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A POLIFONIA COMO ESTRATÉGIA PARA CONSTRUÇÃO DO ETHOS: UMA ANÁLISE DO DISCURSO DOCENTE.

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Academic year: 2021

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A POLIFONIA COMO ESTRATÉGIA PARA CONSTRUÇÃO DO ETHOS: UMA ANÁLISE DO DISCURSO DOCENTE.

Elisabeth Gonçalves de Souza (UEMG/UFMG-Bolsista Fapemig)

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo perceber, a partir da polifonia, como os docentes constroem uma imagem de si, o Ethos. Para alcançar tal objetivo utilizaremos como referencial teórico-metodológico os estudos de Maingueneau e Amossy, no que se refere ao Ethos.Para, tratarmos da polifonia, utilizaremos o referencial do Modelo de Análise Modular. Pretendemos também propor um diálogo entre a teoria do Ethos e o Modelo de Análise Modular (MAM).

O texto analisado é parte do corpus do projeto “A polifonia na construção do discurso docente acerca dos processos de escolha do LD de Alfabetização” desenvolvido no município de Barbacena em 2007, que apresentava como objetivo geral compreender os processos de escolha do livro didático de alfabetização através do desvelamento da polifonia presente no discurso dos professores alfabetizadores da Rede Municipal de Educação de Barbacena. Este projeto está em consonância com as pesquisas, estudos e discussões do Grupo de Pesquisa LER 1– Leitura e Escrita: Reflexões, credenciado pela UEMG em 2006.

Partimos da hipótese de que os textos produzidos pelos docentes na pesquisa configuram-se como discurso2. Chamaremos de discurso a “um conjunto de enunciados na medida em que relevam a mesma formação discursiva” Foucault (1996). Ainda segundo, Foucault (1996)

Formação discursiva é um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço que definiram uma época dada, e para uma área social, econômica, geográfica ou lingüística dada, as condições de exercício da função enunciativa.

Os docentes foram convidados a construir um texto argumentativo a partir das seguintes categorias: descrição do material didático com o qual se trabalha no momento; relato do processo de escolha desse material; utilização do Guia de LD no processo de escolha, sem necessariamente, apresentar a característica de pergunta-resposta desses questionamentos. Nossa proposta, neste artigo, é perceber como os professores constroem uma imagem de si, que vozes perpassam seus discursos quando tratam do processo de escolha do LD, e como constroem o Ethos.

Iniciamos nossa pesquisa com vinte e seis professoras, porém devido à alta rotatividade de profissionais atribuída a contratos temporários, a encerramos com vinte e dois textos. Nessa discussão, optamos pela análise de um texto escolhido de forma aleatória. .

1 A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DOCENTE: O ETHOS

1 O objetivo central do grupo é abrir um espaço de interlocução e de reflexões entre pesquisadores sobre as perspectivas, os corpora e as interfaces da Análise do Discurso (AD) em Barbacena e Região. Pretende-se com essa discussão atender ao interesse crescente em relação à AD, por parte de alunos e professores da

UEMG/Barbacena e das instituições da região.

2 Partimos da concepção de discurso refletida nas pesquisas e nas discussões realizadas pelo Grupo de Pesquisa LER-Leitura e Escrita: Reflexões. O Grupo entende que a AD, por suas especificidades e relações com outras áreas humanas, oferece um campo de questões temáticas e/ou epistemológicas para discutir a linguagem, sua organização e seu funcionamento, seja no interior dos campos da Lingüística, seja na interface com a Educação, com a História, com a Psicanálise, com a Filosofia etc. É importante ressaltar que essas afinidades e relações constituem um espaço privilegiado para reflexões sobre questões inerentes à linguagem e a outros fenômenos sociais que a envolvem direta ou indiretamente.

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Todo locutor ao realizar uma enunciação constrói uma imagem de si. O que pretendemos aqui é perceber que imagem o professor constrói de si ao argumentar sobre o processo de escolha do LD de Alfabetização.

Os estudos do Ethos vêm desde a Antigüidade Clássica e nas últimas décadas foram retomados por alguns estudiosos da Análise do Discurso Francesa, principalmente Dominique Maingueneau, Patrick Charaudeau e Ruth Amossy. Com base nos estudos desses autores é que buscaremos perceber a construção do Ethos no texto proposto utilizando marcas polifônicas.

De acordo com Maingueneau (1998), Ethos é o fenômeno pelo qual podemos perceber, na enunciação, o caráter do locutor. Barthes (apud Maigueneau, 1998) afirmava que pouco interessava a sinceridade do locutor, mas a impressão que este causava a seu auditório.

O ethos não diz respeito apenas, como na retórica antiga, à eloqüência judiciária ou aos enunciados orais: é valido para qualquer discurso, mesmo para o escrito. Com efeito, o texto escrito possui, mesmo quando o denega, um tom que dá autoridade ao que é dito. Esse tom permite ao leitor construir uma representação do corpo do enunciador ( e não, evidentemente, do corpo do autor efetivo). A leitura faz, então, emergir uma instância sujetiva que desempenha o papel de fiador do que é dito.(Maingueneau, 1998, p. 98)

E em que espaço se constrói o Ethos? No momento da enunciação, ou num outro momento, anterior à enunciação? Patrick Charaudeau pontua que o Ethos pode ser pré-construído, quando as imagens começam a ser percebidas antes da enunciação, em elementos preexistentes ao discurso e construído, quando a concretização da imagem se dá no momento da enunciação, nos atos trazidos pelo próprio ato de linguagem. O sujeito professor constrói para si uma identidade social de locutor, com base nos papéis que ele se atribuiu no momento da enunciação. Para Charaudeau:

O sujeito aparece portanto, ao olhar do outro, com uma identidade psicológica e social que lhe é atribuída, e, ao mesmo tempo, mostra-se mediante a identidade discursiva que ele constrói para si. O sentido veiculado por nossas palavras depende depende, ao mesmo tempo daquilo que somos e daquilo que dizemos. O ethos é o resultado dessa dupla identidade, mas ele termina por se fundir em uma única.

2 A CONCEPÇÃO GENEBRINA DE POLIFONIA

Diante de inúmeras abordagens da Análise do Discurso que poderiam explicitar a perspectiva docente acerca do processo de escolha do LD, através de textos produzidos pelos próprios professores (discursos), optamos pela polifonia, entendida a partir do Modelo de Análise Modular.

O componente polifônico da abordagem modular do discurso refere-se à inscrição da subjetividade de outro locutor em um discurso, assim como a atitude adotada pelo locutor, em seu próprio discurso, face às outras vozes que nele se fazem ouvir. Diz respeito a uma outra subjetividade, diferente da subjetividade do locutor. Uma estrutura é polifônica quando o locutor repete ou retoma um outro ponto de vista, independente de sua intervenção, posicionando-se em relação a ele. Essa concepção de polifonia se consolida a partir dos estudos bakhtinianos e seus desdobramentos na Análise do Discurso Francesa.

Polifonia, para o MAM (Roulet; Filliettaz e Grobet, 2001)3, parte das definições Bakhtinianas e torna-se mais ampla e mais concreta, pois considera também o resultado da acoplagem das análises concernentes às formas e às funções dos discursos produzidos e representados.

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Roulet concebe a análise do discurso por módulos, uma vez que o discurso pode ser decomposto em sistemas de informações que, por sua vez, podem ser descritos independentemente. Além disso, as informações obtidas em cada módulo podem ser relacionadas. Janice Helena Chaves Marinho (2004) pensa no MAM como um interessante instrumento de análise para oferecer um quadro teórico e metodológico que permite a compreensão da complexidade e da heterogeneidade das atividades discursivas.

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Existem, na organização geral do MAM, dois componentes específicos denominados: forma de organização elementar enunciativa e forma de organização complexa polifônica que tratam das questões relativas à enunciação e à polifonia.

A forma de organização enunciativa se propõe a identificar os discursos produzidos e representados no interior de um discurso. Por discurso produzido, entende-se aquilo que o locutor disse e por discurso representado considera-se aquilo que o locutor disse que alguém disse. Tanto os discursos produzidos quanto os representados estão presentes na superfície do texto e podem apresentar-se das seguintes formas:

1 – Formulado: representação direta introduzida por um verbo de fala, dois pontos, travessão e/ou aspas; representação indireta; representação indireta livre.

2 – Designado: o discurso pode ser designado por um verbo ou por um sintagma nominal;

3– Implicitado: traz como marcas os conectores que tem a função de estabelecer um encadeamento implícito com o discurso de um interlocutor.

Já a organização polifônica refere-se à subjetividade de um locutor em um discurso, assim como a atitude adotada pelo locutor, em seu próprio discurso, face às outras vozes que nele se fazem ouvir. A polifonia para o MAM é a função dos discursos produzidos e dos discursos representados, fazendo então emergir a subjetividade inscrita nesses discursos.

O que o MAM amplia na noção de polifonia em relação aos outros autores (Bakhtin, Maingueneau, Authier-Revuz) é a possibilidade de a mesma ser uma informação advinda de uma organização complexa em que sua descrição se faz necessariamente de outras dimensões e formas de organização do discurso: não somente lexical e sintático, mas interacional, hierárquico, enunciativa e polifônica. Descrever a organização polifônica de uma intervenção é identificar os discursos produzidos e representados que se constituem em diferentes níveis e ir além da descrição das funções destes discursos, diante de informações interacionais, referenciais, etc. É entender o porquê de diz o que se diz e como se diz.

3 ANÁLISE ENUNCIATIVA E POLIFÔNICA DO CORPUS

Para compreender como os professores se posicionam em relação ao processo de escolha do Livro Didático através de seus discursos iniciamos nossa análise pelo módulo interacional, que trata da materialidade das relações de interação.

O enquadre interacional trata da materialidade da interação, que pode ser apontada como uma negociação entre autor/leitor e se distingue de outras informações situacionais, textuais ou lingüísticas constitutivas dos discursos. A função do módulo interacional é delimitar os níveis de interação e especificar suas características. É pelo enquadre que podemos observar a relação entre os sujeitos do discurso – os interactantes -, o tipo de interação que se dá entre eles através dos parâmetros do canal (escrito, visual, oral), o modo de comunicação (tipo de presença dado pela distância espaço-temporal) e o tipo de elo comunicacional (unidirecional ou recíproco).

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Interlocutor <professor alfabetizador> Interlocutor < professor alfabetizador’> Interlocutor <leitor/pesquisador > Interlocutor <leitor> canal escrito co-presença espaço-temporal não-reciprocidade <DEPOIMENTO’ > canal escrito co-presença espaço-temporal não-reciprocidade <DEPOIMENTO>

Classificamos o enquadre acima como composto por conter dois nível de interação, compostos de quatro posições de interação (professor alfabetizador/leitor) e (professor alfabetizador’/pesquisador) estes últimos ocupando o espaço do “narrado”.

No nível mais externo temos uma interação cujo canal é escrito, uma vez que foi pedido que o professor elaborasse um texto para o pesquisador. Há co-presença espaço-temporal, pois o texto deveria ser produzido na presença do pesquisador. Não há reciprocidade, pois não poderia haver influência direta do pesquisador e vice-versa durante a elaboração do texto. No nível mais interno, a materialidade se mantém, pois entendemos que há apenas uma passagem abstrata para o nível do narrado, apenas ressaltamos que nesse nível enfatizaremos a figura do pesquisador como um leitor possível e que influencia na argumentação do professor pois o mesmo deve gerenciar a suas estratégias de proteção de face.

Um detalhe que gostaríamos de abordar é a questão sobre a não exposição de alguns professores, o que aqui chamaremos de silenciamento. Ainda que os autores do texto sejam professores atuantes nas classes de alfabetização e de acordo com dados levantados por essa pesquisa acerca da formação desses docentes, que nos apontam uma boa qualificação com quase totalidade dos professores graduados e pós-graduados, emergiu em alguns textos o medo de expor-se. Tal fato nos foi possível perceber por algumas escolhas lexicais através de construções impessoais, em especial pelo uso da terceira pessoa. Uma das explicações possíveis para essa proteção pode ser dada pela definição de papéis e posições com já dito. Ainda que o professores pesquisados tivessem um bom grau de instrução, a figura do pesquisador pode aparecer como uma barreira, daí o temor em ser mal interpretado.

É interessante lembrar que existe ainda uma distância entre os papéis sociais dos interactantes. O pesquisador é quem tem maior domínio da situação de interação em relação aos professores, quando se trata da produção de textos sobre questões relacionadas ao trabalho docente como objeto de pesquisa. O fato de ser pesquisado incomoda a qualquer pessoa, pois sentir observado e ser conhecer a fundo o objeto de pesquisa, gera uma relação baseada de certa forma no constrangimento.

Ainda com relação à distinção de papéis, tem-se que, na situação de interação provocada pelo pesquisador, o professor alfabetizador, ciente dessa distinção, temendo expor-se ao risco de ser mal interpretado ou censurado, coloca-se como um enunciador que tende a assumir uma posição não comprometedora, marcada no enquadre pelo nível mais interno, ou nível do “narrado”. Dessa forma ele procuraria mascarar uma crítica mais direta, uma opinião mais contundente.

As informações interacionais serão aliadas a seguir às informações encunciativo polifônicas. A fim de identificar as vozes que compõem o discurso docente, passaremos à análise do corpus sob a

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perspectiva enunciativo - polifônica. Apresentaremos as marcas de representação utilizadas pelo MAM: discurso representado formulado – marcado por colchetes preenchidos [...]; discurso representado designado, marcado após a expressão que os designa por colchetes vazios [ ]; discurso representado implícito – representado por colchetes vazios na frente do conector [ ]. Adotaremos PA para professor alfabetizador, PA’ para professor alfabetizador’, ALD para autores de livros didáticos e FI para figura institucionalizada.

PA PA'[ O processo de escolha do livro didático nas escolas por si só já é positiva para a educação. È uma forma democrática de dar ao professor a oportunidade de adquirir um material de qualidade para auxiliá-lo no seu trabalho, comungando com sua filosofia de trabalho. A qualidade do livro didático vem melhorando bastante e com certeza podemos encontrar um material que se adeque às nossas necessidades de acordo com a nossa formação e posicionamento diante do que pretendemos trabalhar, que linha de trabalho vamos adotar e também as necessidades de formação de nosso alunado.

Aqui na escola municipal (X)4, esta última escolha do livro didático foi bastante proveitosa,

tivemos um tempo anterior (uma semana) para manusearmos os livros na escola e em casa, debatermos mais informalmente com os colegas e então num dia específico nos reunimos (os dois turnos) e juntos escolhemos o que julgamos atender a maioria, após exposição PA[ ] dos pontos positivos e negativos e ainda exposição PA[ ] da proposta de trabalho de cada professor.

Penso que foi um momento bastante importante para a escola, os professores “naquele momento, especialmente” puderam pensar, refletir sobre suas propostas de trabalho e através desta inteiração fazer uma auto-avaliação e acredito que até mudanças significativas.

Colocaria como ponto negativo o fato de após a escolha refletida, crítica do livro didático, acontecer do livro escolhido não chegar à escola para atender a todos os alunos. Isto aconteceu conosco aqui. Depois de escolher um livro ou até aceitar a escolha feita pelo grupo e já compartilhar da mesma, você não tem o livro para trabalhar e tem que fazer nova opção (livros já existentes na escola).

Os critérios que me embasaram na escolha do livro didático foram a forma que penso a alfabetização, numa linha construtivista sócio-interacionalista; o olhar que devemos ter a partir das referências bibliográficas, que autores ALD[falam a linguagem que entendemos] e a crenças que temos para uma educação cada vez com mais qualidade; a diversidade textual, enfim o design como um todo no livro, tornando-o rico e agradável de ser “consumido” e “conhecido” no processo de construção e aquisição da alfabetização.]]

OBS: Os textos foram transcritos segundo os originais.

No nível mais externo, temos o discurso produzido que vai do início ao final do texto. É nesse nível que o autor ‘diz’, no caso o professor, já refletido no que foi dito na análise interacional. No segundo nível, temos a marca de um discurso formulado pelo PA’. Esse discurso se estrutura basicamente na primeira pessoa, mas em algumas passagens notamos a escolha pela terceira pessoa, em especial, no que se refere às críticas mais contundentes, feitas pelo autor ao processo de escolha do LD no passado (na escola) e das atuais políticas públicas de distribuição do LD, que nem sempre disponibilizam exemplares suficientes para todos os alunos. Acreditamos que essa estratégia, em nossa opinião, configura-se como proteção de face.

Parece-nos que o professor consegue perceber que o processo tem pontos positivos, mas não se nega a explicitar o que ‘na opinião dele’ seria um problema no processo. Isso pode ser observado pelo jogo feito com o discurso designado em que a voz do professor é retomada como uma voz de outro que não o professor que ‘diz’ após exposição PA[ ] dos pontos positivos e negativos e ainda exposição PA[ ] da proposta de trabalho de cada professor.

De acordo com nossa análise, observamos que o professor acredita ser uma ‘boa’ estratégia a oportunidade de os professores exporem os pontos positivos e negativos da escolha em uma reunião.

No final do texto, o professor alfabetizador utiliza um discurso formulado indireto: que autores ALD [falam a linguagem que entendemos]. Nesse momento o docente se faz valer do

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discurso de autoridade, ao referir-se aos autores e a teorias de ensino/aprendizagem bastante divulgadas, para reafirmar a importância da formação dos professores. Em contra partida, é feita uma crítica `a política pública, sobretudo no processo de avaliação/seleção das obras, com referência à linguagem de livros que, muitas vezes, não é acessível.

4 A CONSTRUÇÃO DO ETHOS

No texto em análise, a docente pesquisada inicia seu texto dizendo que o processo de escolha do LD “È uma forma democrática de dar ao professor a oportunidade de adquirir um material de

qualidade para auxiliá-lo no seu trabalho, comungando com sua filosofia de trabalho”. Nessa

passagem o professor, se faz valer do discurso político para construir sua imagem. A utilização do termo democrática indica que o professor tem uma preocupação com o coletivo, com a participação de todos.

Para construir um Ethos de competência, que exige de seu possuidor, ao mesmo tempo, saber e habilidade, o docente enfatizou suas bases teóricas: Os critérios que me embasaram na escolha do livro didático foram a forma que penso a alfabetização, numa linha construtivista sócio-interacionalista; o olhar que devemos ter a partir das referências bibliográficas. Aqui, o docente faz uso do discurso didático, utilizando uma referência conhecida e que lhe atribui a imagem de um profissional que se mantém informado sobre as teorias educacionais, que estuda as referências dos livros que adota para perceber se elas se correlacionam com o seu “saber”, ou com sua postura teórico-metodológica. Ao usar o discurso de autoridade, o professor constrói uma imagem de si como aquele que adota teorias educacionais atuais e respeitadas por estudos científicos. Já as marcas referentes às escolhas lexicais “consumido” e “conhecido” demonstram um discurso intitucionalizado, pois para a instituição escolar toma como critérios de qualidade o fato da obra ser conhecida por todos os professores, constituindo um status, e que seja totalmente utilizado, consumido no decorrer do ano letivo. As obras que são abandonadas, ou que não são totalmente esgotadas, acabam consideradas menos importantes.

Nesse trecho, observamos a representação social da profissão docente. Circula no meio pedagógico certas imagens prontas, estereótipos, relativos ao exercício do magistério: profissão que exige constante aperfeiçoamento, muita leitura e atenção às recente teorias educacionais. Para Charaudeau “os grupos julgam os outros grupos com base em um traço de sua identidade”.

Ao fazer o seguinte relato:“Colocaria como ponto negativo o fato de após a esolha refletida, crítica do livro didático, acontecer do livro escolhido não chegar à escola para atender a todos os alunos. Isto aconteceu conosco aqui. Depois de escolher um livro ou até aceitar a escolha feita pelo grupo e já compartilhar da mesma, você não tem o livro para trabalhar e tem que fazer nova opção

(livros já existentes na escola), o docente apresenta um Ethos de humanidade ao demonstrar, com

certo sentimento de indignação (você não tem o livro para trabalhar), a insuficiência de livros que atinge diretamente aos alunos e posteriormente compromete o trabalho dos professores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O professor analisado através das estratégias da polifonia mostrou ser um profissional que constrói uma imagem de “qualificado” para exercer sua posição e para poder escolher também os livros didáticos. O professor utiliza vozes do discurso político para construir uma imagem de professor comprometido com o processo democrático, em que todos tenham uma educação de qualidade. Posiciona-se também negativamente em algumas situações, demonstrando a mesma preocupação anterior, pois os livros foram de números insuficientes, demonstrando assim uma imagem de humanidade através de um sentimento de preocupação com a qualidade dos livros que os alunos utilizariam. Recorre, portanto, a inúmeras vozes para construir seu Ethos.

Concluímos também que o discurso docente e as imagens que o professor constrói de si e de seu auditório estão relacionadas com o imaginário social do exercício da profissão docente. Ao esboçar suas bases teóricas, o professor constrói um Ethos de estudioso, atualizado com as questões

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educacionais, consolidando um estereótipo do magistério, em que os professores devem estar em processo constante de atualização, de formação continuada.

REFERENCIAS

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