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Autos nº 9527-72.2012.8.16.0021
SENTENÇA
1. RELATÓRIO
BANCO BRADESCO S.A. ingressou com os presentes Embargos à Execução Fiscal em face da Fazenda Pública do Município de Cascavel, devidamente qualificados aos autos.
Narrou o embargante, em síntese, que a embargada ajuizou execução fiscal objetivando a cobrança de multa administrativa, no valor de R$100.687,75.
Ponderou que o processo administrativo está sem motivação, portanto, eivado de nulidade.
Asseverou que o valor da multa é exacerbado, pois não observou os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Pugna pela atribuição de efeito suspensivo aos embargos. E, ao final, pede a procedência. Juntou documentos (mov. 1.4/1.8).
Os embargos foram recebidos com atribuição de efeito suspensivo (mov. 18.1).
Devidamente intimada, a embargada apresentou impugnação aos embargos (mov. 21.1), alegando a impossibilidade do exame dos pontos discutidos, pela ausência de documentos. Alegou que a multa aplicada pelo PROCON é revestida de legalidade, que foi respeitado o devido processo legal, e foi aplicada conforme os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Sustentou sua competência para aplicação da multa, bem como, sustentou estar motivada a decisão. Requereu a improcedência. Juntou documentos (mov. 21.2/21.8).
Houve réplica (mov.32.1), oportunidade na qual sustentou a nulidade do procedimento administrativo, pelo fato de o réu ter exigido preparo para a interposição de recurso administrativo.
Manifestação do réu reiterando o pedido de improcedência dos embargos (mov. 36.1).
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Instadas as partes a especificarem provas (mov. 38.1), ambas pugnaram pelo julgamento antecipado (mov. 43.1 e 46.1).
Eis o que havia a relatar. DECIDO. 2. FUNDAMENTAÇÃO
Do julgamento antecipado da lide
O feito comporta julgamento antecipado, tendo em vista a desnecessidade da produção de outras provas, sendo que o teor dos autos já permite a prolação de sentença de mérito, nos termos do art. 355, I, e 920, ambos do Código de Processo Civil.
MÉRITO
Trata-se de embargos à execução fiscal em que pretende o embargante a anulação da multa aplicada pelo PROCON.
A CDA que fundamenta a execução fiscal embargada é proveniente de multa aplicada pelo PROCON, em razão de suposta infração ao direito do consumidor, praticada pelo embargante.
Após parecer administrativo do referido órgão, que julgou subsistente a reclamação do consumidor (21.4/21.5), a parte executada foi notificada para recolhimento da multa ou apresentação de recurso, condicionado ao depósito equivalente a 25% do valor da multa imposta (fl. 5 – mov. 21.5).
Por consequência, o executado, ora embargante, apresentou recurso administrativo, mas não depositou o percentual da multa, tendo sido incluído o valor em dívida ativa (mov. 21.6).
O ato praticado pelo PROCON é ilegal.
A exigência de depósito prévio para interposição de recurso administrativo não encontra amparo no ordenamento jurídico constitucional, em que se privilegia o direito de petição, o contraditório e a ampla defesa, de acordo com o art. 5º, incisos XXXIV e LV, da Constituição da República.1
1 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
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Essa posição já se encontra pacificada através da edição da Súmula Vinculante nº 21, o que supera qualquer discussão sobre o tema. Vejamos:
“Súmula 21. É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.”
Cumpre destacar que o direito ao duplo grau de jurisdição é inerente ao contraditório e à ampla defesa, ou seja, é o direito da parte de revisão daquilo que foi decidido singularmente, quer se trate de ato administrativo que atinja o administrado, quer se trate de processo sancionatório e/ou disciplinar, independentemente do recolhimento prévio do valor da multa.
Não é outro, aliás, o entendimento esposado por nossos tribunais:
“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE MULTA EM DECISÃO ADMINISTRATIVA. EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO PRÉVIO PARA ADMITIR RECURSO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DO DIREITO DE PETIÇÃO. SENTENÇA MANTIDA EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. De acordo com o disposto no artigo
5º da Constituição Federal a exigibilidade do depósito prévio da multa, seja parcial ou total, para viabilizar o processamento de recurso administrativo, impede o direito de defesa do cidadão, bem como o direito de petição. Foram editadas súmula vinculante nº 21 e súmula nº 373 pelo
Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, as quais dispõem no sentido de que é ilegal a exigência de depósito prévio como
condição de admissibilidade do recurso administrativo.” (TJPR. AC n.
1009004-5. 5ª Câmara Cível. Des. Rel. Luiz Mateus de Lima, DJ 11/03/2013)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS À EXECUÇAO FISCAL. MULTA.
PROCON. EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO PRÉVIO DA MULTA, COMO CONDIÇAO DE
PROCEDIBILIDADE DO RECURSO. EXIGÊNCIA INJUSTA E NAO RAZOÁVEL. 1.
Veste-se de profunda ilegalidade a exigência de depósito de parte de multa como condição de procedibilidade de recurso administrativo. 2. Não
é justa nem razoável e muito menos proporcional aplicar-se uma multa que gravita em torno dos R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), com base num débito do consumidor de cerca de R$ 400,00 (quatrocentos reais). 3. Violação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 4. Agravo de Instrumento provido.” (TJPR. AC. 28589 Ag Instr 0662999-0, 5.ª Câmara Cível. Des. Rel.
Rosene Arão de Cristo Pereira, DJ 30/11/2010)
b) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
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“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DEPÓSITO RECURSAL PRÉVIO.
RECURSO ADMINISTRATIVO. REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE.
INCONSTITUCIONALIDADE. 1. A JURISPRUDÊNCIA DO STF ESTÁ PACIFICADA NO SENTIDO DA INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO PRÉVIO DO VALOR DA MULTA COMO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO EM FACE DA VIOLAÇÃO ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DE PETIÇÃO, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 2. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL IMPROVIDAS.” (TRF 5ª REGIÃO, APELREEX 7427 CE 0002555-46.2009.4.05.8100, 2ª TURMA. DES. REL. MANUEL MAIA, DJ 02/03/2010)
Conforme explanado anteriormente, o Colendo Supremo Tribunal Federal também já decidiu pela inconstitucionalidade da exigência de depósito prévio como condição de admissibilidade de recurso administrativo.
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO. EXIGÊNCIA LEGAL DE PRÉVIO DEPÓSITO DO VALOR DA
MULTA COMO CONDIÇÃO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
ADMINISTRATIVO. OCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NOVA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL FIRMADA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO DE AGRAVO PROVIDO. A exigência legal de prévio depósito do valor da multa,
como pressuposto de admissibilidade de recurso de caráter meramente administrativo, transgride o art. 5º, LV, da Constituição da República.
Revisão da jurisprudência: RE 390.513/SP (Pleno).” (STF – RE-ED 531415 – SP
– 2ª T. – Rel. Min. Celso de Mello – DJU 29.06.2007)
Portanto, não há que se falar em necessidade de depósito de parte do valor da multa para interposição de recurso administrativo, mostrando-se, assim, abusivo o ato praticado pelo PROCON.
Importante salientar, ainda, que o entendimento adotado pelo STF por meio da Súmula Vinculante nº 21 possui efeito ex tunc, ou seja, retroage para alcançar atos anteriores à declaração de inconstitucionalidade.
Segundo dispõe o art. 4º da Lei nº 11.417/06, a súmula vinculante tem eficácia imediata, sendo possível a modulação dos efeitos por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse público, através do voto de 2/3 (dois terços) dos membros do Supremo Tribunal Federal.2
2 Art. 4o A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços)
dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público.
3“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. DEPÓSITO PRÉVIO
COMO REQUISITO DE ADMISSÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO. SÚMULA VINCULANTE 21. EFICÁCIA EX TUNC. ART. 4º DA LEI Nº 11.417/06. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. REEXAME A QUE SE NEGA PROVIMENTO, PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO.” (TJPE. AC. n. 0266371-0. 7ª Câmara Cível. Des. Rel. Fernando Cerqueira, DJ 28/03/2012).
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In casu, não tendo o STF feito qualquer ressalva, imperioso seguir aregra de que a declaração de inconstitucionalidade ora tratada possui efeito ex tunc.3 Neste sentido acabou por se manifestar o STF na Reclamação nº 10.938, in verbis:
“O objetivo da Súmula Vinculante 21 é extinguir a exigência
de depósito como requisito de admissibilidade de recursos administrativos. Nesse sentido, o Recurso Extraordinário
388.359, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 22.6.2007. A
circunstância de o recurso ser interposto antes da edição do enunciado com força vinculante por este Tribunal não tem o condão de afastar a inconstitucionalidade da exigência de depósito prévio para interposição de apelos administrativos.”
(STF. RCl 10.938/PE. Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 04/03/2011) Em se tratando de inconstitucionalidade reconhecida por meio da Súmula Vinculante nº 21, uma vez evidenciada tal circunstância em qualquer procedimento administrativo - exigência do depósito recursal – deve ser ela aplicada de ofício pelo juízo.
Registre-se que, apesar de o embargante ter interposto o recurso no caso dos autos, este não restou apreciado em razão da ausência de recolhimento de 25% do valor da multa aplicada.
Logo, a irregularidade no desenvolvimento do processo administrativo que deu origem ao título exequendo afasta a presunção de certeza e liquidez a ele outorgada, impondo o reconhecimento da insubsistência da execução e sua consequente extinção, restando prejudicadas as demais alegações da parte embargante.
3. DISPOSIVO
Ante o exposto e tudo mais que dos autos consta, julgo procedentes os presentes embargos, para o fim de declarar a nulidade da Certidão de Dívida Ativa nº 2911/2011, que embasa a execução fiscal nº 3379-45.2012, com a consequente extinção desta, nos termos do art. 485, IV do Código de Processo Civil.
Condeno a embargante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 8% do valor atualizado da causa, atendendo ao grau de complexidade da causa, o zelo do profissional e o tempo exigido para a realização do serviço (artigo 85, § 3º, II e §4º, III, do Código de Processo Civil 2015).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
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Deixo de submeter o presente feito ao reexame necessário, em vista do disposto no artigo 496, §4º, do Código de Processo Civil.
Cumpram-se, no mais, as determinações preconizadas pelo Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado.
Com o trânsito em julgado, traslade-se cópia da presente aos autos de execução fiscal correspondente, promova-se o levantamento da penhora eventualmente existente.
Oportunamente, postas as cautelas de estilo, arquivem-se. Cascavel, datado automaticamente. (lv)
Raquel Fratantonio Perini Juíza de Direito Substituta
