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Artes visuais, loucura e moda : articulações para uma alfabetização estética na residência artística do Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE ARTES

CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS

JÉSSICA DE LIMA TORREÃO CEREJEIRA

ARTES VISUAIS, LOUCURA E MODA: ARTICULAÇÕES PARA UMA ALFABETIZAÇÃO ESTÉTICA NA RESIDÊNCIA ARTÍSTICA DO HOSPITAL

PSIQUIÁTRICO DOUTOR JOÃO MACHADO Natal/RN 2017

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JÉSSICA DE LIMA TORREÃO CEREJEIRA

ARTES VISUAIS, LOUCURA E MODA: ARTICULAÇÕES PARA UMA ALFABETIZAÇÃO ESTÉTICA NA RESIDÊNCIA ARTÍSTICA DO HOSPITAL

PSIQUIÁTRICO DOUTOR JOÃO MACHADO

Memorial Reflexivo apresentado à Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito para a integralização da atividade de Trabalho de Conclusão de Curso II, do Curso de Licenciatura em Artes Visuais.

Orientador: Prof. Dr. Marcos Alberto Andruchak Co-Orientadora: Profa. Dra. Nara Salles

Natal/RN 2017

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JÉSSICA DE LIMA TORREÃO CEREJEIRA

ARTES VISUAIS, LOUCURA E MODA: ARTICULAÇÕES PARA UMA ALFABETIZAÇÃO ESTÉTICA NA RESIDÊNCIA ARTÍSTICA DO HOSPITAL

PSIQUIÁTRICO DOUTOR JOÃO MACHADO

Memorial Reflexivo apresentado à Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito para a

integralização da atividade de Trabalho de Conclusão de Curso II, do Curso de Licenciatura em Artes Visuais.

Aprovado em: ____/____/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________ Orientador: Prof. Dr. Marcos Alberto Andruchak Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

________________________________ Co-orientador(a): Prof.ª Dr.ª Nara Salles Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

________________________________

Examinador: Prof. Mr. Artur Luiz de Souza Maciel Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

________________________________ Examinador: Mr. Josadaque Pires

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à todos os amigos que fiz no Hospital Psiquiátrico Dr. João Machado e à toda minha família que sempre me incentivou a correr atrás dos meus sonhos.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente quero agradecer a Deus por tudo que ele me ofereceu até aqui: saúde, coragem, e amor, pois sem essas coisas jamais teria sido possível chegar até aqui. Gostaria de agradecer a minha família que sempre me apoiou nas minhas decisões. Agradeço ao meu pai, Cândido da Silva Cerejeira Leal, e a minha mãe, Elizabete de Lima Torreão Almeida, por tudo que me ensinaram, principalmente a acreditar nos meus sonhos, pois com muita força de vontade, perseverança e humildade, eles se tornam realidade. Agradeço aos meus irmãos Jackeline Cerejeira e Thiago Cerejeira por todo apoio e paciência que tiveram ao longo desses 5 anos de curso. Meus sinceros agradecimentos ao meu orientador Andruchak Marcos e a minha co-orientadora e melhor amiga, Nara Salles, que sempre me deu todo o suporte necessário para que eu avançasse em meus estudos e pesquisas e me preparou não só para encarar os desafios da vida acadêmica, mas para encarar a vida e me instruiu a fazer sempre o bem, independente de toda a maldade que existe no mundo. Agradeço ao Dr. Josadaque Pires que me deu a oportunidade de realizar este trabalho dentro do Hospital, pois sem o seu apoio não teria sido possível. Agradeço a todos os meus colegas da turma 2013.1, em especial a Luana Ferreira e a Ícaro Silva e outros tantos que cruzaram o meu caminho e deixaram uma boa recordação. Agradeço ao meu companheiro Robson Medeiros, que sempre me incentivou e me apoiou em minhas escolhas acadêmicas e profissionais. Também, obrigada a todos os professores que me ensinaram e contribuíram para minha formação no curso de Licenciatura em Artes Visuais da UFRN. Enfim, agradeço a todos aqueles que me incentivaram de certa forma a construir a minha carreira até aqui e a me construir como ser humano.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Mosaico de fotos do espaço cedido para implementar a Residência

Artística...……...16

Figura 2 - Mosaico de fotos da vista interna do espaço...…....…...….16

Figura 3 - Mosaico com registros da organização da Residência Artística, com o apoio dos internos, profissionais da área da saúde mental e artistas colaboradores...………....…...17

Figura 4 - Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço...………...…….24

Figura 5 - Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço...……….24

Figura 6 - Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço...………..25

Figura 7 – Oficina de Pintura “Qual é o seu sonho?”...30

Figura 8 - Oficina de Composições Visuais...32

Figura 9 - Oficina de introdução ao desenho e a pintura: Linha, Ponto e Plano...37

Figura 10 - Momento de pintura nas paredes da Residência Artística ...…………...……38

Figura 11 - Momento de pintura nas paredes da Residência Artística ...……...….39

Figura 12 – Oficina de Moda e Arte...40

Figura 13 - Elaboração do Caderno de Artista...41

Figura 14 - Assemblage com Boneca...43

Figura 15 - Desenhando e pintando um traje ...………...………..…..44

Figura 16 – Desenhando e pintando um traje...44

Figura 17 – Desenho de Croquis...45

Figura 18: Making Off do Ensaio Fotográfico...45

Figura 19 – Ensaio fotográfico com Ruth...46

Figura 20 – Ensaio fotográfico com Ruth...46

Figura 21 – Ensaio fotográfico com Vitória...47

Figura 22 – Ensaio fotográfico com Vitória...47

Figura 23 – Ensaio fotográfico com Josefa...48

Figura 24 – Ensaio fotográfico com Josefa...48

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RESUMO

Este trabalho apresenta os resultados da pesquisa desenvolvida que propõe uma articulação entre as artes visuais, moda e a loucura dentro da Residência Artística implementada desde 2014 no Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado - HPDJ, explorando o espaço da própria residência artística para práticas de alfabetização estética com os internos em tratamento no Hospital, a fim de reafirmar a relevância das artes visuais e dos processos criativos utilizados nas ações artísticas dentro deste espaço hospitalar. O objetivo geral é o desenvolvimento da linguagem das artes visuais desenvolvendo atividades que explorem as habilidades artísticas dos internos, através de uma alfabetização estética, com o apoio de uma equipe de profissionais do campo da saúde mental (Josadaque Pires, Nara Salles, Ionara Ferreira, Telma Lira, Ataildo Sergio, Fátima Roberta e alguns estagiários de psicologia que passaram pelo Hospital) e artistas (Francisco Junior, Ewerton Rangel, Emisandra Helena, Renan Carlos) em um espaço apropriado, cedido pela instituição, para tais práticas artísticas e que culminará com a realização de uma exposição no Hall do Prédio Anexo do Departamento de Artes da UFRN, entre os dias 04 a 07 de Dezembro de 2017. Nosso interesse está justificado pelo desejo de ensinar artes aliada a incessante busca pessoal em contribuir para a autonomia e humanização dessas pessoas, minimizando os prejuízos causados pelo descaso social pelos quais passaram durante anos, promovendo uma vivência em artes que pode levar ao bem estar psíquico com possibilidades de reestabelecimento da saúde mental desses pacientes, a curto, médio e longo prazo. É ainda, fruto de um extenso percurso de pesquisa in loco no HPDJ, desenvolvido pelo Núcleo de Pesquisa Transdisciplinar de Pesquisa em Artes Cênicas e Espetaculares, coordenado pela professora Dr.ª Nara Salles e pelo psicólogo Dr.º Josadaque Pires, do qual faço parte desde 2014. Para a fundamentação teórica utilizamos os seguintes autores: Françoise Dolto, Fayga Ostrewer, Wassily Kandinsky, Paulo Freire, Vigotski, Foucault, Gonzalez-Rey, Nise da Silveira e ainda a vida e obra de Artur Bispo do Rosário, contada por Luciana 1 2 2 Hidalgo, que foram extremamente relevantes para as investigações, dialogando diretamente com as práticas de alfabetização estética. Nosso intuito também está centrado em fomentar a discussão sobre a necessidade de espaços como o da Residência Artística dentro dos Hospitais Psiquiátricos em nosso país,

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compreendendo que a luta antimanicomial, a qual apoiamos, mesmo sendo de fundamental importância se dá a passos lentos.

Palavras-chave: Artes Visuais; Alfabetização Estética; Residência Artística, Loucura; Moda; Hospital Psiquiátrico.

ABSTRACT

This work presents the observations made from the articulation between visual arts, fashion and madness within the Artistic Residence implemented since 2013 in the Psychiatric Hospital Doutor João Machado - HPDJ, exploring the space of the own artistic residence for practices of a esthetic literacy with the inmates in treatment at the Hospital, in order to reaffirm the relevance of the visual arts of the creative processes used in artistic actions within this hospital space. This work has as main objective the development of the language and artistic abilities of the inmates, through aesthetic literacy proposed in the research, with the support of a team of professionals in the field of mental health, in an appropriate space, provided by the institution, for such Artistic practices, culminating in an exhibition in the Annex building Hall of the Department of Arts of UFRN, from November 27 to December 1, 2017. My interest is justified by the desire to teach visual arts, together with the incessant personal search to contribute to the rescue of the autonomy and humanization of these people, minimizing the damages caused by the social neglect they have spent for years, promoting an experience in the visual arts that can lead to psychic well-being and reestablish the mental health of these patients in the short and long term. It is also the fruit of an extensive on-the-spot research in the HPDJ, developed by the Transdisciplinary Research Center for Scenic and Performing Arts, coordinated by Professor Dr Nara Salles and Dr. Josadaque Pires, from which I am a member since 2014 I will use the following authors: Fayga Ostrewer, Wassily Kandinsky, Paulo Freire, Vigotski, Foucault, Gonzalez-Rey, Nise da Silveira and the life and work of Artur Bishop of the Rosary, told by Luciana Hidalgo, who were extremely Relevant to the investigations presented here, dialoguing directly with the aesthetic literacy practices developed with the inmates in the residence. We will also provoke an important discussion about the need for spaces such as this one of the Artistic

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Residence within the Psychiatric Hospitals in our country, understanding that the anti-asylum fight, which we support, even if it is of fundamental importance, is taking slow steps.

Keywords: Visual Arts; Aesthetic literacy; Artistic residence, madness; fashion; Psychiatric hospital

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SUMÁRIO

RESUMO...7

1. INTRODUÇÃO ………...………...11

2. O HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DOUTOR JOÃO MACHADO…...13

2.1. A Residência Artística...………..….15

2.2. Arte, Loucura e Moda...……….…...19

3. ALFABETIZAÇÃO ESTÉTICA...……….……..22

3.1 Cadernos do Artista...……...….……..……....26

4. EXPOSIÇÃO...……….…….…..28

5. AÇÃO PEDAGÓGICA...28

5.1. Plano de Curso e Desenvolvimento das Ações...29

5.1.1 Realidade...32

6. METODOLOGIA...33

6.1 Fases do Processo...33

7. DIÁRIO DAS AÇÕES REALIZADAS...36

7.1 Oficina de Introdução ao Desenho e a Pintura: Linha, Ponto e Plano...36

7.2 Moda e Arte: Conexões...39

7.3 Confecção dos Cadernos de Artista...40

7.4 Trabalhando a Identidade: Assemblage com Bonecas de Pano...42

7.5 Desenhando o que vai vestir: autonomia no processo criativo...44

7.6 O Ensaio Fotográfico...45

CONSIDERAÇÕES FINAIS………...49

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1. INTRODUÇÃO

Esta pesquisa configura-se como um memorial reflexivo intitulado de “Artes Visuais, Loucura e Moda: Articulações para uma Alfabetização Estética na Residência Artística do Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado”, desenvolvido para conclusão do curso em Artes Visuais e trata de um dos vértices, em forma de Projeto de Pesquisa de Iniciação Científica, de um extenso projeto integrado de pesquisa, ensino e extensão em desenvolvimento há quatro anos no Hospital Psiquiátrico Dr. João Machado, na cidade de Natal no Rio Grande do Norte. Projeto este executado pelos integrantes do Núcleo Transdisciplinar de Pesquisa em Artes Cênicas e Espetaculares/CRUOR Arte Contemporânea, fazendo uso do espaço da Residência Artística para a elaboração de práticas pedagógicas, tendo como foco as artes visuais, a fim de reiterar o importantíssimo papel da arte e dos processos criativos desenvolvidos nas ações artísticas dentro deste espaço hospitalar, prevendo a realização de uma exposição, com resultado específico desta proposta, no Hall do Prédio do Departamento de Artes da UFRN, entre os dias 04 à 07 de Dezembro de 2017.

Trata-se de uma pesquisa ação que propõe processos artísticos colaborativos e compartilhados envolvendo profissionais da psicologia, psiquiatria, psicanálise, artes visuais em encontros artísticos com os internos do já citado hospital psiquiátrico. Este trabalho faz parte de uma Iniciação Científica e Artística coordenado pela professora Dr.ª Nara Salles. O objetivo geral é possibilitar o desenvolvimento da linguagem e habilidades artísticas, bem como da autonomia, associadas aos processos criativos propostos aos internos, através de uma alfabetização estética em forma de aulas para formação artística, com o apoio de uma equipe de profissionais do campo da saúde mental, em um espaço cedido pela instituição para o desenvolvimento dessas práticas artísticas, denominada Residência Artística. Para tanto, se faz necessário cumprir com os objetivos específicos da pesquisa, dos quais destacamos a necessidade de investigar as relações, produções e processos criativos das artes visuais e da moda, bem como da importância dessas relações e produções para o desenvolvimento da autonomia criativa e reorganização mental dos internos, que pode ser promovida pelo acesso

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aos processos de criações artísticas colaborativas, adaptando às especificidades psíquicas e corporais de cada paciente em tratamento. É, portanto, através desta investigação que se busca compreender o papel do artista dentro de um Hospital Psiquiátrico, na emocionante e desafiadora busca de fornecer meios que possibilitem uma alfabetização estética, apresentando aos internos a expressão artística como uma linguagem para que possam retornar de forma humanizada à sociedade na qual não foi possível se adequar antes de seu internamento.

Mister se faz analisar teoricamente alguns conceitos fundamentais como o de processos criativos e o de autonomia criativa e a partir desses pontos, estudar a relação com alguns processos criativos da moda, buscando traçar narrativas da poética artística nos Cadernos do Artista, que estão sendo trabalhados com os internos como forma de reorganização de suas identidades e histórias pessoais em formato de narrativas poéticas, expressadas pelo viés da arte.

Nosso interesse em tratar desse tema específico nesta pesquisa decorreu inicialmente pelo carinho e apreço desenvolvido ao longo de quatro anos de pesquisa e vivência dentro do Hospital, suscitando o desejo de ensinar artes visuais na busca de desenvolver a autonomia e humanização dessas pessoas estigmatizadas após o doloroso processo de internamento, em alguns casos, desnecessário, e causado por abandono dos familiares. Esta trabalho se explica ainda pela densa pesquisa que vem sendo desenvolvida pelo Núcleo de Pesquisa Transdisciplinar de Pesquisa em Artes Cênicas e Espetaculares/CRUOR Arte Contemporânea, coordenado pela professora Dr.ª Nara Salles e pelo psicólogo Dr.º Josadaque Pires, que despertou o interesse da autora em desenvolver este projeto específico de PIBIc (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) e TCC (Trabalho de Conclusão de Curso de Artes Visuais) em função do desejo de dar continuidade a uma pesquisa que busca enfatizar a importância do contato e da vivência humana com a linguagem da arte, que já vem sendo realizada com os internos no Hospital Psiquiátrico em questão.

Outro fator importante que contribuiu para a escolha deste tema para o desenvolvimento da pesquisa, foi a oportunidade de receber da direção da instituição, um espaço dentro do próprio hospital, que nos foi doado exclusivamente para a implementação e desenvolvimento da Residência Artística. Importante destacar que o local cedido pelo hospital encontra-se em total abandono e com

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muitos problemas em sua estrutura física, necessitando de manutenções e reparos com urgência.

O tratamento dado ao interno ainda hoje é percebido como uma prática desumanizadora e excludente, colocando o louco em um lugar de incapaz, impotente, desprovido de razão, perigoso e assim o processo de exclusão se dá pelo abandono e pela detenção no leito, muitas vezes aliada a uma medicação desmedida. Ainda hoje, o louco está nesse lugar de estigma e opressão e isso é perceptível nas expressões artísticas dos pacientes.

Esta pesquisa propõe-se então a uma articulação entre loucura e arte, enveredando também pelo viés da moda em seus processos criativos e de construção e reconstrução de identidade. É, portanto pela arte, em um espaço de saúde e ciência, que deseja-se produzir conhecimento sobre o real e o vivido. Pois,

as obras artísticas são construções poéticas por meio das quais os artistas expressam ideias, sentimentos e emoções. Resultam do pensar do sentir e do fazer, que por sua vez são mobilizados pela materialidade da obra, pelo domínio de técnicas, e os significados pessoais e culturais. São, por isso, constituídas de um conjunto de procedimentos mentais, materiais e culturais. Podem concretizar-se em imagens visuais, sonoras, verbais, corporais, ou são apenas manifestações das próprias linguagens, como expressão e representação de algo. (FERRAZ e FUSARI, 2009, p.20)

Acreditamos fortemente que o que nos move a desenvolver este projeto são os avanços perceptíveis e as altas de pacientes após se envolverem com a arte de forma tão intensa e descobrirem nela uma nova linguagem ao longo das aulas junto a outros artistas. Pretendemos dessa forma permanecer na instituição, dando prosseguimento e aprofundando esta investigação, agora também pelo viés criativo da moda.

2. O HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DOUTOR JOÃO MACHADO

Este trabalho de conclusão de curso está sendo realizado desde 2014, no Hospital Psiquiátrico Dr. João Machado (HJM), instituição voltada ao atendimento de pessoas que demandam cuidados na área de saúde mental e que buscam assistência no Sistema Único de Saúde (SUS). O HJM faz parte da Rede de

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hospitais públicos gerenciados pela Secretaria de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Norte (SESAP – RN) e está localizado na Avenida Alexandrino de Alencar, número 1700, no bairro do Tirol em Natal, sendo conhecido como o maior hospital de urgências e internamento em saúde mental do estado do Rio Grande do Norte e é caracterizado como de média complexidade no Sistema Único de Saúde (SUS).

É importante ressaltar que a distância física do Hospital até o centro da cidade e o difícil acesso ao HJM é proposital, pois foi construído ainda nos moldes da psiquiatria asilar, padrão na década de 50. Inaugurado no dia 15 de janeiro de 1957, se propunha inicialmente a um formato de colônia para pessoas com algum tipo de transtorno mental, que viviam à margem da sociedade e eram vistos pela sociedade em geral como desajustados e perigosos para aqueles que dispunham de sua “normalidade”. Outro ponto de grande relevância, e que vale ser lembrado aqui, é que o Hospital Colônia, como ainda é chamado até hoje, foi criado com base na psiquiatria social, que aplicava a laborterapia visando a recuperação gradual dos internos. Ao ser submetido ao internamento, a pessoa é introduzida em largos pavilhões, divididos por sexo, sendo que os transtornos derivados de envolvimento com álcool e drogas tem um pavilhão especifico.

Apesar de ser oficialmente registrado como Hospital Colônia Dr. João Machado, o HJM é tratado pelos próprios profissionais da instituição como Hospital Dr. João Machado. Hoje ainda é comum ouvirmos pessoas se referirem ao Hospital Dr. João Machado pelo nome de Hospital Colônia, porém o nome Hospital Colônia soa como uma referência até pejorativa se formos analisar ao pé da letra o sentido de um espaço denominado “colônia”, pois o Hospital Dr. João Machado nem de longe pode ser visto como um ambiente seguro, onde os “doidos” do estado do Rio Grande do Norte vivem de forma razoável e podem ser mantidos sob controle, mas carrega sim consigo a triste marca advinda da cultura manicomial do estigma e consequentemente da exclusão social dos que fogem dos padrões pré estabelecidos e formatados pela sociedade.

Sabe-se que os portadores de transtornos mentais no Estado do Rio Grande do Norte já foram retirados da cidade e deixaram de ter autonomia e liberdade e hoje vivem à margem da sociedade e mesmo aqueles que recebem alta são submetidos a novos internamentos após algum tempo, por não conseguirem se

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reajustar dentro dos parâmetros pré-estabelecidos pela sociedade. Esses indivíduos estarão durante toda a sua vida sujeitos a fazerem parte desta tragédia social, enclausurados pelas paredes e portas de uma instituição totalitária, que ainda hoje possui uma forte cultura de repressão e controle.

E é neste molde, ainda enrijecido pela cultura manicomial, que encaramos o desafio de fazer a arte permanecer nestes espaços, através da implementação de uma Residência Artística, no interior do Hospital.

2.1 A Residência Artística

Conforme a pesquisa dentro do Hospital foi se desenvolvendo, viu-se a necessidade de um espaço físico para abrigar nossas ferramentas de trabalhos com os pacientes, armazenar os figurinos da montagem cênica “(Lou)cure-se!” e até para promover um ambiente agradável de convivência entre artistas e pacientes. Então o espaço inicial que nos foi cedido precisou ser desocupado para que fosse feita uma reforma e para que o espaço fosse utilizado para a instalação de um novo pronto socorro psiquiátrico. Foi então que a instituição nos direcionou um segundo espaço, já muito deteriorado pela passagem do tempo e falta de zelo, que demandaria de nós um investimento financeiro altíssimo para todos os reparos que seriam necessários para a utilização do espaço de forma segura. Em contrapartida nos foi mostrado um terceiro espaço composto por algumas salas, corredor e um grande terreno ao fundo, com estrutura razoável, demandando poucos reparos e consequentemente um menor investimento financeiro. Optamos por escolher o terceiro espaço ofertado e nele começamos a implementar a Residência Artística.

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Figura 1 – Mosaico de fotos do espaço cedido para implementar a Residência Artística.

Fonte: Acervo da Autora

Figura 2 – Mosaico de fotos da vista interna do espaço.

Fonte: Acervo da Autora

Inicialmente foi feita a higienização do espaço, pinturas das paredes, reforma em alguns pontos mais críticos e conserto da parte elétrica. Em seguida pensou-se na possibilidade de aliar os momentos de alfabetização estética através de interferências artísticas no próprio espaço, levando mais cor, forma e interação ao ambiente.

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Figura 3 – Mosaico com registros da organização da Residência Artística, com o apoio dos internos, profissionais da área da saúde mental e artistas colaboradores.

Fonte: Acervo da Autora

Entende-se que para a construção de conhecimento sobre o fenômeno da loucura no campo da Arte e da Moda se faz importante uma metodologia em que a poética visual esteja presente durante todo o tempo de pesquisa, para que possamos transitar nas questões pertinentes à existência humana que estão presentes na alma individual e coletiva da humanidade, visto que o caminho da individuação de cada singularidade se dinamiza na coletividade.

A arte se faz presente no HJM de uma forma espontânea nos desenhos e poemas inscritos nas paredes e em algumas pinturas e desenhos já produzidos em oficinas pelos internos. Estes escritos, assim como algumas obras de arte produzidas pelos internos do HJM, no período de 1962 a 1979, foram evidenciadas através de um estudo e trabalho de curadoria feito pela artista visual Pollyane Azevedo, fruto de

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seu Trabalho de Conclusão de Curso em Artes Visuais, pela UFRN, no ano de 2016. Nesta produção artística

foi identificada ainda uma quantidade expressiva de desenhos contendo informações textuais como dedicatórias, versos, diálogos, historietas, títulos e legendas - alfabéticas e numéricas - escritas em português, inglês ou de forma ilegível (AZEVEDO, Pollyane, 2016, p. 22)

Assim sendo, propor possibilidades de vivenciar processos vitais e criativos através das artes nos fez vislumbrar uma possibilidade de abrir canais de demonstração e expansão para uma outra forma de fala e escuta desses “gritos” interiores que, aprisionados num modo de ser restrito passam a experimentar para além dessas formas contidas de expressão que estereotipam o louco e possa assim ser reconhecidos como artistas pelos seus pares e funcionários do hospital, após a alfabetização estética. E assim, pela arte, em 8 um espaço de saúde e ciência estamos juntos produzindo conhecimento sobre o real e o vivido, concretizado na obra e vivência artística.

A arte se faz presente no HJM de uma forma espontânea nos desenhos e poemas inscritos nas paredes e em algumas pinturas e desenhos já produzidos em oficinas pelos internos. Assim sendo, propor possibilidades de vivenciar processos vitais e criativos através das artes visuais e da moda me faz vislumbrar uma possibilidade de abrir canais de expressão e expansão para os “gritos” interiores que, aprisionados num modo de ser restrito possam experimentar para além dessas formas contidas de expressão que estereotiparam o louco e sejam assim reconhecidos como artistas. E assim, pela arte, em um espaço de saúde e ciência produzir conhecimento sobre o real e o vivido, concretizado na obra de arte. Pois temos a firme convicção que

fazer arte é construir novos saberes sobre o real e, portanto, é frequentar territórios que costumam pertencer unicamente ao pensamento das ciências. É importante discutir quais os canais que conectam os polos do fazer artístico e dos procedimentos acadêmicos, e delimitar como estas dinâmicas diversas podem se relacionar. (CARREIRA, 2012, p.21).

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2.2. Arte, Loucura e Moda

Em um contexto histórico acerca do termo “loucura” não existem diferenciações do “louco” na sociedade medieval, dos internamentos forçados no séc. XVII e na nova categoria criada junto com a psiquiatria no século XIX. Para Focault (1964) a linguagem dos “loucos” na Europa da idade média era desvalorizada, embora não fosse completamente anulada. Além disso, desde a idade média até o século XX, o “louco” possuiu o mesmo status e designavam o internamento como forma de marginalizá-lo da sociedade considerada “normal”. (DANTAS, 2006).

No século XVIII novas definições surgiram e realocaram o “louco” aonde existia uma relação estreita entre a relação dele com ele mesmo e com o mundo. Nessa época já existia o medo de que a loucura ganhasse espaço maior na sociedade devido a fatores como miséria e opressão do governo. Já no fim do século, os asilos eram considerados apenas para “loucos”. Iniciaram-se então os protestos contra o internamento que misturavam presos e “loucos”.

A loucura como um mito, para Max Weber refere-se a um comportamento peculiar de determinados indivíduos dentro de um determinado grupo, onde esse indivíduo governa-se a partir das normas e expectativas pré-determinadas, onde a ação (prática social) atua como um conjunto de finalidades, códigos e valores. A sociedade sempre busca a criação de um conjunto liderado por representações, imaginações através do qual ela seja capaz de se reproduzir, distribuindo papéis, expressando necessidades do coletivo e os objetivos a serem alcançados. (ANSART, 1979).

Em se tratando do mito, Ansart (1979) cita que ele é o próprio imaginário vivido, a forma de relacionar-se dos homens entre si e com o mundo. Considerando como alicerce esse conceito de imaginário, o mito da loucura pode ser compreendido como a maneira em que ocorre o relacionamento entre si dos indivíduos. Assumindo assim a referência dos comportamentos e raciocínios normais, tudo aquilo que fosse destoante desse padrão e que assumissem papéis divergentes das representações

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tidas como dentro da normalidade, passaria a fazer parte integrante do grupo dos loucos.

A partir desse ponto, os estudos das narrativas orais, principalmente advindas de médicos e profissionais da saúde que lidam diretamente com pacientes psiquiátricos, permitem a compreensão do fenômeno da loucura e repassam a informação de como esse fenômeno tem sido abordado, e quais as transformações que ocorreram ao longo dos séculos. Ansart (1979) acrescenta ainda que a linguagem se constitui elemento fundamental para o controle social, e que o próprio mito possui essa função de permitir que um determinado paradigma possa determinar posições sociais que os justifique. Ressalta-se ainda que, a ideologia, à forma como os mitos são apresentados, acabam tecendo a imagem das divisões sociais de igualdades e desigualdades.

Somente a partir da reforma instaurada por Pinel nos asilos, já com o advento do desenvolvimento industrial no século XIX, foi que passou-se a enxergar a o significado da força de trabalho na sociedade, levando ao entendimento da loucura como uma doença que poderia ser tratada:

[...] como primeiro princípio do capitalismo, as hordas de desempregados proletários eram consideradas como um exercito de reserva da força de trabalho. Por essa razão, os que não trabalhavam, sendo capazes de trabalhar, saíram dos estabelecimentos (...), os loucos foram deixados dentro dos estabelecimentos e foram considerados como pacientes cujos distúrbios tinham causas que se referiam ao caráter ou de natureza psicológica. [..]. (Foucault, 2002).

Foi nesse período em que os hospitais e o ramo da psiquiatria iniciaram sua evolução histórica como instituições de tratamento dos chamados “loucos”. Diante desse contexto, o próprio Foucault começa a utilizar uma abordagem bem mais motivada pela experiência prática vivenciada dos indivíduos diagnosticados como loucos afim de evidenciar se a loucura era mesmo um fato verídico como a sociedade vinha impondo.

Em se tratando da relação entre arte e loucura, parte-se do pressuposto conceito de artes a partir do pensamento de estudiosos da área, como Freud, que deduziu “arte” como o resultado de impulsos que conflitam. Em outras palavras, o pai da psicanálise afirmou que um artista é aquele que afasta-se da realidade por não

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concordar em abandonar suas paixões, que correspondem ao prazer profundo da mente. (ZOSCHKE, 2007).

Enquanto fenômeno, a Moda pode ser compreendida pelo olhar da Psicologia Sócio-Histórica, que o conceitua como um processo em permanente movimento e transformação, que se encontra simultaneamente, dentro e fora dos indivíduos (BOCK et al., 2001). Isto leva a considerar a Moda como uma intrincada teia de múltiplas relações, onde cada homem tem sua parcela de contribuição num todo maior e, ao mesmo tempo, é influenciado por ele.

A partir desse movimento, se forma a subjetividade, que é ao mesmo tempo individual e coletiva, porque estas constituem momentos contraditórios que se integram na constituição da psique humana (GONZÁLEZ-REY, 2003). Não obstante, elas podem ser observadas em cada um destes momentos, porque a subjetividade individual está relacionada a história de vida, sentidos e significações de um indivíduo, ainda que esta seja permeada pelos valores sociais. Nas palavras de Bock et. al (2001, p.93) “a subjetividade individual representa a constituição da história de relações sociais do sujeito concreto dentro de um sistema individual”.

Na moda, esta subjetividade individual pode ser observada no estilo de vestimenta, na forma como o indivíduo se apropria das tendências, nas peças que escolhe e no modo como as coordena. Ainda que os meios de comunicação influenciem os indivíduos sobre o que vestir, cada um poderá seguir essa moda ou não, apropriar-se de seus elementos. Uma vez que o fizer, será de um modo particular, de modo que é impossível que duas pessoas tenham seu vestuário idêntico.

Ainda que cada indivíduo se comporte de modo singular, é impossível deixar de considerar a subjetividade social, se constitui num complexo “sistema de sentidos procedentes de diferentes zonas do social” (GONZÁLEZ-REY, 2003, p.216) que, ainda que sejam produzidos individualmente, ganham caráter coletivo na forma de um discurso socialmente produzido, orientando as ações da sociedade como um todo.

Esta subjetividade social aparece nas tendências de moda, que estão vinculadas a um desejo coletivo e aos valores que predominam em um determinado momento na sociedade. Em geral são captadas por pesquisas de mercado e pela observação de estilos individuais que vão se generalizando, ganhando amplitude

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social. E é importante salientar que, enquanto parte da subjetividade social, a moda não está desvinculada dos diferentes sentidos e dos demais aspectos da sociedade pós moderna, como o consumismo, a tendência ao individualismo, a massificação e a valorização do novo.

Ainda que a subjetividade não tenha uma forma física, ela é formada pela ação do homem sobre o ambiente externo, e do efeito que isto produz em sua psique. Pois a “a alteração provocada pelo homem sobre a natureza altera a própria natureza do homem” (VIGOTSKI, 2000, p.73). Assim, ao produzir roupas e ao consumi-las, o homem modifica o ambiente e a si próprio, numa contínua interação. Ao se vestir, ele leva em consideração os diferentes cenários sociais e as relações daí decorrentes. A roupa, então, permite a apresentação do corpo no mundo, permitindo ao ser humano expressar sua identidade, seus valores, suas preferências estéticas e até mesmo seu estigma.

Além dessas interfaces entre Moda e Psicologia, existem outras, que não foram citadas aqui, como a Psicologia do Consumidor, a Psicologia das Cores. E ainda muitas outras, que ainda não foram construídas, mas que devem ser escritas a partir das conexões que se estabelecem entre as diversas áreas do saber, porque o conhecimento extrapola as rígidas divisões do saber consolidado.

3. ALFABETIZAÇÃO ESTÉTICA

O processo de alfabetização estética que está sendo desenvolvido no HJM é o fundamento desta pesquisa, pois é através da diferenciação e caracterização dos elementos básicos de uma composição artística, que os internos poderão se dispor a encarar de forma praticamente autônoma, o processo de criação de uma obra de arte pelo viés da moda.

[...] a autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade. (FREIRE, 1996, P. 107).

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Fez-se necessário para tanto, levar os internos a compreensão e a diferenciação do que seria um desenho e do que seria uma pintura, o que compõe cada um e que nem sempre um desenho precisa ter cor. Levá-los a utilizar o desenho como ferramenta de expressão e linguagem está sendo, sem dúvidas, um dos meus maiores objetivos durante este processo de alfabetização.

Não tenho encontrado obstáculos em despertar neles o gosto pela pintura, e pelo desenho, pois chega a ser quase instintivo o apreço deles por esta linguagem. Percebi que colocar à disposição deles todo o aparato de materiais necessário para suas aventuras artísticas foi o primeiro passo. Interagir com a folha de papel, as paredes, portas, cadeiras, tintas, lápis de cor e pincéis, além de levá-los a descobrir outros aparatos artísticos através do próprio manuseio, como folhas secas de árvores, galhos, pedaços de telha, sucata e madeira, faz com que eles interajam com um espaço que, aos poucos, vai pertencendo mais ainda a eles, mesmo já tendo sido implementado para eles.

Figura 4 – Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço.

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Figura 5 – Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço.

Fonte: Acervo da Autora

Procuro sempre lembra-los que é preciso interagir com esses materiais e matérias-primas, não de forma dominadora, mas sim harmonicamente, para que seja possível dar forma ao que desejam expressar. Esses são exercícios criadores pelo qual é estabelecida uma narrativa poética de re-ligação com as memórias de cada interno e que são construídas na aventura de ser e de se colocar no espaço através de formas, linhas, pontos. É nesses suportes artísticos (paredes, papéis, portas, móveis, etc.) que ficam literalmente cheios de vida, que o interno passa a experimentar dos primeiros entendimentos do trágico, do “estar aqui, agora”, e de fazer parte de um mundo que necessita compreender, porém em sua forma única de organização, isso já foi feito. E é justamente por essa forma única de perceber o mundo que me interesso, enquanto artista, pesquisadora e admiradora da manifestação da sensibilidade humana.

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Figura 6 – Escritos nas paredes da Residência Artística, após a organização do espaço.

Fonte: Acervo da Autora

3.1 Caderno de Artista

O artista contemporâneo apropria-se de uma diversidade de recursos em sua produção criativa. Ele é um pensador e ao mesmo tempo um questionador das inovações artísticas do mundo. O conceito mais usual para “arte” é defini-la como a experiência própria do artista que a vivencia. Em termos gerais, ser artista na atualidade traduz-se em questionar a natureza da arte. (KOSUTH, 1969).

Diante disso, conseguir enxergar o próprio trabalho criticamente e reflexivamente, atribuindo um distanciamento, caracteriza-se um grande desafio para o artista, que, ao encontrar-se submergido em seu processo de criação, acaba por contaminar-se por ele. (ROCHA, 2010).

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Mas o que seria um artista contemporâneo?. Em linhas gerais, parte-se do conceito de contemporaneidade para compreender melhor o contexto geral. Ser contemporâneo para Harvey (2009, p. 21) significa estar presente em um ambiente que promova aventura, poder, alegria, crescimento, revolução dentro de si e do mundo. A definição está relacionada com o seu comprometimento diante das inovações e transformações cotidianas, onde mais recentemente, criou-se a imagem da “destruição criativa” que promove um desconcerto dos problemas diários dos modernistas.

Tendo em vista que atualmente a velocidade aplicada pelos veículos de comunicação e as diversas formas de linguagens tem fundamentado de forma descontínua o processo de formação dos pensamentos, isso remete a um novo comportamento social que permite a fragmentação, pluralismo e a veracidade das oratórias e opiniões sob as características do dia-a-dia.

Assume-se então a premissa de que a arte acaba por refletir o comportamento da sociedade contemporânea, levando em consideração o relacionamento do homem com o seu ambienta natural. (READ, 1983, p. 20).

Scott (2009) afirma que,

Arte contemporânea é um espectro imenso de manifestações e impulsos sem avalista, um ambiente não primordialmente destinado à excelência ou à genialidade, e sim ao experimento, à criação de linguagens” (SCOTT, 2009).

Diante disso, sintetiza-se o quão complexo se tornam os alicerces da arte contemporânea, que ainda em fase de criação e desenvolvimento, ainda possui definições a serem melhor estruturadas. Em suma, o artista contemporâneo está em posição de destaque na sociedade como construtor de pensamentos artísticos e suas manifestações.

Como ferramenta essencial para permitir o diálogo entre o artista e seu trabalho, os chamados cadernos ou diários de artistas atuam como protagonistas desse processo de criação. São distintos do livro de artista, pois são apenas um objeto e não uma obra. Atuam como auxiliares na organização e formação do artista em sua produção, carregando um status poético e estético que valoriza ainda mais a obra do artista.

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O caderno de artista atua ainda como um recurso e um elemento que oferece a possibilidade de autocrítica e reflexão, tornando-o um indivíduo amadurecido através de sua própria experiência. Analisar a proposta do caderno de artista como um meio de tornar o artista um profissional reflexivo possibilitará uma afirmação sobre a importância do uso deste recurso para o processo de formação do artista.

Os cadernos constituem a poética das obras e inserem-se no espaço da crítica sob diversos formatos, como: manifestos, cartas, entrevistas, ensaios etc.

Para Cruz (2009, p. 33),

Trato os livros como corpos textuais. O que vem a ser um corpo? Não somente o encaixe de ossos e de carnes, mas também uma porção ilimitada de matéria ou de coisas; a parte principal de um livro: o corpo do texto e o coração da escrita; o núcleo central de certos objetos, o corpo da nave espacial copulou a estação em órbita, por exemplo; [...] (CRUZ, 2009, p. 33).

Sendo assim, é através desses cadernos que os artistas conseguem registrar todo o processo construtivo de sua obra, protagonizando-as de forma concreta todos os conceitos utilizados ao longo de seu trabalho.

Por fim, essa pesquisa encontra-se ainda em andamento, na busca por bases conclusivas para afirmar que a prática reflexiva pode ser estimulada através do caderno de artista e oferecer uma postura reflexiva para esse individuo que está diante da complexidade do mundo contemporâneo.

O Caderno de Artista foi o suporte artístico que uniu o processo de construção das narrativas das três internas convidadas, através de um trabalho cujo eixo temático eram as suas identidades.

4. EXPOSIÇÃO

Durante todo o processo de alfabetização estética, foi sendo ressaltado de forma muito clara para as internas, que este trabalho culminaria em uma exposição e que o motivo de não poderem ficar com suas produções artísticas ao final de cada dia, era justamente por precisarmos juntar todo este material que estava sendo

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produzido por elas, para uma mostra final. Cientes do desfecho desse trabalho, era comum ouvi-las comentar sobre como queriam estar no dia da exposição. Até que foi acordado um dia para que planejássemos juntas como seria a exposição e foi proposto inicialmente um desfile “performático” para a vernissage.

Planejamos então a exposição para ocorrer entre os dias 04 e 08 de Dezembro de 2017, no Hall do Prédio Anexo do Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, aberta a comunidade acadêmica e externa.

A exposição contará com as três peças criadas pelas internas e com as fotografias, fruto do ensaio fotográfico realizado com as peças confeccionadas.

5. AÇÃO PEDAGÓGICA NO HOSPITAL PSIQUIÁTRICO

A ação pedagógica aconteceu em dois momentos diferentes, ambos dentro do Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado, com dois grupos diferentes de internos, com o apoio do psicólogo Josadaque Pires e de seus estagiários de psicologia de diferentes universidades do estado. A preferência pela Hospital é de poder atender a um número maior de pacientes e beneficiá-los com as propostas voltadas para o ensino-aprendizagem das artes visuais e da moda.

Deste modo, os dois encontros realizados no hospital, envolvendo como tema central as artes visuais, teve o objetivo fazer com que os internos tivessem um contato inicial com os processos criativos ligados à arte e ao conceito de composições artísticas, de modo que pudessem explorar as suas memórias em busca de constituir uma composição.

5.1 Plano de Curso e Desenvolvimento da Ação

Dados Gerais da Ação:

Público-alvo: Internos do Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado Faixa etária: 15-40 anos

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- 1º Dia

Data: 16/08/2017

Conteúdo: Pintura Temática: “Qual é o seu sonho?”

Objetivo geral:

Desenvolver uma pintura, fazendo uso das cores à disposição e das novas cores criadas a partir de suas misturas, partindo da temática central “Qual é o seu sonho?”.

Objetivos específicos:

Seguir a temática proposta para a pintura;

Experimentar o uso das cores e os novos tons criados a partir de suas misturas;

Recursos: Tintas;

Coleções e canetas hidrocor; Pincéis;

Recipiente para colocar a tinta; Papel Ofício A4.

Método:

Inicialmente foi realizada uma conversa com todos os internos envolvidos na atividade, ao redor de uma mesa, para que cada um falasse à respeito do seu sonho e em seguida foi solicitado que fizessem uma pintura sobre o sonho de cada um, individualmente. Foram distribuídas as folhas de ofício e as tintas foram colocadas sob a mesa. Nesta atividade tivemos o apoio dos estagiários de psicologia e de alguns artistas do CRUOR.

Avaliação:

Notamos que sempre que mesmo jogando uma temática para ser trabalhada, em diversos momentos eles precisaram abrir mão da temática, para expressar outras emoções através do desenho, da pintura, da escrita. Surgiram por exemplo, inúmeras mensagens, cartas com escritos pouco legíveis, seguidas de um pedido de “entregue para minha filha/neto/mãe”. Outros preferiram retratar

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lembranças do passado, como se o maior desejo fosse voltar para o momento anterior à loucura e ao internamento.

Figura 7 – Oficina de Pintura “Qual é o seu sonho?”

Fonte: Acervo da Autora

- 2º Dia

Data: 24/08/2017

Conteúdo: Composições Visuais

Objetivo geral:

Compreender o que é uma composição artística e vivenciar a construção de uma composição artística.

Objetivos específicos:

Compreender o que é uma composição visual;

Experimentar a criação de uma composição visual através de colagens;

Recursos:

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Canetas hidrocor e coleções; Pincéis para aplicação de cola;

Recipiente para por cola individualmente; 3 tesouras sem ponta;

Papel Ofício A4.

Método:

Inicialmente foi realizada uma conversa com todos os internos envolvidos na atividade, ao redor de uma mesa, para explicar e exemplificar de forma prática o que seria uma “composição visual”. Logo em seguida, foi entregue a cada um uma base (folha de ofício), uma revista e um recipiente para colocar a cola. As tesouras ficavam sempre sob tutela dos estagiários de psicologia, que davam um suporte no recorte das figuras selecionadas pelos internos para formarem suas composições. Ao final, cada interno mostrava o seu resultado e falava um pouco à respeito do que havia produzido.

Avaliação:

Não temos intuito de avaliar o resultado obtido com a atividade, mas sim de analisar o processo. No entanto, é possível avaliar o nível de envolvimento de cada interno como muito positivo, tendo em vista que a absorção do conceito de “composição visual” foi boa e a interação dos internos com os elementos visuais foram de extrema importância para os resultados observados.

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Figura 8: Oficina de Composições Visuais

Fonte: Acervo da Autora

5.1.1 Realidade

Os dois encontros ocorreram de forma muito similar ao que havia sido planejado. Obviamente, quando se planeja alguma atividade para ser desenvolvida dentro de um Hospital Psiquiátrico temos que ter flexibilidade de permitir que algumas situações e que o próprio estado dos internos guiem o trabalho por um determinado caminho. Não se tratam de atividades inteiramente fechadas, mas sim uma mediação para que através da linguagem artística eles possam se expressar.

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6. METODOLOGIA:

Por conseguinte, faz-se necessário apresentar a estrutura do trabalho, para que consiga abarcar todos os questionamentos e objetivos acima citados. De início, no primeiro capítulo apresento ao leitor uma contextualização histórica acerca do espaço em que desenvolvo a pesquisa e falo da minha relação inicial com o Hospital, até conquistarmos uma das alas para implementar a Residência Artística. Ainda neste capítulo irei fazer uma pequena explanação acerca da articulação entre arte, moda e loucura, trazendo alguns conceitos importantes sobre os processos criativos presentes na arte e na moda em contraponto com o universo da loucura.

No segundo capítulo apresento alguns conceitos pertinentes à alfabetização estética e explico de que maneira se deu esse processo dentro da Residência Artística instalada no HJM, onde relato as minhas descobertas, desafios e encantamentos. Irei ainda trazer neste capítulo alguns conceitos à respeito da ferramenta do “Caderno do Artista”, utilizado para traçar narrativas artísticas individuais dos internos explicitando a importância dessa ferramenta para a reorganização pessoal desses internos. Trago ainda uma abordagem sobre os processos criativos em contraponto com o desenvolvimento da autonomia desses indivíduos e concluo o capítulo 2 trazendo algumas considerações sobre a moda em uma perspectiva psicológica. Já no terceiro capítulo faço um breve relato de como planejo executar a exposição, além de justificar a sua realização. Por fim, no quarto capítulo, apresento um diário de trabalhos contendo relatos descritivos da ação pedagógica desenvolvida com os internos e profissionais do HJM, na Residência Artística, durante o processo de alfabetização estética.

6.1 Fases do Processo

Fase 1:

 Alfabetização Estética – Ação Pedagógica: Como requisito para conclusão de TCC, é necessário a realização de uma ação pedagógica, baseada no tema abordado. Dessa forma foram idealizadas duas oficinas, cada uma com 4h, em diferentes dias, de modo que fossem agregados tanto conhecimento teórico,

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como prático. Após a primeira reunião para discutir o projeto de TCC com o orientador Dr. Andruchak Marcos, juntamente com a co-orientadora Dra. Nara Salles e o psicólogo do HJM Dr.º Josadaque Pires, foi conclusivo a necessidade de uma alfabetização estética naquele ambiente, para possibilitar a observação e a investigação a que me propus desde o início acerca do processo criativo dos internos e a importância desta alfabetização e dos Cadernos do Artista, na busca de desenvolver a autonomia, para o retorno à sociedade. Além disso, outro grande mote desta alfabetização estética é de que os internos estivessem aptos a desenvolver as outras etapas do processo criação, já no intuito de desenvolverem os trajes sob minha orientação e consultoria para serem postas em exposição.

● Bibliografia: Produção feita baseada nos livros “Imagens do Inconsciente: com 271 ilustrações” de Nise da Silveira, “Artur Bispo do Rosário – O senhor do

Labirinto” de Luciana Hidalgo, “Criatividade e Processos de Criação” de Fayga

Ostrower “Metodologia do ensino da arte” de Maria Heloisa C. de T. Ferraz e Maria F. de Resende Fusari, além de outros artigos presentes nas referências ao final do projeto; que fomentam as teorias discutidas nessa primeira etapa do Memorial, bem como na elaboração de metodologias para trabalhar a alfabetização estética dentro de um ambiente hospitalar.

● Fichamentos: Essa fase serviu para fundamentar e dar consistência ao projeto de pesquisa, pois através desses fichamentos foi possível encontrar argumentos relevantes para dialogar com alguns aspectos desta pesquisa; ● Produção do Projeto: Abarca, de forma pessoal e referenciada, as

investigações feitas ao longo do semestre e os conceitos que dialogam com o tema, evidenciando a importância da realização do Memorial e a sua execução inicial, que servirá de base para a criação do projeto final.

Fase 3:

● Aplicar a ferramenta “Caderno do Artista”: Na produção final, espera-se aplicar esta ferramenta com 3 internos a serem selecionados ao longo do processo, oferecendo a cada um deles uma base (caderno artesanal confeccionado por mim) para a elaboração de seus Cadernos de Artista. Inicialmente pretende-se trabalhar com temáticas gerais a cada dia e posteriormente, de acordo com a

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necessidade observada, posso especificar as temáticas de acordo com cada indivíduo;

● Desenvolvimento dos trajes para exposição: Nesta etapa pretende-se iniciar o processo de criação dos trajes a serem utilizados na exposição. Cada interno será instruído a escolher uma das temáticas individuais trabalhadas em seu Caderno do Artista, como norte para a sua criação. Neste momento serão utilizadas ferramentas e processos criativos da moda para que seja possível colocar os internos de forma mais intensa à frente de suas criações, e assim, ocupando o lugar de criadores, usufruirão de todos os benefícios e prazeres deste “lugar”, estando também cientes desde o início das responsabilidades e obrigações de um criador.

● Produção Final do Projeto: Coleta dos registros das produções dos Cadernos de Artistas para ilustrar este Memorial.

● Exposição: A exposição acontecerá no Hall do Prédio Anexo do Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, no dia 7 de Dezembro, aberta a comunidade acadêmica e externa e contará com um desfile de abertura, onde os internos serão os homenageados por suas respectivas criações.

7. DIÁRIO DAS AÇÕES REALIZADAS

7.1 Oficina de Introdução ao Desenho e a Pintura: Linha, Ponto e Plano

Trouxe cinco internos, sendo quatro mulheres e um senhor. Formei com eles um círculo em que eu me coloquei como parte do círculo e não como ponto central ou superior e acredito que essa configuração auxiliou durante o processo. Minha expectativa era fazer com que eles compreendessem a função do ponto, da linha e do plano e como esses elementos se relacionam em uma composição.

Busquei trazer inicialmente os conceitos básicos dos elementos visuais: ponto, linha e plano, contidos no livro “Ponto e Linha Sobre o Plano” de Wassily Kandinsky. Fiz uso então de vários pedaços de linhas de costura colorida e grossas para demonstrar que com elas seria possível criar formas. Consegui prender a atenção de todos e logo em seguida pedi para que eles tentassem fazer outras

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formas. Após fazerem algumas tentativas, comecei a perceber que estavam saindo algumas formas interessantes, porém nada muito bem definido.

Em seguida comecei a trabalhar com miçangas como sendo “pontos” sobre o plano (chão). Peguei uma linha de uma cor próxima a cor das miçangas e isso ajudou os internos a comparar o desenho formado pela linha e o desenho formado pela junção de pontos e assim que indaguei: “Se eu juntar vários pontinhos eu consigo formar o que? Um círculo!” e assim perceberam que tanto a linha, quanto a união de várias miçangas podiam formar desenhos. Convidei então M. a vir ao centro do círculo para mostrar que o seu corpo era feito por linhas, pedindo que eles percebessem e me dissessem que linhas eram aquelas e assim foram me apontando, a linha da perna, das costas, das roupas. Em seguida fui exemplificar com as linhas do espaço, do cruzamento das paredes que formavam arestas e assim, aos poucos eles foram percebendo que tudo era feito de linha e no fim já estavam me apontando linhas onde nem eu mesma havia enxergado antes.

Figura 9 - Oficina de introdução ao desenho e a pintura: Linha, Ponto e Plano

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Logo depois foram se dispersando e distraindo com a movimentação do preparo das tintas para a realização de outra ação por parte de outros artistas da residência e aproveitei para sugerir que pintassem ali o que para eles fazia falta, seja uma pessoa, seja um sentimento, seja uma comida.

Houve uma das pacientes que chorou ao lembrar que os filhos faziam falta. Já M. disse que se sentia sozinho e queria voltar para casa.

Foi possível observar que sempre que propúnhamos atividades com pintura, mesmo jogando uma temática para ser trabalhada, em diversos momentos eles precisaram abrir mão da temática, para expressar outras emoções através do desenho, da pintura, da escrita. Surgiram por exemplo, inúmeras mensagens, cartas com escritos pouco legíveis, seguidas de um pedido de “entregue para minha filha/neto/mãe”. Outros preferiram retratar lembranças do passado, como se o maior desejo fosse voltar para o momento anterior à loucura e ao internamento.

No primeiro momento as pinturas que surgiram faziam menção a essa temática dada, porém muitos escreveram nomes próprios, como que se desejassem reafirmar suas identidades através da escrita do nome próprio. A interna que chorou lembrando dos filhos, desenhou-os na parede, em pranto e ao concluir o desenho já não chorava mais, como um processo de catarse. Houve também quem desejasse beber a tinta, houve quem não conseguisse sequer controlar o movimento fino das mãos para passar a sua ideia para a parede, devido aos efeitos colaterais das medicações. Mas muitos se desenharam nas paredes, em forma de silhuetas, por vezes com meu auxílio. R., por exemplo, fez o seu autorretrato, mas andando de skate.

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Figura 10 – Momento de pintura nas paredes da Residência Artística

Fonte: Acervo da Autora

Figura 11 – Momento de pintura nas paredes da Residência Artística

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7.2 Moda e Arte: Conexões

Neste encontro, foi proposto um primeiro contato com o universo da moda e da arte. Começamos mostrando para as internas alguns livros de moda, de arte e questionamos se elas sabiam o que era moda, para que servia a moda, bem como o que arte e para que servia a arte. Elas foram folheando os livros, observando as ilustrações, se familiarizando com esse universo e tecendo comentários sobre o que viam nas páginas dos livros. Ficamos assim por alguns minutos, até que propus que fizemos um quebra cabeça, onde o intuito era formar pares de figuras, sendo uma obra de arte e uma peça de roupa inspirada naquela obra de arte. E para a nossa surpresa, todas conseguiram fazer as associações de forma correta.

Figura 12: Oficina de Moda e Arte

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7.3 Confecção dos Cadernos de Artista

A confecção dos Cadernos de Artista integrou o processo de alfabetização estética. As bases foram confeccionadas pela autora e entregue as internas, junto a uma série de elementos para serem aplicados a estrutura do caderno. Inicialmente houve uma conversa, onde explicamos que o Caderno seria uma espécie de diário, mas também de pasta para a armazenagem dos trabalhos que elas fossem desenvolvendo a cada encontro.

Assim, as internas foram selecionando os elementos para incrementar os seus cadernos e aplicando-os com o auxílio das psicólogas presentes. Josefa, uma das internas, resolveu bordar o seu próprio nome. Já Ruth desenhou um bebê e Kelsinha, uma das internas que recebeu alta e não pode concluir os trabalhos, preencheu o seu caderno com conchinhas, pois ela tinha uma fixação pelo mar, já que só teve a oportunidade de conhecer o mar quando já estava internada no Hospital Psiquiátrico, através do nosso trabalho.

Foi interessante observar, que mesmo fazendo uso dos mesmos elementos que estavam à disposição, cada uma delas criou uma composição diferente, de acordo com as suas memórias, vivências e histórias de vida.

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Figura 13: Elaboração do Caderno de Artista

Fonte: Acervo da Autora

7.4 Trabalhando a Identidade: Assemblage com Bonecas de Pano

Uma temática que já tínhamos percebido a necessidade de ser tratada era a “Identidade”. E trabalhar a identidade dessas internas de forma lúdica foi um grande desafio. Após fazer a impressão das fotografias do rosto de cada interna e colá-los nas bonecas de pano que seriam trabalhadas pelas internas, fazendo uso de retalhos de tecidos, aviamentos, tintas, entre outros materiais. Inicialmente explicamos o conceito de assemblage e citamos as assemblages de Artur Bispo do Rosário como exemplo, contamos a história dele para as internas e o que ele fazia com o que encontrava no Hospital. Tudo virava arte. Ouvindo atentamente, cada uma recebeu a sua boneca e começou a desenvolver a sua assemblage com o auxílio das estagiárias de psicologia, da professora Dr.ª Nara Salles e do psicólogo Dr. Pires.

Como dentro do Hospital não existem espelhos, a fotografia foi uma forma que encontramos de fazer com que elas pudessem se olhar, se reconstruir e fazer interferências em seus “rostos”, em seus “corpos”, em seus “cabelos”. A assemblage

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que mais chamou atenção, embora todas sejam muito interessantes de serem analisadas, foi a de Vitória, que pendurou no pescoço de sua boneca um molho de chaves. Que simbologias existem por trás da escolha de cada elemento? Quantas memórias e questões são trabalhadas por elas enquanto desenvolvem essas atividades?

Figura 14: Assemblage com Bonecas

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7.5 Desenhando o que vai vestir: autonomia no processo criativo

Foi solicitado que os pacientes desenhassem o figurino que desejavam usar no dia da apresentação, da forma que soubessem. Ao longo do desenho, fui questionando a cada um sobre as partes que compunham um traje: “E as mangas?”, “E o decote?”, “Você prefere que cor?”, “Gosta dessa cor?”, “Ela te lembra o que?” e as respostas sempre eram interessantes. Continuei nesse processo até perceber que cada um já estava satisfeito com o resultado. Procurei sempre relembrar a eles que essas peças seriam executadas, então precisaria ficar muito claro o que eles queriam em seus trajes.

Figura 15 – Desenhando e pintando um traje

Fonte: Acervo da Autora

Figura 16 – Desenhando e pintando um traje

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Figura 17: Desenho de Croquis

Fonte: Acervo da Autora

7.6 O Ensaio Fotográfico

O ensaio fotográfico foi uma proposta que surgiu com o intuito de atribuir à exposição final, várias linguagens artísticas em um só espaço. Este ensaio foi desenvolvido com as internas, vestindo os trajes desenhados por elas mesmas, em diferentes ambientes do Parque das Dunas, localizado na Av. Alm. Alexandrino de Alencar - Tirol, Natal – RN. Contamos para esta etapa, com a participação voluntária do artista visual e fotógrafo Renan Carlos, que com o seu olhar extremamente sensível, conseguiu capturar toda a beleza, leveza e força dessas três mulheres, com histórias de vidas tão diferentes, mas que convivem já há tantos anos, cercadas pelas paredes de um Hospital Psiquiátrico.

Figura 18: Making Off do Ensaio Fotográfico

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Figura 19 – Ensaio fotográfico com Ruth

Fonte: Fotografia de Renan Carlos

Figura 20 – Ensaio fotográfico com Ruth

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Figura 21 – Ensaio fotográfico com Vitória

Fonte: Fotografia de Renan Carlos

Figura 22 – Ensaio fotográfico com Vitória

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Figura 23 – Ensaio fotográfico com Josefa

Fonte: Fotografia de Renan Carlos

Figura 24 – Ensaio fotográfico com Josefa

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7.7 Exposição

O ensaio fotográfico foi uma proposta que surgiu com o intuito de atribuir à exposição final, várias linguagens artísticas em um só espaço. Este ensaio foi desenvolvido com as internas, vestindo os trajes desenhados por elas mesmas, em diferentes ambientes do Parque das Dunas, localizado na Av. Alm. Alexandrino de Alencar - Tirol, Natal – RN. Contamos para esta etapa, com a participação voluntária do artista visual e fotógrafo Renan Carlos, que com o seu olhar extremamente sensível, conseguiu capturar toda a beleza, leveza e força dessas três mulheres, com histórias de vidas tão diferentes, mas que convivem já há tantos anos, cercadas pelas paredes de um Hospital Psiquiátrico.

Sendo assim, a exposição ocorreu no dia 7 de Dezembro no Hall do Prédio Anexo do Departamento de Artes da UFRN e contou com a presença dos que compuseram a banca examinadora deste trabalho de conclusão, familiares, amigos, profissionais do campo da saúde mental e curiosos que transitavam pelo departamento. A exposição intitulada “Vem mainha ver o mar!”, reuniu as produções artísticas desenvolvidas pelas internas durante o processo de alfabetização estética e as fotografias de Renan Carlos, das internas escolhidas: Ruth, Vitória e Josefa.

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Figura 25 – Registros da Exposição “Vem Mainha Ver o Mar!”

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dos resultados conquistados durante esses 4 anos consecutivos de pesquisa no Hospital Psiquiátrico Doutor João Machado, posso concluir que os espaços para a produção e vivência em artes são fundamentais para promover a melhoria da saúde mental dos internos em tratamento em hospitais psiquiátricos. No entanto, são muitos os desafios e entraves burocráticos, de cunho político e ideológico, que distanciam os colaboradores deste projeto dos resultados idealizados.

Apesar de o processo de alfabetização estética não ter sido tão extenso como gostaríamos, os resultados alcançados foram os esperados, de modo que foi possível viabilizar a realização da exposição dos cadernos e trajes confeccionados, ao final desta pesquisa.

Concluo que este TCC II foi finalizada com êxito, já que os produtos almejados nos objetivos do trabalho foram alcançados e aplicados de acordo com a metodologia pretendida. Portanto, reconhecemos que a responsabilidade do artista no ambiente de um hospital psiquiátrico é, antes de tudo, promover a permanência de espaços onde a arte é vivenciada de forma catalizadora e reorganizadora da estrutura do ser autônomo e criativo.

Como sabemos, o tratamento recebido pelo interno dentro de Hospitais Psiquiátricos ainda precisa melhorar muito e a arte nesses espaços assume um papel fundamental, catalisando dores, ausências, memórias boas ou ruins e oferecendo práticas que incentivam o tratamento humanizado, através do afeto, da escuta e do acolhimento.

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