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Ensinar e aprender segundo pais e professores de escolas públicas do Rio de Janeiro: um estudo de representações sociais

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Academic year: 2020

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de escolas públicas do Rio de Janeiro:

um estudo de representações sociais

Teaching and learning according to parents and teachers from

public schools in Rio de Janeiro - a social representations’ study

Edson A. de Souza Filho1

1 Doutor em Psicologia Social pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (1984). Professor Associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Departamento de Fundamentos da Educação, Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Instituto de Psicologia - UFRJ, desde 1999.

Endereço profissional: Av. Pedro Calmon, 550, prédio da Reitoria, 8.º andar, sala 801. Rio de Janeiro-RJ. CEP: 21941-901. E-Mail: edsouzafilho@gmail.com.

Resumo

Comparamos representações sociais (MOSCOVICI, 1961/1976) de pais e pro-fessores sobre ensino/aprendizagem. Os par-ticipantes foram pais (n= 49) e professores (n= 72) ligados a escolas públicas do ensino fundamental do Rio de Janeiro, através de questões abertas. Os grupos convergiram quanto ao que é aprender, mas diferiram sobre o ensinar. Constatamos diferenciação quanto às formas de avaliação de ensino e aprendizagem. Em ensino com os professores, se destacaram aspectos de planejamento, de-senvolvimento intelectual/cultural, enquan-to com os pais, aquisição de valores éticos/ morais. Para estes, contudo, houve mais referência a observar diferenças individuais, condições de trabalho e pesquisar.

Palavras-chave: Representações sociais. Ensino/aprendizagem. Avaliação.

Abstract

We compared teachers’ and parents’ social representations (MOSCOVICI, 1961/1976) on teaching and learning. The participants included parents (P) (n=72) and teachers (T) (n=49) linked to primary public schools in Rio de Ja-neiro, throughout open questions. The groups agreed on what is learning, but they differed about teaching. Moreover, we verified differen-tiation regarding the diverse ways to evaluate teaching and learning. Among teaching activities

with teachers stood out aspects of planning, and

intellectual/cultural development, while with

parents, acquisition of ethical/moral values. For

the parents, however, there was more reference to aspects such as noticing individual differences, working conditions and researching.

Keywords: Social representations. Teach-ing/learning. Evaluation.

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Introdução

Ensinar e aprender podem ser tratados separadamente, mas fazem parte de um processo complexo interligado, sobretudo se encarados a partir do senso comum. Nesse sentido, os estudos voltados para a busca de relações, continuidades e rupturas entre saberes acadêmicos e leigos, a respeito dos fenômenos de educação, têm avançado nos últimos anos, entre os quais destacaríamos aqueles que se fundamentam na abordagem das representações sociais (MOSCOVICI, 1961/1976; BARBICHON, 1973; ROQUEPLO, 1974; WAGNER, 2007).

Até recentemente, as preocupações sobre ensino/aprendizagem estavam fortemente centradas no saber acadêmico, tomado como referência e modelo normativo, o que vem sendo questionado por muitos, sobretudo no âmbito das ciências sociais e humanas, onde o conhecimento popular tem sido historicamente fonte de inspiração (BENJAMIN, 1987; EDWARDS e MERCER, 1987). Tal preocupação não implica em renúncia ao rigor formal e abandono de método científico para o seu aprofundamento e avanço, mediante o questionamento constante das heranças culturais acumuladas. Um passo nessa direção tem sido escutar mais atenciosamente a fala popular, que se manifesta não só entre leigos, mas, inclusive, entre os profissionais qualificados de Educação, que costumam lançar mão no dia-a-dia de saberes informais, beneficiando e aperfeiçoando seu trabalho. Ao lado disso, o ensino fundamental tem enfrentado dificuldades de realização, em quealunos e pais são constantemente responsabilizados pelo fracasso (GAMA e JESUS, 1994), muitas vezes atribuído aos meios socioeconômicos e à posse do chamado capital cultural/simbólico. Nesse sentido, os pais têm sido apontados como co-responsáveis pelo processo educacional, exigindo mais aprofundamento a respeito de como eles encaram tais atividades, bem como sobre as doutrinas que lhes dão suporte.

A abordagem das representações sociais (R.S.) tem sido adotada na área de ciências da educação, particularmente em psicologia da educação (RANGEL, 1994; COSTA e ALMEIDA, 1998; GILLY, 1984, 1989; EMLER, OHANA e MOSCOVICI, 1987; PLACCO e PRADO, 2002), podendo se tornar um dos seus fundamentos teóricos. De modo mais geral, poderíamos dizer que o fenômeno das representações sociais está dentro de uma preocupação já apontada por alguns autores mais influentes em psicologia da educação, como Vygotsky (1984), com sua posição sociohistórica. Sem pretender expor as afinidades entre os modelos teóricos mencionados, poderíamos dizer que historicamente a teoria das representações sociais foi primeiramente formulada por Moscovici (op. cit), num esforço para compreender o modo de apropriação e transformação de um saber acadêmico por parte de indivíduos e grupos, o que foi estendido, em seguida, a outros assuntos, inclusive de natureza cultural, como o corpo e a doença mental.

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Nossa hipótese geral é que existem diferenças e divergências entre pais e professores sobre o ensino praticado por estes últimos, sobretudo quando se refere aos conteúdos técnicos profissionais. Ademais, as várias práticas de avaliação escolar são fonte de divergência, seja de aprendizagem do aluno, seja de ensino do professor, tendo em vista a ausência de oportunidade de discussão, bem como de explicitação objetiva de critérios, sobretudo daqueles praticados por professores.

Supúnhamos haver um forte consenso de pais e professores sobre o que se aprender com os pais, conhecimento que é partilhado por ambos os grupos. Já quanto a aprender com os professores, poderíamos esperar alguma diferenciação, uma vez que se trata de experiência vivida no ambiente escolar. Contudo, como ela é acessível a todos que tiveram experiência acadêmica, além de não se referir a um conhecimento especial para o qual se exige outro tipo de vivência, acreditávamos não ser geradora de R. S. específicas para cada grupo em foco. Tratar-se-ia de considerar também as atividades de pais e professores como papéis sociais (MAISONNEUVE, 1977; HARRÉ, 1986), em termos de expectativas de desempenho de funções sociais, as quais são construídas e reguladas de modo diferente, conforme o caso. Supomos que os papéis parentais sejam mais tradicionais e inseridos em grupos culturais, como os étnicos e religiosos, enquanto os papéis docentes sejam mais relacionados à vida profissional em que se faz mais uso de um pensamento racional, tal como inserida em organizações especializadas, ainda que ocorram trocas constantes entre os mesmos.

Portanto, no caso da atividade de ensino, esperávamos encontrar forte diferenciação em termos de representações sociais. Assim, os professores tenderiam a mostrar interesse em relação às novas pedagogias, que incluem tarefas menos conhecidas pelos pais, tais como: formação para a cidadania, a interação social, bem como aspectos técnicos menos acessíveis relacionados ao planejamento e execução do trabalho propriamente dito. Do mesmo jeito, o ensino praticado por pais poderia ser gerador de clivagem intergrupal. Primeiro, pela própria situação proposta ser algo inusitado, poder-se-ia supor que os pais se limitariam a “ensinar”, seja um saber informal, seja um saber formal, porém como atividade auxiliar ao ensino oferecido pela escola.

Na idéia de avaliar, seja a atividade de aprendizagem, seja a de ensino, está outra situação inusitada, sobretudo para os pais. Para estes, supomos que a avaliação é praticada por professores, sendo pouco usual pensar que os pais possam avaliar o que ensinaram para seus filhos, podendo ser fonte de diferenciação, uma vez que os professores estão mais acostumados à idéia de avaliar, ainda que em contexto/situação específica.

Enfim, a avaliação de ensino é um assunto ainda pouco elaborado no âmbito do ensino fundamental. Como existe certa aspiração de participação na vida escolar entre pais, acreditávamos que esse fato fosse propiciador de uma busca de critérios produzidos e acumulados na memória de pais depois de conversas mantidas com outros pais em tantas oportunidades, inclusive fora da escola.

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Método

Participantes

Os participantes foram professores (n=49) e pais (n=72) ligados a escolas públicas do ensino fundamental da cidade do Rio de Janeiro. Eles foram contatados através de estudantes do curso de pedagogia da UFRJ.

Instrumento e procedimento

Foi preparado um questionário contendo perguntas abertas sobre o que é aprender/ensinar, como avaliar aprendizagem/ensino, o que fazer quando filhos/ alunos não conseguem aprender/ensinar, o que estes podem fazer, tal como praticados/realizados com pais/professores.

Os participantes foram contatados diretamente em seus lugares de trabalho ou residência, onde responderam por escrito as perguntas formuladas. Quando necessário, as respostas foram preenchidas pelos próprios pesquisadores.

Análise de dados

O material simbólico das respostas foi analisado em termos de conteúdo temático (BARDIN, 1991) e disposto em tabelas de freqüência e percentagem, as quais foram submetidos a testes de qui-quadrado.

Resultados

Abaixo, apresentamos as tabelas com os resultados de análises, relatadas em seguida. Todas as vezes que a comparação intergrupal foi significativamente mais numerosa para um grupo, as freqüências e percentagens foram sublinhadas e realçadas. Assim, sublinhamos os temas que foram mais usados por cada grupo quando a diferença entre eles foi acima de 25%, independente do resultado do teste estatístico para a distribuição de freqüências para toda a tabela, ressaltando também as diferenças temáticas de freqüência para cada linha separadamente quando fosse acima de 2%.

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Tabela 1 - O que é aprender com os pais e com os professores?

Conteúdos Pais Professores

Com pais Com prof. Com pais Com prof.

Freq. % Freq. % Freq. % Freq. %

Educação geral/valores éticos/morais 91 72,2 23 20,7 63 64,9 11 13,2

Vida social/boas maneiras 21 16,6 8 7,2 18 18,5 15 18,07

Indivíduo psicológico 4 3,1 2 1,8 8 8,2 4 4,8

Bagagem acadêmica/intelectual 3 2,4 58 52,2 2 2,0 44 53,0

Direitos/cidadania 2 1,6 1 0,9 1 1,0 2 2,4

Ajudar/ser ajudado/ser estimulado 3 2,4 2 1,8 1 1,0 2 2,4

Profissão/Mercado de trabalho 0 0 9 8,1 0 0 3 3,6

Horários/planejamento 0 0 1 0,9 0 0 0 0

Para se viver bem 1 0,8 1 0,9 0 0 0 0

Responsabilidade/envolvimento do professor

com que ensina/Professor refletindo 1 0,8 6 5,4 1 1,0 2 2,4

Família em harmonia/paz/amor 0 0 0 0 3 3,1 0 0

Total 126 100 111 100 97 100 83 100

x2 (aprender com pais)=não significativo.

x2 (aprender com professor)=não significativo.

Conforme o que prevíamos, a atividade de aprender apresentou poucas diferenciações temáticas entre os grupos observados. Mesmo assim, notamos mais convergência quanto à aprendizagem de valores morais/éticos como atividade com pais, ao passo que bagagem acadêmica/intelectual com professores. Ao lado disso, é bom notar que os pais apresentaram mais expectativas não partilhadas com professores de conteúdos de aprendizagem do estudante com o professor em educação geral/valores morais/éticos, profissão/mercado de trabalho e responsabilidade/ envolvimento do professor do que ensina.

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Tabela 2 - Como é a atividade de ensino praticada por pais e professores?

Conteúdos Pais Professores

Com pais Com prof. Com pais Com prof.

Freq. % Freq. % Freq. % Freq. %

Atender diferenças individuais/diálogo 8 10,0 11 15,5 3 5,1 11 11,9

Trabalhar em grupo 0 0 0 0 0 0 1 1,1

Formar hábito de consulta/professor

mediador 0 0 4 5,6 0 0 0 0 Estimular iniciativas 3 3,8 0 0 0 0 2 2,2 Orientação moral-ética/cidadania 7 8,8 2 2,8 36 61,0 13 14,1 Desenvolvimento intelectual/cultural 34 43,0 7 9,8 1 1,7 12 13,0 Afetividade 1 1,2 0 0 2 3,4 0 0 Plano de trabalho/sistemático 2 2,5 23 32,4 4 6,8 36 39,1 Estimular/ajudar 21 26,6 4 5,6 6 10,1 3 3,3 Ensino contínuo/Ensinar 0 0 9 12,7 4 6,8 5 5,4

Pais/professores trabalham juntos 0 0 0 0 0 0 3 3,3

Condições de trabalho ruins/Culpa

das autoridades 2 2,5 10 14,1 0 0 5 5,4

Rebeldia/falta de limite 1 1,2 0 0 0 0 0 0

Punir 0 0 0 0 3 5,1 0 0

Deve ter aplicação prática 0 0 1 1,4 0 0 0 0

Idade 0 0 0 0 0 0 1 1,1

Total 79 100 71 100 59 100 92 100

x2 (ensino dos pais)=73, 933; gl=10; p<0,0000.

x2 (ensino dos professores)=24,907; gl=12; p<0,0153.

Em relação à atividade de ensino com os pais, obtivemos diferenças significativas entre pais e professores. Assim, notamos que os pais consideraram a atividade de ensinar praticada por eles mesmos como sendo voltada para desenvolvimento intelectual/ cultural, estimular/ajudar, atender às diferenças individuais, entre outros, ao passo que, para os professores, observamos que a orientação moral-ética/cidadania concentrava boa parte das suas representações em relação à atividade de ensino dos pais, entre outros.

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Já em relação ao ensino com professores, constatamos maior ênfase entre os próprios professoresem plano de trabalho/sistematicidade, orientação moral-ética/ cidadania, desenvolvimento cultural/intelectual, enquanto entre os pais o ensino dos professores estava associado a atender diferenças individuais, condições ruins de trabalho, ensino contínuo/ensinar, estimular/ajudar, formar hábito de consulta.

Tabela 3 - Como se deve avaliar a aprendizagem de alunos e filhos realizada com os pais e com os professores?

Conteúdos Pais Professores

Com pais Com prof. Com pais Com prof.

Freq. % Freq. % Freq. % Freq. %

Constante 4 5,4 1 1,1 4 12,5 12 12,9

Registro 1 1,3 0 0 0 0 1 1,1

Tarefa/atividade para casa 0 0 13 14,1 0 0 6 6,5

Prova 1 1,3 23 25,0 0 0 16 17,2 Avaliação oral 22 29,7 13 14,1 6 18,7 9 9,7 Participação/entrosamento/ Acompanhamento/debates 15 20,2 10 10,9 5 15,6 3 3,2 Interesse/motivação 1 1,3 9 9,8 0 0 2 2,2 Criatividade/valoriza sua realidade sócio-cultural 0 0 2 2,2 0 0 6 6,5 Pais na prática 5 6,7 2 2,2 1 3,1 6 6,5

Respeitando diferença individual 0 0 0 0 1 3,1 8 8,6

Obediência 3 4,1 0 0 0 0 0 0

Assimilação 0 0 6 6,5 2 6,2 3 3,2

Levar em conta evolução 5 6,7 3 3,2 2 6,2 6 6,5

Orientação/sanar dúvidas 11 14,8 0 0 8 25,0 3 3,2

Diagnóstico/método 3 4,1 7 7,6 0 0 10 10,7

Nunca dizer estar errado 0 0 1 1,1 0 0 0 0

Depende da sociedade 3 4,1 0 0 3 9,4 0 0

Não podemos dizer se outro sabe 0 0 0 0 0 0 2 2,2

Estrutura escolar 0 0 2 2,2 0 0 0 0

Total 74 100 92 100 32 100 93 100

x2 (Avaliar aprendizagem com pais)=não significativo.

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Pais e professores consideraram a avaliação de aprendizagem com professores de modo tendendo à aproximação de freqüências de temas. Os primeiros ressaltaram prova, avaliação oral, tarefa de casa, participação/entrosamento, interesse/motivação, assimilação, enquanto os últimos indicaram mais aspectos como constância, diagnóstico/ método, respeitando diferença individual, criatividade/cultura do aluno, pois, na prática, levar em conta evolução do aluno, orientação/sanar dúvidas, entre outros. Já as avaliações de aprendizagem com pais, segundo eles mesmos, também apresentaram diferenças significativas na comparação com professores. Assim, houve ênfase em avaliação oral, participação/entrosamento, pais na prática, entre outras; enquanto para os professores, orientação/sanar dúvidas, constância, depende da sociedade, entre outros.

Tabela 4 - Como se deve avaliar o ensino praticado por pais e professores?

Conteúdos Pais Professores

Com pais Com prof. Com pais Com prof.

Freq. % Freq. % Freq. % Freq. %

Comportamento cotidiano de cada aluno 22 47,8 9 13,4 10 55,6 6 11,1

Aproveitamento do aluno em exames

nacionais 2 4,3 12 17,9 0 0 5 9,2

Condições de trabalho 0 0 1 1,5 0 0 0 0

Interesse/participação/pais/ família/Avaliar

contexto social 6 13,0 3 4,5 1 5,3 3 5,5

Avaliação conjunta pais/professores 9 19,6 2 3,0 7 38,9 11 20,4

Difícil avaliar o professor 0 0 4 6,0 0 0 0 0

Professor é mais importante 0 0 1 1,5 0 0 0 0

Auto-avaliação 0 0 3 3,0 0 0 13 24,1

Depende dos valores/

transformar em cidadão 1 2,2 0 0 0 0 0 0

Criatividade/motivação/prazer (do professor) 0 0 4 6,0 0 0 1 1.9

Respeito mútuo 2 4,4 0 0 0 0 0 0

Constante/diariamente 1 2,2 0 0 0 0 0 0

Atualização do professor/pais/ planejamento/ 1 2,2 21 31,3 0 0 12 22,2

Péssimo/fraco 2 4.4 4 6,0 0 0 0 0

A escola deve avaliar o professor 0 0 3 4,5 0 0 1 1,9

Ensino/aprendizagem são inseparáveis 0 0 0 0 0 0 2 3,8

Total 46 100 67 100 18 100 54 100

x2 (Avaliar ensino de pais)=não significativo.

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Pais e professores trataram a avaliação de ensino com professores de modo diferenciado. Para os pais, os principais conteúdos foram atualização do professor, aproveitamento positivo dos seus estudantes nos exames nacionais, difícil avaliar o professor, péssimo/fraco, criatividade/motivação/prazer. Já os professores enfatizaram como critério de avaliação do seu ensino a auto-avaliação, avaliação conjunta de pais/professores. Pais e professores consideraram o ensino com pais como se manifestando no comportamento cotidiano de cada aluno, enquanto para os próprios pais foi mais representado em termos de interesse/participação dos pais/família/contexto social. Já os professores enfatizaram mais o ensino com pais em termos de avaliação conjunta de pais/professores.

Considerações Finais

Os resultados expostos indicaram, principalmente, dois fatos psicossociais: de um lado, a existência de uma divisão de trabalho/especialização entre papéis de pais e professores; de outro, a presença de esforços de ambos os grupos para elaborar esta divisão por meio de representações/práticas a serem mais compreendidas. Nossa intenção é buscar a lógica subjacente aos dados e às possibilidades existentes.

Um primeiro ponto refere-se ao forte consenso quanto aos aspectos morais/éticos, boas maneiras e disciplina entre os grupos a respeito de aprender. Ou seja, boa parte da tarefa de educação infantil no período coberto pelo ensino fundamental, considerada como própria dos pais, estaria limitada a esses aspectos, segundo certas concepções e práticas, deixando para os professores aqueles mais voltados para a assimilação de informação, de conhecimentos, entre outros. Assim, o peso dos convencionalismos sociais (moral/ético e informativo) estaria impedindo o desenvolvimento do aluno enquanto “indivíduo” em ambas as esferas de vida social, o que merece mais reflexões. Como se houvesse uma expectativa generalizada entre pais e professores, de um estudante bem comportado/disciplinado e dotado de uma bagagem intelectual convencional. Não haveria um paralelo entre estes dados e os resultados alcançados em termos de desenvolvimento moral observado por Kohlberg e seus seguidores, em pesquisas aqui e em outros países (BIAGGIO, 1998), em que o chamado estágio pós-convencional só seria atingido por uma percentagem muito pequena de pessoas (em torno de 5%)? Nesse caso, poder-se-ia supor que parte destes fatos seria resultado de concepções/práticas de educadores a respeito do que aprender. Acreditamos que outros dados que obtivemos poderiam ampliar essa interpretação.

Assim, o ensino de pais, tanto para estes quanto para os professores, conteria forte conotação ético-moral impositiva/coercitiva (ADORNO, et al. 1950), ainda que os primeiros tenham colocado certa ênfase na dimensão individual. Nesse caso,

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a interação mais elaborada entre pais e filhos nas suas várias dimensões é o que permitiria o desenvolvimento do indivíduo (HOWITT et al., 1989). Contudo, mesmo entre pais notamos na nossa pesquisa pouca freqüência de respostas com conteúdos em que o indivíduo fosse considerado separadamente, como um ser distinto e que busca autonomia, prejudicando o trabalho de sua formação, o que não foi compensado também por parte de professores, ao considerarem o ensino de pais. Trata-se de um fato cultural que merece reflexão por parte dos educadores em geral, indicando possivelmente a influência de concepções que não valorizam o indivíduo, conforme já foi ressaltado por Foucault (1994). Sabemos que tais concepções estão mais difundidas em certos ambientes socioculturais no Brasil. Mesmo sendo concepções hegemônicas a respeito de socialização e inserção social, elas acabam gerando preconceito em relação aos indivíduos e grupos particulares que não se identificam com as mesmas, numa sociedade realmente plural, mas onde alguns grupos numericamente majoritários, com ou sem poder, insistem em impor padrões de representação (MOSCOVICI e PEREZ, 1997), impedindo a existência de um relacionamento social mais adequado ao ambiente educacional.

O ensino praticado por professores foi mais descrito em termos técnicos e racionais, indicando, o uso de uma linguagem diferenciada daquela dos pais, sem procurar mais entrosamento com o conhecimento a respeito partilhado pelos pais. Ou seja, parece haver uma certa contradição dos professores entre o afã de se comunicar e o de manter sua área de domínio sem ingerência dos pais. Outros dados a serem comentados abaixo poderão fazer compreender melhor esses resultados. Ao lado disso, os próprios pais, se colocando talvez fora do ambiente escolar, preferiram mencionar aspectos dos seus filhos e as condições objetivas de trabalho naquele ambiente. Mas foi possível constatar que eles estavam preocupados com o desenvolvimento individual dos filhos a partir de vários itens, tais como aprender a pesquisar, atender dificuldades e aplicar conhecimentos. Este último aspecto parece ser crucial para a motivação do aluno e para a consolidação de uma escola de fato ancorada na vida social da comunidade onde ela se insere, num momento em que tem crescido na mente coletiva a imagem da escola como fornecedora de diplomas inúteis. Mas, notamos uma presença muito pequena de preocupação com o desenvolvimento de potenciais criativos dos filhos e estudantes, indicando a inexistência de uma prática educacional sistemática sobre o assunto por parte dos educadores em geral, o que poderia ocorrer mais como um “acidente” educacional (LEMAINE, 1974).

Em relação à avaliação do trabalho educacional dos professores, estes preferiram indicar os critérios de forma sem se limitar ao que o senso comum considera como mais usual, como avaliação por meio de prova, teste oral e tarefa de casa. Assim, os professores mencionaram que a avaliação era constante, procurando levar em conta diferenças individuais, além de contextualização, motivação, aplicação do conhecimento, sanar

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dúvidas, ou seja, tudo o que os pais haviam respondido a respeito da atividade de ensino, como se tivessem clara consciência a respeito do que pais/alunos aspiram, mas que não vem sendo praticado efetivamente nas escolas brasileiras. Nesse sentido, a pergunta a respeito da avaliação de aprendizagem com pais foi utilizada como mais uma oportunidade de colocar, além daqueles conteúdos de aprendizagem com eles mesmos, outros referentes à escola, tais como avaliação conjunta de professores e pais, sanar dúvidas, aplicar conhecimento, usar técnica/motivar.

A divergência entre pais e professores se evidenciou na questão referente à avaliação do ensino praticado pelos professores. Assim, os próprios professores acreditavam que a auto-avaliação ou em conjunto com os pais seria suficiente, enquanto os pais preferiram a avaliação externa praticada pelos exames nacionais, escola ou consulta sobre satisfação/motivação. Outros partiram para a avaliação sumária dos mesmos em termos negativos, considerando-os como necessitando atualização. Trata-se de um assunto novo que, aparentemente, foi mais bem recebido pelos pais do que pelos próprios professores, que reagiram no momento da coleta algo defensivamente, como se evitassem a situação proposta.

Em outra pesquisa foi possível verificar o quanto o professor de escola pública na mesma cidade supunha que a comunidade esperava interações desfavoráveis entre aluno e professor, o que deve afetar a avaliação da atividade do professor por parte dos pais, numa cadeia de expectativas negativas a serem mais elaboradas.

Referências

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Data de recebimento: 14/06/2008. Data de aceite: 14/07/2008.

Imagem

Tabela 1 - O que é aprender com os pais e com os professores?
Tabela 2 - Como é a atividade de ensino praticada por pais e professores?
Tabela 3 - Como se deve avaliar a aprendizagem de alunos   e filhos realizada com os pais e com os professores?
Tabela 4 - Como se deve avaliar o ensino praticado por pais e professores?

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