência (disclosure), responsabilidade pelos resultados (accountability) e cumprimento de normas (compliance)”8 . Enquanto no poder

4 FILGUEIRAS, Fernando. Além da Transparência: Accountability e Política da Publicidade. São

Paulo: Revista Lua Nova, 2011, p. 78.

5 “Por ser uma concepção derivada de uma perspectiva da economia da informação, o conceito de

transparência pressupõe o cidadão como um consumidor de informação, cuja ação pública se baliza em uma concepção privada de bens.” Cf. FILGUEIRAS, ibid., p.77.

6 Em 1995, a Secretaria de Administração Federal cria o Ministério de Administração Federal e

Reforma do Estado (MARE) por meio da Medida Provisória Nº. 813/95, convertida em lei apenas no ano de 1998.

7 “Enquanto a administração pública burocrática foi criada dentro de um Estado liberal mas

não-democrático, e estava preocupada com controles rígidos, a reforma da gestão pública é impensável sem democracia. A autonomia que o administrador público assume, a possibilidade de tomar decisões em lugar de simplesmente executar a lei, é controlada a posteriori por mecanismos de responsabilidade gerencial, em particular pelo mecanismo de responsabilidade social que envolve pressão por mais transparência (...).” Cf. BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. O modelo estrutural de gerência pública. Rio de Janeiro: Revista de Administração Pública, 42 (2), 2008, p.402.

(16)

público, ela traduz o potencial de um governo gerir-se, tomar decisões e promover políticas sólidas de interesse coletivo9.

Assim, ao modificar o seu perfil administrativo10, o Brasil passa a aplicar a

descentralização, a liberdade e a flexibilidade no seio da Administração Pública, o que submete o agente estatal ao efetivo controle sobre os atos por ele praticados e à obrigatoriedade da prestação de contas. De tal modo que a publicização dos atos públicos não é suficiente para consolidar a fiscalização social que permite a efetivação da cidadania democrática. Leciona Regis Oliveira:

“Diferentemente do comportamento particular em que a conduta pode ser censurada pela sociedade ou por entes privados, a transparência identifica a seriedade do agente e possibilita que a sociedade possa exercer controle. Na captação de recursos e no destino as suas finalidades, deve haver a imprescindível publicidade para que se dê transparência ao exercício da função, permitindo o controle. Assim, publicidade, transparência e controle andam juntos. Cada qual identificando uma etapa do procedimento administrativo-financeiro e possibilitando que haja não só o controle interno e hierárquico, mas também o controle social.” 11

Ademais, o legislador é claro em dar prioridade ao termo transparência para expressar sua intenção de promover o acesso às informações financeiras produzidas no âmbito público. Conforme, observa-se:

“Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos."12

Nesse sentido, a publicidade constitucional deve ser entendida, na sua acepção mais ampla, como instrumento que compele o comportamento confiável do agente público, permite com que o cidadão mensure a compatibilidade da decisão

ed. São Paulo: Atlas, 2003. 256 p. apud PLATT NETO et al. Publicidade e Transparência das Contas Públicas: obrigatoriedade e abrangência desses princípios na administração pública brasileira. Belo Horizonte: Contabilidade vista e revista, v. 18, n.1., 2007, p. 81.

9 BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. O modelo estrutural de gerência pública. Rio de Janeiro: Revista

de Administração Pública, 42 (2), 2008, p.400.

10 São expoentes do processo a implementação do MARE (Cf. nota de rodapé nº. 6) e a aprovação

da Emenda Constitucional Nº. 19 de 1998.

11 OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 4ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2011, p. 122.

12 Original sem marcações. Grifo nosso. Cf. BRASIL. Planalto. Lei Complementar. Nº. 101 de 2000.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm>. Acesso em 03 de julho de 2013.

(17)

administrativa representada pelo ato executado e que se muna de provas para demandar a responsabilização diante de um comportamento impróprio.

A transparência é, portanto, ferramenta que permite o controle social sobre o setor público, que caminha em complemento à publicidade e à accountability e preza pela diminuição de “assimetrias informacionais”13 a fim de otimizar a gestão

pública14.

1.3 – A consciência do contribuinte quanto ao seu papel político e o desenvolvimento do Estado Financeiro

A percepção sobre a participação do contribuinte na constituição do poder público transformou-se ao longo do aprimoramento da filosofia política, e ao mesmo tempo que modifica o perfil do Estado Financeiro, corrobora para a institucionalização de garantias ao cidadão quanto à gestão dos recursos coletivos.

Efetivamente, saímos de um estágio de submissão do indivíduo ao patrimônio do príncipe à época contemporânea, período em que se evidencia uma preocupação coerente do cidadão quanto à atividade financeira do Estado.

A proposta a ser desenvolvida abaixo foi recortada em dois tópicos, com objetivo de expor os três períodos principais da cronologia do Estado Financeiro, que, segundo o professor Ricardo Lobo Torres, são o Estado Patrimonial, Fiscal e Estado Democrático e Social Fiscal.

O intuito almejado é explorar o contexto histórico que justifica o aparecimento de demandas políticas características do Estado Democrático de Direito, sobretudo no sentido de alocar a legitimidade e eficácia do princípio da transparência dentro dessa perspectiva.

13 STIGLITZ; Joseph E. On Liberty, the Right to Know, and Public Discourse: The Role of

Transparency in Public Life . Oxford: Oxford Amnesty Lecture, 1999. 31 p. apud FILGUEIRAS, Fernando. Além da Transparência: Accountability e Política da Publicidade. São Paulo: Revista Lua Nova, 2011, p. 75.

14 “Ainda sob a perspectiva de Stiglitz: “Greater openness can be justified on instrumental grounds, as

means to ends—ends like reducing the likelihood of the abuse of power. Greater openness is an essential part of good governance.” – “A maior abertura do poder pode ser justificada, sob uma ótica instrumental, como maneira de se alcançar os fins – fins como a redução da probabilidade de abuso de poder. Essa maior abertura é parte essencial de uma boa governança.” V. STIGLITZ; Joseph E. On Liberty, the Right to Know, and Public Discourse: The Role of Transparency in Public Life . Oxford: Oxford Amnesty Lecture, 1999. p. 27. Tradução nossa.

(18)

1.3.1 – Do Estado Patrimonial ao Estado Fiscal

Iniciaremos a análise proposta pelo Estado Patrimonial que surge na Idade Média e foi definido com tal nomenclatura por Ricardo Lobo Torres, devido à:

“(...) sua dimensão principal que lhe marca o próprio nome – consiste em se basear no patrimonialismo, ou sejam em viver fundamentalmente das rendas patrimoniais ou dominiais do príncipe, só secundariamente se apoiando na receita extrapatrimonial de tributos.”15

Explica o professor que, no período, a tributação era fonte de renda secundária para organização e continuidade das atividades que se sucediam nos feudos. Exigia-se o pagamento de contribuições com objetivos pontuais, como por exemplo, para permitir o uso das imediações dos nobres e a permanência nas suas propriedades. Em complemento às lições de Lobo Torres, ilustra Regis de Oliveira:

“Os principais tributos então cobrados eram: a) a corveia, ou seja, o trabalho forçado dos servos nas terras senhoriais, para preservar o castelo, muralhas, etc.; b) a talha, pagamento devido pela proteção e incidia sobre parte da produção; c) banalidades, pelo uso do forno, do moinho, da forja, da prensa de olivas e uvas; d) taxa de casamento, no caso do ervo casar-se fora do domínio; e) mão-morta, devido em decorrência de herança, uma vez que o senhor é o herdeiro e para ficar com bens que já eram seus, o servo paga; f) o dízimo, 10% dos rendimentos, devidos à Igreja; g) péage (pedágio), pelo uso dos caminhos do senhor; h) gabela, taxa sobre o sal, instituído em 1.341; i) chévage, imposto por cabeça sobre servos e alforriados etc.”dentre outros”.”16

Na Idade Média, o regime de vassalagem caracterizava-se pela submissão dos servos; a detenção do domínio territorial, dos meios de produção pelos senhores, e a existência de uma rígida ideologia que embasava o poder instituído. O papel político principal estava centralizado na figura do soberano, que o exercia por “investidura divina”. Além disso, o fato de o tributo ser anexado ao patrimônio do príncipe de forma acessória contribuía para a falta de legitimidade política do povo, especialmente, quanto às questões financeiras do governo.

Devido à necessidade de custear as expensas públicas e da nobreza, gradativamente, os encargos sobre a população foram aumentados e o assentimento absoluto não teria continuidade. Em 1215, com a implementação da Magna Carta inglesa, foi cunhada a máxima democrática: “no taxation without

15 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro. 18. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 8. 16 OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

(19)

representation”17. A expressão traduz a demanda coletiva por legitimidade

parlamentar fundamentado no pagamento de tributos aos nobres. É o embrião da conscientização sobre a conexão que existe entre o tributo pago e o financiamento do poder político vigente.

Segundo Lobo Torres, o Estado de Polícia sucede o Estado Patrimonial e “é

modernizador, intervencionista, centralizador e paternalista18. Em termos de

progresso quanto ao desenvolvimento de uma filosofia do contribuinte, o período apresenta características muito semelhantes àquelas praticadas no Estado Patrimonial, pois a finalidade do poder era ainda a consecução da felicidade geral, a forma de governo era monárquica e a concentração de renda visava à manutenção do patrimônio do príncipe. Em conseqüência, não há que se adentrar no exame minucioso dessa fase.

Em seguida, o autor demarca o aparecimento do Estado Fiscal, compatível com a filosofia liberal, contundente em assegurar a liberdade como elemento essencial de todo ser humano. Sob o aspecto político, a definição do papel do Estado amadurece, deixa de ser indexada ao temor religioso e passa a ser defendido o Estado como ente constituído para que o cidadão alcance o fim ao qual lhe foi colimado.

No período, valida-se a força do conceito de legitimidade como expressão máxima da vontade coletiva. Nesse sentido, Locke traça os limites da dinâmica existente entre governo e “subordinado”:

“(...) todo poder confiado como um instrumento para se atingir um fim é limitado a esse fim, e sempre que esse fim for manifestamente negligenciado ou contrariado, isto implica necessariamente na retirada a confiança, voltando assim o poder para as mãos daqueles que o confiaram, que podem depositá-lo de novo onde considerarem melhor para sua proteção e segurança".”19

Alinhada ao princípio descrito no trecho supracitado, mas voltada à perspectiva do Direito Financeiro20, a Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão, firmada em 1789, apresenta um grande avanço em termos de legitimidade

17 OLIVEIRA, ibid., p. 83.

18 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro. 18. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 8. 19 LOCKE, John, Dois Tratados sobre o Governo. (Trad. Julio Fischer). São Paulo: Martins Fontes,

1998, v. II, § 149, p. 518.

20 OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

(20)

da atividade fiscal do Estado. O documento regulamenta nos seus artigos 13 e 14 tanto a necessidade de instituir-se a tributação quanto a liberalidade e o controle que deve ser exercido pelo povo no seu exercício. Confira-se:

“Artigo 13º- Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum, que deve ser repartida entre os cidadãos de acordo com as suas possibilidades.

Artigo 14º- Todos os cidadãos têm o direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, a necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a colecta, a cobrança e a duração.”21

E, por fim, pelo viés econômico, tanto Ricardo Lobo Torres como Regis de Oliveira afirmam que a base para o pleno desenvolvimento do Estado Fiscal foi o capitalismo e a própria economia liberal que multiplicou as possibilidades de obtenção da receita pública, seja por meio de empréstimos públicos financiados com a renda arrecadada ou pela da dinamização da base tributária e aperfeiçoamento da burocracia fiscal. Lobo Torres assevera que:

“Com o Estado Fiscal se aperfeiçoam os orçamentos públicos, substitui-se a tributação do campesinato pela dos indivíduos, mimiza-se a intervenção estatal, tudo o que representa uma nova Constituição Financeira.”22

Assim, compatível à sofisticação das teorias do Estado e dos modelos econômicos desenvolvidos, vai sendo definida a topografia de um Direito Financeiro que percebe o contribuinte como cidadão, a quem o poder político constituído deve servir.

1.3.2 – Do Estado Fiscal e seus desdobramentos ao Estado Social Fiscal

Não é cabível esgotar o estudo sobre o Estado Fiscal tendo em vista apenas o que foi exposto acima. O professor Ricardo Lobo Torres avança na análise e afirma que seu início é datado do século XIX e sua duração prolonga-se até o fim do

21 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. São

Paulo: Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php>. Acesso em 08 de agosto de 2013.

(21)

século XX, desdobrando-se, nesse período, com três nomenclaturas distintas, equivalentes às qualidades econômicas e políticas demonstradas por ele.

O aprofundamento é relevante e as marcações propostas estão dispostas em sua obra da seguinte forma: em primeiro lugar, é colocado o Estado Fiscal Minimalista; em segundo lugar, o Estado Social Fiscal e, por fim, o Estado Democrático Social e Fiscal.

O primeiro marco, já denominado anteriormente como Estado Fiscal Minimalista, nasce com o advento das doutrinas liberais de Adam Smith, no término do século XVIII e tem duração estendida até os primeiros anos do século XX. A época foi marcada pela consolidação da filosofia burguesa. Enquanto a classe em ascensão afirmava sua capacidade de ruptura com os dogmas sociais pelo fortalecimento do poder do capital, o Estado via sua importância diminuída em proporção à redução das suas atribuições.

Uma vez que não era mais responsável pela promoção da felicidade e tampouco possuía despesas excessivas, restaram como suas prerrogativas: o

“exercício do poder de polícia, da administração da justiça e da prestação de uns poucos serviços públicos”23 e, desse modo, houve a transferência do poder político

do Estado para a burguesia. Ideologicamente, essa transformação significou uma “tomada” de consciência no sentido de identificar o indivíduo como verdadeiro construtor e mantenedor das estruturas de governo e, portanto, capaz de fiscalizar as atividades públicas que a eles estavam subordinadas.

Posteriormente, ascende o Estado Social Fiscal, com a consolidação da doutrina do Welfare State, cujo dever baseia-se não somente em promover e garantir as liberdades individuais, mas proporcionar qualidade de vida entre os cidadãos por meio da renda auferida pela tributação. A decisão de implementá-lo não é desinteressada e tem cunho político extremamente forte arraigado à sua formação.

Aproximadamente na metade do século XX, a expansão da doutrina comunista era considerada uma ameaça ao capitalismo, bem como aos ideais democráticos e a geopolítica mundial era bipolar. Nessa corrida, a função dos países capitalistas era comprovar ao mundo como o regime era próspero e preocupado

(22)

com o bem estar coletivo, apesar da sua base ideológica estar firmada na obtenção do lucro e acumulação de riqueza.

Dessa forma, o Estado consolida-se como responsável pela promoção de educação, saúde, transporte públicos, além da regulamentação da economia, garantia do pleno emprego e das condições para prosperidade individual.

Todavia, a concentração de um grande número de atribuições como de sua competência provocou o desgaste do ente. Logo, a partir da constatação da sobrecarga da máquina pública, ocorre o enfoque na corrente política neoliberal. Desse modo, propõe-se a revisão conceitual da sua finalidade para evitar a falência e garantir a longevidade da instituição.

A trajetória dessa transformação culmina com a Crise do Petróleo, considerada como um dos primeiros grandes abalos na economia mundial após o

Crash de 1929. O panorama geral apresentava a seguinte conjuntura: com a

estagnação da economia, o contribuinte não possuía meios para gerar renda e garantir o financiamento de seu próprio bem estar. Ou seja, vítima de um complicado momento financeiro, o cidadão buscava no Estado a complementação para insuficiência dos seus recursos, que, por sua vez, tampouco disponibilizava de reservas para lastrear a demanda.

Assim, visando a redução da oneração excessiva, o Estado neoliberal ganha proporção no cenário político mundial. Abandona-se a ilusão de que os recursos públicos sejam infinitos e passa-se a se preocupar com custo de funcionamento da engrenagem estatal e abrangência das suas atribuições.

Nesse sentido, após os colapsos econômicos enfrentados no início da década de 70, torna-se reforçado o dever de contraprestação eficaz do Estado quanto ao uso e disponibilidade do patrimônio público, a idoneidade no seu tratamento e gerenciamento, bem como a necessidade de vigilância das estruturas internas da Administração. De acordo com o que certifica o professor Luiz Jungstedt:

“(...) a intervenção do Estado na ordem econômica, em razão do avanço do neoliberalismo no final do século XX passou a limitar-se ao controle de sua execução, realizada pela iniciativa privada”.24

24 JUNGSTEDT, Luiz Oliveira Castro. Direito Administrativo – Parte I – Estado Gerencial Brasileiro.

(23)

Portanto, o que se exige do Estado Democrático e Social Fiscal é que ele se disponha a servir à coletividade, sem deslizes na gestão do orçamento público. A sua atuação deve ser executada de forma transparente em prol do aproveitamento sadio dos bens coletivos e visando à otimização da capacidade de retorno do tributo ao contribuinte. Este que, por sua vez, demanda por meios eficazes para proceder à fiscalização da atividade governamental.

1.4 – Transparência fiscal e interesse público

Considerando a importância que a legitimidade popular passa a desempenhar para justificar o poder constituído, ocorre o aprimoramento jurídico, administrativo e econômico do Estado no sentido de atender ao interesse público como a finalidade máxima da Administração.

Na atividade financeira, a legitimação é concretizada pela transparência a ser exigida no trato dos recursos públicos, que vai possibilitar o controle sobre a sua gerência. O desvio do recurso do seu empenho natural consiste em violação à finalidade principal do poder, descaracterizando a investidura do agente público no cargo que exerce.

Há de se contar também que, em decorrência do contexto neoliberal, houve a descentralização, flexibilização e admissão da iniciativa privada nas políticas de governo, o que torna ainda mais urgente existência do critério do controle da coletividade sobre a atividade do gestor público.

Não obstante dizer que o princípio da transparência é consolidado pelo acesso à informação. Não há sob qualquer hipótese, Estado transparente se o seu exercício financeiro é opaco ou translúcido, ao passo que a Administração Pública deve oferecer à coletividade documentos que demonstrem a condição do seu patrimônio.

Em acréscimo, é fundamental defender que os dados disponibilizados devem ser recebidos de forma integral, atual, compatível e real. Seria inócuo apresentar, por exemplo, o balanço patrimonial de um ente público se esse não traduz uma análise verdadeira dos fatos geradores ocorridos dentro daquele ano fiscal.

Igualmente, a transparência fiscal ganha qualificação de instrumento para efetivação da cidadania financeira. A sua violação implica o cerceamento de direitos

(24)

individuais, além de trazer outras conseqüências extremamente nocivas à credibilidade da Administração. O patrimônio público deve ser gerido com idoneidade e responsabilidade e para fiscalizar o procedimento, é preciso que o próprio Estado se abra à sociedade por meio do fornecimento de informações amplas, compreensíveis, tempestivas e precisas ao cidadão, que é titular da coisa pública.

(25)

2.1 – CAPÍTULO II – DAS RELAÇÕES ENTRE DIREITO E CONTABILIDADE

Dentro da estrutura textual proposta a seguir, primeiramente, serão fixados os limites do interesse do Direito em aproximar-se da Contabilidade e, por conseguinte, os benefícios para a sociedade oriundos dessa perspectiva interdisciplinar.

Em seguida, pretendemos demonstrar que a transparência só é viabilizada quando da adoção da técnica adequada e, para isso, elencaremos os possíveis métodos de registro propostos pela ciência contábil e suas implicações práticas. Investigamos na literatura da matéria suporte para elucidar, principalmente, as conseqüências reais dos procedimentos assumidos.

Posteriormente, considerando a admissão do regime misto para efetuar a contabilidade nacional, previsto por lei e adotado pela Administração Pública durante praticamente todo período do seu implemento no Brasil, buscaremos contrapor seu antigo posicionamento aos princípios contábeis existentes e justificar pelo viés da própria disciplina a rejeição ao regime de caixa para suprir a finalidade informativa da ciência.

Ao final, faremos a análise de três dos quatro subsistemas de contas públicas presentes na Lei 4.320/64 e reiterados na LRF com intuito de demarcar os objetivos de cada um e a pertinência que lhes cabe o atual regime contábil. Optamos por seguir o modelo de contas estabelecido em lei, apesar de regulamentação da Secretaria do Tesouro Nacional, por meio da Portaria nº 665/2010, atualizar a configuração dos modelos de demonstrativos previstos pela legislação.

Em conclusão, tendo em vista a multiplicidade de demonstrações financeiras e suas distintas finalidades, observaremos que a visualização precisa do patrimônio público só será viável quando, ao menos, o sistema patrimonial submeter-se ao método da competência, que atende efetivamente ao princípio da transparência.

2.2 – Direito e Contabilidade em prol da transparência fiscal

A ciência contábil tem como premissa o monitoramento dos fatos que envolvam a realidade econômica de uma determinada instituição, ela promove a

(26)

proteção ao patrimônio por meio das informações que registra. Segundo Regis Oliveira, “A ciência das finanças é antes de tudo informativa.”25

A previsão do NBC (Normas Brasileiras de Contabilidade) T 1, seção 1.1 aprovada pela Resolução 78526 do Conselho Federal de Contabilidade27 delibera

que:

“a contabilidade, na sua condição de ciência social, cujo objeto é o patrimônio, busca, por meio da apreensão, da quantificação, da classificação, do registro da eventual sumarização, da demonstração, da análise e relato das mutações sofridas pelo patrimônio da Entidade particularizada, a geração de informações quantitativas sobre ela, expressas tanto em termos físicos quando monetários” 28

Quanto à sua aplicabilidade ao setor público, a Resolução Número 1.128/08, que dispõe sobre o NBC T 16, seção 4, delimita como seu propósito:

“ (...) fornecer aos usuários informações sobre os resultados alcançados e os aspectos de natureza orçamentária, econômica, financeira e física do patrimônio da entidade do setor público e suas mutações, em apoio ao processo de tomada de decisão; a adequada prestação de contas; e o necessário suporte para a instrumentalização do controle social.”29

25 OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2011, p. 95.

26 A resolução foi revogada sucessivas vezes e o NBC substituído. A citação da seção é essencial,

entretanto, porque mensura com precisão o objetivo da Contabilidade.

27 Sobre o Conselho Federal de Contabilidade: “(...) criado pelo Decreto-Lei nº 9.295, de 27 de maio

de 1946, é uma Autarquia Especial Coorporativa, dotado de personalidade jurídica de direito público. Sua estrutura, organização e funcionamento são estabelecidos pelo Decreto-Lei nº 9.295/46 e pela Resolução CFC nº 960/03, que aprova o Regulamento Geral dos Conselhos de Contabilidade. O CFC é integrado por um representante de cada estado e mais o distrito federal, no total de 27 conselheiros efetivos e igual número de suplentes – Lei nº 11.160/05 -, e tem, dentre outras finalidades, nos termos da legislação em vigor, principalmente a de orientar, normatizar e fiscalizar o exercício da profissão contábil, por intermédio dos Conselhos Regionais de Contabilidade, cada um em sua base jurisdicional, nos Estados e no Distrito Federal; decidir, em última instância, os recursos de penalidade imposta pelos Conselhos Regionais, além de regular acerca dos princípios contábeis, do cadastro de qualificação técnica e dos programas de educação continuada, bem como editar Normas Brasileiras de Contabilidade de natureza técnica e profissional.” Disponível em sítio oficial, <http://portalcfc.org.br/o_conselho/>, acessado em 29 de julho de 2013.

28 Cf. CFC. NBC T, Seção 1.1. In. CFC. Resolução 785 de 1995. apud CONTI, José Maurício et al. A

Lei 4.320/64 Comentada. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 282.

29 Cf. CFC. NBC T16, Seção 4. In. CFC. Resolução 1.282 de 2008. apud ZARTH, Samantha Braga. A

aplicação integral do regime de competência a contabilidade pública brasileira segundo as normas brasileiras de contabilidade pública aplicadas ao setor público. Porto Alegre: 2010, 30 p. Tese (Graduação) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.

(27)

Ela é, portanto, essencial para o controle da atividade orçamentária do Estado, pois o seu emprego adequado permite a análise dos procedimentos selecionados pelo poder público para destinação e obtenção das receitas.

Através dos documentos financeiros gerados pelos contabilistas, pode-se revelar a origem dos recursos de um determinado exercício financeiro, a sua aplicação, bem como o histórico de fatos geradores que alteraram a configuração patrimonial da entidade. Esses elementos combinados e sob exame técnico revelam se houve ou não coerência da Administração ao gerenciar os bens coletivos.

Considerando as demandas do interesse público inseridas no Estado Democrático e Social Fiscal30, o domínio da Contabilidade torna-se prerrogativa para

viabilização do princípio da transparência na atividade administrativa, pois sem informação confiável, não se obtém efetivamente a publicidade, extraída do art. 37 de nossa Carta Magna. Acrescenta Iudícibus:

“Todo trabalho de acumulação de registros e dados sistematicamente classificados que constitui a rotina contábil, tem por finalidade inserir os dados colhidos em relatórios contábeis, os quais devem ainda ser interpretados, no sentido contábil, por profissional habilitado, a fim de proporcionar à administração e aos demais interessados informações relevantes para as tomadas de decisões.”31

Assim, a aproximação entre o Direito e a Contabilidade vem no sentido de complementar a perspectiva que o jurista tem da realidade produzida pela lei, alinhando-o à prática e provendo-o de embasamento técnico que possibilite a guarda de direitos que possam estar sendo violados sob a escusa do

30 “En cuanto pensamos que los entes públicos son sujetos realizadores de una actividad consistente

en la registración mediante un sistema de cuentas, de la actividad financiera, advertimos que tal acción es administrativa, esto es, realizada por la Administración pública y más concretamente por una parte de ella, la Administración financiera, cuya acción , en un Estado de Derecho esta sometida a normas jurídicas que encauzan y dirigen el actuar de la Administración con el desígnio de que ésta realice los fines de interes general que el ordenamiento jurídico la señala. Ello quiere decir que la actividad contable es una actividad normatizada, o sea, la que está regulada por normas que constituyen el ordenamiento jurídico de la Contabilidad pública.” – “Enquanto pensamos que os entes públicos são sujeitos realizadores de uma atividade que consiste no registro mediante um sistema de contas da atividade financeira, advertimos que tal ação é administrativa, isto é, realizada pela Administração Pública e, mais concretamente, por uma parte dela, a Administração Financeira, cuja ação, em um Estado de Direito, está submetida às normas jurídicas que encalçam e dirigem o agir da Administração com o desígnio de que esta realize os fins de interesse geral que o ordenamento jurídico assinala. O que quer dizer que a atividade contábil é uma atividade normatizada, ou seja, está regulada por normas que constituem o ordenamento jurídico da Contabilidade Pública.” Cf. GUERRERO, Luis Corral. Contabilidad pública y derecho. Madrid: Revista Española de Financiación, v.I, n. 02, maio/agosto, 1972, p. 317. Tradução nossa. Grifo nosso.

(28)

desconhecimento. Caminha bem José Maria Garreta Such quando aponta duas razões principais pelas quais existe a comunicação entre as disciplinas, afirma:

“Em primeiro lugar, a garantia da informação que, por meio da contabilidade, deve ser dada aos que tem direito a ela. Nesta linha, o direito contábil deve regular o conteúdo desta informação, a forma de expressá-la e a valoração dos fatos e direitos expostos pela mesma. Em segundo lugar, a garantia dos legítimos interesses de possíveis titulares em conflito (empresários, credores, consumidores, trabalhadores e o Estado)”32

A relação é bilateral, da mesma forma que o Direito precisa de amparo da técnica e dos aspectos científicos abrigados na Contabilidade, o contador também faz uso do ordenamento jurídico para executar os procedimentos habituais da sua profissão. Em se tratando do viés privado dessa comunicação, por exemplo, a Receita Federal exige do contribuinte o acesso às informações precisas do seu patrimônio e o particular busca na legislação de Imposto de Renda, Soluções de Consulta e Instruções Normativas, dentre outros instrumentos, as orientações para bem satisfazer às requisições do Fisco.

No âmbito público, a Contabilidade prevalece por sua própria finalidade como aliada do cidadão. Conforme exposto, a ciência tem cunho informativo: proporciona ao usuário a fotografia das disponibilidades do Estado e está vinculada por sua natureza ao provimento de informações “fidedignas, tempestivas e

compreensíveis”33 ao usuário que é titular do patrimônio público e, nessa qualidade,

tem o direito de verificar a quantificação exata do que, em um sentido neoliberal, lhe pertence.

No Brasil, a produção teórica sobre o tema é escassa. Sob uma perspectiva mais ampla, Espanha e França são expoentes na área. Os franceses dedicaram-se ao estudo da temática por razões históricas. No país, o setor administrativo é muito bem desenvolvido e possui contencioso exclusivo34, o que gera uma atenção mais profunda sobre tais campos comuns de conhecimento. Na Espanha, prevalece o

32 RODRIGUEZ, Carlos Cubillo apud CONTI et al. A Lei 4.320/64 Comentada. 2. Ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2010, p. 291. Grifo nosso.

33 CARVALHO, Deusvaldo; CECCATO, Marcio. Manual Completo de Contabilidade Pública. São

Paulo: Elsevier, 2011, p. 8.

34 O sistema de jurisdição francês é distinto do brasileiro. No país, os tribunais administrativos podem

criar coisa julgada, com possibilidade de recurso à via judicial apenas em grau de exceção. Até a ascensão do Direito Constitucional, o Direito Administrativo era a matéria com maior evidência nas faculdades de Direito. Sobre o tema: Julgar nos Estados Unidos e na França, de Antoine Garapon.

(29)

entendimento pelo enquadramento do Direito da Contabilidade dentro do Direito Financeiro35, como uma disciplina autônoma capaz de habilitar o estudante a

expandir a compreensão que possui tanto do ato/fato contábil quanto da construção legislativa sobre o fenômeno econômico.

Logo, o que se pode é afirmar é que a leitura da informação contábil pelo jurista o proverá de instrumentos para avaliar se a atividade administrativa possui efetiva harmonia com sistema normativo tributário e financeiro, bem como com os princípios constitucionais perseguidos no contexto do Estado Democrático de Direito. Essa leitura, no entanto, há de ser completa: questionando-se os métodos selecionados para a produção das demonstrações exigidas por lei, o próprio conteúdo técnico do documento em análise e seus efeitos reais no patrimônio público. A partir do diálogo com a Contabilidade, é possível que a sociedade tenha a garantia de que o administrador público cumprirá o seu dever de fornecer informações íntegras sobre o destino dos recursos coletivos e, assim, alcançar a transparência fiscal, prevista no art. 48 da LRF.

2.3 – O regime contábil no Brasil

O método do registro de contabilidade aplicado ao setor público foi o misto até o ano de 2008, conforme disposição do art. 35 da Lei 4.320/64 e, por ausência de regulamentação quanto ao procedimento de competência do órgão central de contabilidade da União, conforme o art. 50, § 2º da LRF36 do mesmo dispositivo, não

se aplicou o regime de competência às finanças públicas.

Sendo assim, a Contabilidade Pública foi procedida pelo regime misto até 2010, quando a Secretaria do Tesouro Nacional expede a Portaria Conjunta STN/SOF nº. 3/200837, ratificando o entendimento do Conselho Federal de

35 GUERRERO, Luis Corral. Contabilidad pública y derecho. Madrid: Revista Española de

Financiación, v.I, n. 02, maio/agosto, 1972, p. 320 apud CONTI et al. A Lei 4.320/64 Comentada. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 290/291.

36 “Art. 50, § 2o A edição de normas gerais para consolidação das contas públicas caberá ao órgão

central de contabilidade da União, enquanto não implantado o conselho de que trata o art. 67.” BRASIL. Planalto. Lei Complementar. Nº. 101 de 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm>. Acesso em 03 de julho de 2013.

37 SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL; SECRETARIA DO ORÇAMENTO FEDERAL. Manual

de Despesa Nacional de 2009. Disponível em:

<http://www.sefaz.al.gov.br/legislacao/financeira/federal/MANUAL_DESP_NACIONAL.pdf>. Acesso em 10 de agosto de 2013.

(30)

Contabilidade (CFC) no sentido de adotar o regime de competência em sua integralidade para o setor.

Em seguida, foi emitido o 2º Manual de Procedimentos de Contabilidade Aplicada ao Setor Público trazendo as normas para alteração do regime e prazos para que os respectivos entes federativos promovessem a modificação. No entanto, o tempo estipulado era curto e, passaram a prevalecer os prazos das Portarias STN nº 467/2009 e 664/201038 para a efetivação do implemento objetivado. Assim ficou

estabelecido pela última:

“Art. 7º As Partes IV (Plano de Contas Aplicado ao Setor Público) e V (Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público) deverão ser adotadas pelos entes de forma facultativa, a partir de 2011 e de forma obrigatória a partir de 2012 pela União, pelos Estados e Distrito Federal e de 2013 pelos Municípios.”

Observa-se que a Contabilidade Pública nacional caminha em direção à execução das melhores práticas em âmbito de registro de Patrimônio, tendo por finalidade atender às demandas por transparência e controle social do interesse público e, alinhando-se aos procedimentos mais adequados já aplicados internacionalmente, garantir a moralidade no trato dos recursos públicos.

2.3.1 – Definição de regime contábil

Enveredando pelas rotas da doutrina financeira, introduziremos o conceito de registro e regime contábil com a finalidade de esclarecer o significado dos termos e quais são suas implicações práticas para o funcionamento da Contabilidade.

O registro é o lançamento do evento que modifica ou modificará o patrimônio do ente analisado. O procedimento de contabilização consiste na transposição do ato/fato contábil para os documentos que agenciam o monitoramento da situação patrimonial de uma certa entidade. Deve-se ter em mente que a função do contador

38 “Art. 2º A Parte II do MCASP – Procedimentos Contábeis Patrimoniais, aborda os aspectos

relacionados ao reconhecimento, mensuração, registro, apuração, avaliação e controle do patrimônio público, adequando-os aos dispositivos legais vigentes e aos padrões internacionais de contabilidade do setor público. Parágrafo único. As variações patrimoniais serão reconhecidas pelo regime de competência patrimonial, visando garantir o reconhecimento de todos os ativos e passivos das entidades que integram o setor público, conduzir a contabilidade do setor público brasileiro aos padrões internacionais e ampliar a transparência sobre as contas públicas”. SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL. Portaria nº. 664 de 2010. Disponível em: <http://www3.tesouro.fazenda.gov.br/legislacao/download/contabilidade/Port_664_2010.pdf>. Acesso em 11 de agosto de 2013.

(31)

é de análise da realidade financeira do patrimônio que servirá de base para a produção de informação, cujo objetivo será o de auxiliar o usuário no processo de tomada de decisão racional39.

Quando, por exemplo, o juiz remete os autos de um processo ao contador para solicitar seus cálculos, solicita àquele profissional que examine a realidade fática e retire dela a quantificação justa do montante a ela atribuído. A partir da avaliação obtida é que o magistrado sentenciará, pois, nessas circunstâncias, o contador cumpriu com o objetivo da ciência à qual serve e proveu a informação precisa, confiável e temporal concernente ao episódio em questão.

O regime adotado é a classificação do momento em que o lançamento será registrado nos documentos contábeis. Assim, o acontecimento real deverá ser contabilizado de acordo com dois critérios aceitos pela doutrina: um, quando do sua efetiva liquidação ou, dois, pela realização do fato gerador. Em outras palavras, o registro ocorrerá pelo método de caixa ou pela competência que se vai explorar com maior grau de profundidade em seguida.

“A maneira como os ingressos e os dispêndios de um determinado exercício financeiro serão registrados no orçamento dependerá do regime contábil a ser acolhido pelo país, o que significa que, de acordo com o sistema adotado nem toda receita ou despesa fará parte daquele exercício. Com a finalidade de compreender essa questão, importante lembrar que existem dois regimes existentes: o de caixa e o de exercício.”40

Logo, considerando um determinado exercício financeiro, é necessário que o contador proceda ao registro daquele evento que constará dentro da documentação contábil referente àquele período ou ao futuro, conforme o regime adotado pelo profissional. No setor privado, alguns critérios legais vinculam a sua atuação ao regime de competência e, no público, o Brasil sofreu alteração em sede de Portaria da Secretaria do Tesouro Nacional41, a fim de uniformizar a competência como

39 IUDÍCIBUS, Sérgio. Teoria da Contabilidade. 4. Ed. São Paulo: Editora Atlas, 1994, p. 21 apud

SILVA, Luiz Ivan dos Santos. Contabilidade : objetivo, objeto e funções. Feira de Santana: Sitientibus, n. 38, 2008, p. 95.

40 CONTI, José Maurício et al. A Lei 4.320/64 Comentada. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2010, p. 130.

41 Enquanto não é criado o Conselho que determina a LRF, art. 50, § 2º e art. 67, será atribuída à

autoridade contábil máxima do país competência de editar, por meio dos instrumentos cabíveis, normas para o regulamento dos procedimentos contábeis a serem adotados. Aqui cabe uma crítica à disposição: as determinações da STN não têm caráter definitivo por conta de serem previstas por portarias e regulamentos, que são atos administrativos com menor grau de segurança jurídica do que as leis. Considerando que a adoção do regime de competência no setor público é regra de interesse

(32)

método de contabilização a ser implementado, quando antes era reconhecido o misto.

Posteriormente, definiremos os regimes de contabilidade existentes (caixa, competência e misto) e quais são os efeitos práticos atribuídos à sua aplicação. Tendo como preocupação principal a integridade da informação produzida, a análise não deixará de abordar as regras técnicas do procedimento, mas seu foco principal incidirá sobre o que diz a doutrina especializada da ciência contábil quanto à vinculação que ele apresenta com a finalidade informativa da Contabilidade.

2.3.2 – Regime de Caixa

O regime de caixa permite a contabilização do fato que produzirá a transformação nas condições patrimoniais da entidade apenas quando da sua efetiva consolidação e não da mera previsão de sua ocorrência. Por ele, a contração de um empréstimo, por exemplo, a ser pago no próximo exercício financeiro não terá impacto naquele ano corrente. O registro do débito em conta de despesa será consolidado apenas no pagamento da obrigação devida. Ou seja, tanto receitas quanto despesas serão apuradas quando ocorrer a “passagem” do montante pelo caixa da companhia.

O princípio não é admissível na contabilidade privada, pois ao ser feito o registro apenas da efetivação do fato gerador, a informação perde precisão por não serem atendidos os requisito da tempestividade e oportunidade42. Significa dizer que a contabilidade da entidade será incompatível com sua realidade econômica porque alguns ativos e passivos realizáveis a longo prazo não estarão presentes na documentação contábil por ela produzida.

O implemento deste regime na totalidade das contas de uma entidade produz apenas um fluxo de caixa, cuja função é, segundo os ensinamentos contábeis, somente quantificar os recursos ou prejuízos que a entidade teve em um período de tempo. Nesse sentido:

público, é preciso refletir sobre a necessidade de se atribuir maior rigidez ao posicionamento da STN, a partir da edição de lei que garanta-o expressamente.

42 CARVALHO, Deusvaldo; CECCATO, Marcio. Manual Completo de Contabilidade Pública. São

(33)

“Em termos comparados, o regime de caixa apresenta desvantagens como: a informação tem escopo limitado, não adequado para demonstrar o impacto de transações resultando no fluxo de caixa fora do período corrente do relatório; o regime é incapaz de encontrar as demandas por informações de ativos e obrigações, e o impacto do consumo corrente dos estoques de ativos governamentais, por tipos de transações e áreas; tem foco somente no fluxo de caixa, ignorando outros fluxos que podem também afetar a habilidade governamental de prover bens e serviços no momento atual e no futuro; gera uma limitada transparência em relação ao uso do recurso financeiro na gestão de ativos e obrigações (Diamond, 200243).”44

Apesar de ser reconhecido na qualidade de exceção45, o regime de caixa também não é razoável para as empresas. Como a informação extraída nessas condições é limitada, pouco interessa ao seu usuário e ao administrador obtê-las. Há dois motivos para tanto: o primeiro justifica-se no fato de que o fluxo de caixa não contempla a capacidade de solvência da entidade em caso de falência, o que é negativo em se tratando de uma sociedade anônima cuja segurança informacional é essencial para inspirar a confiança de seus acionistas.

E o segundo diz respeito ao aspecto gerencial da informação contábil: o administrador recorre aos resultados e ao perfil de movimentação das contas apresentados pela empresa para traçar metas de desempenho futuro, definir as estratégias de longo prazo e demarcar a ênfase de atuação que deverá trilhar na gestão da companhia. Logo, o processo torna-se prejudicado quando do implemento deste método porque ele não é capaz de permitir uma análise temporal abrangente do patrimônio.

Com relação à Contabilidade Pública, esses aspectos também devem ser observados. A situação patrimonial dos bens públicos é de interesse geral pois o cidadão possui legitimidade para saber precisamente como estão sendo aplicados os seus recursos, através do registro adequado e minucioso do patrimônio. E, quanto à perspectiva de longo prazo da administração da coisa pública, é dever do gestor gerenciá-lo da forma mais eficiente, tendo em vista não só as decisões de curto, mas as medidas de médio e longo prazo que, se corretamente investidas, proporcionarão desenvolvimento e bem estar futuro ao país.

43 DIAMOND, Jack. Performance Budgeting - is Accrual Accounting Recquired?. International

Monetary Fund (IMF), 2012, p. 17. Verificar quadro 4. Disponível em <http://www.imf.org/external/pubs/ft/wp/2002/wp02240.pdf>. Acesso em 09 de agosto de 2013.

44 AQUINO, André Carlos Busanelli de. Desmistificação do regime contábil de competência. Rio de

Janeiro: Revista de Administração Pública, v. 44, n. 4, 2010, p. 889.

45 O art. 16 da Resolução Nº. 94 do Comitê Gestor do Simples Nacional regulamenta o art. 18, § 4º da

Lei Complementar Nº. 123 de 2006 e concede às pequenas empresas e empresas de pequeno porte o registro dos seus recebimentos pelo regime de caixa.

Referências

Documentos relacionados

O tema proposto neste estudo “O exercício da advocacia e o crime de lavagem de dinheiro: responsabilização dos advogados pelo recebimento de honorários advocatícios maculados

Em Lisboa, e de acordo com os capítulos especiais da cidade levados às Cortes de 1418, tanto os tabeliães do Paço (i.e. os tabeliães do público) como os das Audiências

Notamos, portanto, que desde cedo Eça de Queirós já desenvolvia suas aptidões jornalísticas (apenas com 21 anos, no Distrito de Évora). Em maio de 1870 iniciou a

Apart from the two nuclear energy companies that were strongly hit by the earthquake effects (the Tokyo and Tohoku electric power companies), the remaining nine recorded a

Ainda que a metastização cerebral seja condição rara em caso de neoplasia com localização primária no intestino, em casos de exceção em que tal invasão se verifica por parte

Neste estágio, assisti a diversas consultas de cariz mais subespecializado, como as que elenquei anteriormente, bem como Imunoalergologia e Pneumologia; frequentei o berçário

Estudos sobre privação de sono sugerem que neurônios da área pré-óptica lateral e do núcleo pré-óptico lateral se- jam também responsáveis pelos mecanismos que regulam o

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das