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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU PROJETO A VEZ DO MESTRE

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O NOVO CRIME DE ESTUPRO

Por: Denise Pereira Maciel

Orientador

Prof. Dr. Francis Rajzman

Rio de Janeiro 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O NOVO CRIME DE ESTUPRO

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito e Processo Penal.

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AGRADECIMENTOS

...a Deus sobretudo, aos meus pais pela oportunidade, minha irmã pelas orações e ao meu esposo pela paciência.

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DEDICATÓRIA

...dedico aos meus pais, minha irmã, e ao meu esposo.

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RESUMO

Visa o presente trabalho analisar as alterações proporcionadas pela lei 12.015/2009 no que diz respeito aos delitos sexuais – anteriormente denominados crimes contra os costumes, e suas implicações, especificamente nos delitos de estupro , estupro de vulnerável, assim como suas implicações de ordem penal e processual penal.

Após sucinta análise sobre as alterações implementadas pela mencionada Lei, resta demonstrado uma evolução técnica em certos aspectos, mas retrocesso em outros ao torná-la, em alguns casos, mais branda, beneficiando agentes criminosos.

Subsiste aos estudiosos do Direito, a partir do advento da Lei 12.015/2009, a busca por soluções interpretativas que visem racionalizá-la, de maneira a tornarem-na mais razoável em sua aplicação prática, expurgando criminalizações esdrúxulas e punindo com maior rigor fatos que merecem tal apenação.

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METODOLOGIA

O método utilizado para a exploração do problema foi a leitura de livros, revistas acadêmicas da área e pesquisa de campo feita através de questionário nas áreas de abrangência das 72ª e 73ª DP e DEAM (Delegacia de Atendimento à Mulher) – SG.

Com a pesquisa e o questionário, foi alcançado relevante resultado para a conclusão deste trabalho.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Das alterações 09

CAPÍTULO II - Questões processuais 25

CAPÍTULO III – Questão intertemporal -

Lei penal benéfica? 38

CONCLUSÃO 41 ANEXOS 43 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 46 BIBLIOGRAFIA CITADA 47 ÍNDICE 48 FOLHA DE AVALIAÇÃO 50

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INTRODUÇÃO

Em vigor desde o dia 1º de janeiro de 1942, o atual Código Penal Brasileiro manteve intacto o tipo penal do crime de estupro por 67 anos.

Finalmente, no dia 10 de agosto de 2009, a Lei ordinária de número 12.015/09 veio provocar alterações substanciais nesse crime tão relevante para o sistema penal.

Enfim, parece que após tantas modificações no comportamento sexual dos brasileiros, sobretudo as ocorridas nas décadas de 60 e 70, os “Crimes contra os costumes” mereciam uma reavaliação.

Obviamente, toda legislação traz consigo os valores de sua época, e o código penal não fugiu a esta regra. Numa breve pesquisa, é possível constatar que vigorava uma sociedade altamente machista, em meio à qual a repressão do instinto sexual era em muito, superior à dos dias atuais.

Na elaboração final do Código Penal, verificava-se tal regra. Na voz da doutrina, as relações sexuais são pertinentes à vida conjugal, constituindo direito e dever recíproco dos que casaram. O marido tem direito à posse sexual da mulher, ao qual ela não se pode opor. Casando-se, dormindo sob o mesmo teto, aceitando a vida em comum, a mulher não pode se furtar ao congresso sexual, cujo fim mais nobre é o da perpetuação da espécie. O despertar do legislador para uma obrigatória modificação dos crimes sexuais só veio ocorrer muito recentemente, com a Lei 11.106/2005. Por obra de tal norma, revogou-se uma série de crimes culturalmente ultrapassados, tais como o crime de “sedução” (art. 217) e o de “rapto consensual” (art. 220).

Por fim, a nova lei 12.015/2009 insere-se nesse contexto, sendo que este estudo recairá em evidência, sobre sua inovação no crime de estupro.

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CAPÍTULO I

DAS ALTERAÇÕES

Com o advento da Lei 12.015, de 07 de agosto de 2009, de vigência iniciada em 10.08.2009, data de sua publicação no Diário Oficial da União, foi sensivelmente alterado o título VI da Parte Especial do Código Penal. A primeira alteração que salta a vista diz respeito à denominação: Tratava-se dos Crimes Contra os Costumes, revelando os aspectos culturais e históricos que permeavam a elaboração do diploma repressivo, e que ecoavam em diversas previsões do texto original que guardavam pertinência com os aspectos históricos e sócio-culturais da sociedade da década de quarenta, agora chamados de Crimes Contra a Dignidade Sexual.

Nesta mudança legislativa, já não se pretende resguardar os costumes, mas a própria dignidade sexual, a liberdade de autodeterminação do indivíduo de manter uma vida sexual conforme seus desígnios e livre de qualquer coação como forma de realização humana e consecução efetiva de um aspecto da própria dignidade humana. Seria impensável tal raciocínio na sociedade brasileira de 1940.

A antiga redação do artigo 213 considerava de forma taxativa a mulher como o único sujeito passivo do crime de estupro. Como a figura típica exigia conjunção carnal, (cópula vagínica), o sujeito ativo necessariamente deveria ser homem, tutelando-se a liberdade sexual da mulher. Com a inovação legislativa, ainda que a conduta de “constranger alguém’’ a praticar ou permitir que com a mulher se pratique ato libidinoso diverso de conjunção carnal continue incriminada, é certo que tal conduta, ganhou nova denominação, uma vez que unida à conduta de constranger a mulher à conjunção carnal, a partir da inovação legal, tanto homem quanto mulher podem ser autores ou vítimas de estupro.

Assim sendo, a distinção entre conjunção carnal e ato libidinoso, a impossibilidade do homem ser vítima de estupro, bem como a discussão

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acerca da possibilidade da mulher ser autora do crime de estupro perde sua importância a título exemplificativo gerando efeitos imediatos no que diz respeito à punibilidade das condutas.

No que se refere ao crime de atentado violento ao pudor, protegia-se a liberdade sexual tanto do homem quanto da mulher. Ambos poderiam ser sujeitos ativos ou passivos, pois o tipo consistia em “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal”.

Considerando tal inovação, o artigo 214 do CP foi expressamente revogado, passando a sua descrição típica a integrar o delito de estupro. Os casos que anteriormente seriam considerados atentado violento ao pudor são, hoje, tratados como estupro. A nova figura típica do estupro agora descreve a conduta de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Preservada a cominação legal anterior de 6 (seis) a 10 (dez) anos de reclusão.

As hipóteses de estupro qualificado, antes previstas no artigo 223, caput e parágrafo único, também revogadas pela nova legislação, agora foram inseridas em parágrafos, nos próprios artigos em que se aplicam, adotando-se uma redação mais técnica. Vejamos:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

§1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§2º Se da conduta resulta morte: Pena – reclusão , de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Cada um dos novos dispositivos merece uma análise específica, ainda que sucinta, a fim de que se possa compreender o que realmente muda, tanto na prática como na teoria.

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1.1. Revogação do artigo 214 do Código Penal. Abolitio

criminis

ou não?

O artigo 214 do Código Penal, que previa o crime de atentado violento ao pudor foi expressamente revogado pelo artigo 7º da Lei n. 12.015/09.

Quando ocorre esse tipo de revogação de norma penal incriminadora, normalmente opera-se a abolitio criminis, causa extintiva da punibilidade prevista no artigo 107, III, do Código Penal.

Entretanto, no caso do atentado violento ao pudor, não se operou o

abolitio criminis, tendo em vista que a conduta de constranger pessoa à prática

de atos libidinosos diversos da conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça não foi abolida do Direito Penal, haja vista que tal fato continua sendo punido com a denominação de estupro, e no caso de vítima menor de 14 anos ou doente mental, de estupro de vulnerável.

Portando, para aqueles que antes da vigência da Lei n. 12.015/09 praticaram o crime tipificado no artigo 214 do Código Penal continuarão respondendo pela conduta delituosa, agora com nova denominação, mas aplicando-se a pena de 06 a 10 anos.

Assim sendo, no crime de atentado violento ao pudor, ocorre também o crime de estupro comum quando o agente (homem ou mulher) pratica contra o ofendido "outro ato libidinoso", que não seja a cópula vaginal. Em seu sentido semântico, libidinoso é o ato que se relaciona com o prazer sexual, tendo o significado de lascivo, dissoluto ou devasso.

Em seu sentido normativo ou jurídicopenal, o ato libidinoso previsto no referido dispositivo legal é todo aquele que se apresenta como manifestamente obsceno ou ofensivo ao sentimento de pudor comum verificado na vida social, numa determinada época.

Nesse elenco de outros atos libidinosos diversos da conjunção carnal, que podem configurar o crime de estupro em seu conceito legal ampliado (antes, seria o caso do atentado violento ao pudor), encontram-se aqueles que

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se enquadram no espaço de normalidade estabelecido pela pudicícia média, mas que, praticados contra a liberdade sexual de alguém, podem configurar esta infração contra os costumes. Como assinalou com propriedade Magalhães Noronha, "os atos libidinosos obedecem a uma escala de diferentes graus de luxúria e devassidão. É a hierarquia da volúpia, indo desde os meros toques e tateios até os coitos anormais". Para o autor, estes últimos deveriam constituir um tipo penal autônomo mais grave. 1

1.2 . Fim do concurso material entre estupro e atentado

violento ao pudor. Único crime, estupro. Liberdade ou falha do

legislador?

Questão importante refere-se ao entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante, que sustentava ser possível o concurso material (artigo 69 do CP) entre os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor (HC 75451 / SP- São Paulo – Habeas Corpus – Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA).

Uma corrente admitia , por entender que ambos os delitos tutelavam o mesmo bem jurídico, outra corrente majoritária, mais restrita, entendia que por não estarem no mesmo tipo penal, não seriam da mesma espécie, o que impossibilitava a continuidade, e ocasionava o concurso material de crimes.

Com a reforma, suprime-se essa possibilidade, já que agora as duas condutas constituem apenas um tipo penal, e dessa forma, quem praticar, em um mesmo contexto fático, conjunção carnal e outros atos libidinosos contra a mesma vítima, responderá por um único delito: o estupro, uma vez que, trata-se de crime de conteúdo variado ou de ação múltipla, são crimes em que o tipo fazreferência a várias modalidades de ação. Neste aspecto, o novo art. 213 do CP é mais benéfico, podendo ensejar a revisão de diversas penas.

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Este aspecto já vem levantando protestos no meio jurídico, ante a menor penalização do agente criminoso, que antes poderia responder por dois crimes e atualmente responderá somente por um (estupro). Essa posição deve ser entendida como a melhor?

Certamente, a unificação dos delitos de estupro e atentado violento ao pudor em apenas um tipo legal de crime gerará, inevitavelmente, benefícios aos réus. Realmente, a fusão dos dois tipos penais que previam o estupro e o atentado violento ao pudor foi benéfica ao agente, pois a nova lei criou o chamado tipo misto alternativo, onde a prática de mais de um comportamento por ele previsto importará em crime único, desde que praticado numa mesma relação de contexto. Assim, por exemplo, se o agente, com a finalidade de levar a efeito a conjunção carnal, vier, também, a praticar atos de felação, deverá responder por um único crime de estupro, de acordo com a nova redação legal.

Se por um lado, o novo tipo penal de estupro gerou um benefício aos réus, por outro lado, a situação anterior seguindo a corrente predominante que considerava haver concurso material, poderia gerar algumas injustiças, conforme explica-se: Imaginemos duas situações distintas. Primeira situação: duas pessoas agindo em concurso, mediante grave ameça, praticaram coito anal com a vítima, sendo que um apontava a arma e outro realizava o ato, depois, inverteram as posições. Segunda situação: Tício e Mévio em concurso praticaram conjunção carnal, sendo que Tício apontou a arma enquanto Mévio praticou o ato. Depois, Mévio segurou a arma e, Tício apenas apalpou os seios da vítima por alguns segundos. Assim, no primeiro caso, seria reconhecida a continuidade delitiva (crimes da mesma espécie), enquanto no segundo caso, haveria concurso material (estupro e atentado violento ao pudor) e consequentemente a pena seria mais elevada, em que pese a nítida maior gravidade da primeira hipótese.

Considerando a Lei 12015/09 nas hipóteses acima, poderá haver dúvida se ocorrerá crime único ou continuidade delitiva. Para Rogério Greco 2 haverá continuidade delitiva, uma vez que, aquele que não realizou o ato

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libidinoso seria partícipe, e o que praticou autor. A cada rodízio de posição ter-se-ia um novo delito.

Tais exemplos ilustram que o não reconhecimento da continuidade delitiva dos crimes de estupro e atentado violento pudor, geravam penas elevadas nem sempre condizentes com a gravidade dos atos, quando comparadas com outras situações em que a continuidade delitiva era reconhecida. A nova tipificação entretanto, não apenas eliminou a possibilidade de concurso material, como a própria continuidade delitiva, quando se tratar de um único agente que realiza múltiplas condutas com a mesma vítima, por se tratar agora de crime único.

No entanto, há que se defender que, um tempo considerável de duração do estupro e/ou o excessivo grau de sofrimento da vítima, deva ser considerado pelo juiz na dosimetria da pena (para elevar a pena-base), na análise das consequências do crime que é uma das circunstâncias judiciais. O sofrimento da vítima porém, não está relacionado apenas a gravidade do ato em si, mas também as condições psicológicas da mesma.

Verifica-se, sobre esse aspecto, que a Lei 12.015/2009 é mais benéfica e, de acordo com o artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, deve retroagir para alcançar fatos ocorridos antes de sua vigência, inclusive as decisões já transitadas em julgado, que deverão ser revistas em sede de Execução Penal.

Dessa forma, aqueles que foram condenados ou estejam sendo processados pelos dois crimes praticados (estupro e atentado violento ao pudor), no mesmo contexto e contra a mesma vítima, devem ser responsabilizados unicamente pelo crime de estupro.

1.3 - Da violação sexual mediante fraude

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O artigo 215 também foi alterado de forma relevante. O crime antes denominado “Posse sexual mediante fraude” consistia em “ter conjunção carnal com mulher honesta mediante fraude”, o que apresentava-se em descompasso com a evolução social. Com a vigência da nova lei, que também excluiu a elementar “honesta” do tipo penal, adotou-se a expressão “violação sexual mediante fraude”, resultado da unificação dos crimes de posse sexual mediante fraude com o atentado violento ao pudor mediante fraude, o que se demonstrou mais de acordo com a realidade atual, além de atender à isonomia constitucional, pois agora tanto a mulher quanto o homem podem ser vítimas do delito em análise, haja vista a nova redação, que dispõe o seguinte:

“Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa”.

Além de alterar o preceito primário da norma, o legislador resolveu aumentar a pena prevista no preceito secundário, ao fixar a pena de reclusão de dois a seis anos.

Outra inovação neste artigo consiste na cominação de pena de multa, quando o crime é praticado com finalidade de obter vantagem econômica. Não podemos deixar de citar a antiga redação do parágrafo único que previa uma qualificadora se o crime fosse praticado contra mulher virgem menor de 18 e maior de 14 anos, tendo sido revogado pela nova redação em boa hora. De fato, não fazia sentido que no século XXI, a lei atribuísse tamanha importância e proteção jurídica a virgindade da mulher, em descompasso com a realidade social. A nova redação, aborda somente a multa no caso de haver finalidade lucrativa do agente.

1.3.1. Tipicidade objetiva e subjetiva

A conduta típica pode ser realizada pela conjunção carnal ou pela prática de outro ato libidinoso. Em quaisquer dos casos, o crime é cometido

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mediante fraude ou outro meio que dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. Fraude é o ardil, o engodo que induz a vítima em erro. A sua manifestação portanto, é viciada, porque a vítima (homem ou mulher) consente na conjunção carnal ou na pratica de outro ato libidinoso, enganada.

A pretensão desse artigo, não previu a submissão à pratica de ato libidinoso. A conduta prevista é de que o sujeito ativo tenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso, ou seja, noutras palavras, a vítima deverá permitir a prática de um ato libidinoso nela, sendo atípico se ela em função da fraude se submeter ao ato, praticando nela mesma, como a automastubarção.

Em que hipóteses a vítima poderia ser enganada pelo agente, sofrendo o estelionato sexual ? O item 70 da exposição de motivos da parte especial do Código Penal, suscita dois exemplos: a simulação de casamento e o agente substituir-se ao marido na escuridão da alcova. Tais exemplos já demonstram a raridade deste crime. Em pleno terceiro milênio quem seria tão ingênuo a ceder aos desejos sexuais de alguém, por ter sido ludibriado? De fato, nos parece que não obstante raras as hipóteses, elas são possíveis. Exemplo interessante dado por Rogério Greco 3 é de cafajestes espirituais que aproveitando-se da fé dos seus seguidores sugere a pratica de ato libidinoso para solucionar problemas.

1.3.2. Bem jurídico tutelado e sujeito ativo e passivo

A norma protege como bem jurídico a liberdade sexual. Está exemplificado no crime de estupro que o sujeito ativo e passivo pode ser homem ou mulher, já que se refere a alguém. Obviamente, que em relação a primeira parte do artigo (conjunção carnal), só o homem poderá ser sujeito ativo e mulher o passivo.

1.4 - Do estupro de vulnerável

3

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Para que melhor se entenda esta modificação trazida pelo advento da Lei 12.015/2009 talvez seja necessária a análise primeiramente com a redação dada pela nova Lei ao tipo Estupro de vulnerável:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§2o (VETADO)

§3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§4o Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Depois, a análise quando dos dispositivos ainda não alterados para o crime de Estupro:

Art. 213 - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:

Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. Atentado violento ao pudor

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Art. 214 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

Presunção de violência

Art. 224 - Presume-se a violência, se a vítima: a) não é maior de catorze anos;

b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância; c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

A nova lei criou o crime de estupro de vulnerável, que inserido no capítulo II do título VI, agora sob "nomen juris" dos crimes sexuais contra vulnerável, se caracteriza pela prática de qualquer ato libidinoso com menor de 14 anos (217-A, “caput”), ou com pessoa (de qualquer idade) que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento, ou não pode oferecer resistência (§1º), estabelecendo pena de reclusão de 8 a 15 anos. A vulnerabilidade decorre da idade da vítima – menor de 14 anos. O legislador considera que a pessoa nesse estágio de desenvolvimento, ainda não tem maturidade sexual.

A grande peculiaridade aqui, refere-se á ausência da elementar violência ou grave ameaça do tipo penal. O legislador compreendeu que a vontade do menor de 14 anos não é válida. De fato, antes do advento desta lei, se exigia a elementar embora se presumisse a sua existência (art. 224, "a", do CP).

Acontece que, não obstante as ultimas posições do STF tenham sido de que essa presunção era absoluta (HC 75.608, HC 81268, etc.), restava divergência jurisprudencial, em alguns julgados considerando relativa a presunção, e, na doutrina também predominava a relatividade da presunção. Agora, a discussão deixa de existir, porque o legislador não mais exige a elementar "grave ameaça ou violência", no caso do sujeito passivo ser menor de 14 anos, tendo então revogado todo o art. 224 do CP, e criado o novo tipo com "nomen juris" - estupro de vulnerável.

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Como já comentado, este tipo penal é conseqüência da revogação do artigo 224 do Código Penal, que previa as hipóteses de presunção de violência, agora transformadas em elementos constitutivos do crime de estupro de vulnerável, ou seja, em todas as hipóteses onde tínhamos configurado estupro por presunção de violência, agora temos o estupro de vulnerável.

Em que pese, o entendimento de que com a supressão da elementar violência ou grave ameaça do tipo penal de estupro com menores de 14 anos, não se possa mais discutir acerca da relatividade da presunção da violência, não podemos deixar de fazer algumas observações críticas a essa alteração legislativa, que acabou por retirar do magistrado a possibilidade de afastar a violência quando a vítima embora menor de 14 anos, demonstrasse esclarecimento suficiente sobre o sexo e suas consequências já que com o artigo 217-A surge a indagação se essa vulnerabilidade é absoluta, não se admitindo prova em contrário, ou relativa, podendo ser descaracterizada, ante a comprovação da experiência sexual do menor, por exemplo. E, ainda, saber se quando houver relação sexual “consentida” com menor de 14 anos ou com pessoa com deficiência mental será ou não estupro.

Já que tais hipóteses não são mais tratadas como presunção de violência, e sim como elementos do tipo, sempre que o agente manter conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso com menor de 14 anos ou com pessoa com deficiência mental será estupro.

Em se tratando de menor de 14 (catorze) anos, a presunção será sempre absoluta, pois que não existe dado mais objetivo do que a idade, não podendo o intérprete inovar o que está expressamente determinado pelo artigo, criando um dado por ele não exigido. Já, considerando as situações previstas pelo §1º do citado artigo 217-A, somente a análise do caso concreto é que permitirá afirmar se estamos diante de alguém que pode ser considerado vulnerável mesmo que, por exemplo, portador de uma enfermidade ou deficiência mental, uma vez que somente se encontrarão nessa condição aqueles que não tiverem o necessário discernimento para a prática do ato. O mesmo raciocínio pode ser realizado no que diz respeito à vítima que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, tendo em vista que

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somente após a avaliação dos fatos concretos é que se poderá chegar a essa conclusão.

Aliás já houve oportunidade de defender, que a presunção de violência do estupro deveria ser presumida. Ora, as meninas de 13 anos de hoje, não podem ser equiparadas aquelas da década de 1930 que inspirou o legislador do código Penal de 1940. Não há como equiparar uma jovem de 12 ou 13 anos com uma alienada mental, esta é totalmente incapaz de entender o sexo e as suas consequências, aquela via de regra, já tem uma noção exata sobre este tema, que hoje faz parte do currículo escolar, das notícias dos meios de comunicação e da própria orientação dos pais.

Vejamos o seguinte exemplo que demonstra a possibilidade de grande injustiça de se punir alguém simplesmente porque praticou algum ato libidinoso com menor de 14 anos: Um jovem de 17 anos começou a namorar uma menina de 13 anos. Na comemoração de um ano de namoro, véspera da adolescente completar 14 anos, os dois resolvem manter conjunção carnal, nesse momento, o jovem, contaria com 18 anos. Ao tomar conhecimento desse fato, o Ministério Público agora, teria o dever de propor a ação penal pública imputando a esse jovem o delito de estupro de vulnerável.

Diante do juiz, a vítima, diz que foi idéia dela o ato sexual, ressaltando ainda, a relutância do namorado. Pela legislação anterior, haveria a possibilidade da absolvição do réu sob alegação de que a presunção de violência é relativa, e que no caso, inexistiria. Agora, como o tipo penal sequer fala em violência, se presentes as elementares do tipo, o juiz teria que condenar o acusado a uma pena de oito anos, que inicialmente seria cumprida em regime fechado por ser crime hediondo. Essa seria uma solução justa que atende os anseios da sociedade? Seria justo levar esse jovem a um cárcere prisional superlotado e já considerado falido na sua função socializadora? Obviamente que não. O legislador certamente pensou no caso de muitos homens mais velhos que procuram jovens para satisfazerem sua lascívia não atentando ao fato de que a norma é para todos, daí a necessidade do juiz analisar no caso concreto, se a vítima tinha ou não condições de consentir no

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ato sexual. A opção do legislador, em certos casos concretos, pode gerar injustiças.

No Código Penal de 1890, a violência era presumida quando a vítima era menor de dezesseis anos, tendo o Código de 1940 reduzido essa idade para 14 anos. A medida que o tempo foi avançando, a sociedade passou a ser mais liberal e mais informada sobre a sexualidade, por isso, justificou-se a redução da idade de presunção de violência. Passados mais 69 anos, ao invés de se manter a relatividade da presunção de violência, ou torná-la absoluta, reduzindo a idade para 12 anos em adequação ao ECA, que é uma legislação mais recente, resolveu a a nova lei, sob o pretexto de proteger adolescentes, manter a idade de 14 anos, porém, retirando o termo presunção da legislação, no intuito de evitar a discussão se esta seria relativa ou absoluta.

O legislador deveria, ou ter deixando claro que a presunção de violência seria relativa, ou se preferisse torná-la absoluta, deveria reduzir essa idade para menor de doze anos. Desta forma, o ato libidinoso com criança (de acordo com a definição do ECA), seria crime. No entanto, com adolescente, só constituiria fato típico se houvesse o constrangimento ilegal mediante violência ou grave ameaça, ou na hipótese de vulnerabilidade por tratar-se de pessoa explorada sexualmente (art. 218, B, §2º, I, do CP) igualando-se ao pensamento de Nucci 4.

Porém em um aspecto ocorre divergência sobre o posicionamento desse autor quanto a questão da vulnerabilidade do menor de 14 anos vez que com a criação do novo tipo penal do art. 217-A sem a elementar referente ao constrangimento mediante violência ou grave ameaça, não haverá sob o aspecto hermenêutico da norma, como defender que essa presunção poderá ser relativa. Neste caso, o juiz poderá deixar de aplicar a norma do art. 217-A se buscar algum fundamento constitucional no caso concreto, como a violação a proporcionalidade, ou como explica Zaffaroni 5 "princípio da proporcionalidade mínima da pena com a magnitude da lesão".

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NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. São Paulo, RT, 2009. p. 38.

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A opção legislativa de tentar encerrar a discussão acerca da presunção de violência ser absoluta ou relativa, é esclarecida no projeto de reforma do Código Penal, destacando a vulnerabilidade de certas pessoas, não somente crianças e adolescentes com idade até 14 anos, mas também a pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não possui discernimento para prática do ato sexual, e aquela que não pode, por qualquer motivo, oferecer resistência; e com essas pessoas considera como crime ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso; sem entrar no mérito da violência e sua presunção. Trata-se de objetividade fática.

1.4.1. Tipicidade objetiva e subjetiva

A tipicidade objetiva é assemelha-se a do estupro de pessoas não vulneráveis, porém, com algumas diferenças. Uma delas é quer, não integra o tipo, o constrangimento mediante violência ou grave ameaça, porque o legislador já presumindo de forma absoluta que a situação de vulnerabilidade impede que o sujeito passivo possa livremente manifestar sua vontade sexual, não fez constar essas elementares. De sorte que, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com a pessoa vulnerável, para que haja a adequação objetiva ao tipo penal. Há uma sutil diferença. É que no estupro (art. 213), a conduta da vítima pode ser ativa (praticando o ato libidinoso) ou passiva (permitindo que com ela seja praticado). A conduta ativa, inclusive, pode ser realizada no agente, num terceiro, ou nela própria (p. ex., masturbando-se). Já no estupro de vulnerável, o legislador descreveu apenas uma conduta ativa do agente (ter ou praticar). E, se por exemplo, o menor de 14 anos masturbar-se na frente do agente, haverá estupro de vulnerável ? A resposta é negativa, pois, não haverá qualquer conduta positiva do agente. Se, no entanto, o menor agiu dessa forma, porque foi constrangido, deverá o agente responder pelo estupro na sua forma simples.

Portanto, no estupro de vulnerável o agente só responderá se realizou um conduta positiva, como se percebe pelos verbos "ter e praticar". No entanto, se

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o agente tinha o dever legal de agir, ele pode responder pela sua omissão (crime omissivo impróprio), na condição de garantidor .

Ressalte-se ainda que, o dolo deve abranger a situação de vulnerabilidade. Assim, se o agente é levado a crer que a vítima não é menor de 14 anos, nem se encontra em uma das situações de vulnerabilidade descritas no §1º do art. 217-A, poderá ocasionar a atipicidade absoluta ou relativa, em função do erro de tipo que exclui o dolo. Noutras palavras, neste caso, o agente não responderá pelo crime de estupro de vulnerável, podendo o fato ser atípico (atipicidade absoluta), ou configurar o crime do art. 213 (atipicidade relativa), se o agente constrangeu a vítima mediante violência ou grave ameaça.

1.4.2. Bem jurídico tutelado e sujeito ativo e passivo

O bem jurídico protegido neste artigo pela nova lei também é a liberdade sexual da pessoa vulnerável.

O sujeito ativo do crime de estupro de vulnerável pode ser qualquer pessoa – homem ou mulher, porém é impossível que o mesmo seja menor de 14 anos, ou seja, se dois menores de 14 anos têm conjunção carnal ou praticam ato libidinoso diverso, não realizam a figura do tipo, não podendo responder por ato infracional, por ocorrer a figura da confusão no direito penal.

Para que o sujeito ativo responda pelo crime em comento, é necessário que a idade da vítima integre o dolo do agente, conforme já mencionamos. Admitindo-se erro de tipo, que exclui o dolo, se o agente foi levado a acreditar que a vítima não era menor de 14 anos.

O sujeito passivo do delito de estupro de vulnerável, pode ser homem ou mulher, porém, no caso do caput do artigo, necessariamente terá que ser menor de 14 anos. No caso do §1º desse artigo, no entanto, o sujeito passivo será alguém portador de uma enfermidade ou deficiência mental, que impossibilite ter o discernimento necessário, ou então, que por qualquer outra razão não possa oferecer resistência.

(24)

A redação foi aperfeiçoada em relação a que era adotada no revogado art. 224, "b", do CP, por duas razões. Em primeiro lugar, por substituir os termos alienação e debilidade mental, por enfermidade ou deficiência mental, o que é mais apropriado e se harmoniza com os termos adotados pelo Código Civil para o absolutamente incapaz (art. 3º, II). Em segundo lugar, por deixar expresso que além dessa situação, é necessário que lhe falte o discernimento para entender o ato a ser praticado em consonância também com o art. 26 do CP. Certamente, embora a redação anterior não deixasse isso claro, já era assim entendido pela doutrina e jurisprudência, mas ainda havia alguma divergência. Agora, dissipando qualquer dúvida ficou expresso, a exigência de dois critérios, um biológico, consistente na constatação da enfermidade ou deficiência mental, a ser aferido por perícia, e outro psicológico, referente a impossibilidade de compreensão do ato, a ser examinado pelos peritos e/ou juiz.

Portanto, a enfermidade ou deficiência mental deve ter grau bastante elevado, ao ponto da pessoa não ter a capacidade de compreender o que faz, para que seja inócuo o seu consentimento, responsabilizando-se o agente que praticou o ato libidinoso com o vulnerável. Se, no entanto, não obstante a enfermidade ou deficiência mental, ele tiver discernimento sexual, ele poderá ter uma vida normal, inclusive, constituindo família.

Ressalte-se que, no caso do sujeito passivo ser portador de enfermidade ou doença mental, para que o agente incorra no crime de estupro de vulnerável é imprescindível a existência do dolo quanto a essa circunstância, ou seja, que o mesmo tenha pleno conhecimento do estado de enfermidade ou de doença mental da vítima. Exige ainda, a jurisprudência, conforme já salientado, que a deficiência mental seja aferida por exame pericial.

O artigo em comento também possui a forma qualificada, quando resultar lesão corporal de natureza grave ou morte da vítima (§§ 3º e 4º do artigo 217-A, CP).

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CAPÍTULO II

QUESTÕES PROCESSUAIS

Antes do advento da Lei 12.015/09, os então chamados crimes contra os costumes estavam submetidos, em regra, à ação penal privada (artigo 225, caput, do Código Penal). Apenas excepcionalmente é que tais crimes seriam de ação penal pública, ora incondicionada (se o crime fosse cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador, nos termos do artigo 225, § 1º, inciso II, do Código Penal; ou se da violência resultasse lesão corporal grave ou morte, com base no artigo 223 do Código Penal), ora condicionada à representação do ofendido (se a vítima ou seus pais não pudessem prover às despesas do processo, sem privar-se de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família, consoante o artigo 225, § 1º, inciso I, e § 2º, do Código Penal).

Neste capítulo desmembrar-se-á algumas questões acerca das alterações trazidas pela Lei12.015/2009 à esfera processual.

1.1 - Da ação penal

Destarte, de um modo geral, a doutrina não concordava com a regra aqui exposta. Com efeito, alegava-se que não era lógico permitir que a decisão sobre o início da persecução penal ficasse exclusivamente nas mãos do particular considerando que alguns crimes contra os costumes eram de extrema gravidade, notadamente os crimes de estupro (artigo 213) e atentado violento ao pudor (artigo 214), com pena máxima abstratamente cominada de 10 (dez) anos de reclusão. Em situações como essas, era nítido o interesse público na devida punição dos agentes delitivos, o que deveria autorizar o Estado, por meio do Ministério Público, a deflagrar a ação penal. Nesse

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contexto, é conveniente relembrar que esses crimes eram considerados crimes hediondos (artigo 1º, incisos V e VI, da lei 8.072/90), tanto na sua forma simples como na sua forma qualificada, conforme posicionamento do STF (HC 81.288/SC). Aliás, o próprio STF, no julgamento do HC 81.360/RJ, chegou a afirmar que o estupro, por suas características de aberração e de desrespeito à dignidade humana, seria um problema de saúde pública.

Ademais, a regra da ação penal privada para os crimes contra os costumes poderia levar a absurdos absolutamente indesejáveis, a exemplo de um estupro ou mesmo de um atentado violento ao pudor praticado contra vítima que viesse a falecer no curso da ação penal não deixando sucessores (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão – art. 31 CPP), ensejando a perempção desta ação (artigo 60, inciso II, do CPP), a extinção da punibilidade do querelado (artigo 107, inciso, IV, do Código Penal) e, via de consequência, a impunidade de um fato gravíssimo. Ficaria a autoridade policial e o parquet de mãos atadas, nada podendo fazer contra o autor do crime, ante o não preenchimento da condição de procedibilidade?

Algumas vozes estão tentando solucionar o problema levantado, aplicando-se o disposto no artigo 101 do Código Penal (regra do crime complexo), sustentando que no caso de estupro com lesão corporal grave ou morte a ação de tal crime passaria a ser pública incondicionada. Entretanto grande parte da doutrina entende que o crime de estupro não é crime complexo, ficando inviabilizada a aplicação de tal argumento. Considerando tal divergência, há de se analisar mais algumas alterações trazidas pela nova lei.

É certo que o STF, na tentativa de consertar essa distorção, editou a Súmula nº 608, segundo a qual no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.

Não obstante, o problema ainda persistia, pois, se o crime de estupro fosse praticado com violência presumida e contra vítima que viesse a falecer no curso da ação penal privada sem deixar sucessores, o agente do delito seria igualmente beneficiado pela extinção da sua punibilidade, ficando o fato mais uma vez impune.

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O legislador não aproveitou a oportunidade de encerrar com essa aberração com o advento da lei 11.106/2005 que provocou algumas alterações nos crimes contra os costumes – entre elas a revogação do crime de adultério . Após 4 (quatro) anos, felizmente, surgiu a lei 12.015/09 atendendo a todos esses reclamos da doutrina e consagrando, no artigo 225, caput, do Código Penal, como regra geral, a ação penal pública condicionada à representação do ofendido para os crimes contra a dignidade sexual atentando ao verdadeiro bem jurídico tutelado, a dignidade sexual, vertente da dignidade humana insculpida no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Nesse ponto, acertando o legislador.

Desse modo, a partir de agora, a vontade da vítima continua sendo respeitada, mas ela não precisa se expor ainda mais, tomando à frente do pólo ativo da demanda, já que a ação penal será oferecida pelo Ministério Público.

Ademais, a persecução penal estará mais fortalecida, já que o Ministério Público possui prerrogativas públicas que não estão disponíveis para o particular.

Excepcionando a regra do caput do artigo 225 do Código Penal, o parágrafo único deste dispositivo legal dispõe ser a ação penal pública incondicionada se a vítima for menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.

Apesar do ponto positivo mencionado, não há que se olvidar que a novel legislação desperta algumas questões nebulosas, que merecem ser a seguir respondidas.

1.1.1. Os crimes praticados contra vulnerável são de ação penal pública incondicionada ou condicionada à representação do ofendido?

Quanto à ação penal dos crimes praticados contra vulnerável, a lei 12.015/09 apresenta uma contradição. O caput do artigo 225 do Código Penal atualmente apregoa que os crimes definidos nos capítulos I e II do Título VI são de ação penal pública condicionada à representação. Como visto no item anterior, os crimes praticados contra vulnerável estão previstos justamente no

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capítulo II. Portanto, a princípio, eles também seriam de ação penal pública condicionada à representação do ofendido. De outro lado, porém, o parágrafo único do artigo 225, com sua nova redação, determina que os crimes praticados contra vulnerável são de ação penal pública incondicionada. Nesse aparente conflito, qual regra deve prevalecer?

Em uma interpretação sistemática à intenção do legislador de punir com maior rigor obviamente as condutas mais graves, entende-se que apenas os crimes previstos no capítulo I do Título VI (crimes contra a liberdade sexual) é que serão de ação penal pública condicionada à representação do ofendido.

Para os crimes tipificados no capítulo II (crimes contra vulnerável), a ação penal deverá ser pública incondicionada. Conforme o entendimento corroborado por Paulo Rangel 6 : “... o que se quis dizer (aqui o terreno é movediço: adivinhar o que o legislador quis dizer) no caput do art. 225, é que nos crimes definidos no capítulo I (apenas o capítulo I) a ação penal será pública condicionada à representação, e no parágrafo único do mesmo artigo, será pública incondicionada quando a vítima for pessoa menor de 18 anos ou pessoa vulnerável.”

1.1.2. E quanto a Súmula nº 608 do STF? Ela continuaria válida?

A doutrina vem se inclinando pela eliminação da Súmula nº 608 do STF. Isso porque, como já dito anteriormente, a intenção do STF ao editar essa súmula foi consertar distorções que ocorriam por ser o crime de estupro, em regra, de ação penal privada (política criminal). Contudo, a partir do momento em que a nova lei traz regra expressa determinando que o delito de estupro será sempre de ação penal pública (ora condicionada à representação do ofendido, ora incondicionada), a Súmula perdeu a sua razão de existir. Em

6

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consonância com esse entendimento estão os autores Paulo Rangel 7 e Guilherme de Souza Nucci 8 , o qual externa o seguinte:

[...] Elimina-se a Súmula 608 do STF, vale dizer, em caso de estupro de pessoa adulta, ainda que cometido com violência, a ação é pública condicionada à representação. Lembremos ser tal Súmula fruto de Política Criminal, com o objetivo de proteger a mulher estuprada, com receio de alertar os órgãos de segurança, em especial, para não sofrer preconceito e ser vítima de gracejos inadequados. Chegou-se, inclusive, a criar a Delegacia da Mulher, para receber tais tipos de ocorrência. Não há razão técnica para a subsistência do preceito sumular, em particular pelo advento da reforma trazida pela Lei 12.015/2009. Unificaram-se o estupro e o atentado violento ao pudor e conferiu-se legitimidade ao Ministério Público para a ação penal, desde que a vítima concorde em representar. Mais que justo no cenário presente.

1.1.3. E relacionado aos crimes praticados antes da vigência da lei 12.015/09? A aplicação procede?

Quanto à aplicação de uma lei processual penal no tempo, há de ser considerado, o princípio da imediatidade (tempus regist actum) estampado no artigo 2º do CPP, segundo o qual “A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.”

Esse princípio, porém, somente é aplicável para as leis processuais penais puras já que existem leis que são apenas formalmente processuais penais, mas que materialmente são penais, pois possuem conteúdo relacionado ao Direito Penal. A essas leis dá-se o nome de leis processuais

7

RANGEL,Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed.,Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.p.304-306

8

NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à lei 12.015, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: RT, 2009.p.62-63.

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penais mistas ou híbridas, devendo incidir outro princípio, o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica ou favorável (consagrado no artigo 5º, XL, da Constituição Federal, e no artigo 2º do Código Penal), nos termos do artigo 2º da Lei de Introdução ao Código de Processo Penal ("À prisão preventiva e à fiança aplicar-se-ão os dispositivos que forem mais favoráveis" – conforme melhor interpretação doutrinária, este dispositivo se estende a qualquer situação que envolva as já citadas leis processuais penais mistas ou híbridas).

Nesse entendimento, não há dúvidas de que a lei 12.015/09, no que tange à ação penal dos crimes contra a dignidade sexual, tem natureza híbrida ou mista. De um lado, quando trata da ação penal, ela apresenta um caráter formalmente processual penal. No entanto, ao determinar que a ação penal nesses crimes deixa de ser privada para se tornar sempre pública (condicionada à representação do ofendido ou incondicionada), é claro que tal lei atinge diretamente institutos tipicamente de direito material, a saber, a decadência, a renúncia, o perdão e a perempção, todos causas de extinção da punibilidade do agente delitivo (artigo 107, incisos IV e V, do Código Penal), relacionados, portanto, ao direito de liberdade deste último.

Em sendo lei processual penal mista ou híbrida, será que a lei 12.015/09 sempre retroagiria para os fatos ocorridos antes da sua vigência? Para responder a esta indagação, é preciso considerar algumas situações possíveis, abaixo listadas.

Se o crime, antes do advento da lei, estava submetido a ação penal privada será sempre favorável ao indivíduo que cometeu o crime, pois esta ação permite a aplicação dos institutos da decadência, renúncia, perdão e perempção, promovendo a extinção da punibilidade do mesmo. Não há esse resultado na ação penal pública incondicionada, e na ação penal pública condicionada à representação do ofendido, só é possível se operar a decadência. Portanto, no caso em questão, há um claro prejuízo para o agente do delito, independente se a ação penal, no caso concreto, passou a ser pública condicionada à representação do ofendido ou incondicionada, motivo

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pelo qual a lei 12.015/09 não deve retroagir, persistindo o crime como de ação penal privada sem qualquer alteração.

Por esse motivo, se o fato ainda está sendo investigado em sede de inquérito policial, a vítima do delito deve estar atenta ao prazo decadencial que ainda resta para que ofereça a queixa-crime. Mas, se a ação penal já estiver em andamento, não há qualquer alteração no pólo ativo da demanda, devendo o feito permanecer da maneira em que se encontra. Havendo decisão com trânsito em julgado, não há nada mais a se fazer.

Se o crime, antes do advento da lei, estava submetido a ação penal pública condicionada à representação do ofendido, entre a ação penal pública condicionada à representação do ofendido e a ação penal pública incondicionada, é melhor para o agente do delito que o crime esteja submetido à ação penal pública condicionada à representação do ofendido, pois ela permite o instituto da decadência, responsável pela extinção da punibilidade, o que não acontece na ação penal pública incondicionada. Diante disso, se o crime era de ação penal pública condicionada à representação do ofendido, assim permanecerá, independente se a ação penal se tornou pública incondicionada (hipótese prejudicial ao agente, daí porque a lei 12.015/09 não retroagirá) ou pública condicionada à representação do ofendido (não há diferença). Nessa hipótese, pois, também não haverá qualquer alteração, à semelhança do que ocorre com a hipótese anterior.

Se o crime, antes do advento da lei, estava submetido a ação penal pública incondicionada e continua submetido a esta espécie de ação penal, não haverá qualquer diferença, permanecendo, pois, tudo como está. Entretanto, a dúvida surge se o crime era de ação penal pública incondicionada e passou a estar submetido a ação penal pública condicionada à representação do ofendido. Nesta hipótese, há melhoria na situação do agente do delito, que agora poderá ser beneficiado pelo instituto da decadência, que provoca a extinção da punibilidade. Por conta disso, entende-se que a lei 12.015/09 deverá retroagir. Assim, entende-se foi iniciada a ação penal, a vítima deverá ser chamada para oferecer a representação, caso já não tenha feito. Entretanto, deve-se advertir que, se já houver o trânsito em julgado da

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decisão proferida ao longo da ação penal, não será possível a retroatividade da lei 12.015/09. A retroatividade de uma lei após o trânsito em julgado de uma decisão somente é possível se aquela for de caráter exclusivamente penal. Nesse caso, a lei mais benéfica deverá ser aplicada pelo juízo da execução penal, em conformidade com o artigo 66, inciso I, da lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal).

Desta forma, resume-se que a coisa julgada é como um limite ao que foi dito, pois se já houve o trânsito em julgado, não se pode cogitar de retroatividade havendo processo findo, além do que, contendo a norma caráter também processual, só poderia atingir processo não encerrado, ao contrário do que ocorreria se se tratasse de lei puramente penal (lex nova que, por exemplo, diminuísse a pena ou deixasse de considerar determinado fato como criminoso), hipóteses em que seria atingido, inclusive, o trânsito em julgado, por força do art. 2º, parágrafo único do Código Penal.

1.1.4. Se o crime era de ação penal pública incondicionada e passou a ser de ação penal pública condicionada à representação do ofendido, qual o prazo que a vítima tem para oferecer a sua representação?

Como já mencionado, nessa hipótese, se a ação penal foi iniciada antes do advento da lei 12.015/09, o juiz deverá determinar a intimação da vítima para que apresente a representação. Nesses termos, verifica-se que a representação do ofendido deixa de ser condição a ser preenchida para permitir o início da ação penal para se tornar uma verdadeira condição a ser preenchida para permitir o prosseguimento da ação penal.

Mas ainda assim subsiste o questionamento: qual o prazo que a vítima terá para apresentar a representação se ela ainda não consta dos autos?

Há séria divergência na doutrina a esse respeito. Guilherme de Souza Nucci 9 , por exemplo, entende que a vítima deve apresentar a representação de imediato, não havendo novo prazo de 6 (seis) meses para tanto. Todavia, ainda na doutrina, parece prevalecer o entendimento segundo o qual o prazo

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deverá ser de 30 (trinta) dias, em analogia ao disposto nos artigos 88 (que tornou obrigatória a representação para os crimes de lesões corporais leves e culposas) e 91 (que estipulou esse prazo de trinta dias para os crimes anteriormente citados) da lei 9.099/95 entendendo que se há nos autos manifestação de vontade da vítima nesse sentido, suprida estará a representação. Do contrário, não havendo manifestação de vontade da vítima dever-se-á, no prazo decadencial de 30 dias, aplicando o já mencionado artigo91 da Lei 9.099/95, ser chamada a se manifestar. Tal exigência começa a partir da entrada em vigor da lei 12.015/09, devendo o Estado intimar a vítima para se manifestar, no prazo estipulado (30 dias).

Qual o seria o prazo para esta representação, agora uma verdadeira condição a ser preenchida para permitir o prosseguimento da ação penal? Não tendo a nova lei estabelecido um prazo para tais hipóteses em uma disposição de caráter transitório, há uma lacuna a ser preenchida e duas normas que podem ser utilizadas por analogia: o art. 88 da lei 9.099/95, que passou a exigir representação para as lesões leves e culposas, e o seu art. 91, in verbis: "nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência”.

Na prática, é comum verificar que alguns juízes estão reabrindo o prazo decadencial de 6 (seis) meses com a intimação da vítima para apresentar a representação, o que, tecnicamente não é medida das mais corretas.

De qualquer forma, independente do prazo a ser considerado, uma vez intimada, a vítima, se pretender o prosseguimento da ação penal, deverá oferecer a representação. Do contrário, caso não queira o prosseguimento desta ação penal, deverá negar expressamente esse seu direito ao juiz ou deixar passar o prazo in albis, o que promoverá a extinção da punibilidade do agente do delito.

9

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1.1.5. E nos casos em que o crime resulte lesão corporal grave ou morte, como fica a ação penal?

Como já comentado, Código Penal, antes do advento da lei 12.015/09, estipulava no seu artigo 223 que, se do crime contra o costume resultasse lesão corporal grave ou morte, a ação penal seria pública incondicionada. Esse artigo, porém, com o advento da nova legislação, foi expressamente revogado, daí porque, a princípio, a ação penal para esses crimes seria pública condicionada à representação do ofendido.

Surge então, novamente, uma grave distorção: se a vítima de crime que resulte em lesão corporal grave ou morte, sendo maior e capaz, falecer sem deixar sucessores, não haveria como oferecer a representação em face do ofensor, que ficaria impune, eis que beneficiado pela extinção da punibilidade.

Certamente não foi a pretensão da lei 12.015/09, que foi criada para punir com maior rigor crimes desta natureza. Em sendo assim, admitir que a ação penal, nessas hipóteses, seria pública condicionada à representação do ofendido significaria ir contra a própria legislação, sem falar na notória violação ao princípio da proporcionalidade. Diante disso, recomenda-se seja feita uma interpretação conforme a Constituição para que a ação penal, no caso em tela, continue a ser pública incondicionada. Na voz de Paulo Rangel 10 “Não é crível nem razoável que o legislador tenha adotado uma política de repressão a esses crimes e tornado a ação penal pública condicionada à representação. Até mesmo pelo absurdo de se ter a morte da vítima no crime de estupro e não haver quem, legitimamente, possa representar para punir o autor do fato. O crime, sendo a vítima maior e capaz, ficaria impune. Com certeza, por mais confuso que esteja o Congresso Nacional com seus sucessivos escândalos, não foi isso que se quis fazer’.

Sem dúvida será de ação penal de iniciativa pública incondicionada e a razão é que o princípio da interpretação conforme a Constituição recomenda que os seus aplicadores, diante de textos infraconstitucionais de significados

10

RANGEL,Paulo. Direito Processual Penal. 17ª ed.,Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.p.301-303

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múltiplos e de duvidosa constitucionalidade, escolham o sentido que as torne constitucionais, aproveitando ou conservando, assim, as leis, evitando o surgimento de conflitos sociais e, no caso penal, evitando também a impunidade, caso os juízes se pusessem a invalidar os atos da legislatura.

Destarte, se o que se quer com a lei 12.015/09 é estabelecer uma nova política repressiva dos crimes conta a dignidade sexual, protegendo-se a pessoa vítima do descontrole humano, em especial, quando houver morte ou lesão grave é razoável que a ação penal seja pública incondicionada.

Em esfera conclusiva, em linhas gerais sobre este item, é positiva a iniciativa da nova lei em tornar, em regra, pública condicionada à representação do ofendido a ação penal nos crimes contra a dignidade sexual, desse modo, conciliando melhor os interesses da vítima e da sociedade, mas é preciso muita cautela na aplicação no tempo desta novel lei, e na fixação da regra de que a ação penal será pública incondicionada nos crimes praticados contra menor de 18 (dezoito) anos ou vulnerável e naqueles cujo o resultado seja lesão corporal grave ou morte da vítima.

1.2 - Da revogação da Lei 2.252/54

Outra importante alteração reporta-se ao fato de que a Lei 12.015/2009 revogou expressamente a Lei 2.252/54, que tratava do crime de corrupção de menores e inseriu no Estatuto da Criança e do Adolescente o artigo 224-B com a seguinte redação:

“Art.244-B. Corromper o facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito)” anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§1º Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet.

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§2º As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990.”

A pena de 1 a 4 anos não foi alterada, deixando a nova redação de prever a pena de multa.

Além disso, os parágrafos 1º e 2º do novo artigo do ECA vão de encontro ao progresso dos meios de comunicação, tipificando a utilização de meios eletrônicos e até salas de bate-papo para a prática do crime.

De acordo com o §1º, incorrerá nas penas do caput do artigo 224-B do ECA quem utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet, corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la.

Já se a infração cometida ou induzida for hedionda (cf. artigo 1º da Lei8.072/90), as penas do caput do artigo 244-B serão aumentadas de um terço (1/3), conforme o §2º do artigo 244 do ECA.

Apesar da mudança de Diploma legislativo, o crime de corrupção de menores do artigo 244-B do ECA, a exemplo do previsto na lei revogada, continuará a admitir prova em contrario, no sentido de que o menor já era corrompido ao tempo da conduta, ou seja, essa presunção de corrupção continua sendo relativa.

1.3 - Do caráter de hediondez

A Lei reformadora também deu nova redação ao artigo 1º, V, da Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), esclarecendo que o estupro simples (213, caput), também é hediondo, assim como a forma qualificada pela lesão grave ou morte da vítima (§§ 1º e 2º).

A nova previsão legal põe fim à divergência até então existente a respeito do assunto, pois ora se entendia que todas as formas de estupro eram

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hediondas, ora se sustentava que apenas as formas qualificadas pela lesão grave ou morte eram assim consideradas.

Resta colocar que, o estupro de vulnerável (art. 217-A),em todas as suas formas (simples e qualificada), foi incluído no rol dos crimes hediondos (art. 1º, VI, da Lei 8.072/90).

1.4 - Da revogação parcial do artigo 9º da Lei n. 8.072/90

De acordo com o artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos, as penas dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor são acrescidas de metade, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no artigo 224 do Código Penal.

Com a revogação deste dispositivo (artigo 224 do CP), as hipóteses ali contempladas passaram a ser elementos constitutivos do crime de estupro de vulnerável, não mais podendo caracterizar, ao mesmo tempo, causas de aumento de pena desse mesmo delito, sob pena de incorrer em bis in idem, o que é vedado.

Também não será aplicável ao artigo 213 o aumento do artigo 9º da Lei 8.072/90, pois, para a caracterização do crime de estupro, a vítima não pode estar em nenhuma das hipóteses do artigo 224 do CP, visto que, se estiver, o crime agora será o do artigo 217-A.

Portanto, constata-se que houve a revogação parcial do artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos, que continua sendo aplicado apenas às outras hipóteses nele previstas, ou seja, aos crimes patrimoniais nele elencados.

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CAPÍTULO III

QUESTÃO INTERTEMPORAL – LEI PENAL BENEFICA?

A revogação parcial do artigo 9º da Lei 8.072/90 beneficiaria aqueles que praticaram crimes contra as pessoas elencadas no revogado artigo 224 do CP? Sim, porém, em parte.

O fato de a vítima ser menor de 14 anos ou portadora de doença mental continuou a ser tutelado pelo Direito Penal, tanto que a pena mínima do artigo 217-A, “caput”, que trata do estupro de vulnerável ficou estabelecida em 08 anos. Assim sendo, o legislador compensou a retirada da majorante prevista na Lei dos Crimes Hediondos, com um aumento na pena cominadora ao novo artigo do Estatuto Repressivo.

Dessa forma, aquele que recebeu condenação pela prática do crime de estupro ou atentado violento ao pudor contra menor de 14 anos ou portador de doença mental e teve a pena acrescida por conta do artigo 9º da Lei 8.072/90, não terá direito ao cancelamento puro e simples desse acréscimo, apesar de algumas vozes já se manifestarem nesse sentido.

Entretanto, fazendo-se uma análise das penas anteriores e atuais (tomemos como exemplo a mínima cominada), constata-se que o estupro simples (art. 213,CP) tinha pena de 06 anos; o qualificado pela lesão grave, de 08 anos, e o qualificado pelo resultado morte da vítima, de 12 anos. Aplicando-se o aumento de metade em razão do artigo 9º da Lei 8.072/90, chegaríamos respectivamente às penas de 09, 12 e 18 anos.

No estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A do CP, onde já se considera a menoridade ou deficiência mental da vítima, as penas mínimas cominadas são de 08, 10 e 12 anos, respectivamente.

Desse modo, a nova lei apresenta-se como mais benéfica e conforme já comentado, por força constitucional, deve retroagir para alcançar os fatos anteriores, inclusive os já transitados em julgado, não para simplesmente cancelar o aumento de pena, mas fazer a retificação da pena, corrigindo-a nos

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limites estabelecidos pela nova lei. Como exemplo imaginemos que alguém foi condenado por estupro (art.213, “caput” do CP) à pena de 09 anos (pena mínima de 06 anos, majorada de metade pelo fato de a vítima ser menor de 14 anos), terá direito de ter sua pena reduzida para 08 anos, que é o mínimo cominado para o estupro de vulnerável.

Na pesquisa de campo realizada para a efetivação deste trabalho, considerando as respostas dos delegados questionados, ficou claro que inclusive na prática, o legislador teve intenção em tornar o crime de estupro com tipificação mais rigorosa. Porém, algumas aberrações jurídicas11, como a prisão cautelar em sede de inquérito policial que via de regra, pode resultar não só no livramento como na absolvição, facilitaram a defesa.

Ademais, também foi constatado a alta incidência e a captura proporcional dos acusados relacionado ao número de queixas-crime, o que não significa alto índice de prisão pena (prisão após julgamento – processual) devido as facilidades elencadas na esfera processual da Lei 12.015/2009.

1.1.Beijo lascivo

Podemos vislumbrar uma possível desproporcionalidade quanto ao fato de uma pessoa que força alguém a dar um beijo poder ser processada por estupro, recebendo uma pena de 6 a 10 anos. O artigo deveria ser mais específico quanto às espécies de atos libidinosos que se enquadrariam no tipo penal.

Greco12 chama atenção para o fato de que o chamado beijo lascivo jamais se configure em estupro: “Condenar alguém ao cumprimento de uma pena que varia entre 6 a 10 anos de reclusão por ter beijado, à força, uma

11

Dr. Luiz Antônio Ferreira – Delegado Titular da 73ª DP – Neves – SG.

12

Mural. Direito em movimento. Dignidade Sexual – Nova figura típica para o crime de estupro. Rio de Janeiro - RJ: Outubro, 2009 – Nº 68.

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outra pessoa, é uma resposta extremamente desproporcional do Estado a esse tipo de comportamento. Poderá, nesse caso, ser responsabilizado pelo delito de constrangimento ilegal, prevista pelo art. 146 do Código Penal, ou mesmo pela contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (art. 61 da LCP), dependendo da intensidade e da gravidade do fato praticado”.

O legislador, ao criar um tipo legal de crime, deve se orientar por alguns princípios do Direito Penal, como o princípio da intervenção mínima, o princípio da subsidiariedade, entre outros. O princípio que mais tem sido violado pelo legislador na elaboração das leis é o princípio da proporcionalidade. A lei 12.015/2009, claramente, é mais uma manifestação legislativa em que não foi observado o referido princípio.

Com o efeito, o STJ, antes da reforma do Código Penal, já disse que o beijo lascivo, desde que haja violência ou grave ameaça, configurava o delito de atentado violento ao pudor, previsto no revogado art. 214 do Código Penal (RESP 831.058-RS, julgado em 13/9/2007 e publicado no informativo nº 331 do STJ).

Com a reforma do Código Penal, o beijo lascivo com violenta conduta configura o delito de estupro (art.213), punida com pena de reclusão de 6 a 10 anos. Chega-se à seguinte situação, que fere o menor senso de justiça: o beijo lascivo é punido com a mesma pena e com a mesma severidade do que a conjunção carnal. Uma conduta que, embora absolutamente reprovável, possui infinitamente uma menor lesividade, é punida com exatamente a mesma pena do que uma conjunção carnal exercida com violência ou com grave ameaça.

Assim, uma pessoa hoje que forçar alguém a dar um beijo responde pelo delito de estupro (art.213), recebendo uma pena de 6 a 10 anos, em nítida violação ao princípio da proporcionalidade.

De lege ferenda”, o artigo 213 do Código Penal deveria prever escalas penais menores, que deveriam variar de acordo com o grau de lesão ao bem jurídico protegido.

Referências

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