UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ
CAMPUS CAICÓ
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
TRABALHO DE CURSO
TRÁFICO DE CRIANÇA NO BRASIL, UMA TRISTE REALIDADE BRASILEIRA
FRANCINALDO FERNANDES DA CUNHA
CAICÓ – RN
2019
TRÁFICO DE CRIANÇA NO BRASIL, UMA TRISTE REALIDADE BRASILEIRA
Monografia apresentada à Universidade
Federal do Rio Grande do Norte
–
UFRN/CERES
– Caicó, como parte dos
requisitos para obtenção do título de
Bacharel em Direito.
ORIENTADOR:
Luiz Mesquita de Almeida NetoCAICÓ – RN
2019
CDU 343.431/433(81) RN/UF/BS-Caicó
Cunha, Francinaldo Fernandes da.
Tráfico de criança no Brasil, uma triste realidade brasileira / Francinaldo Fernandes da Cunha. - Caicó: UFRN, 2019.
52f.: il. color.
Monografia (Bacharelado em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ensino Superior do Seridó -
Campus Caicó. Departamento de Direito. Curso de Direito. Orientador: Msc. Luiz Mesquita de Almeida Neto.
1. Organização das Nações Unidas (ONU) - Monografia. 2. Direitos humanos - Monografia. 3. Direito da criança e do adolescente - Monografia. 4. Tráfico de menor - Monografia. 5. Combate ao tráfico de crianças - Monografia. 6. Brasil. I. Almeida Neto, Luiz Mesquita de. II. Título.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Profª. Maria Lúcia da Costa Bezerra - CERES-Caicó
TRÁFICO DE CRIANÇA NO BRASIL, UMA TRISTE REALIDADE BRASILEIRA
Monografia
apresentada
à
Universidade
Federal
do
Rio
Grande
do
Norte
–
UFRN/CERES
– Caicó, como parte dos
requisitos para obtenção do título de Bacharel
em Direito.
Aprovado em:____/____/_____
BANCA EXAMINADORA
____________________________________ Prof. Msc. Luiz Mesquita de Almeida Neto
Orientador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
____________________________________ Prof. Dr. Carlos Francisco do Nascimento
Examinador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
____________________________________ Prof. Msc. Saulo de Medeiros Torres
Examinador
Dedico este trabalho que simboliza a conclusão do curso de Bacharel em
Direito, primeiramente ao nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, pois diante das
diversas dificuldades em que eu passei, principalmente nos três primeiros anos do
curso, se não fosse Ele para me ajudar chegando com as providências
necessárias, eu com certeza, jamais teria conseguido concluir este curso. Como
forma de reconhecimento e agradecimento a Deus pelo que fez por mim, buscarei
ajudar as pessoas sempre com a verdade e a justiça que ele sempre pregou para
libertar os necessitados, para isso terei sempre como premissa o Seu
ensinamento escrito em Jo 8:32
“E conhecereis a Verdade e a Verdade vos
libertará”. A escolha desse tema, já é uma forma de por em prática esta verdade.
Em segundo lugar, dedico este curso a minha abençoada e amada esposa
Cleia e as minhas duas filhas abençoadas que eu amo, Camilly e Sofia, que com
sabedoria, prudência e paciência, sempre me incentivaram, mesmo nos
momentos difíceis em que passamos devido a fatores externos.
AGRADECIMENTOS
A Deus, que permitiu que eu iniciasse o curso, que esteve presente comigo
durante todo tempo me dando, persistência, inteligência, sabedoria e agora me
presenteia com a conclusão dele.
A minha esposa Cleia, pelos incentivos, conselhos e paciência.
As minhas duas filhas Camilly e Sofia, pela compreensão das minhas
ausências no nosso lar.
Aos familiares e amigos que sempre me motivaram a prosseguir.
Ao meu orientador prof. Luiz Mesquita que não mediu esforços em me
orientar, sempre com paciência e demonstrando bastante conhecimento na área
do Direito, contribuiu de forma significativa para a conclusão deste trabalho.
Ao Coordenador do curso prof. Carlos Francisco, o meu reconhecimento
pelo seu grande empenho e dedicação em prol deste curso.
[...] Porquanto, o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males; e por causa dessa cobiça, alguns se desviaram da fé e se
atormentaram em meio a muitos
sofrimentos. Exortações aos homens de Deus de todos dos males é o amor ao dinheiro [...]
O presente trabalho levanta a problemática sobre o trafico de pessoas, mais
especificamente o tráfico de crianças no Brasil. O objetivo principal é alertar a
sociedade brasileira com as suas instituições sobre a realidade desse grave
problema que assola as nossas crianças. O trabalho, portanto, aborda questões
sobre o tráfico de pessoas no mundo, as atitudes que a ONU vem tomando para
tentar coibir esse tipo de crime e procura tratar do problema de uma forma mais
detalhada com relação ao trafico de crianças que ocorrem no Brasil,
demonstrando de certa forma uma inércia por parte da sociedade brasileira e as
suas instituições relativo ao combate a essa forma de crime tão bárbaro que
ocorre diariamente com as nossas crianças:
Palavras-chave: ONU. Direitos Humanos. Tráfico de crianças. Combate ao tráfico
de crianças. Brasil
K
eywords: ONU. Human rights. Child trafficking. Fight against child trafficking.
Brazil.
This paper raises the problem of human trafficking, specifically child trafficking in
Brazil. The main objective is to alert Brazilian society and its institutions about the
reality of this serious problem that plagues our children. The paper, therefore,
addresses issues of human trafficking in the world, the attitudes that the UN has
been taking to try to curb this type of crime and seeks to address the problem in
more detail with regard to child trafficking occurring in Brazil, demonstrating in
some way an inertia on the part of Brazilian society and its institutions regarding
the fight against this form of barbaric crime that occurs daily with our children
1 INTRODUÇÃO ... 11
2 A ONU E OS DIREITOS HUMANOS ... 14
2.1 Antecedentes históricos do tráfico de pessoas e o combate desta prática no
âmbito internacional ... 15
2.2 Os diferentes tipos de tráfico de seres humanos ... 21
2.3 A adesão do Brasil ao Protocolo de Palermo ... 24
3
A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, OS DIREITOS HUMANOS E A LEI
13.444/2016 ... 25
4 O TRÁFICO DE CRIANÇAS ... 34
4.1 Os diferentes tipos de tráfico de crianças... 35
4.1.1 Tráfico para adoção de crianças ... 35
4.1.2 Tráfico de crianças para trabalho escravo... 37
4.1.3 Tráfico para exploração sexual de crianças ... 39
4.1.4 Tráfico de órgãos de crianças ... 42
4.2 Causas do tráfico de crianças ... 43
4.3 Locais, no Brasil, de atuação dos traficantes de crianças ... 44
4.3.1 O que as famílias das vítimas devem fazer? ... 45
4.3.2 O que as instituições de segurança podem fazer para melhorar o combate a
esse tipo de crime? ... 46
5. CONCLUSÃO ... 48
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho enfrenta o problema do tráfico de pessoas, mais
especificamente no tocante ao tráfico de crianças, buscando compreender qual o
tratamento jurídico conferido para tutelar esta situação ilegal, bem como quais as
suas causas e principais modalidades e o que poderia ser realizado para
combater.
A metodologia utilizada neste estudo foi a pesquisa bibliográfica, tendo em
vista, a mesma oferecer meios que auxiliam na definição e resolução dos
problemas já conhecidos, como também permite explorar novas áreas onde os
mesmos ainda não se cristalizaram suficientemente.
Atualmente vivemos em um mundo, em que a tecnologia e a modernidade
chegaram a níveis nunca alcançados pelo homem. Observamos o
desenvolvimento de tecnologias nas diversas áreas, sendo a área da segurança
publica inserida nessa tendência de desenvolvimento tecnológico mundial.
O Brasil do século 21, não fica distante dessa tendência mundial,
entretanto, apesar de todo esse desenvolvimento na área de segurança publica,
observamos índices alarmantes relativos a sumiço de crianças no Brasil. No
decorrer do trabalho, serão mostrados alguns dados dos números de pessoas
desaparecidas no Brasil, números esses que provocam perplexidades.
É importante ressaltar que
mesmo diante dessa triste realidade, mostrada
por dados tão preocupantes, o principal objetivo deste trabalho, é alertar e por
que não dizer
“acordar” a sociedade brasileira e as diversas instituições
nacionais sobre este grande problema que aflige milhares de famílias no Brasil.
Dessa forma,
possui como justificativa, sobretudo sensibilizar o leitor
, que é
necessário sair da passividade diante de um problema tão grave e dessa forma,
promover debates envolvendo a sociedade sobre o problema, em busca de
possíveis soluções, que não fiquem apenas nas entrelinhas do campo das ideias
dos grandes intelectuais acadêmicos, mas que possam propor soluções realistas,
práticas e efetivas para solucionar ou amenizar o problema em questão, o qual
destrói a vida de milhares de crianças.
Para alcançar esses objetivos
supracitados, entraremos em vários ramos do direito, como Direito Constitucional,
Direito Internacional, Direitos Humanos, Direito Penal, Direito Civil, Direito da
Criança e Sociologia do Direito. Faremos uma abordagem geral, porém, sucinta
sobre o crime internacional de Tráfico de Pessoas, para nos ambientarmos sobre
o tema. Para isso iremos citar conceitos, tipos de crimes de tráficos de pessoas,
antecedentes históricos, perfis das vítimas mais freqüentes e as razões pelas
quais estes crimes acontecem.
Didaticamente, pode-se dizer que o trabalho está dividido em três seções,
sendo que a primeira seção, falará sobre a Organização das Nações Unidas
–
ONU e Direitos Humanos, divulgando o papel da ONU no combate ao tráfico
internacional de pessoas, por meio da Declaração Universal dos Direitos
Humanos proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em Paris, em
10 de dezembro de 1948. Veremos por meio de antecedentes históricos que foi
percorrido um longo caminho até chegarmos à Declaração Universal dos Direitos
Humanos. Esses antecedentes mostrarão que nem sempre o tráfico de pessoas
foi considerado crime, e que com o passar do tempo, o mundo passou a
criminalizar tal prática e buscou formas de se unir para combater tal pratica ilícita.
Veremos os primeiros passos para essa união mundial por meio da criação da
Liga das Nações, que com a evolução do passar do tempo, tornou-se a ONU, a
qual vem buscando por meio de várias convenções, solucionar os problemas
envolvendo tráfico de pessoas, chegando finalmente a realizar um importante
tratado que foi o Protocolo de Palermo (2000), protocolo este que passou a tratar
de maneira mais séria e efetiva o tráfico de pessoas como crime organizado em
âmbito internacional.
Ainda nesta seção, veremos as principais modalidades de tráfico de
pessoas, e a adesão do Brasil ao importante Protocolo de Palermo.
Na segunda seção, sairemos um pouco da visão internacional de trafico de
pessoas e focaremos mais esse tema no Brasil, falando sobre a Constituição
Federal e algumas leis que tratam sobre o crime em questão, abordando a
principal lei brasileira que trata sobre o tema, que é a LEI 13.444/2016.
Na terceira e ultima seção, traremos à tona o objetivo principal deste
trabalho, o qual irá tratar especificamente sobre o tráfico de crianças no mundo e
principalmente no Brasil.
suas causas, locais no Brasil de atuações das organizações criminosas na prática
desses crimes e sugestões no tocante a procedimentos que as famílias e
instituições de segurança podem fazer para melhorar o combate a esse tipo de
crime tão bárbaro contra as crianças.
2. A ONU E OS DIREITOS HUMANOS
Para que possamos entender a problemática preliminar (ao objeto de
estudo do presente trabalho) do tráfico de pessoas, é necessário falarmos sobre
a questão dos Direitos Humanos. Dessa forma, é importante entendermos como
a Organização das Nações Unidas
– ONU – procura meios de combater o tráfico
de pessoas, para que se possam garantir os Direitos Humanos das pessoas.
Inicialmente, buscando uma definição elementar, verificamos que o site da
Wikipédia define que
1:
Organização das Nações Unidas (ONU), ou simplesmente Nações Unidas, é uma organização intergovernamental criada para promover a
cooperação internacional. Em substituição à Liga das Nações, a organização foi estabelecida em 24 de outubro de 1945, após o término da Segunda Guerra Mundial, com a intenção de impedir outro conflito como aquele. Na altura de sua fundação, a ONU tinha 51 estados- membros; hoje são 193. A sua sede está localizada em Manhattan, Nova York, e possui extraterritorialidade. (...). Os seus objetivos incluem manter a segurança e a paz mundial, promover os direitos humanos, auxiliar no desenvolvimento econômico e no progresso social, proteger o meio ambiente e prover ajuda humanitária em casos de fome, desastres naturais e conflitos armados.
Assim, observamos que, dentre as suas várias atribuições, a ONU procura
tratar sobre grandes problemas e dramas sociais que afligem a humanidade, em
escala global, sendo que tais problemas possuem características diferentes e,
portanto, é necessário que a ONU possua Órgãos específicos para tentar
solucionar cada um deles. A composição da ONU pode assim ser referenciada
2:
(...). A ONU decompõe-se em três grandes linhas. A primeira linha é representada pelos grandes órgãos estruturais da organização: A Assembléia – geral, o Conselho de Segurança, o Tribunal Internacional de Justiça, o Conselho Social e Econômico e o Secretariado; a segunda linha reporta a órgãos, programas, fundos e comissões subsidiárias dos grandes órgãos; já a terceira e última linha compreende as
1WIKIPEDIA: banco de dados. Disponível em:
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza%C3%A7%C3%A3o_das_Na%C3%A7%C3%B5es_Unidas> . Acesso em: 05 nov. 2019.
2 MARTINS, Daniel Valentim; CORREIA, Eduardo Pereira. A organização das Nações Unidas na ordem internacional. In: DUQUE, Raquel; NOIVO, Diogo; SILVA, Teresa de Almeida e (coord).
organizações não governamentais (ONG) e acadêmicos que, não pertencendo aos quadros da ONU, trabalham em parceria com a organização.
No tocante a temas relacionados aos direitos humanos, geralmente os
assuntos são tratados na Assembléia Geral da ONU. Foi inclusive por meio da
Assembléia Geral que foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, como se observa a seguir
3:
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é um documento marco na história dos direitos humanos. Elaborada por representantes de diferentes origens jurídicas e culturais de todas as regiões do mundo, a Declaração foi proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações. Ela estabelece, pela primeira vez, a proteção universal dos direitos humanos.
Vemos então que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi desde
sua proclamação historicamente muito importante, porque propôs o compromisso
de responsabilidades entre as nações para proteger diversos direitos inerentes à
condição humana, em especial (no que mais interessa para o presente trabalho)
no tocante às pessoas vítimas do crime de tráfico humano, um problema
extremamente sério, onde todos os governos tinham conhecimento sobre a sua
existência, contudo, não havia por parte deles, consistentes iniciativas para
combater tamanho crime.
Entretanto, mesmo após a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
nenhum governo adotou medidas sérias e eficazes para combater o tráfico de
pessoas, facilitando assim a sua prática, a qual era comumente realizada por
organizações criminosas de amplo espectro e alcance, encorajadas não somente
pela falta de políticas publicas de combate ao ilícito, mas principalmente por se
tratar de uma atividade criminosa bastante lucrativa.
2.1 Antecedentes históricos do tráfico de pessoas e o combate desta prática
no âmbito internacional
O tráfico de pessoas se tornou um “comércio” bastante lucrativo, muito em-
3 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Disponível em: <https://nacoesunidas.org/direitoshumanos/declaracao/>. Acesso em: 05
bora, criminalizado, geralmente explorado por organizações criminosas. Esse tipo
de “comércio” nem sempre foi realizado por organizações criminosas com as
feições que atualmente possui. Na antiguidade, o Império Romano, em caráter
oficial, se utilizou dessas práticas, na época do seu apogeu.
Ao retrocedermos à época do Império Romano, constatamos que o tráfico
humano era uma prática natural para aquela cultura, não sendo considerada ilícita
a priori, pois se entendia que se tratava de uma atividade comercial legítima, onde
os povos dominados pelo império não detinham mais poder sobre os seus corpos,
podendo desta forma ser escravizados e conseqüentemente objetos de trocas
comerciais. As formas de tráfico e exploração mais utilizadas à ocasião eram a
escravidão sexual e os trabalhos forçados
4:
Entre as causas da escravidão, embora existissem outras razões, estava a captura do cidadão romano ou o nascimento. Neste caso, a condição era determinada pela mãe, ou seja, quem nascia de mãe escrava, mesmo que o pai fosse livre, seria escravo. (ALVES, 1983).
A condição jurídica do escravo era de coisa – res –, tendo como consequências: não poder se casar legitimamente, pois não tinha patrimônio; não ser parte em juízo; e seu proprietário transferi-lo, onerosa ou gratuitamente, a outro homem livre, e até matá-lo. A escravidão perdurou por muito tempo no decorrer da história da humanidade, sendo que este procedimento embora não caracterizasse efetivamente o tráfico de seres humanos, no rigor técnico era considerada a origem mais provável do tema, uma vez que foi o primeiro registro de comercialização de seres humanos (TORRES, 2012).
Na Antiguidade era comum como consequência das constantes guerras e batalhas a apropriação dos povos vencidos pelo exército vencedor, que os tornavam seus escravos (BORGES FILHO, 2005), e os utilizava como mão de obra nas novas terras conquistadas. Este regime durou toda a Idade Média (PADOVANI; CASTAGNOLA, 1978).
Assim constatamos que o Império Romano comercializava seres humanos
para práticas diversas, tendo em vista que se consideravam um povo superior aos
demais, que desta forma teria o direito de escravizar as pessoas e usá-las como
se fossem sua propriedade.
A prática de comercialização dos povos conquistados pelos romanos
gerava muito lucro para os envolvidos, o que assim motivava bastante tal prática
comercial. Contudo, com a queda do Império Romano, ao longo dos anos foi
4 União Pioneira de Integração Social – UPIS. A evolução histórica do tráfico de pessoas para fins de exploração sexual à luz dos direitos humanos. Brasília: UPIS, 2017. Disponível em:
<http://ssystem08.upis.br/repositorio/media/ebook/ebook_direito_trafico-pessoas.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2019. (p. 6)
surgindo diversos acontecimentos históricos (feudalismo, revolução francesa,
revolução industrial, etc.,) que foram minando essa prática, e aos poucos o tráfico
de pessoas deixou de ser uma prática legal, passando a ser paulatinamente
tratado com mais censura, até chegar à condição de ser considerado, pelos
Estados em comunidade internacional, como um ato ilícito, surgindo assim leis
para penalizar quem praticasse tais crimes contra as pessoas. Tal noção é
envolta em um crescente senso de dignidade humana, conforme se extrai do
seguinte trecho
5:
A idéia de que os indivíduos e grupos humanos podem ser reduzidos a um conceito ou categoria geral, que a todos engloba, é de elaboração recente na História. (...).
Foi durante o período axial da História, como se acaba de assinalar, que despontou a idéia de uma igualdade essencial entre todos os homens. Mas foram necessários vinte e cinco séculos para que a primeira organização internacional a englobar a quase totalidade dos povos da Terra proclamasse, na abertura de uma Declaração Universal de Direitos Humanos, que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.
Ora, essa convicção de que todos os seres humanos têm direito a ser igualmente respeitados, pelo simples fato de sua humanidade, nasce vinculada a uma instituição social de capital importância: a lei escrita, como regra geral e uniforme, (...).
Com base em tais noções, temos que
6:
A partir do século XIX, a legislação internacional passou a voltar seus esforços na proibição desse tráfico já que, com o tráfico negreiro, mulheres européias eram trazidas por redes internacionais de traficantes para a Europa e Estados Unidos da América e para as colônias para trabalhar como prostitutas. O “tráfico de escravas brancas” se tornou preocupante devido a um pânico moral nesses locais, que passaram a reivindicar mecanismos de erradicação da prática. Surgem a partir de 1904 os primeiros instrumentos legais para combater o tráfico nacional e internacional de mulheres, que mais tarde foi chamado de tráfico de pessoas. As convenções compreendiam o tráfico como todo ato de captura ou aquisição de um indivíduo para vendê-lo ou trocá-lo.
Assim, com base em tais premissas, verificamos que, na História da
Humanidade, sobretudo após o fim da 1ª Guerra Mundial, diante de tantas
atrocidades praticadas contra o gênero humano, muitos países do mundo se
5 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010. (p. 24)
6 IGNACIO, Julia. Tráfico de pessoas: como é feito no Brasil e no mundo? Disponível em:
uniram para combatê-las, criando assim no ano de 1919 a Liga das Nações, que
depois passou a ser a ONU
7. Dentre as suas diversas missões, no contexto de
promoção da dignidade humana, possuía o propósito de solucionar a questão do
tráfico humano, conforme vemos adiante
8:
(...). A Liga das Nações foi criada pelo Tratado de Paz de Versalhes, de 1919, que, acolhendo proposta do Presidente dos Estados Unidos, criou a Sociedade Geral das Nações (CAMPOS, 1999), (...).
O texto do Tratado de Versalhes, pelo qual foi criada, além da Sociedade das Nações, a Repartição Internacional do Trabalho que visava promover melhores condições de trabalho em todo o mundo, evitando o alastramento das condições que tinham dado causa à Revolução de outubro na Rússia, foi apresentado ao Senado Americano em 1919 (CAMPOS, 1999).
No âmbito da Liga das Nações, foi firmadas a Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças, em 1921, e a Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres Adultas, em 1933; e, em 1947, o Protocolo de Emenda da Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças e Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres Adultas e, posteriormente, a Convenção e Protocolo Final para a Supressão do Tráfico de Pessoas e o Lenocínio, em 1949. Apesar desta última ter sido adotada por 69 países, não disponibilizou nenhum órgão independente para monitorar sua implementação, quanto às medidas impostas aos Estados-membros quanto às áreas sociais, médicas e legais para a eliminação da prostituição e reabilitação das mulheres a ela submetida.
Assim, começamos a observar uma mudança na conjuntura mundial
concernente ao tráfico humano, onde os líderes das nações começam a elaborar
leis que possam abranger o mundo, buscando acabar com tais crimes. Porém as
convenções acordadas não obtiveram o êxito almejado, mostrando pouca
eficiência no objetivo de coibir o tráfico de pessoas.
Em 1956 temos por meio da Convenção de Genebra, mais um esforço,
desta feita por parte da ONU, no sentido de tentar solucionar o problema do
tráfico de pessoas, como se observa adiante
9:
7 MARTINS, Daniel Valentim; CORREIA, Eduardo Pereira. A organização das Nações Unidas na ordem internacional. In: DUQUE, Raquel; NOIVO, Diogo; SILVA, Teresa de Almeida e (coord).
Segurança contemporânea. Lisboa: Pactor, 2016, pp. 265 – 285. (p. 265).
8 União Pioneira de Integração Social – UPIS. A evolução histórica do tráfico de pessoas para fins de exploração sexual à luz dos direitos humanos. Brasília: UPIS, 2017. Disponível em:
<http://ssystem08.upis.br/repositorio/media/ebook/ebook_direito_trafico-pessoas.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2019.
9 IGNACIO, Julia. Tráfico de pessoas: como é feito no Brasil e no mundo? Disponível em:
No século XX, a Organização das Nações Unidas (ONU) manteve a construção de diversas convenções e discussões sobre as ramificações do tráfico de pessoas. Em 1956, a Convenção de Genebra repetiu os conceitos que já tinham sido construídos no passado e ampliou o foco para outros pontos importantes, como o casamento forçado de mulheres em troca de vantagem econômica; a entrega, lucrativa ou não, de menores de 18 anos a terceiros para exploração. A Convenção de Genebra também confirmou a importância de os países membros estabelecerem medidas administrativas para modificar as práticas ligadas à escravidão, assim como definir como crime essa e outras condutas ligadas ao transporte de pessoas de um país a outro e a privação de suas liberdades.
A Convenção de Genebra, ainda assim, não surtiu os efeitos práticos
desejáveis contra o tráfico de pessoas, e diante da ineficiência das leis existentes
contra o combate ao tráfico humano, surge no ano de 2000, o Protocolo de
Palermo.
Observamos que tal protocolo não surgiu de uma hora para outra. Seu
inicio ocorreu no ano de 1998, conforme comentário a respeito do assunto
10:
Em 1998 o Estatuto do Tribunal Penal Internacional passou a definir a escravidão sexual e a prostituição forçada como crimes internacionais de guerra, contra a humanidade. Assim, a Assembléia Geral da ONU criou um comitê intergovernamental para elaborar uma convenção internacional global contra esses crimes e examinar a possibilidade de elaborar um instrumento para tratar de todos os aspectos relativos ao tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças. O comitê apresentou uma proposta intensamente discutida durante o ano de 1999, que foi aprovada como Protocolo de Palermo (2000) por meio do qual o tráfico de pessoas se tornou um crime organizado transnacional, ou seja, comum a várias nações.
Aproveitando a conjuntura da época, pautada pela valorização da defesa
da dignidade humana em uma instância de interação global envolvida em uma
cooperação interestatal, a ONU, em 1999, cria O Escritório das Nações Unidas
sobre Drogas e Crime (UNODC), com objetivos específicos, focando
principalmente na questão do tráfico de pessoas realizado por organizações
criminosas, conforme percebemos do comentário a seguir
11:
A partir de 2000, vários protocolos e convenções foram adicionados a mecanismos da ONU para que os Estados-membros mantenham esforços de combater o tráfico de seres humanos. O Escritório das
10 Id. Ibid.
Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), criado em 1999, passou a ressaltar também o envolvimento do crime organizado na atividade e promover medidas eficazes para reprimir ações criminosas relacionadas, passando a se basear em alguns mecanismos como:
Programa contra o Tráfico de Seres Humanos, em colaboração com o Instituto das Nações Unidas de Pesquisa sobre Justiça e Crime Interregional (UNICRI);
Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças;
Protocolo contra o Crime Organizado Transnacional, Relativo ao Combate ao Contrabando de Migrantes por via Terrestre, Marítima e Aérea.
Todos esses esforços internacionais para enfrentar o tráfico de pessoas foram importantes para considerá-lo uma forma moderna de escravidão.
Dessa forma, a ONU criou os meios necessários para que fosse possível
formular um protocolo mais eficiente que os anteriores, com o objetivo de
combater o trafico humano, pois com esse novo instrumento passou a se adequar
à realidade do problema existente, falando-se aqui no Protocolo de Palermo.
Assim a ONU começa a definir um conceito mais amplo (com uma maior
gama de condutas descritas como ilícitas) e pertinente com a realidade prática do
combate ao tráfico de pessoas.
Após a definição desse conceito, a ONU pode finalmente traçar diretrizes
com objetivos mais claros e abrangentes, elaborando assim por meio da
Convenção de Palermo um texto final, o qual inseria os seus países membros e
passava a tratar o problema de forma transnacional
12:
A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, também conhecida como Convenção de Palermo, é o principal instrumento global de combate ao crime organizado transnacional. Ela foi aprovada pela Assembleia-Geral da ONU em 15 de novembro de 2000, data em que foi colocada à disposição dos Estados- membros para assinatura, e entrou em vigor no dia 29 de setembro de 2003.
A Convenção é complementada por três protocolos que abordam áreas específicas do crime organizado: o Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças; o Protocolo Relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea; e o Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, suas peças e componentes e munições. Observa-se que os países devem ratificar a Convenção antes de aderir a
qualquer um dos protocolos.
A Convenção representa um passo importante na luta contra o crime organizado transnacional e significa o reconhecimento por parte dos
12 UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME (UNODC). Convenção das Nações
Unidas contra o crime organizado transnacional (2000). Disponível em:
Estados-Membros da gravidade do problema, bem como a necessidade de promover e de reforçar a estreita cooperação internacional a fim de enfrentar o crime organizado transnacional. Os Estados-membros que ratificaram este instrumento se comprometem a adotar uma série de medidas contra o crime organizado transnacional, incluindo a tipificação criminal na legislação nacional de atos comuns a participação em grupos criminosos organizados, lavagem de dinheiro, corrupção e obstrução da justiça. A convenção também prevê que os governos adotem medidas para facilitar processos de extradição, assistência legal mútua e cooperação policial. Adicionalmente, devem ser promovidas atividades de capacitação e aprimoramento de policiais e servidores públicos no sentido de reforçar a capacidade das autoridades nacionais de oferecer uma resposta eficaz ao crime organizado.
Portanto, observamos que o Protocolo de Palermo foi um acordo de muita
importância, no contexto de tentar solucionar o problema do tráfico de pessoas
em nível internacional, porque diferentemente dos acordos anteriores, que se
mostraram ineficientes na prática, o Protocolo de Palermo, por possuir uma
característica de maior integração transnacional e atacar as áreas sensíveis das
organizações criminosas relacionadas diretamente ao trafico de pessoas, permitiu
aos Estados uma maior eficiência no combater a estas organizações criminosas
envolvidas nas referidas práticas delituosas. Buscando uma maior eficiência para
o protocolo, a ONU, dividiu as práticas ilícitas por áreas diferentes, mas que se
relaciona com o tema em questão.
2.2 Os diferentes tipos de tráfico humano
Quando falamos sobre o tráfico de pessoas, geralmente raciocinamos que
esta modalidade delitiva deva ser praticada através de alguma forma de coação,
como por meio de um sequestro, sendo presumível o uso de violência contra a
vítima. Entretanto, ao nos aprofundarmos no assunto, verificamos que nem
sempre o tráfico de pessoas vem precedido da violência física. Vejamos o que é e
onde ocorre com mais freqüência
13:
De maneira geral, o tráfico de pessoas consiste no ato de comercializar, escravizar, explorar e privar vidas, caracterizando-se como uma forma de violação dos direitos humanos por ter impacto diretamente na vida dos indivíduos. Se houver transporte, exploração ou cassação de direitos, o crime pode ser classificado como tráfico de pessoas, não importa se há supostamente um consentimento por parte da vítima.
13 IGNACIO, Julia. Tráfico de pessoas: como é feito no Brasil e no mundo? Disponível em:
O tráfico de pessoas é, em todo o mundo, o terceiro negócio ilícito mais rentável, logo depois das drogas e das armas. Essa prática não exclui nenhum país, nem indivíduos, mesmo que mulheres, crianças e adolescentes sejam as principais vítimas. Os países mais vulneráveis ao tráfico de seres humanos e à exploração sexual são os marcados pela pobreza, instabilidades políticas, desigualdades econômicas, países que não oferecem possibilidade de trabalho, educação e perspectivas de futuro para os jovens.
O tráfico de pessoas tem múltiplas facetas e finalidades, sendo que
algumas das principais específicas, dentre as suas formas mais praticadas, serão
abordadas neste tópico. Primeiramente, destacamos a questão relativa ao tráfico
para exploração sexual, onde a vitima é traficada exclusivamente para ser
explorada sexualmente, e nesta situação não se leva em consideração o gênero
masculino ou feminino, conforme vemos abaixo
14:
O tráfico internacional de pessoas decorre de uma série de fatores, relacionados a baixa oportunidade de emprego nos países subdesenvolvidos, ao fenômeno da migração humana, às desigualdades sociais, à discriminação, entre outros. Durante muito tempo, esse delito esteve ligado, de forme quase exclusiva, à exploração sexual de mulheres. Atualmente, é sabido que pessoas são traficadas para serem usadas como mendigos, para casamentos forçados, para fraudar a concessão de benefícios, para serem usadas na produção de pornografia, entre outros tipos de exploração.
Também se destacando, ainda neste contexto, a questão relativa ao tráfico
humano para fins de trabalhos forçados. No tráfico para execução de trabalho
escravo, geralmente esta modalidade ocorre com pessoas em condição
socioeconômica de pobreza, que são atraídas com falsas promessas de emprego.
Após chegarem no local prometido para trabalhar, a pessoa verifica que a
realidade é outra, e o que ganha só dá para pagar uma parte do que deve,
gerando dessa forma uma dívida impagável, como igualmente se observa a
seguir
15:
Dados divulgados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelam a importância de combater o tráfico de pessoas para coibir o trabalho forçado no mundo. A OIT estima que os ganhos globais com trabalho forçado na economia privada equivalem a 150.000 milhões de
14 SILVA, Gabriela Galiza e; TORRES, Saulo de Medeiros. A cooperação jurídica internacional como mecanismo de combate e prevenção ao tráfico internacional de pessoas: a situação brasileira. In: DEL OLMO, Florisbal de Souza; GUERRA, Sidney Cesar Silva; LOSURDO,
Frederico (coord). Direito internacional. Florianópolis: CONPEDI, 2017, pp. 6 – 21. (p. 7).
dólares por ano; cerca de dois terços advêm da exploração sexual comercial (OIT, 2014).
Há também o tráfico de órgãos, no qual existem situações em que é
realizada em comum acordo com a vítima
16:
(...) Gedalya Tauber, também conhecido como Gaudy, natural da Polônia, ex- major do Exército israelense encabeçava a quadrilha, e entrava em contato com pessoas da periferia de Recife oferecendo dinheiro pela cirurgia que ocorreria na África do Sul, com todas as despesas pagas, para a retirada de um dos rins.
Os potenciais doadores eram encaminhados para realizar exames pré- operatórios ainda em Recife, e se os resultados fossem positivos, rapidamente eram providenciados passaportes e passagens pelo grupo de Gedalya Tauber.
Ao chegarem a Durban, os exames eram refeitos e a cirurgia se realizava. Quando retornavam ao Brasil ou ainda na África, as pessoas recebiam o dinheiro. E esses aliciados se tornavam captadores de novos potenciais doadores, recebendo quantias em dinheiro para isso.
Contudo, na maioria dos casos tal crime é realizado com bastante
violência, sem o consentimento da vitima, sendo que a mesma geralmente é
assassinada
17:
O segundo caso foi de quatro pacientes em que a documentação médica mostrava estarem vivos, mas ainda assim, eram submetidos a nefrectomia bilateral, ou seja, eram retirados os dois rins, e quando eles reagiam na mesa de cirurgia, segundo depoimentos de enfermeiros, o médico efetuava manobras com o intuito de causar o óbito do paciente. Em uma dessas manobras conforme relata uma enfermeira à CPI, um paciente se debatia violentamente, e com o bisturi, o médico perfurou o coração e assim ocorreu a morte do paciente. Caso ocorrido em Taubaté, São Paulo, cometido por quatro médicos.
O trecho do depoimento ouvido na CPI revela tal fato:
No caso de Taubaté, teve a enfermeira, que era chefe da enfermagem do hospital, ela testemunhou na CPI e teve casos onde o paciente que foi diagnosticado com morte cerebral, ao ter os órgãos retirados, ele reagiu com estímulos e a enfermeira disse: 'Doutor, mas esse paciente não está morto'. E ela disse na CPI que o médico pegou o bisturi, foi em cima do coração, perfurou o coração e disse: 'Ele está morto, sim. Pronto! Acabou a cena.”
Por outro lado, o tráfico para adoção ocorre de uma forma diferente das
duas anteriores, porque geralmente, nessa modalidade de tráfico, procuram-se
16 AMARAL, Débora Maria Gomes Messias. Tráfico de órgãos: um crime invisível. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/68814/trafico-de-orgaos-um-crime-invisivel/2>. Acesso em 05 nov. 2019.
17 AMARAL, Débora Maria Gomes Messias. Tráfico de órgãos: um crime invisível. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/68814/trafico-de-orgaos-um-crime-invisivel/2>. Acesso em 05 nov. 2019.
crianças para serem vendidas a famílias no exterior que irão adotá-las
irregularmente. Não possui o objetivo de matar a criança.
Finalizando com os principais tipos de tráfico de pessoas, temos o tráfico
de crianças (ressalvado aquele realizado para fins de adoção, destacado no
parágrafo anterior), onde observamos que é diferente dos outros anteriores, tendo
em vista que é sempre feito contra o consentimento da vítima, sendo utilizada
bastante violência contra as crianças, conforme observamos no levantamento da
ONU
18:
Um novo relatório da ONU revelou nesta segunda-feira (7) que o tráfico de pessoas está avançando no mundo, com a exploração sexual das vítimas sendo a principal causa por trás do fenômeno. Segundo o levantamento, que analisou dados de 142 países, as crianças representam 30% de todos os indivíduos traficados, com o número de meninas afetadas sendo bem maior que o de meninos.
Para meninas e meninos, um padrão diferente foi detectado. Embora as crianças sejam em sua maioria vítimas do tráfico para trabalhos forçados (50%), muitas também são vítimas de exploração sexual (27%) e outras formas de exploração, como mendicância forçada, recrutamento em tropas e grupos armados e atividades criminosas forçadas. As meninas foram vítimas de exploração sexual em 72% dos episódios analisados. Casos de trabalho forçado envolvendo as jovens menores de idade equivaliam a 21% do total.
2.3 A adesão do Brasil ao Protocolo de Palermo
O Brasil vem enfrentando muitos problemas com o tráfico de pessoas,
tendo em vista vários fatores, como o seu tamanho continental, graves problemas
socioeconômicos, tráfico de drogas, crimes organizados, sistema judiciário
ineficiente, etc.
Diante dessa situação, cresceu exponencialmente o tráfico de pessoas no
país, e tentando buscar soluções para a grave situação, o Brasil, como país
membro da ONU, adere ao protocolo de Palermo, conforme vemos abaixo
19:
Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças
Aprovado pela resolução da Assembleia-Geral no 55/25, o protocolo entrou em vigor em 25 de dezembro de 2003. Trata-se do primeiro
18 UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME (UNODC). Relatório Global sobre o Tráfico de Pessoas (2018). Disponível em: <https://nacoesunidas.org/criancas-sao-quase-um-
terco-das-vitimas-de-trafico-humano-no-mundo-diz-onu/>. Acesso em: 05 nov. 2019.
19 IGNACIO, Julia. Tráfico de pessoas: como é feito no Brasil e no mundo? Disponível em:
instrumento global juridicamente vinculante com uma definição consensual sobre o tráfico de pessoas. Essa definição tem o fim de facilitar a convergência de abordagens no que diz respeito à definição de infrações penais nas legislações nacionais para que elas possam apoiar uma cooperação internacional eficaz na investigação e nos processos em casos de tráfico de pessoas. Um objetivo adicional do protocolo é proteger e dar assistência às vítimas de tráfico de pessoas, com pleno respeito aos direitos humanos.
(...).
Protocolo Relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea
Este protocolo foi aprovado pela Resolução da Assembleia-Geral no 55/25 e entrou em vigor no dia 28 de janeiro de 2004. O protocolo lida com o problema crescente de grupos criminosos organizados para o contrabando de migrantes, atividade que muitas vezes representa um alto risco para os migrantes e grandes lucros para os infratores. A grande conquista do protocolo foi que, pela primeira vez, um instrumento internacional global chegou a uma definição consensual do contrabando de migrantes. O protocolo visa à prevenção e ao combate desse tipo de crime, bem como promover a cooperação entre os países signatários, protegendo os direitos dos migrantes contrabandeados e prevenindo a exploração dessas pessoas.(...).
Uma vez analisada a noção doutrinária, bem como a perspectiva
internacional, do combate ao tráfico de pessoas, o próximo passo do estudo
– no
capítulo que segue
– passamos a verificar o cenário técnico e legal do direito
positivo interno brasileiro sobre esta temática.
3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL, OS DIREITOS HUMANOS E A LEI 13.444/2016
O Brasil ao longo dos anos vem se empenhando para tentar resolver o
problema do tráfico de pessoas. Dessa forma, por ocasião da elaboração da
Constituição Federal de 1988, a qual tem como um dos seus principais objetivos o
princípio da dignidade da pessoa humana, buscou por meio dos seus
legisladores, atentar para a questão dos direitos fundamentais da pessoa
humana. Logo nos seus artigos iniciais, ela já ressalta a preocupação com os
direitos humanos, demonstrando expressamente a importância da dignidade da
pessoa humana como vemos a seguir
20:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
20 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 18 out. 2019.
III – a dignidade da pessoa humana;
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:[...]
II – prevalência dos direitos humanos;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
Observamos assim que a CF/88, entende que a dignidade da pessoa
humana é inegociável e estão consolidadas no Brasil, devendo prevalecer sobre
tudo. Desta forma a Constituição brasileira deixa claro que é inaceitável o tráfico
de pessoas no Brasil. Diante dessa premissa da nossa Carta Magna, o Brasil vem
tentando combater o tráfico de pessoas no país, que por sinal vem tomando
dimensões estarrecedoras no Brasil, afetando de uma maneira profunda a vida
das pessoas que são vítimas de tamanha barbárie.
O tráfico de pessoas, além de traumatizar famílias inteiras, fere diretamente
a nossa Constituição Federal de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, pois
atinge diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana prevista nela.
Assim temos que
21:
[...] Benizete Ramos de Medeiros e Ana Paula Barcellos, analisando a estrutura da Constituição de 1988, classificam a dignidade da pessoa humana dentro do sistema constitucional em níveis, normas, princípios, subprincípios e regras, como segue:
Em nível I, no seu preâmbulo, a Constituição faz menção ao Estado Democrático de Direito como forma de garantir os exercícios dos direitos sociais e individuais. Em sequência, no artigo 1º, incs. I e II e no artigo 170, caput, verifica-se a incumbência da ordem econômica em assegurar a todos uma existência digna.
No artigo 226, § 7º, foi dado ênfase a família, como forma de garantir a dignidade da pessoa humana. [...] Vale lembrar que a CRFB/88 possui uma abordagem do princípio da dignidade da pessoa humana não só como princípio fundamental, mas também como princípio geral. O magistrado e professor da PUC-RS, Ingo Wolfgang Sarlet entende como definição deste princípio:
A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e
21 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.
A dignidade da pessoa humana, prevista no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal, constitui um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, inerente à República Federativa do Brasil. Sua finalidade, na qualidade de princípio fundamental, é assegurar ao homem um mínimo de direitos que devem ser respeitados pela sociedade e pelo poder público, de forma a preservar a valorização do ser humano.
Para Ingo Wolfgang Sarlet (2001), sendo a dignidade da pessoa humana um fundamento da República, a essa categoria erigido por ser um valor central do direito ocidental que preserva a liberdade individual e a personalidade, portanto, um princípio fundamental alicerce de todo o ordenamento jurídico pátrio, não há como ser mitigado ou relativizado, sob pena de gerar a instabilidade do regime democrático, o que confere ao dito fundamento caráter absoluto.[...].
Assim o Brasil deixa claro que busca combater o tráfico de pessoas.
Infelizmente é um crime bastante complexo, e tanto a Constituição Federal quanto
as leis criminais existentes se tornaram ineficientes e ultrapassadas para
combater o tráfico de pessoas. Após a adesão do Brasil ao protocolo de Palermo,
o país buscou se aperfeiçoar no enfrentamento ao tráfico de pessoas, e diante da
ausência de leis modernas em 2016 cria-se a lei 13.344/2016, de 06 de outubro
de 2016, que, sobretudo, “Dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno
e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas”
22.
A entrada em vigor da lei 13.344/2016, foi muito importante para o Brasil,
porque os crimes relacionados ao tráfico de pessoas previstos no Código Penal
Brasileiro eram arcaicos e com isso não atendiam a contento à finalidade de
combate a este ilícito.
O Código Penal, antes da entrada em vigor da Lei 13.344/2016, criminalizava o crime de tráfico de pessoas apenas na modalidade para exploração sexual, em seus Artigos 231 e 231-A, o que era uma terrível falha legislativa, tendo em vista que o tráfico de pessoas é um crime que pode ser executado em outras modalidades.
Enfim, com a entrada em vigor da lei, os artigos 231 e 231-A foram revogados, dando lugar ao artigo 149-A. Cabe ressaltar que o art. 231, §
22 BRASIL. Lei Federal nº 13.344/2016, de 06 de outubro de 2016. Dispõe sobre prevenção e
repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; altera a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Brasília, DF, 07 Out. 2016 (DOU). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2016/Lei/L13344.htm. Acesso em 12 Set. 2019.
2º, IV, bem como o art. 231-A, § 2º, IV, ambos do Código Penal, previam como causas de aumento de pena o emprego de violência, a grave ameaça e a fraude. Esses três meios de execução, que antes eram causas de aumento, passarão a integrar o próprio tipo penal.
As mudanças foram significativas, pois a ideia da nova lei não é apenas a punição do crime de tráfico de pessoas, mas também o legislador se preocupou com a repressão e com a atenção às vítimas deste horrível delito [...].23
Assim observamos que a Lei nº 13.344/2016, a Lei do Tráfico de Pessoas
acima referenciada, trouxe, modificações importantes ao ordenamento jurídico
brasileiro, porque mesmo apesar do Brasil estar seguindo o Protocolo de
Palermo, o tráfico de pessoas era criminalizado no Brasil apenas quando
praticado para fins de prostituição e exploração sexual, e a lei 13.344/2016 veio
trazer uma mudança profunda na legislação, possibilitando assim um
enfrentamento mais eficaz contra esse ilícito.
Ao analisarmos tal legislação, começamos a observar que ela passou a ser
fundamental para o combate ao tráfico de pessoas em suas diversas
modalidades. Vejamos alguns de seus artigos.
Em seu Art. 1º, esta Lei dispõe sobre o tráfico de pessoas cometido no
território nacional contra vítima brasileira ou estrangeira e no exterior contra vítima
brasileira
24:
Rogério Sanches Cunha (2016) destaca os primeiros e mais importantes dispositivos processuais desta, logo no artigo 1º a norma estabelece a aplicação do crime de tráfico de pessoas cometido em nosso território e também quando a vítima for brasileira e o crime for cometido no exterior. Logo, não se aplica quando o delito é praticado no exterior e a vítima for estrangeira.
Conforme o inciso VIII do Art. 3º, temos que “O enfrentamento ao tráfico de
pessoas atenderá às seguintes diretrizes: [...] VIII
– preservação do sigilo dos
procedimentos administrativos e judiciais, nos termos da lei;”
25. Assim,
percebemos que
26:
23 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
24 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
25 BRASIL. Lei Federal nº 13.344/2016, de 06 de outubro de 2016. Dispõe sobre prevenção e
Outro ponto interessante e com enorme efeito prático está no artigo 3º, VIII, quando aponta como diretriz do enfrentamento ao tráfico de pessoas a preservação do sigilo dos procedimentos administrativos e judiciais, nos termos da lei. Em determinadas situações, o sigilo das investigações e mesmo do processo, será inevitável, visto que dada a gravidade do crime e de seus autores, que na maioria das vezes compõem grandes organizações criminosas. Tal prática é de rara importância para a segurança das vítimas.
Conforme observamos, devido às grandes organizações criminosas
envolvidas no ilícito, por vezes será necessário manter o sigilo de algumas
operações desencadeadas pelo Estado.
No artigo 5º da mencionada lei, observamos que o legislador previu a
cooperação entre os órgãos do sistema de justiça e de segurança. Essa
cooperação é de suma importância para que haja sucesso nas diversas
operações realizadas contra as organizações criminosas. Vejamos o que o
legislador elencou
27:
Art. 5º A repressão ao tráfico de pessoas dar-se-á por meio: I - da cooperação entre órgãos do sistema de justiça e segurança, nacionais e estrangeiros;
II - da integração de políticas e ações de repressão aos crimes correlatos e da responsabilização dos seus autores;
III - da formação de equipes conjuntas de investigação.
Neste ponto, temos que
28:
O artigo 5º da lei 13.344/2016 prevê que a repressão ao tráfico de pessoas ocorrerá por meio da cooperação entre órgãos do sistema de
altera a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Brasília, DF, 07 Out. 2016 (DOU). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2016/Lei/L13344.htm. Acesso em 12 Set. 2019.
26 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
27 BRASIL. Lei Federal nº 13.344/2016, de 06 de outubro de 2016. Dispõe sobre prevenção e
repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; altera a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Brasília, DF, 07 Out. 2016 (DOU). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2016/Lei/L13344.htm. Acesso em 12 Set. 2019.
28 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
justiça e segurança, nacionais e estrangeiros; da integração de políticas e ações de repressão aos crimes correlatos e da responsabilização dos seus autores; e da formação de equipes conjuntas de investigação.
O Art. 9º da supra citada lei se aplica subsidiariamente, no que couber, ao
disposto na Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013 (trata da investigação criminal
incidente sobre organizações criminosas). A aplicação do artigo em comento é de
grande valia, e ajuda bastante na solução de crimes devido à colaboração
voluntária de infratores para solucionar o crime
29:
Já o artigo 9º nos remete à lei 12.850/2013, tal dispositivo permite que de forma subsidiária se aplique esta lei, que trata das organizações criminosas, conceituando essa conduta como:
Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.
Cabe ressaltar também os ensinamentos de Rogério Sanches Cunha, in
verbis:
A colaboração premiada poderia ser definida, já com base na lei em exame, como a possibilidade que detêm o autor do delito em obter o perdão judicial e a redução da pena (ou sua substituição), desde que, de forma eficaz e voluntária, auxilie na obtenção dos resultados previstos em lei. Dispõe o artigo 4º da lei 12.850 2013, que o juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2 terços a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal...”. [...] De acordo com Ronaldo Batista Pinto a colaboração premiada tem como conceito:A colaboração premiada poderia ser definida, já com base na lei em exame, como a possibilidade que detêm o autor do delito em obter o perdão judicial e a redução da pena (ou sua substituição), desde que, de forma eficaz e voluntária, auxilie na obtenção dos resultados previstos em lei. Dispõe o artigo 4º da lei 12.850 2013, que o juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2 terços a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal(...).
Conforme o “Art. 10. O Poder Público é autorizado a criar sistema de
informações visando à coleta e à gestão de dados que orientem o enfrentamento
ao tráfico de pessoas.”
30. Aqui, é proposto criar um sistema de informações,
29 ALMEIDA, Vinicius Margato de. Tráfico de pessoas e a Lei 13.344/2016. Disponível em:
<https://margato10.jusbrasil.com.br/artigos/474235018/trafico-de-pessoas-e-a-lei-13344-2016>. Acesso em: 05 out. 2019.
30 BRASIL. Lei Federal nº 13.344/2016, de 06 de outubro de 2016. Dispõe sobre prevenção e
repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; altera a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
aproveitando a tecnologia existente de forma que possa se criar um banco de
dados, onde possa conter informações diversas relacionadas ao crime de tráfico
de pessoas e para que, quando for necessário, os órgãos governamentais
envolvidos possam fazer uso para solucionar os ilícitos que ocorrem.
Em seu artigo 11, a lei 13.444/2016, altera o Código de Processo Penal,
trazendo mudanças bastante significativas quanto ao procedimento de
enfrentamento no combate ao tráfico de pessoas, conforme vemos abaixo:
Art. 11. O Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido dos seguintes arts. 13-A e 13-B:
“Art. 13-A. Nos crimes previstos nos arts. 148 , 149 e 149-A , no § 3º do art. 158 e no art. 159 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) , e no art. 239 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) , o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderá requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos.
Parágrafo único. A requisição, que será atendida no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, conterá:
I - o nome da autoridade requisitante; II - o número do inquérito policial; e
III - a identificação da unidade de polícia judiciária responsável pela investigação.”
“Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderão requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso.
§ 1º Para os efeitos deste artigo, sinal significa posicionamento da estação de cobertura, setorização e intensidade de radiofrequência. § 2º Na hipótese de que trata o caput , o sinal:
I - não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, que dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei;
II - deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período;
III - para períodos superiores àquele de que trata o inciso II, será necessária a apresentação de ordem judicial.
§ 3º Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva ocorrência policial.
§ 4º Não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que
e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Brasília, DF, 07 Out. 2016 (DOU). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2016/Lei/L13344.htm. Acesso em 12 Set. 2019.