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Penélopes do terceiro milênio: tecem e esperam por seus maridos?: um estudo dos papéis sociais e das transformações experienciadas por idosas donas-de-casa quando do retorno ao lar de seus maridos aposentados

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM GERONTOLOGIA

PENÉLOPES DO TERCEIRO MILÊNIO:

TECEM E ESPERAM POR SEUS MARIDOS? UM ESTUDO DOS

PAPÉIS SOCIAIS E DAS TRANSFORMAÇÕES EXPERIENCIADAS

POR IDOSAS DONAS-DE-CASA QUANDO DO RETORNO AO LAR

DE SEUS MARIDOS APOSENTADOS

Clauzia Regina Borba Corrêa

Orientador: Prof. Dr. Luis Otávio Teles Assumpção

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Clauzia Regina Borba Corrêa

PENÉLOPES DO TERCEIRO MILÊNIO:

TECEM E ESPERAM POR SEUS MARIDOS? UM ESTUDO DOS

PAPÉIS SOCIAIS E DAS TRANSFORMAÇÕES EXPERIENCIADAS

POR IDOSAS DONAS-DE-CASA QUANDO DO RETORNO AO LAR

DE SEUS MARIDOS APOSENTADOS

Dissertação submetida ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em

Gerontologia. Área de confluência: Promoção da longevidade com qualidade de vida: aspectos psicológicos e sócio-culturais do envelhecimento, da Universidade

Católica de Brasília para obtenção do Grau de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Luís Otávio Teles Assumpção

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7,5 cm 7,5cm

Ficha elaborada pela Divisão de Processamento do Acervo do SIBI – UCB. C824p Corrêa, Clauzia Regina Borba.

Penélopes do terceiro milênio: tecem e esperam por seus maridos? Um estudo dos papéis sociais e das transformações experienciadas por idosas donas-de-casa quando do retorno ao lar de seus maridos aposentados / Clauzia Regina Borba Corrêa; orientador Luis Otávio Teles Assumpção – 2005.

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Clauzia Regina Borba Corrêa

PENÉLOPES DO TERCEIRO MILÊNIO:

TECEM E ESPERAM POR SEUS MARIDOS? UM ESTUDO DOS

PAPÉIS SOCIAIS E DAS TRANSFORMAÇÕES EXPERIENCIADAS

POR IDOSAS DONAS-DE-CASA QUANDO DO RETORNO AO LAR

DE SEUS MARIDOS APOSENTADOS

BANCA EXAMINADORA:

_______________________________________

Profº Dr. Luís Otávio Teles Assumpção - UCB

Orientador

_______________________________________

Profª Dra. Lourdes Maria Bandeira - UnB

Examinadora

_________________________________

Profª Dra. Marta Helena de Freitas - UCB

Examinadora

________________________________

Profª Dra. Carmem Jansen de Cárdenas - UCB

Suplente

(5)

DEDICATÓRIA

Aos meus filhos Igor e Erick por entenderem minhas ausências e por ouvirem inúmeras vezes “agora não posso”, “não tenho tempo”.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, Rei dos reis, sem Ele nada seria feito – a Ele toda a honra e toda a glória.

A Jesus Cristo, meu consolo e refúgio, que nas horas incertas me deu alento para prosseguir.

Ao Profº. Dr. Luis Otávio por ter, como um farol na tormenta, me orientado e conduzido com punho firme no árduo e difícil caminho da produção acadêmica. Sua orientação segura engendrou inestimável oportunidade de novos aprendizados.

À Profª. Dra. Marta Helena, amor à primeira vista, pela confiança em mim depositada desde a entrevista de seleção.

À Profª. Dra. Lourdes Maria Bandeira pelas pontuações precisas e enriquecedoras no exame de qualificação do projeto desta pesquisa.

À Profª. Dra. Carmem Jansen de Cárdenas pelo carinho e compreensão no

decorrer deste mestrado.

Aos colegas do mestrado em particular a Maria Clara por ter dado aquela força que somente uma irmã daria – tornamo-nos amigas; e à Maria das Graças, amiga de longa data, foi por seu intermédio que tomei conhecimento deste mestrado.

À Déborah Igreja do Prado por me ajudar na elaboração da proposta de pesquisa para seleção do mestrado e por disponibilizar material bibliográfico no decorrer da pesquisa.

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“Mais importante do que a ciência é o seu resultado, Uma resposta provoca uma centena de perguntas.

Mais importante do que a poesia é o seu resultado, Um poema invoca uma centena de atos heróicos.

Mais importante do que o reconhecimento é o seu resultado, O resultado é dor e culpa.

Mais importante do que a criação é a criança. Mais importante do que a evolução da criação é a evolução do Criador.

Em lugar de passos imperativos, o imperador. Em lugar de passos criativos, o criador.

Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face. E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos E colocá-los-ei no lugar dos meus;

E arrancarei meus olhos

Para colocá-los no lugar dos teus; Então ver-te-ei com os teus olhos E tu ver-me-ás com os meus.

Assim, até a coisa comum serve o silêncio

E nosso encontro permanece a meta sem cadeias: O Lugar indeterminado, num tempo indeterminado, A palavra indeterminada para o Homem indeterminado”.

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RESUMO

Este trabalho trata da mudança de papéis no envelhecimento, em particular da relação marido / mulher, enfocando as alterações ocorridas no comportamento das donas-de-casa quando do retorno ao lar de seus maridos no momento da aposentadoria.

Muito tem se falado sobre aposentados e aposentadas, do dever cumprido, das novas atitudes, das dificuldades, do ócio como prêmio por uma vida inteira de trabalho. Mas pouco ainda tem se refletido sobre o papel das esposas dos

aposentados, especialmente das donas-de-casa daquelas que nunca trabalharam fora e que passaram a maior parte do tempo praticamente confinadas ao espaço doméstico. Sentir-se-ão invadidas num espaço até então pretendido somente delas? Como vêem o retorno ao lar destes maridos, às vezes deprimidos, não querendo se aposentar, com sua auto-estima comprometida, sentindo-se inúteis, sem lugar, sem identidade. Quais mudanças têm ocorrido nestes novos relacionamentos sociais?

Neste trabalho pretendemos dar voz a estas mulheres alijadas e tão pouco ouvidas. Queremos conhecer seu novo papel, suas angústias, seu discurso, suas representações, seus sonhos, seus olhares. O que altera e como se comportam com a volta de seus maridos?

Com o intuito de se compreender estas mudanças nas posturas femininas foram privilegiadas abordagens do pensamento feminista e estudado o conceito de papel social à luz da Sociologia e a teoria de papéis de J. L. Moreno. Como instrumento metodológico foram feitas entrevistas semi-estruturadas com idosas de classe média urbana do Distrito Federal.

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ABSTRACT

This paper is about the role changes between husband/ wife during the elderly age, focusing the alterations, which happen on the behavior of the housewives when their retired husbands return to their homes. Much has been said about being retired, from the new attitudes, from the difficulties, from the idleness as prize of a whole life of work. But there is still few reflections o the wives’ role, especially from the housewives, those who had never worked out of their homes and that spent the most part of their lives surrounded by the domestic environment. Will they feel themselves

being invaded by having to share a space that was supposed to be theirs only? How do they feel in relation to their husbands’ return, sometimes feeling themselves depressed, with a low self-esteem and without identity? What changes have occurred on this new social relationship?

The aim of this paper is to give voice to these women. We want to know their new role, their anxieties, speech, representations, their dreams and their point of view. What is changed and how do they behave with their husbands’ return?

Aiming to understand these changes on the women’s behavior, it was privileged approaches from the feminist thought and it was studied the concept of the social role based on the Sociology and the theory of roles from J. L. Moreno. The methodology was done based on semi-structured interviews with old women from the middle urban class of the Federal District.

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SUMÁRIO

RESUMO ... 7

ABSTRACT ... 8

INTRODUÇÃO ... 10

JUSTIFICATIVA ... 13

OBJETIVOS ... 15

METODOLOGIA ... 16 PRIMEIRA PARTE -TEMÁTICA ...

1. ENVELHECIMENTO ... 19 19 SEGUNDA PARTE - REFERENCIAL TEÓRICO ... 2. BIOGRAFIA DE JACOB LEVY MORENO ... 3. TEORIA DOS PAPÉIS DE J. L. MORENO ... 4. PAPEL SOCIAL À LUZ DA SOCIOLOGIA ...

24 24 28 34 TERCEIRA PARTE - PAPÉIS SOCIAIS E SUAS REPRESENTAÇÕES NA VELHICE ... 5. PAPEL SOCIAL DO IDOSO ... 6. PAPEL SOCIAL DA IDOSA ... 7. ULISSES RETORNA AO SEU CASTELO ...

38 38 41 45 QUARTA PARTE - PAPÉIS FEMININOS: MUDANÇAS E RESISTÊNCIAS ... 8. AS “ETERNAS PENÉLOPES” ... 9. O FEMINISMO E AS MUDANÇAS DE GÊNERO ... 9.1. RESISTÊNCIAS – A HERANÇA CULTURAL ...

50 50 53 62 QUINTA PARTE - ANÁLISE E CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 10. SOBRE O “GRUPO BEM VIVER” ...

11. CARACTERIZAÇÃO DAS ENTREVISTADAS ... 12. ANÁLISE INTERPRETATIVA DAS ENTREVISTAS ... 13. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 14. BIBLIOGRAFIA ...

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INTRODUÇÃO

“Paremos de trapacear, o sentido de nossa vida está

em questão no futuro que nos espera; não sabemos quem somos se ignorarmos quem seremos: aquele velho, aquela velha, reconheçamo-nos neles. Isso é necessário, se quisermos assumir em sua totalidade nossa condição humana”.

Simone de Beauvoir

Ulisses, herói dos contos épicos gregos, enfrentava deuses e monstros em sua Odisséia. Penélope, sua esposa, aguardava confiante seu regresso. Sua propriedade fora invadida por homens cruéis das redondezas com o intuito de com ela contrair matrimônio.

Penélope prometeu, então, escolher um dos pretendentes tão logo tecesse

uma mortalha para seu sogro, posto que ele morreria tão logo ela se casasse. Por amor a Ulisses, ela tecia de dia e desmanchava a noite tornando o trabalho, desta forma, interminável. Assim teceu anos a fio até o regresso de seu amado esposo.

Será que tal como Penélope, as tradicionais donas-de-casa têm aguardado pacientemente o regresso de seus maridos? Como terão tecido seus sonhos, seus desejos, seus pensamentos?

Muito se tem falado do aposentado, do homem que perde seu papel profissional, seus valores, seu status social, sua rede social. Mas e quanto à sua mulher, aquela que por tanto tempo ocupou-se das tarefas domésticas praticamente confinada ao mundo privado? O que se tem dito sobre ela? Que olhar tem sobre este homem que, aproximando-se do final da vida, retorna ao lar? Como será a rotina da casa com o marido todo o tempo ali presente?

Dar voz a estas mulheres ajudou-nos a compreender seu universo e assim, desvendar, dentro dos limites de nossa pesquisa, suas identidades em um contexto de transformações sociais mais abrangentes.

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que ainda exercem alguma profissão remunerada fora de casa, ex-esposas que ainda mantêm um certo vínculo com seus maridos, esposas chefes de família pela impossibilidade de seus cônjuges ou pela falta deles.

Eis aqui uma categoria de difícil apreensão. O que se entender por dona-de-casa? Tanto pode se referir a mulheres com profissões definidas no mundo público e quando retornam ao lar, após o expediente, executam tarefas domésticas e cuidam dos filhos; profissionais que possuem empregados por não gostarem de executar tarefas domésticas, como a mulheres que não trabalham fora e gostam de cuidar de suas casas com afinco e se realizam nesta tarefa; das que não suportam o serviço

doméstico. Há donas-de-casa submissas, subalternas; há também as que empreendedoras, arrojadas e com iniciativa, assumem todo o poder de decisão dentro de casa. Esta ambigüidade/dubiedade deve ser bem ajuizada, refletida.

Privilegiaremos aquelas cuja função doméstica foi primordial em suas vidas – as esposas donas-de-casa. Pesquisaremos as mudanças em seus papéis sociais, as transformações ao longo de suas vidas. Tentaremos compreender e lançar alguma luz em suas ambigüidades, contradições e conflitos.

O universo por nós pesquisado concentra-se na faixa etária de 60 a 74 anos. São mulheres que nasceram nas décadas de 30 e 40. Vivenciaram, de alguma forma, a mudança do Brasil rural para o Brasil urbano. Muitas delas migraram do mundo tradicional para o mundo urbano-industrial. Assistiram e participaram de mudanças sociais extremamente profundas. Grosso modo, o Brasil vivido por suas mães não mais seria o de seus filhos. Educadas em um mundo patriarcal, seu lugar primordial foi o lar – “lugar de mulher honesta é em casa”.

No decorrer de suas existências estas mulheres vivenciaram transformações sociais, políticas, econômicas, de costumes e de comportamento. Assistiram ao advento tecnológico, dos meios de comunicação, testemunharam a chegada do homem à lua, participaram da evolução dos aparelhos eletrodomésticos passando do rádio à televisão, da vassoura ao aspirador de pó, do tanque de lavar roupa à máquina de lavar e de secar de última geração, do forno de microondas.

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No entanto, sabemos, valores culturais estão arraigados no inconsciente. Mesmo habitando em grandes centros urbanos, de alguma forma estes valores estão presentes. Os papéis tradicionais de dona-de-casa mantêm uma certa latência.

Com o intuito de analisar estas mudanças sociais e culturais dos sujeitos pesquisados discorreu-se, na primeira parte desta dissertação, sobre o envelhecimento com o objetivo de se compreender as mudanças que ocorrem nesta etapa da vida.

Na parte dois apresentamos o referencial teórico, onde foi discutido o conceito

de papel social, em particular, trabalhamos com a teoria dos papéis de J. L. Moreno. Dessa maneira nos foi possível melhor compreender o processo de mudança de papéis na terceira idade.

Na parte três discorremos sobre os papéis sociais do idoso e da idosa, suas dificuldades, suas adaptações no contexto social, psicológico e cultural. Sob o título “Ulisses retorna ao seu castelo” nos remetemos ao momento da aposentadoria dos maridos de nossas Penélopes – as donas-de-casa e as eventuais mudanças na vida deles.

Na parte quatro, foram abordadas as mudanças e resistências dos papéis femininos das donas-de-casa, mulheres criadas em um tempo em que as principais funções femininas eram a reprodução, os cuidados com o lar, a criação da prole e a obediência ao marido.

As lutas feministas, no decorrer do século passado, provocaram fortes mudanças nos papéis sociais em todo o mundo, alterando também os papéis das donas-de-casa, sua maneira de pensar, de agir, seus conceitos, sua visão de mundo. Desta maneira a abordagem da teoria feminista foi essencial para a compreensão e apreensão deste tema sob o título “O feminismo e as mudanças de gênero”.

Na parte cinco nos ocupamos em caracterizar os sujeitos da pesquisa, com o objetivo de se conhecer um pouco de suas vidas; a análise interpretativa das

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JUSTIFICATIVA

A população idosa brasileira tem apresentado crescimento vertiginoso nas últimas décadas. Em termos proporcionais, a faixa etária a partir de 60 anos de idade é a que mais tem crescido. Camarano (1999) relata que, segundo as projeções estatísticas da Organização Mundial de Saúde, o grupo de idosos no Brasil aumentará em 15 vezes, enquanto a população total em cinco. O País ocupará, assim, o sexto lugar no mundo quanto ao contingente de idosos, alcançando, em 2025, cerca de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade.

Este aumento da longevidade explica tantos estudos sobre envelhecimento, uma vez que num passado não muito distante, tornar-se um longevo era privilégio de poucos.

Não existe um só envelhecer, mas processos de envelhecimento os quais estão relacionados ao gênero, às etnias, à classe social, à cultura. Os processos de envelhecimento se devem às condições de vida, de trabalho e aos aspectos biológicos aos quais estiveram submetidas as pessoas idosas ao longo de suas vidas.

O interesse pelo estudo da Gerontologia surgiu da observação e curiosidade, enquanto psicóloga, de um número crescente de idosos à procura de atendimento psicoterapêutico. O fato era inusitado, pois o envelhecimento sempre foi pouco abordado na formação acadêmica. Além disto, algumas linhas de psicoterapia não acreditam que pessoas idosas possam se beneficiar deste processo, alegando maior resistência e rigidez por parte desta clientela.

O que acontecia e o que mudava na vida destes idosos – eram as queixas mais freqüentes que apareciam no consultório. Cresceu então o interesse por este grupo composto, em sua maioria, por esposas de aposentados.

Começamos a freqüentar um grupo de convivência para a terceira idade com o objetivo de buscar os atores sociais para a pesquisa. Este grupo era composto em sua maioria por mulheres donas-de-casa, aposentadas, viúvas, divorciadas.

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Nosso trabalho busca compreender a dona-de-casa, um papel social de profundos desdobramentos e conseqüências em diferentes culturas.

Procuramos desvendar as identidades destas mulheres em um contexto de transformações sociais intensas.

Por muito tempo as mulheres não tiveram voz e voto. As participantes desta pesquisa são remanescentes de um sistema patriarcal, com papéis de gênero bem definidos. Viram o movimento feminista dos anos 60 e suas conseqüências. Com que intensidade este movimento repercutiu em suas vidas? Donas-de-casa, submissas e financeiramente dependentes de seus maridos, atualmente já criaram seus filhos,

adquiriram o papel de avó e seus maridos já se aposentaram.

A aposentadoria, forçosamente, traz mudanças de papéis tanto para o marido como para a dona-de-casa, porque a presença do marido aposentado interfere em sua rotina diária, em seus compromissos já assumidos.

Esta pesquisa se justifica porquanto o advento da longevidade traz consigo um maior tempo de convívio entre os cônjuges sendo esta uma situação relativamente nova para os casais idosos. Importantes ajustes serão feitos pelo casal – modificam-se antigos papéis e adquirem-se novos. Precisarão aprender a conviver por mais tempo dentro de casa.

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OBJETIVOS:

OBJETIVO GERAL

Analisar as mudanças/transformações vivenciadas nos papéis sociais de esposas donas-de-casa, quando da ruptura de um padrão cotidiano de vida, em decorrência da aposentadoria de seus maridos e seu conseqüente retorno ao lar.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Investigar as possíveis mudanças (o antes e o depois) na rotina doméstica destas esposas em decorrência da aposentadoria de seus maridos

• Identificar os motivos que influenciaram estas mulheres na tomada de decisão em ser donas-de-casa

• Buscar /conhecer suas representações, seus discursos, seus sonhos e o que mudou ao longo de suas vidas.

• Analisar como lidam com o envelhecimento

• Pesquisar os papeis sociais destas esposas donas-de-casa que nunca

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METODOLOGIA

Nesta pesquisa pretendemos enfocar aspectos subjetivos do processo de envelhecimento e as representações de mulheres donas-de-casa que nunca trabalharam fora. Para tanto, utilizamos a metodologia qualitativa por acreditarmos ser a mais adequada para se entender um fenômeno social, compreender e classificar processos vividos por grupos sociais e possibilitar o entendimento das particularidades do comportamento humano.

Segundo Goldenberg (1997:14), a pesquisa qualitativa se preocupa com o aprofundamento da compreensão de um grupo social, de uma organização, de uma instituição, de uma trajetória. Diz ainda que o método qualitativo tenta “ver o mundo através dos olhos dos atores sociais e dos sentidos que eles atribuem aos objetos e às ações sociais que desenvolvem” (1997: 32).

Dentro desta abordagem qualitativa, a história oral e a entrevista foram os instrumentos utilizados. Segundo Haguette (2000; 92), “tudo que é ‘oral’, gravado e preservado pode ser considerado história oral”. É uma técnica de coleta de dados baseada no depoimento oral, gravada, obtida pela interação entre o especialista e o entrevistado, objetivando a compreensão de fatos sociais e experiências pessoais. “A história oral é interdisciplinar, interessando à história, à sociologia à antropologia, à ciência política e mesmo ao jornalismo” (Idem, 2000; 95).

“A memória está empenhada e integrada com o presente – com atitudes, perspectivas e compreensões que mudam continuamente (...) O que é capturado pela história oral é um segmento da experiência humana – a interação do entrevistador com o entrevistado – no contexto de um passado relembrado, de um presente dinâmico e de um futuro desconhecido e aberto”.

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Segundo o método da história oral a escolha dos entrevistados não pode ser aleatória, por isso o universo por nós escolhido foi bem específico. Só participaram das entrevistas as idosas acima de 60 anos, as quais exerceram exclusivamente a função de dona-de-casa, cujos maridos se encontravam aposentados.

A entrevista pode ser definida como “um processo de interação social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado. As informações são obtidas através de um roteiro de entrevista de acordo com uma problemática central e que deve ser seguida”. (Haguette, 2000:86).

“Enquanto técnica de coleta de dados, a entrevista é bastante adequada para a obtenção de informações acerca do que as pessoas sabem, crêem, esperam, sentem ou desejam, pretendem fazer, fazem ou fizeram, bem como acerca das suas explicações ou razões a respeito das coisas precedentes”. (GIL, 1999; 117)

Com o objetivo de dar voz a estas mulheres tão pouco ouvidas foi privilegiada a entrevista semi-estruturada, onde foram elaboradas questões pertinentes ao tema para as entrevistadas responderem e refletirem.

Segundo Triviños (1987:146) “a entrevista semi-estruturada oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação”. Para ele, a entrevista semi-estruturada é aquela que parte de questionamentos básicos que interessam à pesquisa e oferecem amplo campo de interrogativas. As entrevistas foram gravadas e transcritas no mesmo dia com o objetivo de não se perder os detalhes.

A pesquisa foi realizada com seis idosas donas-de-casa, podendo hoje ser classificadas como pertencentes à classe média urbana, sendo duas viúvas e quatro casadas cuja idade variou entre 60 a 74 anos. Todas residem em Brasília. Com duração média de três horas, o local das entrevistas ficou a critério das entrevistadas. Foram realizadas no consultório da pesquisadora ou em suas residências.

Seus nomes foram substituídos por nomes de flores com o objetivo de se

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entrevista, todas relataram um certo prazer em participar, dizendo se sentirem mais

leves e animadas. Algumas tiveram até alguns insights à medida que rememoravam

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PRIMEIRA PARTE

TEMÁTICA

1. ENVELHECIMENTO

“Há uma experiência que só pertence àqueles que estão velhos: é a da própria velhice. Os jovens só têm desta, noções vagas e falsas. É preciso ter vivido muito tempo para ter uma idéia precisa da condição humana, para ter uma visão geral da maneira como se passam as coisas” (BEAUVOIR, 1990: 470).

O envelhecimento, fenômeno universal, pode ser definido como um processo dinâmico e progressivo de modificações biológicas, psíquicas, sociais, culturais e ambientais que ocorrem ao longo da vida de forma diferenciada para cada indivíduo dependendo da educação, do trabalho e das experiências vividas. Cada sociedade, de acordo com a época, confere valores e interesses distintos à velhice.

Os indivíduos envelhecem de forma individual e diferenciada, dependendo da

maneira como organizaram suas vidas, suas histórias e culturas, o que acarretará diferentes maneiras de se lidar com as perdas e as transformações.

“O envelhecimento tem, sobretudo, uma dimensão existencial e, como todas as situações humanas, modifica a relação do homem com o tempo, com o mundo e com a sua própria história, revestindo-se não só de características biopsíquicas, como também sociais e culturais” (Beauvoir, 1990).

Envelhecer é uma experiência subjetiva e social, não tendo um momento preciso para acontecer. O sentimento de estar envelhecendo pode surgir muito cedo para alguns e não para outros. Cada sujeito percebe o seu tempo de ser velho ao

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próprio corpo. Desta maneira, a conduta do indivíduo diante da velhice ocorre de acordo com os costumes, experiências e estilo de vida, adquiridos no decorrer de sua existência.

A preocupação com a velhice, e todas as modificações decorrentes do avanço da idade, existiu desde as civilizações mais antigas. No decorrer do tempo, cada sociedade reservou para seus idosos uma função e um lugar determinado –

privilegiado ou marginalizado – segundo suas necessidades e seus valores. “As

sociedades, em diferentes momentos históricos, atribuem um significado específico às etapas do curso de vida dos indivíduos, conferindo-lhes papéis e funções” (GUSMÃO, 2001:123).

Simone de Beauvoir em seu livro A velhice (1990) nos diz que, no decorrer dos séculos a velhice foi tratada e descrita, na maioria das vezes, de forma estereotipada e preconceituosa. Eram enfatizados os aspectos biológicos, isto é, a decadência do corpo, a doença, o mal cheiro que o velho exalava. Relata ainda ter havido uma forte presença do idoso em obras literárias e em peças teatrais sendo, geralmente, representado/retratado como uma caricatura. A recusa à velhice data de longo tempo.

Para Debert (1998), a velhice é uma construção social. A idade não é um dado da natureza, nem o único fator explicativo dos comportamentos humanos. Resulta da elaboração simbólica definindo fronteiras entre as idades pelas quais os indivíduos passam e não são necessariamente as mesmas em todas as sociedades, afirma a autora.

Erik Erikson (1998) foi um importante psicanalista a estudar o envelhecimento. Segundo ele, a velhice é um estágio da vida cuja tarefa é a resolução do conflito entre integridade e desespero, podendo resultar na sabedoria. A integridade é o fruto do amadurecimento das pessoas, é a capacidade de auto-aceitação, das modificações físicas que inevitavelmente ocorrem, é a sensação de ter passado por tudo e ter valido a pena. Este processo, segundo ele, leva à sabedoria, uma vez que o indivíduo pôde assimilar bem as experiências de vida,

passou por triunfos e desilusões e se adaptou às suas ocorrências; foi produtivo e criativo, auxiliou e foi auxiliado por pessoas e viveu a vida com dignidade.

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perdida, intimidade ausente, produtividade negligenciada. Pode se tornar uma pessoa depressiva, implicante e amarga, afirma Erikson.

“O modelo societário normal para a velhice tem sido o de encorajar o abandono, mas não a busca de uma nova vida e papel – um novo self. Esta promoção da falsa velhice, ou negação, sufoca o desenvolvimento normal. Simplesmente parecer mais jovem, ter uma aparência mais jovem, é fingimento. A sabedoria da humildade, que pode ser infinita e estranhamente forte, raramente é encorajada” (ERIKSON, 1998:105).

A partir do século XX ocorreram várias transformações na experiência do envelhecimento. Uma das mais importantes foi o crescimento mundial da população

idosa, em decorrência de profundas modificações econômicas e sociais, tais como urbanização, saneamento urbano, preocupações nutricionais, hábitos de higiene, melhores condições no ambiente do trabalho e nas residências, implantação de pensões e aposentadorias e o desenvolvimento científico-tecnológico, promovendo assim a diminuição da taxa de mortalidade.

A longevidade, outrora privilégio de poucos, viabiliza-se para um maior número de pessoas. Estudos mais profundos sobre esta etapa de vida tornam-se cada vez mais necessários. Um dos campos de estudo da velhice é a Gerontologia – que compreende os aspectos antropológicos, psicológicos, jurídicos, ambientais, econômicos, sociais, éticos e políticos. Estas reflexões têm contribuído para um envelhecimento ativo, bem-sucedido e com maior qualidade de vida.

O envelhecimento bem-sucedido é visto como uma competência adaptativa do indivíduo, no sentido de melhor responder aos desafios do corpo, da mente e do ambiente.

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Atribuir somente perdas à velhice é subestimá-la e, assim, propagar o medo de envelhecer. Resistir ao envelhecimento é negar um dos mais importantes ganhos da velhice – a maturidade, a qual proporciona ao idoso inúmeras possibilidades de adaptação ao seu tempo e ao seu espaço.

“Os aspectos negativos da velhice não se referem à falta da capacidade, mas à falta de ilusão, sonhos, ousadia e transgressão. Quanto maior a rigidez e a auto-repressão da afetividade, sexualidade e agressividade, maior a desvitalização e mais acentuada a possibilidade de senilidade” (MONTEIRO, 2002: 946).

A industrialização e a urbanização das sociedades modernas provocaram imensas mudanças sociais que se refletem nas famílias e em suas relações, alterando profundamente os padrões da família tradicionalmente estabelecida. No mundo urbano não mais existem as grandes famílias caracterizadas por várias gerações submetidas ao jugo patriarcal e coabitando sob o mesmo teto. Mudanças importantes ocorreram como a maior participação da mulher no mercado de trabalho e a redução do tamanho da família. Os filhos se casam e constituem novos núcleos familiares independentes; passam a ter vida própria, às vezes morando em outra cidade em busca de oportunidade de emprego. Cuidar dos velhos pais torna-se tarefa quase impossível.

Estudos recentes sobre suporte social e relações intergeracionais na família mostram que, de modo geral, os cuidados com os mais velhos são prestados por uma rede informal de apoio: as famílias constituídas pelos cônjuges, filhos, parentes e, na falta destes, amigos e vizinhos. São numerosas as pesquisas internacionais que desmitificam a idéia de residir com os filhos ou pertencer a uma família extensa seja garantia de uma velhice segura ou livre de violência e maus-tratos1.

Os idosos com melhores condições financeiras continuam morando em suas casas, não buscando a moradia dos filhos ou dos asilos. Constitui-se então o que Beauvoir chama de solidão a dois, pois o casal se isola em casa.

1

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“Os casais trancam-se em suas casas, mais radicalmente que os indivíduos viúvos ou solteiros. O apego muitas vezes ciumento, maníaco, tirânico que têm um pelo outro os leva a produzir o vazio em torno de si” (Beauvoir, 1990: 309).

Para Camarano (2002) e Veras (1999), a proporção de idosos vivendo sozinhos, tanto homens como mulheres, é crescente. Pesquisas têm mostrado que a Seguridade Social, a melhoria nas condições de saúde e os avanços tecnológicos tais como meios de comunicação, elevadores, automóveis, serviços de entrega em domicílio, casas adaptadas para a terceira idade, proporcionam ao idoso, o viver só bem-sucedido, podendo até vir a ser uma preferência e não caracterizar o abandono, o descaso ou a solidão. Em geral, as mulheres apresentam uma tendência maior a viverem sozinhas.

Os que não têm condições financeiras para se sustentar se vêem obrigados a morar com seus filhos ou em asilos – por vezes verdadeiros “depósitos de velhos”, se quisermos usar a expressão de Simone de Beauvoir. Não ter um lar contribui para a perda do referencial, para o sentimento de não pertencer a lugar algum. Beauvoir (1990:312) denomina o asilo como um “morredor”, um lugar onde se espera a morte.

“Mais da metade dos velhos morrem no primeiro ano de sua admissão” (Idem: 317). Para a autora as palavras abandono, segregação, decadência, demência podem resumir o destino dos sobreviventes.

O prolongamento da vida acompanhou-se da desconstrução de uma antiga identidade de velhos e de sua reconstrução sob novos parâmetros de rejuvenescimento e beleza, possibilitados pelas próteses, botox, tratamentos à base de antioxidantes e cirurgias exigidos pelos novos atores sociais – os idosos urbanos.

Na sociedade de consumo, onde o hedonismo é priorizado, a dor e o sofrimento devem ser rapidamente interrompidos com intervenções imediatas, onde o ideal de saúde perfeita é almejado, onde fragilidades são escamoteadas sob músculos delineados, a velhice passa a ser vista como a grande vilã.

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SEGUNDA PARTE

REFERENCIAL TEÓRICO

2. BIOGRAFIA DE JACOB LEVY MORENO

Conhecer a biografia de J. L. Moreno é muito importante, pois nela estão os

primórdios do Psicodrama.

“Afinal, quem foi esse Jacob Levy Moreno, a quem, até hoje, os sociólogos negam reconhecimento, os psicólogos ainda olham com desdém, os psiquiatras julgam um megalomaníaco e os filósofos um ignorante? Quem foi este homem que viveu desafiando todos os dogmas do seu tempo, religiosos, terapêuticos, científicos?” (NAFFAH NETO, 1990: 13).

Nasceu aos seis dias de maio de 1889 em Bucareste na Romênia. Moreno

era de origem judaica (sefardim); sua família veio da península ibérica na época da Inquisição e radicou-se na Romênia.

Aos cinco anos de idade mudou-se com sua família para Viena. Nesta época ele teve uma experiência interessante – a brincadeira de ser deus. Ele e várias crianças brincavam de deus e anjos no porão de sua casa; o céu era constituído por vários planos, formados com caixotes empilhados em cima de uma mesa com uma cadeira no alto que era o trono de deus com o “menino-deus” Moreno sentado. Um dos anjos solicitou que voasse e ele o fez, quebrando o braço direito ao cair no chão.

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Entre 1907 a 1910, Moreno e alguns amigos formaram a “Religião do Encontro”. Expressavam sua rebeldia diante dos costumes estabelecidos usando barbas e viviam pelas ruas à maneira dos mais pobres. Neste período Moreno ia aos jardins de Viena onde fazia jogos de improviso com crianças, favorecendo-lhes a espontaneidade. Moreno denominou este período como a revolução nos jardins de Viena porque ele instigava as crianças a rebelarem-se contra o mundo estereotipado dos adultos e a criarem normas e regras para uma sociedade infantil adequada a suas necessidades e respeitada pelos maiores.

Estudou medicina em Viena especializando-se em psiquiatria. Em 1912,

quando era interno da Clínica Psiquiátrica de Viena, teve um breve e único encontro com Freud. Nesta época Moreno não tinha muito interesse por psicoterapia.

Em 1913, juntamente com um jornalista e um médico especialista em doenças venéreas realizou um trabalho com as prostitutas vienenses utilizando-se de técnicas grupais, conscientizando-as de sua situação, o que favoreceu a organização de uma espécie de sindicato em Amspittelberg.

Durante os anos de 1915 e 1916 teve a seu cargo a assistência de refugiados tiroleses no campo de Mittendorf, próximo de Viena, onde observou as interações psicológicas entre os elementos do grupo.

Formou-se em medicina em 1917 e até 1920 colaborou na revista “Der Neue Däimon”, a revista existencialista e expressionista dominante daquela época, juntamente com Kafka, Martin Buber, Max Scheller, Francis James, Franz Werfel, Jacob Wassermann e outros.

Em 1921 fundou o Teatro Vienense da Espontaneidade, experiência que constituiu a base de suas idéias da Psicoterapia de Grupo e do Psicodrama. Moreno entendia este período em que se dedicou ao teatro como uma transição de sua fase religiosa para a científica. Dizia que superada a fase religiosa, em vez de fundar uma seita, ingressar num mosteiro, ou criar uma teologia, aproveitou sua idéia da “espontaneidade como natureza primordial, que é imortal e reaparece em cada nova geração” para se rebelar contra o falseamento das instituições sociais (da família à

igreja) e a robotização do ser humano. No teatro ele vislumbrava a possibilidade de iniciar sua revolução criadora a partir da investigação da espontaneidade no plano experimental.

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participantes. Nesta mesma época ele introduz o teatro espontâneo aos pacientes psiquiátricos. O Teatro da Espontaneidade transformou-se em Teatro Terapêutico e mais tarde em Psicodrama Terapêutico.

Em 1925 emigra para os Estados Unidos. Nesta época, inspirado por um sonho, concebe um aparelho que reproduziria o som e a imagem, à maneira do vídeo-tape. Os americanos interessaram-se pelo projeto e compraram o invento. Em 1929 dirigia sessões de psicodrama Público no Carnegie Hall.

Em 1931 introduziu o termo Psicoterapia de Grupo e publicou a revista “Impromptu”. Neste mesmo período Moreno voltou sua atenção para a investigação

e mensuração das relações interpessoais surgindo assim os métodos da Sociometria, que durante a Segunda Guerra foram utilizados para a seleção de oficiais americanos. Daí em diante, seus trabalhos atraíram a atenção dos sociólogos, que criaram centros de estudos sociométricos em Washington e projetos de programas carcerários.

Em 1936, Moreno mudou-se para Beacon e construiu o primeiro Teatro de Psicodrama, em torno do qual centralizava uma clínica psiquiátrica e um instituto formativo. No ano seguinte fundou a revista “Sociometry” e incorporou-se à Columbia University e mais tarde à New York University.

Pai do teatro da espontaneidade, da psicoterapia de grupo, do psicodrama, da sociometria ele os considerava como a terceira revolução psiquiátrica, após a primeira revolução com Philipe Pinel que, em 1772, na Revolução Francesa, soltou as correntes dos alienados, tratando-os com humanidade, e o surgimento da psicanálise de Sigmund Freud constituindo-se na segunda revolução.

Moreno morreu em Beacon a 14 de maio de 1974, aos 85 anos de idade.

Deixou um pedido para que em sua sepultura fossem gravadas as seguintes palavras:

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3. TEORIA DOS PAPÉIS DE J. L. MORENO

“Um encontro de dois: olho a olho, cara a cara. E quando estiveres perto arrancar-te-ei os olhos E colocá-los-ei no lugar dos meus;

E arrancarei meus olhos

Para coloca-los no lugar dos teus; Então ver-te-ei com os teus olhos E tu ver-me-ás com os meus”

(Traduzido de “Einladung zu einer Begegnung” por J. L. Moreno. Publicado em Viena, 1914).

O termo papel tem conotações sociológicas, antropológicas, psicológicas. Vem do teatro grego clássico onde os textos eram redigidos em “rolos” de papiro nos quais eram escritos os dramas a serem representados. Passou para o inglês e o francês medievais como “role”. Foi no teatro moderno no século XVII que “role”, em português papel, passou a significar a parte que cada ator desempenharia na peça teatral. Este sentido original de papel teatral assumiu uma outra conotação no discurso das ciências humanas passando a significar a posição que uma pessoa assume na sociedade.

Dentre os muitos autores que discorrem sobre o conceito de papel, J. L. Moreno, criador do Psicodrama, elaborou a teoria dos papéis e foi utilizada nesta pesquisa como fundamentação teórica.

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que se fundiram elementos privados, sociais e culturais” (MORENO, 1978: 238).

Para Moreno o homem só tem consciência de si mesmo ao desempenhar papéis, se não houvesse nenhuma atuação esta conscientização não aconteceria. Como a atuação está sempre relacionada a pessoas e coisas o “eu” é o resultado dos papéis. Por isso ele afirma que o eu surge dos papéis e não o inverso, pois por intermédio do papel o homem se experiencia formando assim o eu. Portanto, o papel é o aspecto tangível do que se chama eu ou self:

“A função do papel é penetrar no inconsciente, desde o mundo social, para dar-lhe forma e ordem. Os aspectos tangíveis do que se conhece como ego são os papéis em que ele atua, com o padrão de relações de papel em torno de um indivíduo, que é o seu foco. Consideramos os papéis e as relações entre eles o desenvolvimento de maior significado em qualquer cultura específica. O papel pode ser definido como a menor unidade de uma cultura; ego e papel estão em contínua interação” (Moreno, 1978: 29).

Ao nascer, a criança passa da matriz materna para um novo universo o qual Moreno denominou Matriz de Identidade. Nesta nova matriz é oferecida à criança uma placenta social, a qual é constituída pelos vínculos paternos e pelas demais pessoas ou seres significativos que circundam o bebê, apresentando-lhe modelos de conduta.“É um mundo indiferenciado onde ela não faz distinção entre o interno e o externo, entre pessoas e objetos, entre psique e ambiente: a existência é una e total” (Idem: 26).

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Na teoria moreniana existem três tipos de papéis conhecidos como papéis psicossomáticos, psicodramáticos e sociais os quais emergem da Matriz de Identidade – lugar onde a criança aprenderá o seu desempenho, fase esta também

chamada por Moreno de treinamento de papéis. “A aprendizagem de papéis é um

esforço que se realiza mediante o ensaio de papéis, a fim de desempenhá-los de modo adequado em situações futuras” (Idem: 29).

Os papéis psicossomáticos, ligados às funções fisiológicas (comer, respirar, dormir, evacuar, urinar) são os primeiros a serem desempenhados e determinam as primeiras ligações com o ambiente. São estruturas sobre as quais vão repousar os

papéis psicológicos ou psicodramáticos e os papéis sociais. Desempenhando estes papéis a criança experiencia o seu corpo – o seu “eu fisiológico”.

Mais tarde ela experimenta os papéis psicodramáticos ou psicológicos onde passa a imitar o comportamento dos adultos que cuidam dela, entrando em contato com a realidade; experimenta também os papéis fantásticos, criativos, onde ela se relaciona com a fantasia. Começa a experienciar sua psique, seria então o “eu psicodramático”.

Os papéis sociais são os últimos e estão ligados à sociedade e suas atribuições formando o “eu social”. A junção destes três “eus” formará o eu total integrado. Assim, uma criança não poderá ter consciência do seu eu se não começar a desempenhar papéis. Primeiro existe o papel e dele surge o eu.

A teoria psicodramática dos papéis não se limita à dimensão social. Leva o conceito de papel a todas as dimensões da vida:

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Todos os papéis são complementares. Um papel não pode existir sem o seu complementar, sem um contra-papel. O modo de ser, a identidade de um indivíduo decorre dos papéis que desempenha ao longo de sua existência e de suas experiências, com as respostas obtidas na interação social, por papéis que

complementam os seus – por intermédio de vínculos. “Não há papel de senhor se

não houver papel de servo e vice-versa. As contradições, crises e transformações dos papéis complementares fazem parte do próprio movimento da história. Papéis opostos ou solidários, de indivíduos diferentes, completam um o sentido do outro” (Gonçalves; Wolff; Almeida, 1988: 74). Moreno diz que a primeira relação complementar vivida pelo indivíduo, seu primeiro vínculo, é a de mãe (ou o seu substituto) e filho.

O papel é característico de cada cultura ou sociedade. Pode gerar problema de comunicação intercultural, quando acontece de um mesmo papel ter atribuições diferentes numa determinada cultura. Isto faz sentido quando Moreno diz que os papéis e as relações entre os diversos papéis constituem o mais importante produto dentro de uma cultura específica.

O papel também pode, termo de Moreno, “adoecer”. A este estado ele denominou de “patologia do papel”. Isto pode acontecer quando a sociedade impõe ao indivíduo funções vitais que ele não deseja cumprir, criando um estado de permanente frustração, ou ainda quando o indivíduo desempenha o papel escolhido

de maneira não desejada.

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é o que freqüentemente origina o sentimento de ansiedade” (Moreno, apud Martín, 1996: 235).

Toda a teoria psicodramática está embasada na espontaneidade e criatividade humana em antagonismo à conserva cultural. Por conseguinte, Moreno acredita que o homem é, por natureza, espontâneo e criador e adoece quando não pode utilizar esses dons naturais. O homem não pode adotar espontaneamente os papéis que desejaria, porque uma sociedade organizada em conservas culturais o impede; trata-se, portanto, de um adoecer da espontaneidade criadora. A espontaneidade criadora adoece porque as conservas são tão poderosas que sufocam a criatividade potencial do sujeito, erradicando sua conduta flexível.

“A conserva cultural presta ao indivíduo um serviço semelhante ao que, como categoria histórica, presta à cultura em geral – continuidade de herança – assegurando para ele a preservação e continuidade do seu ego. Esta provisão é de ajuda desde que o indivíduo viva num mundo comparativamente estável; mas o que deverá fazer quando o mundo à sua volta se encontra em mudanças revolucionárias e quando a qualidade das transformações se converte, cada vez mais, numa característica permanente do mundo em que ele participa?” (Moreno, 1978: 157).

Ele valoriza as relações interpessoais em toda sua obra e acredita ser por intermédio da “ação + palavra” que o homem pode modificar-se e modificar o meio em que vive, “um papel é uma experiência interpessoal e necessita de dois ou mais indivíduos para ser realizado” (Idem: 238).

Nesta visão moreniana são os papéis que promovem a inserção do indivíduo na sociedade. Por que seria diferente na velhice?

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ter suficiente espontaneidade e criatividade para criar novos papéis, abandonar alguns e modificar outros tantos.

Sendo o papel “a maneira como o indivíduo funciona num momento específico em que reage a uma situação específica onde outras pessoas ou objetos estão envolvidos” (Idem: 27), podemos identificar a velhice como uma situação específica. Sob a ótica da teoria dos papéis é possível, sim, promover esta inserção do idoso na sociedade. Uma possibilidade prática seria a utilização da técnica de treinamento de papéis com o intuito de se treinar este novo papel que surge – o papel de idoso. O treinamento de papéis possibilita ao indivíduo “treinar” um papel que não esteja bem

desenvolvido. Este treinamento não estaria apenas relacionado ao idoso, mas a suas famílias com o objetivo de ensinar aos mais jovens a lidar melhor com o idoso, para que este possa se adaptar ao seu atual momento de vida.

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4. PAPEL SOCIAL À LUZ DA SOCIOLOGIA

“No ponto de intersecção entre indivíduo e sociedade encontra-se o homo sociologicus, o homem enquanto portador de papéis sociais pré-formados. O indivíduo constituído pelos seus papéis sociais não é uma imagem da realidade, mas uma construção científica”.

Ralf Dahrendorf

Os seres humanos são seres sociais por natureza, pois já nascem inseridos em um grupo social, numa cultura pré-determinada. No decorrer do seu desenvolvimento assimilam elementos sociais como valores, normas, expectativas, papéis, difundidos e transmitidos pelos outros indivíduos que compartilham de sua cultura.

O funcionamento de toda sociedade depende da existência de padrões de comportamento, regras e valores entre os indivíduos. Neste contexto, os conceitos de status e papel social são especialmente importantes para a análise desta interação social e estabelecem as relações entre o indivíduo, sua cultura e sociedade.

Status refere-se ao lugar ou a posição que o indivíduo ocupa na estrutura social em função dos valores sociais. Localiza o indivíduo no espaço social em

relação a outros indivíduos. Papel é o padrão de comportamento esperado ou exigido de pessoas que ocupam determinado status face às reivindicações existentes da sociedade à qual elas estão inseridas.

A idéia de papel não é nova, Shakespeare, Nietzsche já a utilizavam com sentido sociológico em suas obras. Tanto Dahrendorf (1969) como Ely Chinoy (1975) citam em seus livros, versos de Shakespeare ilustrando o conceito de papel:

“O mundo inteiro é um palco,

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Têm suas saídas e suas entradas;

E um homem em sua vida desempenha muitas partes, Sendo seus atos sete idades”.

(CHINOY, 1975: 69)

O conceito de papel social foi organizado, sistematizado e utilizado pela Sociologia a partir do século XX, onde autores como Ralph Linton, George Mead, Talcott Parsons, Charles Cooley, Jacob Levy Moreno discorreram vastamente sobre o tema.

O conceito de papel social guarda analogia com o papel dramático. “A

diferença consiste em que, no papel social, o indivíduo representa-se a si mesmo. O papel social não é fictício nem temporário; foi aprendido no processo de socialização e é desempenhado nos diferentes grupos de que o indivíduo participa, vindo a ser uma parte integrante de sua personalidade social” (FICHTER, 1973; 243).

Cada indivíduo – ator e membro da sociedade – possui diversos papéis os quais encontram-se entrelaçados e arraigados em sua maneira habitual de pensar e

agir. Sociologicamente, a síntese de todos os papéis desempenhados pelo indivíduo estabelece a personalidade social, sistema total de papéis pelo qual ocorre a mediação entre indivíduo e sociedade. “O papel pode ser estudado cientificamente, pode ser analisado em detalhe e pode ser observado em ação, uma vez que muitos são os indivíduos que realizam o mesmo papel mais ou menos da mesma forma” (Idem; 244).

Os papéis sociais não existem isoladamente, estão sempre relacionados entre si na personalidade do indivíduo e em conexão com os papéis de outros indivíduos, formando assim as relações mútuas e recíprocas. Os indivíduos atuam entre si em seus papeis e por intermédio deles, como por exemplo, chefe e empregado interagem por intermédio do papel de chefe e do papel de empregado. Cada um agindo segundo formas padronizadas, conhecidas e esperadas, porque os papéis sociais são recíprocos e inter-relacionados.

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Antes de desempenhar seus papéis, o indivíduo deve conhecê-los. Assim como o ator de um drama, também o ser social precisa aprender os seus papéis,

familiarizar-se com o seu conteúdo e suas sanções. “Aprendem papéis mais ou

menos completos, observando e imitando outras pessoas e sendo corrigidos e aconselhados por elas” (Idem; 248).

Segundo Berger & Luckmann (2002; 103) “ao desempenhar papéis, o

indivíduo participa de um mundo social. Ao interiorizar estes papéis, o mesmo mundo torna-se subjetivamente real para ele”. Ocorre então o processo de socialização por intermédio da internalização de modelos de comportamento socialmente objetivados

por normas, valores e emoções.

A sociedade julga cada papel social e, de conformidade com estes, aplica as coerções e sanções sobre o indivíduo. Nestas sanções e regras se apresentam as expectativas de papéis e sua obrigatoriedade, possibilitando a identificação de normas específicas nos grupos de referência.

Dentro de cada papel social há um comportamento exigido, sem o qual não se pode desempenhar o papel; um comportamento permitido, onde normas fixas e rígidas não são estabelecidas e um comportamento proibido, contra o qual a sociedade atua com suas penas ou sanções. O modo como cada indivíduo se acomoda às exigências do primeiro nível de comportamento e evita o último indicará

o grau de adequação no desempenho de papéis. “A mediação entre indivíduo e a

sociedade através de papéis sociais, prende o indivíduo também ao mundo do direito e dos costumes. Ele desempenha seus papéis porque a lei e o costume o obrigam”

(DAHRENDORF, 1969; 62).

A existência e o funcionamento dos papéis sociais são condições necessárias para haver uma vida social. Configuram-se segundo as exigências da sociedade ou cultura particular em que são desempenhados. Podem ser encontrados em qualquer tipo de cultura.

Os papéis são fórmulas preexistentes de comportamento social às quais o indivíduo se ajusta. Este ajustamento pode ocorrer de duas maneiras: 1) por

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se casar assume o papel de marido ou na escolha de uma determinada profissão. São os que requerem qualidades especiais. Dependem da competição e esforço individuais.

Linton (1976), relata que numa sociedade onde predominam os papéis atribuídos há mais equilíbrio. Quando o indivíduo tem seus papéis definidos o conflito tende a diminuir.

Os papéis sociais estão sempre em constante mudança. Expectativas de papéis e sanções não são fixas o tempo todo; como a sociedade, estão sujeitos a uma mudança contínua. O comportamento e as opiniões do indivíduo são os

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TERCEIRA PARTE

PAPÉIS SOCIAIS E SUAS REPRESENTAÇÕES NA VELHICE

5. PAPEL SOCIAL DO IDOSO

“Ora, disse o Senhor a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra que te mostrarei: de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção!... partiu, pois Abrão, como lho ordenara o Senhor... Tinha Abrão setenta e cinco anos quando saiu de Harã”. (Gn 12: 1-4)

O processo de envelhecimento ocorre diferentemente para as pessoas, dependendo de seu ritmo, da época de sua vida, do ambiente, da etnia, do gênero. Numa sociedade de consumo, onde só tem valor quem produz, envelhecer tende a ser bastante penoso, difícil. “O velho sente-se um indivíduo que luta para continuar sendo um homem”. (BOSI, 2003: 79).

À medida que envelhece, o indivíduo passa por uma série de transformações biológicas, sociais, psicológicas. Seu corpo físico entra em declínio e já não possui os meios de que dispunha como, por exemplo, o vigor físico e a velocidade de raciocínio.

O indivíduo recebe influência da sociedade na qual está inserido, sendo um participante ativo neste processo ao compartilhar a ideologia, as representações, os valores de seu grupo e elaborar, assim, um sistema de crenças e atitudes em relação a si mesmo e ao ambiente que o rodeia.

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Por intermédio da identidade o indivíduo experimenta-se como pessoa, em todos os seus papéis e suas funções. Sente-se aceito e reconhecido pelo outro, por seu grupo ou por sua cultura.

Com o advento da aposentadoria, o indivíduo perde seu papel profissional e no contexto sócio-econômico-cultural declina sua existência. A partir do momento em que deixa de ser produtivo, torna-se inútil e descartável aos olhos da sociedade de consumo.

Na busca de sua reintegração social, os idosos encontram vários obstáculos a serem enfrentados tais como solidão, abandono, rejeição, marginalização, angústia

existencial proveniente do medo, desespero, sensação de fracasso, perda gradativa do poder aquisitivo, conflito de gerações, dificuldade ou falta de energia para adaptar-se.

Por intermédio de sua ocupação e de seus ganhos o ser humano define uma de suas identidades mais preponderantes. Para ele, portanto, aposentar-se é enfraquecer um lugar na sociedade muito bem consistente e definido. Muitas vezes, implica em outras perdas como a dignidade, o prestígio, o poder, a auto-estima. Para aquele que trabalhou grande parte da vida, o tempo livre pode vir a tornar-se não um momento de descanso, mas um profundo vazio existencial e no momento do descanso não sabe o que fazer com o tempo livre.

Não sabendo o que fazer sente-se inútil, diminuído aos olhos da família. Sente-se sem função e sem lugar dentro da própria casa.

Social e psicologicamente ocorre um sentimento de menos valia. Ele necessitará, então, reformular seus valores e reestruturar sua auto-imagem e sua auto-estima – seu reconhecimento enquanto Ser. O mundo com o qual se identificava já não existe mais. Surgem barreiras que ele percebe como intransponíveis e as expectativas sociais e pessoais geram sentimentos confusos, angustiantes que, muitas vezes remete-o ao isolamento social.

Seus papéis sócio-familiares se desvanecem à medida que os filhos crescem e saem de casa, seu papel de pai sofre um forte abalo. Novas identidades e relações

terão que ser construídas. Quem sabe deixar de ser o pai que impõe regras e normas para se transformar no amigo e conselheiro. Até que ponto, com que custos e concessões psíquicos tal se realizará?

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implicará numa inversão de papéis entre pai e filhos. O patriarca perde o poder de decisão e sente-se subjugado, incapacitado, desenraizado, pois não tem mais seu lugar, sua casa. A partir daí sérios problemas intergeracionais podem se instalar. Estarão os filhos preparados para assumirem o papel de cuidadores?

Uma boa hipótese de trabalho apresenta-se. Os idosos parecem ser mais reticentes que as idosas quanto ao engajamento em novos papéis sociais. Por exemplo, o retorno à universidade, a participação em grupos de convivência e lazer ou dedicação a atividades voluntárias. Por permanecerem presos aos papéis tradicionais de patriarca e provedor, parecem mais fadados ao afastamento e à

solidão na velhice do que as mulheres. Muitos se entregam ao não fazer nada, ao alcoolismo. Tornam-se rabugentos, ranzinzas, implicantes.

O homem idoso vivencia uma gradual redução da potência sexual com a diminuição hormonal da testosterona – o hipogonadismo, denominado Distúrbio Androgênico do Envelhecimento Masculino, onde se altera a capacidade erétil devido a problemas vasculares e à incompetência dos corpos cavernosos. Pode ocorrer aumento de peso com concentração de gordura principalmente na região abdominal, perda de massa muscular, perda de pelos corporais, tendência à anemia e à osteoporose. Outras alterações também são observadas tais como a diminuição do desejo sexual, cansaço físico e mental, com alterações de memória e capacidade de concentração, falta de disposição para a realização de exercícios físicos, insônia, irritabilidade, apatia e depressão.

A velhice não significa apenas perdas. Novos papéis podem surgir como, por exemplo, o papel de avô, o de turista quando existem condições financeiras para viajar, o de estudante quando decide voltar aos bancos da faculdade buscando maior conhecimento, o de voluntário em trabalhos comunitários, e outros mais que dependerão de interesses específicos de cada indivíduo. O idoso pode também voltar ao mundo do trabalho arranjando um emprego remunerado complementando sua renda, enfrentando o pensamento preconceituoso de estar tomando o lugar de alguém mais jovem.

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6. O PAPEL SOCIAL DA IDOSA

“Quero uma mulher Que saiba lavar e cozinhar E de manhã cedo

Me acorde na hora de trabalhar Só existe uma

E sem ela eu não vivo em paz Emília, Emília, Emília

Não posso mais”.

Emília (Wilson Batista e Haroldo Lobo)

Velhice é uma categoria social. Ninguém envelhece da mesma forma. Há diferenças na forma de envelhecer entre homens e mulheres. Ambos sofrem perdas com a idade, enfrentam preconceitos, discriminações e estereótipos, mas o tipo de enfrentamento que cada um utiliza é bastante diferenciado.

A feminização da velhice, entendida como o aumento do número de mulheres na população idosa, é um fenômeno mundial que ocorre tanto em países de primeiro mundo como em países pobres.

Acredita-se que as diferenças sociais e estilos de vida, juntamente com fatores de risco como o fumo, o álcool, o uso de gorduras saturadas e uma maior competição profissional, faz com que os homens morram mais cedo, enquanto as mulheres parecem estar protegidas pelos hormônios e fatores genéticos em nível de

DNA. “Em 1996, dos 12,4 milhões de idosos 54,4% eram do sexo feminino

(Camarano, 1999: 23).

As diferenças entre os sexos justificam a importância de se estudar o gênero, o qual não é exclusivo das diferenças do ponto de vista biológico. De outra forma, diz respeito às construções sociais, aos papéis sociais diferenciados atribuídos tanto à mulher quanto ao homem.

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mulheres idosas acrescente-se o fato delas serem vistas como um problema médico e social.

Mulheres idosas vistas como incapazes, inferiores, doentes, um peso para suas famílias e economicamente dependentes, confirmam a discriminação já

existente.“Até a década de 60 as mulheres eram consideradas relativamente

incapazes e necessitavam da autorização do marido até mesmo para trabalhar” (Goldani, 1999: 92).

Na velhice, as mulheres se deparam com imensas desvantagens acumuladas ao longo de uma vida de discriminação e de desigualdades como, por exemplo, o

trabalho mal ou mesmo não remunerado, os benefícios mínimos de aposentadoria, a ausência de seguro de saúde, a dupla jornada de trabalho.

Um dos papéis sociais fortemente atribuídos ainda hoje às mulheres é o de “cuidadora” dos filhos, netos, pais, cônjuges e parentes. “O cuidado para com os idosos ou para com filhos e netos poderia ser pensado como mais um tipo de trabalho desgastante, não-registrado e não-remunerado para as mulheres”, (Goldani 1999:83). Isto porque elas, em sua maioria, fazem parte de uma geração que não teve profissão definida e não trabalhava fora de casa. Muitas deixaram seu emprego remunerado ou os estudos – “lugar de mulher era em casa”, segundo o velho estereótipo de uma sociedade patriarcal.

Por outro lado, estas mulheres desenvolveram melhores condições de envolvimento na vida familiar. Estabeleceram fortes laços de amizade e uma maior produtividade doméstica, circunstâncias geralmente inacessíveis aos homens. O engajamento masculino na esfera pública e a identificação com o mundo do trabalho contribuem para afastar os homens de suas famílias, o que pode contribuir para o isolamento social após a aposentadoria e, conseqüentemente, para um envelhecimento de menor qualidade.

O que se pode ver em muitas mulheres é o fato de, após terem criado os filhos, muitas procuram recuperar o tempo não vivido fora do lar. Algumas retornam aos estudos, freqüentando cursos de artesanato, informática, academias, grupos de

convivência específicos para a terceira idade e até cursos superiores.

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revisão de conceitos a respeito de quem são os homens e as mulheres do mundo atual, o que pensam, esperam, fazem.

A superação da antiga e exclusiva condição de cuidadora do lar levou a uma redefinição do antigo papel de avó/mãe. Não se pode mais pensar nestas identidades como algo fixo, novas atribuições sociais surgiram.

Apesar disto, o fato de trabalhar fora de casa manteve antigas e tradicionais responsabilidades domésticas. Grande parte destas mulheres continua arcando com uma sobrecarga de esforço, o que caracteriza a dupla jornada de trabalho. Diferentemente dos homens, quando se aposentam, estas mulheres não param de

trabalhar, pois seus afazeres domésticos não cessam após a aposentadoria. Continuam participativas e atuantes.

NERI (2001) relata que, em vários estudos, as idosas queixam-se da continuidade destas responsabilidades domésticas após a aposentadoria, enquanto boa parte dos

homens consegue o almejado descanso. “Em virtude de normas sociais, o papel de

cuidar é especificamente feminino. Quando jovens, as mulheres devem cuidar dos filhos. Na meia-idade e na velhice cabe-lhes cuidar dos maridos quando são doentes, dos pais e sogros idosos quando fragilizados” (Idem: 181).

Cabe destacar outro papel social das idosas em ascendência – o de chefe de

família. O Censo demográfico de 1991 registrou 44% de mulheres com mais de 60

anos chefes de domicílio, frente a 66% de homens na mesma faixa etária. Elas participam do sustento dos filhos solteiros/casados desempregados ou aqueles que se separam e retornam ao lar. Para tanto, disponibilizam suas aposentadorias ou pensões e, por vezes, são obrigadas, até mesmo, a retornarem ao mercado de trabalho.

Nas classes mais baixas da sociedade, as idosas tendem a ser mão de obra ativa, quer em casa cuidando dos netos e liberando os pais para trabalhar, quer em alguma ocupação remunerada.

A menopausa é uma fase difícil para a mulher. Com a carência do estrogênio, as mulheres sofrem alterações físicas, como a atrofia de tecidos da vagina, trompas,

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Outro sério problema para as mulheres idosas é a viuvez. O maior tempo que elas permanecem viúvas se deve ao fato das diferenças de longevidade entre os sexos e também pelo costume de as mulheres se casarem com homens mais velhos. Quando o homem torna-se viúvo a tendência de ele se casar com mulheres mais novas é maior, dificultando assim, um segundo casamento para a mulher mais velha.

Segundo Veras (1999), o fato de os homens idosos terem maior possibilidade de se casarem do que as mulheres, deve-se a fatores culturais. A sociedade é mais indulgente com o fato de o idoso ter novos relacionamentos, não importando a idade da parceira. O inverso não ocorre com muita freqüência, pois o comportamento

esperado de uma viúva ainda é o de permanecer nesta condição. As idosas raramente se casam com um homem mais jovem, o que também tende a ocorrer em outras faixas etárias. O Censo Demográfico de 1991confirmou ao mostrar que havia apenas 9% de casais nos quais as mulheres eram mais velhas do que os homens.

A viuvez não é a única razão da solidão das mulheres idosas. O aumento de divórcios, separações ou mesmo o celibato tende a gerar solidão, isolamento e ansiedade. No entanto, encontra-se grande número de idosas sozinhas que assim ficaram por opção. Inúmeros casos relatados demonstram mulheres que, nesta fase de suas vidas, experimentam uma liberdade até então desconhecida, uma vez que passaram boa parte de suas vidas sob o jugo do homem, quer como filhas, quer como esposas.“A viuvez ou a separação podem trazer a possibilidade de liberdade e alegria, isto quando houve uma relação de autoritarismo e posse”. (MONTEIRO, 2002: 948)

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7. ULISSES RETORNA AO SEU CASTELO

“Quando uma classe profissional tem um problema qualquer que não encontra solução, ela pode fazer greve. E nós, os aposentados? O que a gente pode fazer? Voltar a trabalhar como forma de pressão?”

Fala de um aposentado expressando sua não-existência enquanto ator social (SANTOS, 1990: 26).

O trabalho pode representar uma realização, um campo fértil para a criatividade, estando associado à satisfação, ao reconhecimento e a valorização no grupo familiar e no contexto social. Também pode significar limitação, fadiga e alienação especialmente quando o indivíduo não sente satisfação naquilo que faz e passa apenas a cumprir uma obrigação como meio de sobrevivência.

O indivíduo recebe influência da sociedade na qual está inserido compartilhando a ideologia, as representações e os valores de seu grupo. Elabora um sistema de crenças e atitudes em relação a si mesmo e ao ambiente que o rodeia. A este processo denomina-se socialização.

Nele, o indivíduo adquire papéis sociais, os quais expressam necessidades e motivações. À medida que são assimilados e desempenhados começa a ser constituída a personalidade e a identidade.

Um dos papéis mais significativos na identidade do sujeito é o profissional, especialmente nas sociedades industriais modernas, onde o valor do indivíduo está fortemente associado à produtividade, representando poder, status e competência.

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A perda deste papel profissional, acarretando o afastamento da esfera do trabalho, ao ocorrer, pode, portanto, representar um profundo rompimento do indivíduo com seu universo significativo. É o que ocorre freqüentemente por ocasião da aposentadoria.

Segundo o pensamento de Hannah Arendt (2001) pode-se assinalar a diferença entre duas esferas de atuação na vida humana: a pública e a privada. Enquanto na vida privada o homem busca proteção e refúgio frente ao mundo é na esfera pública que se situa a possibilidade da plena realização da condição humana.

No espaço público, por intermédio do discurso, os homens podem agir em

meio à pluralidade dos outros homens para transformar o mundo. O exercício da cidadania se dá dentro deste contexto. Ser cidadão é ser um ator político na esfera pública. Em oposição a esta esfera, onde transitam os cidadãos livres, está a vida privada que, na sua origem, relaciona-se ao sentido de privação, onde o indivíduo seria destituído de coisas essenciais à vida humana 2.

"A privação da privatividade reside na ausência de outros; para estes, o homem privado não se dá a conhecer e, portanto é como se não existisse. O que quer que ele faça permanece sem importância ou conseqüência para os outros, e o que tem importância para ele é desprovido de interesse para os outros” (Idem: 68).

Para Peter Towsend (citado por SANTOS, 1990) a vida do sujeito equilibra-se sob duas fontes: o mundo familiar e o mundo do trabalho. Ao chegar a aposentadoria, duas saídas lhe são possíveis: o isolamento ou o retorno à vida familiar.

A aposentadoria implica inúmeras mudanças econômicas, culturais, psicológicas e sociais. “Sociologicamente ela representa uma ruptura com o mundo do trabalho acarretando uma modificação no sistema de relações sociais e no sistema de papéis e status” (SANTOS, 1990: 1). Representa a exclusão do mundo do trabalho e o afastamento do sistema de produção, reorganizando espacial e temporalmente a vida do sujeito e reestruturando a identidade pessoal e social.

2 Para maior aprofundamento desta questão sugerimos a leitura da obra de Hannah Arendt, A

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