• Nenhum resultado encontrado

Vista do A igreja adventista do sétimo e a mídia impressa | Acta Científica

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Vista do A igreja adventista do sétimo e a mídia impressa | Acta Científica"

Copied!
12
0
0

Texto

(1)

A IGREJA ADVENTISTA DO SÉTIMO

E A MÍDIA IMPRESSA

Francisco Luiz Gomes de Carvalho1

Resumo: Este estudo advém de uma revisão bibliográfica e apresenta uma visão geral acerca da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). O objetivo é explicitar a compreensão adventista acerca da mídia impressa, sua importância para o desenvolvimento denominacional, bem como evidenciar as representações simbólicas dos adventistas em relação à evangelização advinda da propaganda religiosa direta. Interessa esboçar um contexto histórico, bíblico e social para compreender a utili-zação da mídia por parte da IASD. A IASD teve sua origem a partir do movimento milerita nos EUA (séc. XIX) e desde seus primórdios caracterizou-se marcadamente pelo interesse na mídia impressa como estratégia de difusão da mensagem adventista do sétimo dia ao redor do mundo.

Palavras-chaves: Igreja Adventista do Sétimo Dia; Mídia; Evangelização

THE SEVENTH-DAY ADVENTIST CHURCH AND THE PRINTED MEDIA

Abstract: This study comes from a literature review and presents an overview about the Seven-th-day Adventist Church (SDA). The aim is to uncover the Adventist understanding about the printed media and its importance for the denominational development. It also seeks to highli-ght the symbolic representations of Adventist evangelism arising in relation to direct the reli-gious advertising. Our interest is to sketch a historical, biblical and social context to understand the use of the media by the SDA. The SDA church had its origin from the Millerite movement in the U.S. (XIX century), and since its beginning it was characterized by emphasizing the printed media as a strategy for disseminating the Seventh-day Adventist message around the world. Keywords: Seventh-day Adventist Church; Media; Evangelization

As publicações tiveram grande influência na história da Igreja. Com a invenção da imprensa, o conhecimento encontrou o meio pelo qual deixava de ser privilégio de poucos e se tornava acessível a todos. Em pouco tempo, esse novo meio de comuni-cação chama atenção da Igreja, tanto que, em 1487, o Papa Inocêncio VIII publica o Inter Multiplices. Segundo Puntel (2010, p. 24), tal documento além de definir o pensa-mento da Igreja referente aos meios de comunicação escrita, apontava para o fato de que “o Papa estava preocupado com a vida espiritual dos católicos e via no advento da imprensa uma nova tecnologia que poderia ameaçar o controle eclesiástico da produção cultural de seu tempo”.

1 Mestrando em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Bol-sista CNPQ. Especialista em Docência Universitária (Unasp), graduado em Teologia (Unasp) e graduando em Pedagogia (Unip). E-mail: fluizg@yahoo.com.br

(2)

90

Certamente as publicações desempenharam papel significativo para a causa da Refor-ma. Com efeito, escrevendo sobre Lutero e sua obra, um conhecido historiador afirma que

se ele não conseguiu missionários para levar a mensagem a terras distantes, Deus proveu um missionário de outra espécie. A imprensa foi a sucessora dos evangelistas. Foi a artilharia empregada contra a fortaleza romana. Lutero preparou uma mina cuja explosão sacudiu o edifício de Roma até os alicerces mais profundos. (D´AUBIGNÉ, 1985, v. 6, p. 197).

Neste texto, pretende-se apontar alguns delineamentos referentes à relação entre a IASD e a mídia impressa. Não é intenção fazer um estudo histórico e aprofundado acerca do desenvolvimento da empresa de publicações dessa denominação, mas somente desvelar algumas nuances do interesse denominacional pela mídia impressa como estra-tégia de difusão da mensagem. Convém indicar que a leitura do passado que orienta este texto encontra-se dialeticamente imbricada com questões do presente. Assim que, nesta perspectiva histórica, o saber histórico resulta do conhecimento do passado textualizado, permeado de intervenções e interdições. Ou seja,

é necessário lembrar que uma leitura do passado, por mais controlada que seja pela análise de documentos, é sempre dirigida por uma leitura do presente. Com efeito, tanto uma quanto a outra se organizam em função de problemáticas impostas por uma situação. Elas são conformadas por premissas, quer dizer, por ‘modelos’ de interpretação. (CERTEAU, 2000, p. 33).

Este texto apresenta-se permeado por uma postura caracteristicamente marcada pela busca por evidenciar as representações simbólicas dos adventistas em sua relação com a evan-gelização advinda de propaganda religiosa direta demarcada pelo uso da mídia impressa. Para isto, torna-se inevitável indicar no discurso da profetisa do movimento, Ellen G. White, o filão orientador para a denominação em seu constante interesse avivado pela obra das publicações.

Há de se ressaltar que neste texto a palavra mídia é utilizada no mesmo sentido de impren-sa, sendo que privilegiar-se-á como recorte a referência às publicações impressas (livros, revistas e folhetos) no adventismo. Para êxito neste empreendimento, Adorno e Horkheimer (1992), Bour-dieu (1997), Hoffer (1968), Martino (2003) e Pesavento (1995) tornam-se primordiais para auxiliar nos apontamentos, delineamentos e considerações referentes à relação do adventismo e mídia.

Origem e formação da IASD

Há poucas pesquisas cujo objeto de estudo é a IASD, o que aponta para certo desco-nhecimento a respeito das origens históricas de tal movimento, bem como de detalhes refe-rentes à sua expansão mundial e manutenção identitária. A compreensão acerca do adven-tismo pulverizada em pesquisas brasileiras apresenta diversas posturas. Martin (1990) aponta para a proximidade do adventismo com a família evangélica; Oliveira Filho (2004) situa a IASD no contexto dos movimentos messiânicos norte-americanos, enquanto que Bitten-court Filho (1996) sinaliza na direção de que tal igreja é, na realidade, uma seita,

(3)

constituin-91

AR

TIGO

do-se em pseudoprotestantes. Uma postura mais elucidativa é adotada por Bellotti (2010), que, mesmo considerando que a IASD adota práticas e crenças que não são comuns a todos os ramos protestantes, indica que essa igreja é oriunda do protestantismo norte-americano.

A partir da década de 1830 até o seu apogeu, no ano de 1844, figurou vigorosamente o movimento milerita2 na América do Norte. Balizado por um contexto de movimentos

mes-siânicos do século XIX, tal movimento floresceu em uma época de especial união do espírito revivalista e democrático caracterizadores do povo americano. Gaustad (1975, p. 15), ao des-crever o ambiente religioso contextual do movimento milerita, afirma que “revivalistas e mile-nialistas, comunitários e utopistas, espiritualistas e prognosticadores, celibatários e polígamos, perfeccionistas e transcendentalistas” compunham o cenário que anteriormente era dominado pelas organizações religiosas convencionais. O movimento milerita, além de mostrar inconfor-mismo com as associações religiosas já estabelecidas, apresentava algumas características gerais, aqui assinaladas. São elas: a) reivindicação de certa primazia de iluminação interior e do Espírito Santo; b) pregação que enfatizava o aspecto não conclusivo da Revelação; c) propugnação da realização da Igreja no mundo alheia aos poderes estabelecidos (QUEIROZ, 1965, p. 92).

Com o desapontamento vivido em 1844, advindo da frustração do não retorno de Jesus, no interior de um dos grupos remanescentes do movimento milerita foram lançadas as bases ideológicas que culminaram posteriormente na sistematização de crenças e organização institucional da denominação religiosa, que se tornou conhecida como Igreja Adventista do Sétimo Dia (TARLING, 1981).

De acordo com Knight (1993), o movimento milerita foi um movimento religioso marcadamente interconfessional, e o não cumprimento das predições de Miller culminou na multiplicidade de interpretações referentes ao advento de Jesus. As diferenças dotri-nárias contribuíram para separar os seguidores de Miller, o que fez surgir pelo enosqua-ro grupos. Um deles, que ficou conhecido como os adventistas do “Sábado e da Porta Fechada”3, finalmente encontrou unidade e missão (DOUGLASS, 2001).

Em 1863, houve a organização da IASD, que, por essa época, contava com cerca de 3.500 membros. Já em 2009, a membresia estava estimada em mais de 16 milhões distribuídos ao redor do mundo. A IASD desenvolveu um sistema doutrinário formado por doutrinas comuns ao cristianismo, ensinos mantidos por alguns segmentos conser-vadores, bem como por outros que lhe são particulares. Diz Nunes (1999, p. 56) que a IASD, “ensina verdades que lhe são distintas (santuário, juízo investigativo, a manifes-tação do espírito de profecia na vida e obra de Ellen G. White, o selo de Deus, a marca da besta e a tríplice mensagem angélica)”.

Com a organização da IASD em 1863 e a sistematização das doutrinas defendidas pe-los adventistas, percebe-se o papel desempenhado pela profetisa no círculo denominacional, 2 Teve a liderança de Guilherme Miller (1782-1849), que, depois de intenso estudo da Bíblia e interpretação

pecu-liar de textos proféticos, anunciou a volta de Jesus para uma época marcada, entre a primavera de 1843 e a primavera de 1844. Para um breve resumo acesse: <http://bit.ly/P0ikGa>. Acesso em: 01 dez. 2011.

3 O grupo que originou a IASD apresentava três núcleos principais, sendo eles: a) estudo acerca do

Santu-ário; b) estudo referente ao dia de santificação (sábado) e c) aceitação do dom profético de Ellen G. White. Para maiores detalhes, ver Timm (2002).

(4)

92

podendo ser melhor compreendido como atuante na confirmação e correção dos rumos doutrinários, bem como no direcionamento de investimentos das finanças institucionais para o cumprimento da missão. De acordo com Douglas (2001, p. 183), Ellen G. White es-teve “muitas vezes à frente dos líderes do movimento, não apenas em percepções teológicas e suas aplicações práticas, mas também na constante insistência por unidade e organização”. Em pouco tempo, houve uma rápida transição da instabilidade pós-milerita para uma organização estável e uniforme alcançada pela IASD em seus primórdios. Segundo Douglas (2001, p. 183), dentre as razões elencadas para o fenômeno de ex-pansão adventista, pode-se citar o interesse adicional pela educação, regime alimen-tar, cuidado médico, liberdade religiosa etc. Fato é que o interesse por instituições “paralelas” favoreceu o avanço da denominação tanto do ponto de vista ideológico quanto institucional. O estabelecimento de instituições educacionais, médicas, de pu-blicações no meio da IASD é em muito resultante das orientações de Ellen G. White provindas de suas visões e sonhos4.

O adventismo e a mídia escrita

O desapontamento de 1844, além de trazer desânimo aos confiantes que aguar-davam o retorno de Jesus, contribuiu para dispersar aqueles que professavam os en-sinos do movimento milerita. Alguns daqueles remanescentes do movimento milerita empreenderam esforços no sentido de manter avivadas as doutrinas, bem como a reorientação do fervor espiritual. De certa forma, os remanescentes demonstraram inspiração na “experiência milerita para difundir seus conceitos de verdade religiosa em contínua expansão” (SCHWARZ; GREENLEAF, 2009, p. 69).

Dentre os fatores condicionantes para a amplitude de alcance e sucesso do mo-vimento milerita, pode-se relevar o intenso uso da mídia impressa à disposição naquela época. Assim, segundo Douglass (2001, p. 362), “publicar livretos, folhetos e periódicos era o segredo do sucesso do movimento milerita do Segundo Advento”.

O uso da mídia impressa nos primórdios da IASD cumpriu propósito trino: oportunizar comunicação entre os crentes dispersos, divulgar as conferências para que mais pessoas pudessem assistir, como também tornar conhecidas as novas com-preensões doutrinárias advindas de estudos.

O início da obra das publicações na IASD, bem como o lugar importante que a mesma encontra no desenvolvimento institucional, deve muito à atuação da profetisa ad-ventista, pois foi sob sua orientação que tal empreendimento lançou as bases e encontrou as diretrizes necessárias para sua efetivação e constante fervor avivado.

Foi em Dorchester, Masschussetts, no mês de novembro de 1848, após uma visão da profetisa, que o papel significativo da página impressa para o adventismo recebeu os delineamentos. Tendo recebido a visão, Ellen G. White transmitiu uma mensagem ao marido (Tiago White) que dizia:

4 Para informação acerca das visões e sonhos leia a obra de Douglass (2001, p. 546-549), onde há uma seleção de

(5)

93

AR

TIGO

você deve começar a publicar um pequeno jornal e mandá-lo ao povo. Seja pequeno a princípio; mas, lendo-o o povo, mandar-lhe-ão meios com que imprimi-lo, e alcançará bom êxito desde o princípio. Desde este pequeno começo foi-me mostrado assemelhar-se a torrentes de luz que circundam o mundo. (WHITE, 1996, p. 127).

Não foi sem muito esforço e economia que, em pouco tempo, o primeiro perió-dico esteve a circular: uma modesta revista de cerca de oito páginas com o título Present Truth (A Verdade Presente). Pouco tempo se passou e logo o desânimo acometeu o redator,

ameaçando a publicação da revista. Por essa ocasião, em 1850, Ellen G. White escreveu:

Contemplei a revista e vi que isto era necessário. […] Foi-me mostrado que a revista deve prosseguir; […] Vi que Deus não quer que Tiago pare ainda. Cumpre-lhe escrever, escrever, escrever, despachar a mensagem e deixá-la ir. Vi que ela iria aonde os servos de Deus não podem ir. (WHITE, 1979, p. 2).

A publicação dessa revista se estabeleceu e outro periódico (Advent Review) foi criado. Entretanto, logo perceberam a necessidade de unificação dos periódicos e nas-ceu uma revista que combinava as finalidades das duas precedentes, denominada Second Advent Review and Sabbath Herald:

O periódico tornou-se a revista oficial da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Teve seu nome mudado várias vezes, a última para Adventist Review. Historicamente, os adventistas

comumente a têm chamado de Review. (SCHWARZ; GREENLEAF, 2009, p. 74).

A nova revista apresentava-se composta, em sua maior parte, por assuntos doutrinários, mas também veio apresentar em seu escopo a seção “comunicações”, na qual incluía cartas de missionários e transmitia informação referente ao movimento dos ministros itinerantes.

Essas primeiras publicações desempenharam fundamentalmente o papel de favo-recer coesão e unidade doutrinária ao movimento adventista que expandia lentamente. O que se viu a partir do humilde começo foi a multiplicação de edições e editoras, publica-ção de diversas obras. A IASD conta atualmente com 63 editoras e filiais5.

Além da orientação da profetisa a respeito do início da obra de publicações, acres-centa-se a informação referente à introdução do agente evangelizador por meio de litera-tura no meio denominacional, fato este devedor a uma visão recebida por Ellen G. White em uma reunião campal em New York, em setembro de 1875. Dessa forma, são lançadas as bases a partir das quais a obra das publicações adquiriu caráter de colportagem6, a ser

desenvolvida com um senso de sacralidade, ou seja, um ministério balizado pela vocação 5 Dados estatísticos denominacionais encontram-se disponíveis em: <http://bit.ly/Nllf6p>. Acesso em: 11 dez. 2011. 6 Atividade de distribuição voluntária e, às vezes, independente de publicações de conteúdo religioso e temas relacionados

(6)

94

evangelística. Assim sendo, a denominação iniciou o programa mundial de evangelismo pela literatura, no qual homens e mulheres levam a página impressa de porta em porta. Em uma reunião oficial da IASD realizada na Basileia, Suíça, em 14 de setembro de 1875, Ellen G. White (1999, p. 693) disse:

Em breve Deus fará grandes coisas por nós, se nos achegarmos humildes e confiantes a Seus pés. […] Mais de mil se converterão brevemente em um dia, a maioria dos quais reconhecerá haver sido primeiramente convencida através da leitura de nossas publicações.

A história da IASD atesta que a expansão mundial denominacional durante os anos seguintes aos primórdios surge estreitamente entrelaçada com os escritórios de publicações esta-belecidos em diversos países, bem como através do envio de literatura, como foi o caso do Brasil e de alguns países da América do Sul. Nesse esteio, Oliveira Filho (2004, p. 170,171) afirma que

a expansão latino-americana do adventismo ocorreu a partir da segunda metade do século XIX, inicialmente através de publicações enviadas à Argentina por alguns parentes de imigrantes alemães, com a posterior vinda de “colportores”. […] De fins do Império à primeira República, estabeleceram-se núcleos adventistas em várias regiões do Brasil. Inicialmente, com a chegada de exemplares de Stimme der Warheit (A voz da Verdade) através do porto

de Itajaí para alemães de Brusque; os periódicos editados em Battle Creek, Michigan, tornaram inúmeras famílias “interessadas” nas doutrinas adventistas, em Santa Catarina, sendo efetuados maiores contatos por correspondência com a editora e a Sociedade Internacional de Tratados dos Estados Unidos, que passaram a enviar novas publicações.

É em um arcabouço doutrinário-profético que o adventismo atualiza a sua compreensão como povo remanescente singular e portador de uma mensagem. O eixo doutrinário encontra em Apocalipse 14:6 a base para proclamação do evangelho eterno a “toda nação, e tribo, e língua e povo”. Segundo Knight (2010, p. 55), “[…] a compreensão dessa visão apocalíptica literalmente levou os membros da igreja a sacrificar a vida e os recursos para disseminar o que costumavam chamar de mensa-gem”. A leitura do capítulo 18 de Apocalipse, que revela a visitação sobrenatural de um anjo iluminando a Terra com a sua mensagem e glória é entendida no meio adven-tista como o movimento resultante da distribuição de literatura, indicando, assim, que a evangelização pelas publicações é um cumprimento da obra “daquele outro anjo”. Oliveira (1985, p. 92) ressalta que,

à semelhança dos três anjos de Apocalipse 14, o anjo do capítulo 18 constitui um símbolo. Deus confiou aos homens e não a seres celestiais a responsabilidade de proclamar o evangelho redentor ao mundo.

(7)

95

AR

TIGO

Todo esse simbolismo encontra explicação na seguinte declaração:

A Igreja Adventista do Sétimo Dia foi chamada à existência em razão de uma mensagem especial para os últimos dias. Sua missão é viver essa mensagem e fazer com que outros dela tomem conhecimento (mediante livros e periódicos e por outras formas) a fim de que também a possam vivê-la. (MAXWELL, 1982, p. 107).

Em solo brasileiro, a IASD transplantou a mesma orientação da matriz estaduni-dense, apesar da gênese denominacional nestas terras apresentar-se no mínimo de forma curiosa: o crescimento do adventismo em terras brasileiras está intimamente relacionado ao seu interesse pelas diversas mídias como ferramentas de difusão da mensagem.

Estudos referentes ao uso da mídia entre as diversas confissões religiosas apontam para o fato de que as igrejas com histórico e orientação religiosa mais próxima do protes-tantismo carregam uma vocação orientadora em seu projeto de expansão. Bellotti (2010, p. 64) sinaliza para a evidência de que

os adventistas foram pioneiros no uso de mídia eletrônica para transmitir mensagens evangelizadoras no Brasil, em 1943, e possuem tradição no uso da imprensa para a divulgação de suas doutrinas e de seu estilo de vida, baseado no vegetarianismo e no bem-estar físico e espiritual.

A este grupo pertence uma das maiores editoras do Brasil, a Casa Publicadora Brasileira (CPB), que, em 2000, completou 100 anos, a qual somente na década de 1990 acumulou uma produção de 18 milhões de livros. A pungência do crescimento da mídia impressa adventista no Brasil encontra-se na plataforma dos mais variados meios de distribuição de literatura, pu-blicação de livros didáticos que servem para a rede educacional adventista, mas, sobretudo, no programa baseado em revenda de livros realizado por colportores efetivos e estudantes que, nas férias, buscam nas vendas os meios para manter-se em escolas e faculdades.

Os últimos anos têm assinalado o intenso investimento na produção de livros que são usados no programa evangelizador anual, que distribui grande quantidade de literatura para o público em geral. Para se ter ideia, o projeto em curso aponta para a distribuição na América do Sul, em 2012, de mais de 35 milhões de exemplares do livro A Grande Esperança. Essa obra é uma seleção de 11 capítulos do livro O Grande Conflito (principal publicação denominacional), cuja intenção é apresentar a explicação do passado, interpretação do presente e revelar o futuro.

Tais projetos buscam reavivar o imaginário adventista referente à compreensão apocalíptica de povo remanescente com uma mensagem peculiar a ser proclamada. Eles se apoiam em textos escritos da orientação profética para legitimar os investimentos na direção evangelizadora. Muitas declarações da profetisa Ellen G. White estão entre as pre-feridas para demonstrar a diretriz espiritual e sobrenatural da obra do ministério das pu-blicações. Uma delas reza o seguinte: “Devemos utilizar os meios possíveis para levar a luz diante do povo. Utilize-se a imprensa e cada meio de propaganda para chamar a atenção para o trabalho” (WHITE, 1997, p.130). Na mesma direção, outra declaração sustenta que

(8)

96

este é um trabalho que deve ser feito. O fim está próximo. Já se tem perdido muito tempo, quando esses livros já deviam estar em circulação. Sejam eles vendidos longe e perto. Espalhem-se como folhas de outono. Esta obra deve continuar sem que ninguém a impeça. Almas estão perecendo sem Cristo. Sejam elas advertidas de seu breve aparecimento nas nuvens do céu. (WHITE, 1999, p. 25).

Talvez a orientação profética mais contundente acerca do poder que as publica-ções devem representar ao programa evangelizador da denominação, seja a que afirma: “De nossos livros e revistas, brilharão luzes que iluminarão o mundo com a verdade

presente” (WHITE, 1999, p.5).

Considerações finais

Os estudos acerca do protestantismo e sua atual configuração apontam para a ne-cessidade de aprofundamentos e rediscussões, pois o protestantismo deixou de ser uma força de negação do mundo e da sociedade, passando a desenvolver mecanismos internos de inserção no panorama social, cultural e político da sociedade (CAMPOS, 2004).

A atual complexidade protestante é melhor compreendida à luz do paradigma da complexidade7, visto que “valoriza a multicausalidade, a complexidade interna das

insti-tuições e movimentos religiosos, as relações dialéticas entre agentes e organização, seus recursos humanos e o entorno” (CAMPOS, 2004, p. 118).No mesmo sentido, Mendonça (2008) indica a necessidade dos estudos atentarem aos limites, continuidades e rupturas características do movimento histórico do protestantismo.

Conhecer as condições institucionais é tão importante quanto as condições sociais da produção de bens simbólicos, conforme afirma Bourdieu (1997, p. 157), que assinala a importância “de observar, portanto, os produtores da mensagem religiosa, os interesses específicos que animam as estratégias”.

A observação atenta da maior parte das publicações adventistas indica que a denominação não apostou em um proselitismo direto, mas sim buscou ocupar cada vez mais espaço no mercado de bens religiosos. Segundo Bellotti (2005, p. 105), é im-prescindível lembrar que “todo produto de mídia religiosa possui uma dupla natureza: a instrução e a divulgação”.

A constante atualização das publicações, diversidade de temas, abordagens e suportes apresentados nos produtos adventistas indica que os agentes institucionais estão atentos às mudanças ocorridas no contexto social, o que permite afirmar que a “compatibilidade entre a religião e mudança social garante-se com uma mudança no próprio modus operandi dessa produção simbólica em uma sociedade secularizada” (MARTINO, 2003, p. 28).

Como a IASD se encontra imersa em uma sociedade que, na atualidade, é caracte-risticamente marcada como uma “sociedade de comunicação”, tem-se a indicação de que,

(9)

97

AR

TIGO

neste sentido, a Igreja Adventista se apresenta atenta ao seu tempo ao desenvolver sua mensagem religiosa por intermédio de várias frentes e por fomentar e gerir a atuação de empresas, em variados setores, como parte de sua missão. (FONSECA, 2008, p. 97).

A continuidade do fervor avivado no meio denominacional referente ao papel a ser desempenhado pelas publicações na obra adventista aponta para uma das características fundamentais de qualquer tradição, que “é justamente sua capacidade de encontrar em si mesma os referenciais simbólicos para a explicação do presente, atualizando-se cada época em sua explicação” (MARTINO, 2003, p. 50).

Com o propósito de apreender o objetivo subjacente da instituição religiosa em seu uso midiático, convenciona-se apontar a intencionalidade de convencimento do outro, a fim de direcioná-lo à adesão por um segmento religioso, além da perspectiva de visibilida-de pretendida (CUNHA, 2008). Assim, as representações se expressam em conhecimento, ações que tem como pano de fundo as estratégias de interesses, manipulação e poder,

ou seja, no domínio da representação, as coisas ditas, pensadas e expressas têm outro sentido além daquele manifesto. Enquanto representação do real, o imaginário é sempre referência a um ‘outro’ ausente. O imaginário enuncia, se reporta e evoca outra coisa não explícita e não presente. Este processo, portanto, envolve a relação que se estabelece entre significantes (imagens, palavras) com os seus significados (representações, significações), processo este que envolve uma dimensão simbólica. (PESAVENTO, 1995, p.15).

Como a maior parte da literatura adventista está marcadamente permeada pelo espectro doutrinário, é pertinente indicar que na mídia impressa adventista a informação/ mensagem é o produto-meio vinculado à obtenção de êxito no projeto religioso mais amplo, no qual as ligas da tradição adventista apontam para a representação unilateral do mundo. O que, desta forma,

representa a combinação de instâncias de socialização e de construção de universos simbólicos que pautariam a ótica que terá o ‘fiel-receptor’ da realidade […] difundindo conceitos e perspectivas de comportamento. (MARTINO, 2003, p. 59).

Adorno e Horkheimer (1992) explicitam que a ideia de objetividade que perpassa a mí-dia impressa corrobora a difusão de bens simbólicos e conteúdos ideológicos, que podem estar mascarados pela intencionalidade de veiculação de informação neutra. Certamente, os dogmas, certezas e a série de representações ofertadas por uma instituição religiosa, dispostas em diversos suportes midiáticos, dentre eles a mídia impressa, lançam as bases para uma contínua atribuição de significados que são apropriados pelos fiéis ou simpatizantes, tendo como resultante disso o agir

com a certeza plena de estar de posse de um conhecimento, senão socialmente reconhecido, individualmente capaz de responder a questões existenciais, de maneira a fornecer resposta e sentido à existência. (HOFFER, 1968, p. 82).

(10)

98

Muito além da evangelização doutrinária, propagação de ideias religiosas, busca pela visibilidade, convencimento do outro e busca por novas adesões ao segmento reli-gioso, as igrejas que lançam mão das diversas mídias projetam em seu arcabouço nuances que apontam para o objetivo maior, que é alcançar a dominância e monopólio para a produção do sagrado (WUTHNOW, 1994).

Follis e Cunha (2010, p. 68) apontam a tendência adventista de ampliar sua atu-ação no campo midiático ao lançar mão de novos suportes na comunicatu-ação de massa, pois ao que parece “a sobrevivência da palavra, na moderna sociedade da imagem, só será possível através da união com a imagem midiática”. De fato, de uma coisa pode-mos ter certeza, ainda existe muito sobre o que se pesquisar acerca do adventismo e a mídia, visto ser grande

o tamanho, a distribuição e escopo de atuação da Igreja Adventista, ao lado de sua característica de gestão centralizadora, além de seu pioneirismo no uso dos meios de comunicação de massa. (FONSECA, 2008, p. 99).

Referências

ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1992. BELLOTT, K. K. Mídia presbiteriana no Brasil. Luz para o caminho e editora cultura cristã (1976-2001). São Paulo: Annablume/FAPESP, 2005.

. Pluralismo protestante na América Latina. In: SILVA, E. M.; BELLOTTI, K. K.; CAMPOS, L. S. (Orgs.). Religião e sociedade na América Latina. São Bernardo do Campo, SP: Universidade Metodista de São Paulo, 2010.

BITTENCOURT FILHO, J. Abordagem Fenomenológica. In: ROLIM, F. C. et al. Novos movi-mentos religiosos na igreja e na sociedade. São Paulo: AM Edições, 1996.

BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

CAMPOS, L. S. Protestantismo e mudança social. In: SOUZA, B. M.; MARTINO, L. S. (Orgs.). Sociologia da religião e mudança social. São Paulo: Paulus, 2004.

CERTEAU, M. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000.

CUNHA. M. N. A serviço do rei: uma análise dos discursos cristãos midiatizados. Revista de Estudos da Religião, ano 8, set, p. 46–68, 2008. Disponível em: <http://bit.ly/Ox0bwK>. Acesso em: 11 dez. de 2011.

DÁUBIGNÉ, J. M. History of the reformation. London: Oliver & Boyd, 1985. v. 6. DOUGLASS, H. E. Mensageira do senhor: o ministério profético de Ellen G. White. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2001.

(11)

99

AR

TIGO

ETKIN, J.; SCHVARSTEIN, L. Identidad de las organizaciones: invarianca y cambio. Buenos Aires: Paidós, 1989.

FOLLIS, R.; CUNHA, M. Motivações adventistas para o uso da mídia. Acta Científica. v. 18, n.1, p. 59 – 72, 2010. Disponível em: <http://bit.ly/OT0dMD>. Acesso em: 10 ago. de 2011. FONSECA, A. B. Muito além do sábado: o pioneirismo adventista na mídia eletrônica religiosa. Revista de Estudos da Religião. Ano 8, Set, 2008, p. 89 – 100. Disponível em: <http://bit.ly/ Ox0bwK>. Acesso em: 11 dez. de 2011.

GAUSTAD, E. The rise of Adventism. New York: Harper & Row, 1975.

HOFFER, E. Fanatismo e movimentos de massa. Rio de Janeiro: Lidador, 1968.

KNIGHT, G. R. Antecipating the advent: a brief history o seventh-day Adventists. Boise: Pacific Press, 1993.

. A visão apocalíptica e a neutralização do adventismo: estamos apagando nos-sa relevância?. Tatuí: Canos-sa Publicadora Brasileira, 2010.

MARTIN, D. Tongues of fire: the explosion of protestantism in latin America. Oxford: Bla-ckwell, 1990.

MARTINO, L. S. Mídia e poder simbólico: um ensaio sobre comunicação e campo religioso. São Paulo: Paulus, 2003.

MAXWELL, C. M. História do adventismo. Santo André: Casa Publicadora Brasielira, 1982. MENDONÇA, A. G. Protestantes, pentecostais & ecumênicos: o campo religioso e seus personagens. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2008.

MORIN, E. (Org.). A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

MORIN, E.; LEMOIGNE, J. L. A inteligência da complexidade. São Paulo: Petrópolis, 2000. NUNES, L. Crises na Igreja Apostólica e na Igreja Adventista do Sétimo Dia. Análise compa-rativa e implicações missiológicas. Engenheiro Coelho: Imprensa Universitária Adventista, 1999. OLIVEIRA, E. A mão de Deus ao leme. Santo André: Casa Publicadora, 1985.

OLIVEIRA FILHO, J. J. Formação histórica do movimento adventista. Estudos Avançados, v. 18, n. 52, p. 157-179, 2004. Disponível em: <http://bit.ly/NllMWe>. Acesso em: 12 de dez. de 2011. PESAVENTO, S. J. Representações. Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH/ Con-texto, v.15, n. 29, 1995.

(12)

100

QUEIROZ, M. P. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Dominus/Edusp, 1965. SCHWARZ, R. W.; GREENELEAF, F. Portadores de luz: história da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2009.

TARLING, L. The edges of seventh-day adventism. Bermagui South, Australia: Galilee Publication, 1981.

TIMM, A. R. O santuário e as três mensagens angélicas: fatores integrativos no desenvolvi-mento das doutrinas adventistas. Engenheiro Coelho: Unaspress, 2002.

WHITE, E. G. Vida e ensinos. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 1996.

. Manuscrito 2, 1850. In: SCHWARZ, R. Light bearers to the remant. Mountain View: PPPA, 1979.

. Evangelismo. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 1997.

. O colportor evangelista. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 1999. WUTHNOW, R. Producing of sacred. Chicago: University of Illinois Press, 1994.

Referências

Documentos relacionados

5 “A Teoria Pura do Direito é uma teoria do Direito positivo – do Direito positivo em geral, não de uma ordem jurídica especial” (KELSEN, Teoria pura do direito, p..

Fita 1 Lado A - O entrevistado faz um resumo sobre o histórico da relação entre sua família e a região na qual está localizada a Fazenda Santo Inácio; diz que a Fazenda

No entanto, maiores lucros com publicidade e um crescimento no uso da plataforma em smartphones e tablets não serão suficientes para o mercado se a maior rede social do mundo

esta espécie foi encontrada em borda de mata ciliar, savana graminosa, savana parque e área de transição mata ciliar e savana.. Observações: Esta espécie ocorre

Neste estudo foram estipulados os seguintes objec- tivos: (a) identifi car as dimensões do desenvolvimento vocacional (convicção vocacional, cooperação vocacio- nal,

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

De acordo com o Conselho Nacional do Ministério Público (2016), a tomada de decisão apoiada pode ser entendida como: “É um processo judicial criado pela Lei Brasileira

de lôbo-guará (Chrysocyon brachyurus), a partir do cérebro e da glândula submaxilar em face das ino- culações em camundongos, cobaios e coelho e, também, pela presença