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Òkòtò: dança desobediente afrocentrada, caminhos para a formação em Dança no Ensino Superior sob os estudos das relações étnico-raciais brasileiras

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

ESCOLA DE DANÇA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DANÇA

JADIEL FERREIRA DOS SANTOS

ÒKÒTÒ: DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA, CAMINHOS

PARA A FORMAÇÃO EM DANÇA NO ENSINO SUPERIOR SOB OS

ESTUDOS DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS BRASILEIRAS

SALVADOR 2018

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JADIEL FERREIRA DOS SANTOS

ÒKÒTÒ: DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA, CAMINHOS

PARA A FORMAÇÃO EM DANÇA NO ENSINO SUPERIOR SOB OS

ESTUDOS DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS BRASILEIRAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Dança, Escola de Dança, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Dança. Orientadora: Prof.ª. Dr.ª Lenira Peral Rengel

Coorientadora: Prof.ª. Dr.ª Amélia Vitória de Souza Conrado

SALVADOR 2018

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Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Universitário de Bibliotecas Santos, Jadiel Ferreira

ÒKÒTÒ: dança desobediente afrocentrada, caminhos para a formação em Dança no Ensino Superior sob os estudos das relações étnico-raciais brasileiras / Jadiel Ferreira Santos. -- Salvador, 2018. 246 f.

Orientadora: Lenira Peral Rengel.

Coorientadora: Amélia Vitória de Souza Conrado. Dissertação (Mestrado - Programa de Pós-Graduação em Dança) -- Universidade Federal da Bahia, Escola de Dança da UFBA, 2018.

1. Formação em Dança. 2. Relações Étnico-Raciais. 3. Lei 11.645/08. 4. Dança Desobediente. 5. Racismo Institucional. I. Peral Rengel, Lenira. II. de Souza Conrado , Amélia Vitória . III. Título.

CDD - 793.3 CDU - 793.07

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JADIEL FERREIRA DOS SANTOS

ÒKÒTÒ: DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA, CAMINHOS

PARA A FORMAÇÃO EM DANÇA NO ENSINO SUPERIOR SOB OS

ESTUDOS DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS BRASILEIRAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Dança, da Escola de Dança, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Dança.

Aprovada em 18 Julho de 2018.

Banca Examinadora

Prof.ª. Dr.ª Lenira Peral Rengel – Orientadora

_______________________________________________

Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Universidade Federal da Bahia - PPGDANÇA

Prof.ª. Dr.ª Amélia Vitória de Souza Conrado – Coorientadora _______________________________________________ Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia Universidade Federal da Bahia - PPGDANÇA

Prof.ª. Dr.ª Nanci Helena Rebouças Franco

_______________________________________________ Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia Universidade Federal da Bahia - FACED

Prof.ª. Dr.ª Lara Rodrigues Machado

____________________________________________

Doutora em Artes Cênicas pela Universidade Estadual de Campinas - São Paulo Universidade Federal da Bahia – PPGDANÇA

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AGRADECIMENTOS

Muitos contribuíram com minha jornada sem fim enquanto artista, pesquisador acadêmico da dança em minha trajetória ativista negra até este momento. Desta forma, sem pretensões de desmerecimento com todos que colaboraram significativamente em minha vida acadêmica e artística, concentrarei meus agradecimentos como ato político de (re) existência e reconhecimento, tal qual esta pesquisa, como um gesto de eterna gratidão e afeto ancestral a minha mãe Gedalva Ferreira dos Santos, força materna que me mantém vivo, ao meu pai Cícero Silvestre dos Santos, in memoriam, e ao meu irmão Jatiniel Ferreira dos Santos, in memoriam.

Agradeço de modo muito especial ao parceiro Anderson Santana (Pretim), anjo que Exu colocou em meu caminho para amenizar minhas dores, amigo que ao longo de nossa história sempre foi a terra afetuosa e singela que me acalentou nos momentos mais difíceis que passei nessa trajetória no mestrado em Salvador. Minha eterna gratidão a professora e amiga Lara Rodrigues Machado, poeta da vida que levarei para toda minha existência devido ao seu amor verdadeiro e vida dedicada às ancestralidades que sou.

Todo meu axé a minha mestra e mentora intelectual Maria José (Mazé) que ao longo de minha vida foi minha irmã, amiga, mãe e pessoa responsável por me ensinar ser/dançar desobediente e afrocentrado, quem me fez perceber-me um ativista negro, artista e acadêmico da dança, estado de corpo que me possibilitou estar vivo até hoje.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio à realização desta pesquisa.

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RESUMO

Esta pesquisa/denúncia, em sua natureza ativista negra LGBTQI+, objetiva analisar e refletir sobre as implicações das relações étnico-raciais brasileiras e suas complexas dimensões socioculturais no processo de formação de Dança no Ensino Superior. A pesquisa foi desenvolvida na Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia. Problematizam-se quais os níveis de afetações culturais e cognitivas causadas pela ausência ou presença dos saberes das culturas negro-brasileiras, negro-africanas e dos estudos das relações étnico-raciais, pautando-os como estudo fundamental para descolonizar o conhecimento no ensino, aprendizagem e criação artística dos futuros professores de Dança. As referências são as Leis 10.639/03 e 11.645/08 que prevêem a obrigatoriedade da história africana, afro-brasileira e indígena na Educação Básica, as Epistemologias do Sul (SANTOS, 2010; 2007) para reconhecermos o epistemicídio de saberes de pesquisadores, artistas e acadêmicos negros na dança, segundo Asante (2009). Para pensarmos as condições socioeconômicas e culturais do negro, a partir da sua localização centrada na África e suas diásporas, são apresentadas a Dança Desobediente Afrocentrada e a metodologia artística exuniana como um caminho decolonial e afrocêntrico em diálogo com o conceito de pesquisa-ação (THIOLLENT, 1986) para refletir o ensino e aprendizagem das danças de estéticas negras como projeto corporal artístico-pedagógico contemporâneo e emancipatório, considerando o lugar de fala (RIBEIRO, 2017) para visibilizar as epistemes negras na dança e na educação sob uma abordagem interseccional de raça, gênero, sexualidade e classe. “Com base nas Ciências Cognitivas (LAKOFF; JOHSON, 2004; 1999), delineia-se a hipótese de lesão cultural e cognitiva na formação do professor e no ensino de Dança, onde se deve atuar com metáforas ativistas negras”, junto à afirmação do empoderamento da “população negra” como posição política (MUNANGA, 2016; 2015) que atua como contradispositivos (AGAMBEN, 2009) às “metáforas colonizadoras” presentes na dança e seus espelhamentos (RAMACHANDRAM, 2014). Foram feitas revisões bibliográficas, análise crítica de denúncias de racismo contra professores, eventos acadêmicos, artísticos, projetos pedagógicos, seminários e outras ações formativas desenvolvidas pela Escola de Dança que contemplassem os problemas dessa pesquisa. Como resultado, constatou-se a existência do racismo institucional, a prática de epistemicídio, a violência simbólica cometida contra os saberes e os corpos negros, bem como denúncias de racismo. A pauta do racismo, as trajetórias dos pesquisadores e artistas negros são visibilizadas quando conveniente e útil para a disputa política interna e perpetuação do poder institucional branco e de suas epistemes eurocêntricas. Observam-se também as iniciativas ativistas de alunos em sua maioria negros com criação de trabalhos artísticos, grupos de pesquisa que abordam a temática étnico-racial. Conclui-se que apesar de alguns mínimos avanços na Escola de Dança (UFBA), necessita-se de um maior tempo para análise. A política de identidade aplicada nessa Escola ainda reproduz as epistemes eurocêntricas como saberes legitimadores. Não existe um projeto político pedagógico que prepare de modo efetivo os futuros professores para atuarem segundo a Lei 11.645/08 e os estudos étnico-raciais na escola.

Palavras- chave: Formação em Dança. Relações Étnico-Raciais. Lei 11.645/08. Lei 10.639/03. Dança Desobediente. Racismo Institucional.

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ABSTRACT

This is a black LGBTQI+ oriented and activist research whose aim is to analyze and reflect on the Brazilian ethnic and racial relations and how such complex social and cultural expressions impact the dance education in the universities. This research was developed at the Dance School of Universidade Federal da Bahia (Federal University of Bahia).Questions are raised on the cultural and cognitive effects of both lack and presence of knowledge of Brazilian and African black cultures and ethnic and racial relations. Such awareness is essential to decolonize the knowledge required for future dance teachers, whether they are teaching, learning or creating. Laws 10.639/03 and 11.645/08 require that the History of African, African-Brazilian, and Indigenous People be taught in the Basic Education. The Epistemologies of the South (SANTOS 2010; 2007) allows us to acknowledge the epistemicide of knowledge provided by black researches, artists and intellectuals on dance, according to Asante (2009).The African-centered Disobedient Dance and the Exu-based artistic methodology allow us to reflect on the social, economic and cultural situation of the black people, from their life in Africa to the subsequent diasporas. The Dance and the methodology are introduced herein as a decolonizing tool and an African-centered way related to the action research concept (THIOLLENT, 1986) so as to present the learning and teaching of black aesthetic dances as an emancipatory contemporary artistic and a pedagogic body project within the “place of speech” (RIBEIRO, 2017) in order to bring to light the black epistemes on dance and education under an intersectional approach concerning race, gender, sexuality and class. Having in mind the cultural and cognitive harm in the teacher’s education and on dance teaching, based on the Cognitive Sciences (LAKOFF; JOHNSON, 2004; 1999) the “black activist metaphors” are introduced as an alternative to empower the “black population”, a political position (MUNANGA, 2016; 2015) of counter-device (AGAMBEN, 2009) towards the “colonizing metaphors” found in the dance and its mirroring (RAMACHANDRAM, 2014).This research was based on bibliographical review, critical analysis of complaints against teachers for racism, academic and artistic events, pedagogical projects, seminars and other educational actions undertaken by the Dance School and related to the issues presented herein. The outcome revealed the existence of institutional racism with the epistemicide, a symbolic violence perpetrated against black knowledge and bodies, as well as the complaints about racism. The racism issue and the challenges faced by black researchers and artists are only discussed when convenient and useful for the political dispute in the institution, maintaining the white institutional power and its Eurocentric epistemes. Activist initiatives from students (most of them black) with the creation of artistic works and research groups for the ethnic and racial issues were also considered for this study. Despite some progress, there are setbacks to the Dance School (UFBA) and they demand more time for analysis. The identity policy in this School still reproduces the Eurocentric epistemes as essential knowledge. There is no political and pedagogical project to effectively prepare new teachers on their sapproach pursuant to the Law 11.645/08 and to the ethnic and racial studies at school.

Keywords: Dance Education. Ethnic and racial relations. Law 11.645/08. Law 10.639/03. Disobedient Dance. Institutional racism.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Representação de Exu òkòtò ... 28 Figura 2 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: projeto filá corpo político lugar de fala de existências negras, Performer Anderson Santana ... 98 Figura 4 – Ato em apoio a aluna Gabriela Sampaio, aluna do curso de dança da (UFBA). Autora da denuncia de racismo por parte de professaras da escola de Dança/UFB. Coletivo Dandara ... 147 Figura 5 – Coletivo Dandara e amigos em ato de apoio a aluna Gabriela Sampaio, aluna da escola de dança/UFBA. Vitima de racismo ... 168

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO: ABRINDO CAMINHOS, ARTIVISMO NEGRO NA DANÇA ... 12

2 CAMINHOS ENCRUZILHADOS: UMA PERSPECTIVA ARTÍSTICA EXUNIANA PARA PESQUISAR/DANÇAR NA FORMAÇÃO EM DANÇA ... 28

2.1. DANÇA ÒKÒTÒ: ABRINDO CAMINHO ... 28

2.2 RAÇA E SEUS CAMINHOS ENCRUZILHADOS ... 45

2.3 MOVIMENTO NEGRO E AS METÁFORAS ATIVISTAS DA RAÇA/COR/NEGRA NO BRASIL ... 56

2.4 POLÍTICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS ... 62

2.5 ABRINDO O CAMINHO: DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA DE MERCEDES BAPTISTA NA DANÇA BRASILEIRA ... 67

3 CONSTRUINDO NINHOS DE BARRO: TECENDO CONEXÕES COGNITIVAS...77

3.1 CIÊNCIAS COGNITIVAS ... 80

3.2 COGNIÇÃO ... 83

3.3 CORPO: CORPONECTIVIDADE ... 88

3.4 PROCEDIMENTO METAFÓRICO DO CORPO ... 90

3.5 DANÇA METÁFORAS: “ABEBÉS, ESPELHO, ESPELHO MEU” – CORPO NEGRO NO ESPELHO ... 91

3.6 OPERAÇÕES METAFÓRICAS NO PROCESSO DE CONHECIMENTO DE CORPOS NEGROS ... 96

3.6.1 Metáfora do canal...96

3.6.2 Metáforas colonizadoras ou colonialistas ... 98

3.6.2.1 A cor na metáfora ... 104

3.6.3 Vista minha pele à flor da pele ... 106

3.6.4 Metáforas ativistas negras ... 109

3.6.5 Lanço-me em memórias, não tão remotas, para metaforizar de modo ativista ... 111

4 DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA ... 113

4.1 DANÇA DESOBEDIENTE DE CORPOS BIXA-DOSS EM INTERSECCIONALIDADE DE RAÇA, GÊNERO, SEXUALIDADE E CLASSE ... 129

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5. MEMÓRIAS DE CORPOS QUE DANÇAM DESOBEDIENTES: A PRESENÇA NEGRA NA ESCOLA DE DANÇA DA UFBA ... 147 5.1 A DANÇA DO CISNE NEGRO: UM POSSÍVEL MODO DE DANÇA DESOBEDIENTE NA ESCOLA DE DANÇA DA UFBA ... 151 5.2 B.O/7.716: PERCEPÇÕES DE SI NA EXPERIÊNCIA DE SER UM PESQUISADOR EM DANÇA ... 167 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS: CONSIDERAÇÕES CERTAS DE INCERTEZAS CERTAS DE CERTEZAS INCERTAS ... 200 REFERÊNCIAS ... 215 ANEXOS ... 225 ANEXO 1 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: Perfor(mar) o que não emergiu ... 225 ANEXO 2 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: Perfor(mar) o que não emergiu ... 226 ANEXO 3 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: Perfor(mar) o que não emergiu ... 227 ANEXO 4 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: Perfor(mar) o que não emergiu. ... 228 ANEXO 5 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: filá corpo político lugar de fala de existências negras ... 229 ANEXO 6 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: filá corpo político lugar de fala de existências negras. ... 230 ANEXO 7 – Experimentos Danças Desobedientes Afrocentradas: filá corpo político lugar de fala de existências negras. ... 231 ANEXO 8 – Experimentos Danças Desobediente Afrocentrada: em interseccionalidade de gênero, sexualidade e classe por uma dança afroqueer e afrofuturista. ... 232 ANEXO 9 – Experimentos Dança Desobediente Afrocentrada: em interseccionalidade de gênero, sexualidade e classe por uma dança afroqueer e afrofuturista. ... 233 ANEXO 10 – Experimento Dança Desobediente Afrocentrada: em interseccionalidade de raça, gênero, sexualidade e classe por uma dança afroqueercentrada e afrofuturista. ... 234

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Anexo 11 – Experimento Dança Desobediente Afrocentrada: em interseccionalidade de raça, gênero, sexualidade e classe por uma dança afroqueercentrada e afrofuturistica. ... 235 ANEXO 12 – Experimento Dança Desobediente Afrocentrada: trilogia de espelhos difusos em metáforas colonizadoras na imagem de Iemanjá em festas urbanas em Salvador. ... 236 ANEXO 13 – Experimento Dança Desobediente Afrocentrada: Corpos Bixa-Doss em interseccionalidade de raça, gênero, sexualidade e classe por uma dança afroqueercentrada e afrofuturística. ... 237 ANEXO 14 – Coletivo Dandara e amigos em Ato de apoio a aluna Gabriela Sampaio, aluna do curso de dança da (UFBA). Autora da denúncia de racismo por parte de professaras dessa instituição. ... 238 ANEXO 15 – Coletivo Dandara e amigos em Ato de apoio a aluna Gabriela Sampaio, aluna do curso de dança da (UFBA). Autora da denúncia de racismo por parte de professaras dessa instituição. ... 239 ANEXO 16 – A tarde. Aluna da Ufba acusa professoras de racismo. ... 240 ANEXO 17 – Projeto Corpos Bixa-Doss aprovado no PIBEXA/UFBA em diálogos com as perspectivas da pesquisa Dança Desobediente ... 242 ANEXO 18 – Diáspora: núcleo negro de pesquisa. ... 243 ANEXO 19 – “Negras Utopias’’ são experimentos de dança performance que propõe uma reflexão sobre a relação dos temas negritude e homoafetividade, a partir do recorte em ‟homens gays negros” ... 244 ANEXO 20 – Seminário performático: Negras Utopias é poder propor um ambiente afetivo de proximidade para discussão de temas atravessados entre identidades de gênero, raça e sexualidade ... 245 ANEXO 21 – Seminário criado pelo grupo de pesquisa Corponectivo para homenagear a trajetória do pesquisador e artistas Clyde Morgan na Escola de Dança da UFBA. ... 246 ANEXO 22 – Projeto Corpos Bixa-Doss aprovado no PIBEXA/UFBA em diálogos com as perspectivas da pesquisa Dança Desobediente ... 247

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12 1 INTRODUÇÃO: ABRINDO CAMINHOS, ARTIVISMO NEGRO NA DANÇA

“Muitas vezes penso que preciso dizer as coisas que me parecem mais importantes, verbalizá-las, compartilhá-las, mesmo correndo o risco de que sejam rejeitadas ou mal-entendidas. Mais além do que qualquer outro efeito, o fato de dizê-las me faz bem.” (AUDRE LORDE,1978)

As reflexões propostas neste estudo surgem de um histórico de agressões discriminatórias e crimes de racismo que foram e continuam fazendo parte de minhas trajetórias cotidianas, incluindo, obviamente, neste cotidiano, os trajetos artísticos e pedagógicos. Desde já coloco que compartilho da luta histórica de populações fortemente massacradas por diversos modos de intolerância, totalitarismo, discriminação, sobretudo com os povos indígenas. E, intento que esta pesquisa transpareça a ação solidária a que se propõe, muito embora seu foco seja o de romper com o silenciamento e invisibilidade dos estudos étnico-raciais em relação a pessoas negras. No caso deste estudo, busco especificar as questões da população negra brasileira no processo de formação no ensino superior de Dança e, é importante frisar, este conhecimento é nuclear para pessoas negras ou não.

[...] quando ciente de sua subalternidade, o intelectual negro saberá dos limites de sua fala uma vez que antes de ser agente reflexivo é ‘objeto científico’. Saberá que se sua consciência subalterna lhe autoriza a falar sobre a diferença negra no Brasil, por outro lado, espreita seu grau de incorporação de uma ‘objetividade’ científica universal, de ajuste a tropos e apelos disciplinares. Ela é seu senhor, é a autoridade que o protege, como intelectual, do descontrole do sentimento de diferença e da insurgência que isto pode representar visto que se é possível registrar a diferença, há que se silenciar sobre as mais profundas compreensões, os mais profundos desejos de reversão da desigualdade racial e injustiça social. (LIMA, 2001, p. 282-283).

Eu, enquanto sujeito negro e gay estive ao longo de minhas trajetórias, e ainda tenho a experiência de viver e sobreviver em uma sociedade racionalizada por valores ideológicos civilizatórios de uma consciência colonizadora branca eurocêntrica heterossexual e patriarcal. Gostaria de ver a racista sociedade brasileira ter a capacidade de vivenciar a experiência de viver em uma sociedade também regida pelo pensar filosófico, político e educacional da consciência negra. É sob tal perspectiva que esta pesquisa surge, com o objetivo de propor uma construção conjunta de caminhos possíveis para repensarmos a formação do professor de dança com relação às leis e políticas afirmativas destinadas ao âmbito

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13 educacional, com recorte para as relações étnico-raciais na Educação Básica e no Ensino Superior.

Ao longo dos anos, essas ações de hostilidade e vilania me fizeram criar modos e estratégias de combate ao racismo, para que eu pudesse dimensionar os saberes e buscar diálogos que emergissem da população negra brasileira. Considerando as atuais atrocidades feitas pelo atual governo (em curso em 2017-2018) héteropatriarcal de direita e que vem instaurando uma barbárie no desmonte das universidades públicas e o sucateamento das escolas públicas brasileira, gostaria de iniciar as problematizações com um “Primeiramente Fora Temer”, “Salve, Marielle Franco presente!” e “Lula livre!”.

Ao ter como parâmetro nossas próprias reivindicações e suas especificidades, sejam elas de classe, gênero, raça, entre outras, proponho o desafio político a partir das reflexões apresentadas nesta pesquisa de revermos nossas ações enquanto cidadãos, artistas, professores, pesquisadores e acadêmicos de dança. Proposta que também leva em conta a sociedade pluriétnica que somos, o objetivo é pensar não só no que queremos fora do sistema político brasileiro, mas que também possamos estabelecer uma postura crítica do que queremos propor enquanto política de identidade, educacional, econômica e de justiça social. E que tenhamos como parâmetro e consenso a urgência de uma educação pautada nos saberes africanos e afro-brasileiros. De modo que possamos assumir uma postura ética e ensejarmos pautas comuns a todos e políticas elementares ao bem-estar social. Trata-se de um convite para a compaixão, não no sentido romântico regado pelo sentimento de caridade, mas como ação política necessária para o fomento e manutenção de políticas que garantam os direitos da dignidade humana de todas as pessoas marginalizadas.

Minha voz subalterna fala então não apenas de uma opressão econômica e racial, mas também de um passado histórico de inacessibilidade a campos de saber e poder legitimados, a da contenção de símbolos e valores negro-africanos, da restrição à palavra e da dificuldade do uso de categorias e conceitos que traduzam a minha experiência como intelectual negro na academia brasileira. (LIMA, 2001, p. 284).

Pensemos nas condições em que o negro foi e continua sendo considerado na sociedade brasileira. Esta é a pauta elementar que proponho a todos (as), professores (as) de dança. No entanto, não se trata de uma pesquisa racializada,

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14 centrada tão somente nas especificidades das questões da população negra brasileira. Almeja-se, contribuir em alguma medida com o processo de conscientização dos docentes e discentes de dança acerca da compreensão dos processos históricos colonizadores e civilizatórios pelo quais fomos e ainda somos submetidos e demonstrar que as evidências desta pesquisa nos indicam que estes fatos são reproduzidos em nossas práticas no ensino e aprendizagem de dança.

Nós, negros e negras, representaram a parcela da sociedade brasileira que secularmente é a que mais sofre cognitivamente e economicamente de modo particular e desumano em todas as esferas das camadas sociais que ocupamos e, sobretudo no que tange ao acesso a uma educação pública e de qualidade. O objetivo aqui é propor reflexões necessárias e urgentes acerca de uma revisão no processo de formação de dança no Ensino Superior a partir dos estudos étnico-raciais sob uma perspectiva decolonial, de maneira que possamos entender esta demanda social não como sendo uma única responsabilidade de professores, artistas negros e em certa medida da população afrodescendente e indígena.

Convido a todos, sem que haja violação dos lugares de fala e apropriação cultural, para travarmos uma batalha ético-epistemológica e incluirmos em nossas abordagens artístico-pedagógicas e acadêmicas de dança os saberes dos povos historicamente invisibilizados, silenciados e colocados fora do sistema educacional brasileiro.

Entendo que as dinâmicas de movimento nesta proposição devam ser de fora para dentro, a fim de criar lócus de resistência para retirar de nossas ações cotidianas o que é homogeneizador, massificador, colonizador, que sempre operam sobre pessoas das camadas sociais menos favorecidas. Sugiro gritarmos, dançarmos simbolicamente no exercício da ética para leitura desta pesquisa sob o compromisso de fazer ecoar as problematizações que decorrem ao longo desta escrita.

Proponho uma dança desobediente ao colonialismo, patriarcado e ao capitalismo (SANTOS, 2016), ao machismo, à lgbtfobia, com pretensão de transformar as invisibilizações e o epistemicídio, que tomando como base os estudos de Santos (1995) o epistemicídio, em essência, é a destruição de conhecimentos, de saberes, e de culturas não assimiladas pela cultura branca/ocidental. É um subproduto do colonialismo instaurado pelo avanço imperialista europeu sobre os povos da Ásia, da África e das Américas. Que atinge de modo específico os saberes

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15 de corpos negros. De modo que produzir linguagens e ações emancipatórias e afrocêntricas na dança é uma ação urgente para combater o epistemicídio presente em nossa sociedade.

Nesta perspectiva, ao escolher desenvolver uma pesquisa sobre o processo de formação de dança no ensino superior, enquanto cognitivo, apresento uma análise de contextos de Salvador, nos quais a escola de dança da UFBA está instaurada. Proponho discutir não só a entrada de corpos negros, e/ou pessoas negras, como ação reparatória na universidade, mas também a produção de seus conhecimentos, de modo que possamos democratizar a estrutura hegemônica, branca e elitista que alicerça os pensamentos ideológicos, políticos e epistemológicos que regem de modo geral as universidades federais brasileiras.

Temos como recorte disparador das discussões das Leis 10.639/03 e 11.645/08. Ainda que estas leis venham a ser anuladas pelas atuais conjunturas políticas de natureza fascista instaurada em nosso país, em função das políticas educacionais do governo ilegítimo de direita. Os crescentes estudos epistemológicos decoloniais que visam pensar a complexidade da colonização na perpetuação do poder e na produção de conhecimento branco e hegemônico que legitimou, até hoje o extermínio de saberes dos povos colonizados, assim como da produção de conhecimento de intelectuais, pesquisadores e artistas negros dentro e fora do universo acadêmico.

A argumentação é a de que as ações das Leis 10.639/03 e 11.645/08 somados aos estudos decolonias decorrentes são as que mais suscitaram e ainda suscita debates públicos, expondo questões como o racismo velado institucional e estrutural que este país insiste em não assumir.

Assim como o mito da democracia racial e ideal de igualdade de direitos, proclamado em sua maioria pelos classistas golpistas e partidários de direita que tem criado por meio da máquina pública parlamentar, retaliações e barreiras contra a consolidação das políticas de ações afirmativas e para as políticas públicas destinadas ao campo das artes, entre outros. De modo que demarcam e ampliam os estudos sobre os aspectos e os modos operantes específicos que a colonização operou, e ainda opera, na América latina, sobretudo seu poder na hegemonia epistemológico. Por tanto defender a opção decolonial epistêmica, teórica e política é uma ação urgente para compreendermos e agir no mundo, que nos marca pela permanência da colonialidade global nos diferentes níveis de nossas vidas pessoais

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16 e coletivas, principalmente as existências demarcada por corpos e cultura/saberes negras.

Pensar a formação em Dança nessas condições demanda subverter a lógica colonizadora e civilizatória global e as atuais políticas governamentais brasileiras para que possamos verdadeiramente contribuir para formação de pessoas criativas, autônomas e crítico-reflexivo. Neste caso, por meio da dança, criar novas possibilidades de transformação social e modos de existir, resistir e sobreviver. Portanto, um dos objetivos deste trabalho é analisar o conhecimento experiencial acerca da implementação da Lei 11.645/08 no projeto político pedagógico do curso de Dança da UFBA.

Pretende-se dessa maneira analisar as dinâmicas de perpetuação dos discursos colonizadores nos espaços educacionais (da Escola de Dança da UFBA) formais e midiáticos, os quais por sua vez se tornam corresponsáveis ao compactuar e reproduzir estereótipos que inferiorizam e vinculam ao corpo e à dança de estética negro-africana, afro-brasileira e indígena.

Outros contingentes étnico-culturais presentes na sociedade brasileira, com imagem representativa não positiva reforçam ideologias de segregação racial em detrimento de uma supremacia branca que desconsidera e invisibiliza as produções culturais, artísticas, acadêmicas de negros e negras, provocando um contínuo genocídio epistemológico e físico contra a população afro-brasileira e suas formas de existências. Nessa relação de poder, os estereótipos em suas mais diversas formas de representações e comunicações na escola de Dança da UFBA, nas mídias e nos espaços de educação não são positivos, onde se evidenciam como detentores de conhecimentos culturais, inteligência e padrão de corpos a serem seguidos.

Valores alicerçados em ideologias preconceituosas que negligenciam, inferiorizam, invisibilizam, escravizam, menosprezam e silenciam a população afrodescendente e seus ancestrais, restringindo toda contribuição cultural acadêmica e artística dessa população e seus pares, destinando-os apenas um papel escravocrata sem capacidade intelectual, portanto, de seres pecaminosos, inferiores, desprovidos de cultura, religião e de um corpo apropriado para se relacionar socialmente.

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17 Deste modo, proponho problematizar a função político-social propagada no mundo e presente nos discursos da Escola de Dança e nos espaços educacionais formais, midiático e artístico/acadêmicos de Dança.

Ao se tratar das implicações étnico-raciais na formação de Dança na UFBA, a busca se dá por ampliar os diálogos e fomentar reflexões e análises que contribuam no processo de formação dos futuros professores de dança, visando sua atuação na sala de aula. São crescentes os estudos voltados para a revisão histórica e a validação da produção de conhecimentos a partir de sociedades colonizadas com vistas a seus empoderamento perante o capitalismo moderno e o colonialismo nas suas muitas formas de dominação, principalmente as epistemologias imperantes que suprimiram muitas formas de conhecimentos de povos e nações colonizadas.

O interesse pelo estudo das relações étnico-raciais no processo de formação de dança – entendido como ação cognitiva, ou seja, meio como se conhece o mundo, as pessoas, as idéias, as leis, as danças, por exemplo – no Ensino Superior está alicerçado em minha militância ativista no Movimento Negro de Alagoas e no Centro de Cultura e Cidadania Malungos do Ilê. Lá, dediquei-me aos estudos desta temática com a dança e o teatro para melhor compreender os mecanismos do racismo e a vida em uma sociedade colonizada.

Os argumentos que movem e constituem esta pesquisa tomam também como centralidade temas implicados nas relações e contribuições da cultura negro-africana e sua diáspora no Brasil. Suas vinculações vitais e históricas realizam inserções em atividades culturais e artísticas no nosso cotidiano e contribuem para construções de conhecimentos curriculares e formativos em Dança.

O marco decisivo para a quebra deste silenciamento foi a execução do Projeto Dança Afro, aprovado no Programa Vivência de Artes na Universidade Federal de Alagoas pela Pró - Reitoria Estudantil (PROEST) nos anos de 2010 e 2011, no qual atuei como coordenador e bolsista. O objetivo foi divulgar a importância da aplicação da Lei 11.645/08 que compõe o conjunto de Políticas Públicas de Ações Afirmativas implementadas em nosso país, a qual estabelece o ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena na educação básica. No avançar deste estudo tenho ficado cada vez mais convicto que as danças de caráter desobediente são as grandes responsáveis por me manter vivo e tantos outros. São objetos de análise desta proposta trabalhos artísticos apresentados no Painel Performático (mostra artística de dança) que dialogaram ou dialogam com a

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18 temática desta pesquisa. Consideramos também eventos artísticos e acadêmicos promovidos pela Escola de Dança da UFBA, os quais, também, abordaram ou abordam a temática desta pesquisa.

Assim, nossos objetivos se voltam a verificar se o curso de Dança da UFBA estabeleceu metas para incluir no projeto político pedagógico estratégias e ações artístico-pedagógicas que viessem a contemplar a Lei 11.645/08; os estudos decoloniais; pesquisar como os alunos compreendem o conceito dança negra/dança afro; que problematizem a temática das relações étnico-raciais; analisar as políticas de Ações Afirmativas implantadas na UFBA e suas implicações no Curso de Dança; identificar casos de racismos e discriminação racial ocorridos na Escola de dança ao longo de sua história; apresentar experimentos de uma dança desobediente, e, por fim contribuir para a reestruturação curricular da Escola de Dança.

As metodologias que vêm sendo desenvolvidas e construídas sob a perspectiva de fomentar provocações nesse amplo debate que é a pesquisa em dança fundamentam-se em estudos com um recorte específico acerca de alguns princípios da cosmovisão e filosofia africana dos povos iorubás com foco em Exu enquanto elemento constitutivo e dinâmico para existência humana, e inspira-se em meu modo pessoal de criação artística junto ao conceito de pesquisa-ação (Thiollent, 1986) e Molife K. Asante (2009) que pensa a afrocentricidade como princípio educacional em diálogo com Karenga (2003), o qual sugere Nguzo Saba (os sete princípios), ou seja, conjunto de elementos que nos ajudam a pensarmos as perspectivas afrocêntricas no ensino e aprendizagem de dança a partir da centralidade da comunidade, respeito à tradição, alto nível de espiritualidade e envolvimento ético, harmonia com a natureza, natureza social da identidade individual, veneração aos ancestrais e unidade do ser.

Esses sete princípios nos ajudam a pensar educação na perspectiva de uma dança desobediente e afrocentrada. Apresenta-se, portanto, articulações desses estudos com as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e com as Leis 10.639/03 e 11.654/08 que obrigam o ensino de História e Cultura Afro-brasileira, africana e indígena nas escolas, em vigor desde 2004. A necessidade desta abordagem surge mediante as complexidades do conjunto de conhecimentos envolvidos (ciências cognitivas, filosofia exuniana, arte e danças atadas às questões políticas) para falar de corpos que dançam em processo de formação.

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19 A partir dessa perspectiva, lanço-me no desafio de novas possibilidades metodológicas que contemplem melhor as especificidades e necessidades desta pesquisa, de modo que traço aqui indícios para construir uma proposta metodológica de pesquisa em dança a qual chamo de artística/exuniana. Uma perspectiva artística/exuniana como uma opção decolonial para performar/protagonizar uma desobediência epistemológica no pesquisar/dançar. Deste modo a decolonialidade procura romper com a universalidade do conhecimento que o colonialismo trouxe ao mundo.

A natureza epistêmica da cosmovisão/filosofia exuniana nos dá a possibilidade de termos outra visão de mundo e de ser humano, por ser Exu a tradução de uma esfera. Para os iorubás, Exu está associado ao poder da fertilização e das coisas. Por ser ele o senhor do princípio e da transformação, Exu é ordem, energia que se multiplica e se transforma na unidade elementar da existência humana. Neste momento, por me entender parte desta pesquisa, enquanto artista e acadêmico da dança, proponho a perspectiva de traduzir a energia de Exu sob o desafio de estabelecer as interlocuções comunicacionais entre as epistemologias díspares e convergentes, ciência e arte, que fundamentam e dão vida a esta pesquisa. Pois, é Exu energia vital da comunicação e força dinâmica da transformação no sistema religioso ancestral, negro-africano iorubá e em suas diásporas, é o movimento, dinâmica e sem ele não existe culto aos orixás nem vida para os seres.

Os seguintes procedimentos são classificados em cinco fases preliminares estruturadas enquanto metáforas ativistas negras que conduziram minha conduta ética e procedimental na pesquisa, sem estabelecer relações hierárquicas, por entender que estão articuladas e conecta-se de modo complementar cada uma delas. São elas: 1.Padê de epistemes afrocentradas, 2. Trilhas, 3. Encruzilhada, 4.Travessia, 5.Ilha da desordem.

A fase da análise dos dados coletados na pesquisa de campo será guiada pelas recomendações de Minayo (1992) no que se refere à relação entre o pesquisador e suas conclusões. A autora faz um alerta ao fato de que muitas vezes o pesquisador se ilude ao julgar a realidade dos dados, já de início, se apresenta de forma nítida e transparente. Outro perigo para o pesquisador consiste em envolver-se tanto com os instrumentos e não dar a devida relevância aos significados contidos nos dados da pesquisa. A partir deste referencial metodológico, a pesquisa

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20 de campo tem como metaestabelecer e lançar, com as constatações, questões que nos sensibilizem e conduzam a pensarmos sobre os avanços e desafios para a abordagem do estudo étnico racial no processo formativo de dança no Ensino Superior.

Em função dos níveis de afetações que os conhecimentos de natureza colonizadora atravessam e instauram suas ideologias epistemológicas nos ambientes educacionais, surgem os seguintes problemas de pesquisa: quais os impactos e implicações causados pela ausência ou presença da abordagem das relações étnico-raciais no processo formativo, enquanto cognitivo, dos futuros professores de dança, sejam pessoas negras ou não?

Destaco como pressuposto desta pesquisa que a ausência ou presença desta temática na formação de professores de dança ocasionam implicações nas próprias relações de pertencimentos identitários pessoais, étnico-culturais, bem como na própria atuação artística e socioeducativa, em detrimento dos processos históricos civilizatórios e colonizador aos quais somos submetidos. Há interferência, deste modo, nas dinâmicas de relações sociais e nos agenciamentos de evolução cultural, artística e sociocognitivo ocasionando lesões culturais e segregação cognitivas nas formas como são produzidos os conhecimentos de pessoas em sua maioria negras. Parte do enunciado desta dissertação, intenta traduzir preocupações e desafios aos quais pretende rebelar-se este estudo. Estabelecendo deste modo lócus de resistência às segregações sociocognitivas (XAVIER, MATTOS, 2012) e ao branqueamento e lesões culturais, por meio de uma dança desobediente afro-centrada, uma desordem fronte a ordem do sistema político e seus mecanismos de controle por via do racismo, patriarcalismo, genocídio, epistemicídio e determinismo cultural e epistemológico do sistema colonizador e eurocêntrico que se perpetuam, sobretudo no ambiente escolar e na Dança.

A formulação de Boaventura Sousa Santos acerca do epistemicídio na qual uma de suas ações é demarcada pela racialidade da cultura, de corpos e civilização de corpos outros com base no racismo. Torna possível compreender esse processo de violência, invisibilidade e inferioridade de copos/danças/saberes negros. É o conceito de epistemicídio que decorre, na abordagem de Santos sobre os modos operantes devastador do colonialismo e da visão civilizatória que até hoje alcança por meio de suas (re) formulações a perpetuação do racialismo em todas as instâncias de relações e estruturas que constitui nossa sociedade.

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21 Uma das preocupações e questionamentos está em como democratizar e decolonizar o conhecimento no ensino, formação e práticas artísticas e pedagógicas de Dança. Neste sentido a perspectiva decolonial objetiva problematizar a manutenção das condições colonizadas da epistemologia, buscando a emancipação absoluta de todos os tipos de opressão e dominação (apud ROSEVICS, 2017, p. 189).

Busco, com estudos e pesquisas de modo interdisciplinar em relação a outras áreas do conhecimento – que estão implicadas na formação acadêmica de Dança e que tenham pretensões de conhecer e aprender com os devires da África e suas diásporas corpóreas dançantes – terem como referência, para um projeto de dança desobediente, os contextos tradicionais, contemporâneos, culturais, políticos e filosóficos africanos e afro-brasileiros. Considero-os como aspectos fundamentais para a construção de um projeto corporal em Dança decolonial e sensível aos problemas do mundo contemporâneo globalizado.

Posso afirmar com toda veemência que ser negro ou pertencer a uma classe social (o que nos torna um só corpo entre nossas diferenças culturais e corporais) seja qual for a época social de sua existência, colonial/imperialista ou capitalista contemporânea, aqui no Brasil significa estar sob uma ideologia de uma pureza e supremacia cultural, artística, econômica e epistemológica branca. Podemos entender deste modo, que o racismo é apenas um dos aspectos desse tentacular e horripilante crime que a humanidade branca colonialista foi capaz, e continua sendo, de conceber este abuso.

Chamo atenção para a capacidade que formadores de professores de Dança têm de ampliar e fomentar o debate por meio do confronto de idéias aqui expostas e posicionamentos políticos a partir desta temática, em específico das relações étnico-raciais. Reafirmo o intuito como uma possibilidade factual e positiva no processo cognitivo artístico-acadêmico de Dança para os sujeitos em processo de formação, sejam negros ou não.

O lugar de fala pontua territórios que demandam revisões histórico-sociais das trajetórias de sujeitos que secularmente têm sido privados do exercício de direito democrático, de cidadania e da sua condição de existência humana. Esta perspectiva apresenta-se neste estudo como uma ação transformadora para um discurso ativista negro.

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22 Apontar e analisar o poder das palavras e ações metafóricas de natureza colonialista que incidem no corpo e na dança, emergentes do procedimento metafórico do corpo (RENGEL, 2007) e, a partir dos lugares de fala de cada sujeito que se percebe como negro, reinventar discursos metafóricos racistas, sejam verbais ou não, que se efetivem como agentes transformadores e corresponsáveis pela criação e protagonismo de uma desobediência afrocentrada civil e epistêmica na dança.

A dissertação se apresenta em cinco capítulos articulados de maneira complementar e as Considerações. Apresento a seguir um breve resumo dos capítulos.

1 INTRODUÇÃO: ABRINDO CAMINHOS, ARTIVISMO NEGRO NA DANÇA O primeiro capítulo é um convite a todos, sem que haja violação dos lugares de fala e apropriação cultural, para travarmos uma batalha ético-epistemológica e chamarmos para dentro de nossas abordagens artístico-pedagógicas e acadêmicas de dança, os saberes dos povos historicamente invisibilizados, silenciados colocados fora do sistema educacional brasileiro.

Neste momento são demarcados os objetivos e discussões que foram desenvolvidos na pesquisa demarcada por meu lugar de fala, posicionamento político enquanto artista e pesquisador ativista negro de Dança, de maneira a evidenciar indícios das implicações sociopolíticas e educacional da sociedade brasileira, sobretudo na pauta das relações étnico-raciais como fator determinante para que possamos compreender as lutas antirracistas e do outras minorias sociopolíticas, assim como outras problematizações que são e dão vida a esta pesquisa.

Estima-se dar subsídios para as reflexões necessárias e urgentes acerca de uma revisão no processo de formação de Dança no Ensino Superior a partir dos estudos étnico-raciais sob uma perspectiva decolonial, de maneira que possamos entender esta demanda social não como sendo responsabilidade única de professores, artistas negros e em certa medida da população afrodescendente e indígena.

Tenho como parâmetro nossas próprias reivindicações e suas especificidades, sendo ele de classe, gênero, raça, entre outras, proponho o desafio político a partir das reflexões apresentadas nesta pesquisa de revermos nossas

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23 ações enquanto cidadãos, artistas, professores, pesquisadores e acadêmicos de Dança. De modo que possamos assumir uma postura ética e ensejarmos pautas comuns a todos, por exemplo, as políticas elementares para o bem-estar social de todos.

2 CAMINHOS ENCRUZILHADOS: UMA PERSPECTIVA ARTÍSTICA EXUNIANA PARA PESQUISAR/DANÇAR NA FORMAÇÃO EM DANÇA

Aqui traço as origens e implicações sociais, políticas e culturais que foram construídas na sociedade brasileira e, de modo mais amplo, no mundo em torno do conceito de raça e seus desdobramentos determinantes para estabelecer e estruturar as relações sociais guiadas pelo fator cor e outros marcadores físicos e econômicos. Neste capítulo, pontua-se com base em uma breve abordagem do contexto histórico das lutas antirracista de ativistas negros brasileiros que contribuíram, ao longo da história, para instaurar e ampliar o debate das desigualdades na sociedade brasileira pautada pelas relações étnico-raciais.

Este breve apanhado histórico irá nos ajudar a compreender as determinações das políticas de ações afirmativas das Leis 10.639/03 e 11.645/08 que tornaram obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena em todas as escolas públicas e particulares, do ensino fundamental até o ensino médio, o que remete novos desafios também para a formação dos professores.

A partir desses referenciais serão abordadas as bases epistemológicas e dimensões críticas e reflexivas, mesmo que de modo sucinto, a fim de compreender a importância das políticas de ações afirmativas para a população negra brasileira, o significado das Leis 10.639/03 e 11.645/08 e para se pensar na inclusão desses estudos na formação superior de Dança.

Como apontado, há um longo trajeto das raízes do racismo, compreender as dimensões e rastros dessas raízes torna-se fundamental para termos a dimensão da complexidade do processo pelos quais passaram as políticas públicas de ações afirmativas destinadas à população negra. Ressalto aqui a especificidade do tema, portanto, não serão abordadas políticas de ações afirmativas para outros segmentos populacionais.

Deste modo, levando em conta as contribuições das danças afro-brasileiras, sejam elas para o contexto cênico ou não, estas foram e continuam sendo um marco

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24 na história da Dança no Brasil. Por isso, na busca por esse entendimento dessas especificidades das manifestações culturais populares afro-brasileiras e suas reconfigurações para cena na dança, apresento uma breve análise na trajetória artística de Mercedes Baptista. Bailarina singular e pesquisadora, Mercedes Baptista foi nomeada a mãe da dança afro-brasileira e trouxe como principal lema a criação de uma dança que valorizasse o corpo e a dança do negro brasileiro com foco nas matrizes africanas e afro-brasileiras.

Ainda neste capítulo, problematiza-se a falta de metodologias existentes para a pesquisa em dança com complexidade anunciada nesta pesquisa, onde os níveis de afetações entre o pesquisador e o campo de pesquisa rompem fronteiras sejam elas científicas ou acadêmicas do ponto de vista de métodos de pesquisa. Neste sentido, lança-se uma perspectiva de metodologias para dar conta das implicações surgidas ao longo desse processo/pesquisa.

Pretendo fomentar provocações nesse amplo debate que é pesquisar em Dança, com um recorte especifico acerca de alguns princípios da filosofia africana dos povos iorubás com foco na mitologia de Exu, junto ao conceito de pesquisa-ação (THIOLLENT, 1986) e Molife K. Asante (2009) que pensa a afrocentricidade como princípio educacional em diálogo com Karenga (2003) quem sugere o Nguzo Saba (sete princípios), para pensar educação na perspectiva de uma dança desobediente afrocentrada.

3 CONSTRUINDO NINHOS DE BARRO: TECENDO CONEXÕES COGNITIVAS

A compreensão do corpo nessas considerações ocorre a partir de uma abordagem reflexiva capaz de criar parâmetros de análises, que contribuam para formular um projeto reflexivo e político, propício para pensar um mundo com princípios de alteridade e diversidade étnico-cultural e social. Abordaremos neste capítulo questões epistemológicas acerca do entendimento de corpo e seu processo cognitivo, a partir dos estudos de Varella (1991) Damásio (2011), Ramachandran (2014) e Rengel (2007, 2015).

Para analisar e contextualizar as afetações sociocognitivas das metáforas nomeadas neste estudo como colonialistas, de natureza racista e as metáforas ativistas negras, com a natureza de empodermanto, presentes em nossas relações

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25 sociais e na dança, iremos abordar a operacionalidade cognitiva da metáfora, denominada por Rengel (2015, 2007) de procedimento metafórico do corpo.

Estudamos também – ainda para a questão da metáfora como um modo de conhecer o mundo e a si mesmo – uma das fontes de Lenira Peral Rengel para sua pesquisa de doutoramento que foi Lakoff e Johnson (2002, 1999). As pesquisas do neurocientista Ramachandran (2014) acerca das descobertas das capacidades dos neurônios-espelho referenciam para pensar na profusão de lesões culturais por meio de metáforas colonialistas/colonizadoras (gestuais, verbais), as quais a grande maioria da população negra e branca é submetida, e nelas se espelham, inclusive na dança. Estes fatos servirão como base para entendermos o segundo capítulo e dimensionarmos os níveis de afetações do racismo.

4 DANÇA DESOBEDIENTE AFROCENTRADA

Nesta pesquisa, penso a Dança Desobediente Afrocentrada a partir de algumas perspectivas epistemológicas, entre elas está a da Afrocentricidade de Molife K. Asante (2009) que propõe a “Afrocentricidade” como uma epistemologia decolonial para pensarmos as condições socioeconômicas e culturais de pessoas negras a partir da sua localização centrada na África e suas diásporas, a Lei 11.645/08, os atuais estudos de pesquisadores decoloniais como (Quijano, 2000) e, os estudos de Santos (2010) e o ativismo na Arte/dança LGBTTQI+ de bichas pretas em interseccionalidade de Raça, gênero, sexualidade e classe. Proponho ampliarmos o diálogo para pensarmos uma dança de estética negra brasileira ativista contemporânea como ação estratégica de sobrevivência cognitiva do corpo negro em seus modos de (re) existência.

De maneira que possamos mensurar a construção de uma política cultural, artística e educacional de um projeto corporal emancipatório e reestruturador das representações sobre o corpo negro na dança e na educação. Visando superar os desafios que este conhecimento ainda enfrenta como uma ação emancipatória e como uma possibilidade de descolonizar o conhecimento na criação e formação artística/acadêmica de dança. Aos modos hegemônicos de dança é revelar as próprias maneiras de dançar.

Vale ressaltar que, não se trata de uma emulação das manifestações dos orixás ou da cultura e sim de suas releituras para o contexto pedagógico e cênico da Dança com as possibilidades de (re) criação que a arte permite contextualizada para

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26 contemporaneidade que somos e vivemos. Dança desobediente afrocentrada é um convite a encontros transculturais, decolonias, afrofuturismo e não violento nos modos de crer, ensinar, resistir, ser, sobreviver de dançar. Formulo aqui um pressuposto que, uma dança desobediente afrocêntrica deve começar seu lugar de reflexão a partir de nossa ancestralidade de modo interseccional com nossas identidades de gênero, sexualidade, classe e raça.

Objetivo desse modo, problematizar com crítica inscrita no corpo os comportamentos, gestos, discursos, a função político-social propagados no mundo e presentes nos discursos dos espaços educacionais formais, midiático e artístico/acadêmicos de Dança a partir da dança desobediente afrocentrada. A busca se dá por ampliar os diálogos e fomentar reflexões e análises que contribuam no processo de formação desses futuros professores de dança, visando a sua atuação na sala de aula e suas criações, configurações estéticas artísticas de dança.

5 MEMÓRIAS DE CORPOS QUE DANÇAM DESOBEDIENTES: A PRESENÇA NEGRA NA ESCOLA DE DANÇA DA UFBA

Ao retornarmos às origens da formação em Dança no Brasil, na UFBA, pretendo por meio do recorte da temática das relações étnico-raciais identificar qual o planejamento artístico/pedagógico para se pensar a formação em Dança e quais as epistemologias que fundamentam esta formação. No capítulo cinco, intento um espaço de respostas para questões suscitadas nos capítulos dois e quatro.

A pauta da pesquisa é analisar as existências de indícios de danças desobedientes, ou que poderiam assim ser chamadas, e da existência de abordagens metodológicas colonizadoras e civilizatórias. A análise é realizada de forma que se revelem contradições nos modos de conceber a configuração estética da dança negra.

Este capítulo expõe um levantamento bibliográfico de pesquisas que tratam da formação e currículo e produção artística da Escola de Dança da UFBA. Destacam-se as dissertações de mestrado de Nadir Nóbrega (2006) e Margarida Seixas Trotte Motta (2009), nas quais são tecidas considerações que me ajudaram no entendimento das questões abordadas nesta pesquisa acerca das implicações étnico-raciais e os indícios de uma dança desobediente.

Em Denílson Francisco das Neves (2016) há parâmetros para entender a estrutura curricular da Escola de Dança da UFBA e as perspectivas para

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27 reformulação curricular pensando os saberes das danças populares como projeto corporal para ensino e aprendizagem de dança.

Neste quinto capítulo são abordadas também proposições formativas que foram realizadas pela Escola de Dança que problematizaram ou suscitaram reflexões a partir, ou não, das políticas de ações afirmativas e da Lei 11.645/08. Faço uma reflexão sobre possíveis contradições entres os eventos formativos propostos e a política de identidade adotada na estrutura da Escola no discurso presente na produção artística de discentes e docentes.

Esta reflexão permite identificar as intersecções entre estas ações e as proposições desta pesquisa para a possibilidade de uma formação em dança atenta à realidade da população afro-brasileira fora e dentro dos contextos educacionais. O período deste recorte é durante minha trajetória na Escola de Dança da UFBA que compreende o ano de 2014, como aluno especial, até o presente momento (2018) como mestrando do Programa de Pós-Graduação em Dança.

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28 2 CAMINHOS ENCRUZILHADOS: UMA PERSPECTIVA ARTÍSTICA EXUNIANA PARA PESQUISAR/DANÇAR NA FORMAÇÃO EM DANÇA

2.1. DANÇA ÒKÒTÒ: ABRINDO CAMINHO

Figura 1 – Representação de Exu òkòtò

Fonte: http://iyalorisarosane.blogspot.com.br/2010/07/okoto.html Èsù yè, Laróyè!1

A jí kí Barabo e mo júbà, àwa kò sé, A jí kí Barabo e mo júbà, e omodé ko èkó Ki Barabo e mo juba Elégbára eÈsù l’ònòn Nós acordamos e cumprimentamos Barabô, A vós, eu apresento meus respeitos. Que vós não nos façais mal.

Nós acordamos e cumprimentamos Barabô, A vós, eu apresento meus respeitos.

A criança aprende na escola (é educada, ensinada) Que a Barabô eu apresento meus respeitos, Senhor da força, sois o Exu dos caminhos.2

A canção escolhida para abertura deste diálogo de caminhos encruzilhados já anuncia as perspectivas artísticas, filosóficas, cognitivas, metafóricas e educacionais de dança, nas quais fundamento este ensaio metodológico exuniano. Essa inspiração artística não trata de uma busca essencialista por uma ancestralidade romantizada e folclórica em torno da

1 Significa: Viva Exu! Ou Salve Exu (OLIVEIRA, 2004, p. 19 apud SOARES, 2016, p.23). 2 Música para Exu. (OLIVEIRA, 2004, p. 17 apud SOARES, 2016, p. 23).

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29 mitologia/filosofia africana dos orixás e principalmente em torno da figura do orixá Exu3 no contexto brasileiro. Adianto que esta é uma posição

extremamente política, em convergência no que se tem estruturado no campo dos estudos culturais e sociais sob decoloniedade e colonialidade do saber (SANTOS 2010), do poder (QUIJANO 1989).

As perspectivas decolonial nas quais dialogo nesta pesquisa para propor uma dança desobediente afrocentrada e uma perspectiva metodológica artística exuniana para pesquisa/dançar, assim como repensarmos a formação artística e pedagógica dos futuros professores de dança da Escola de Dança da UFBA, estão alinhado ao pensamento do grupo Modernidade/Colonialidade (M/C) formado no final de 1990 por intelectuais latino-americanos de diversas universidades das Américas. Tais como: Aníbal Quiijano, Enrique Dussel, Wlater Mignolo, Immanuel Wallerstein, Santiago Castro-Gómez, Boaventura Santos, Nelson Maldonado-Torres entre outros (Bllestrin, 213).

De modo que demarcam e ampliam os estudos sobre os aspectos e os modos operantes específicos que a colonização operou, e ainda opera, na America latina, sobretudo seu poder na hegemonia epistemológico. Por tanto defender a opção decolonial epistêmica, teórica e política é uma ação urgente para compreendermos e agir no mundo, que nos marca pela permanência da colonialidade global nos diferentes níveis de nossas vidas pessoais e coletivas, principalmente as existências demarcada por corpos e cultura/saberes negras. Deste modo a decolonialidade procura romper com a universalidade do conhecimento que o colonialismo trouxe ao mundo. Ao analisar a colonialidade presente na modernidade, os decoloniais. Expõem as marcas deixadas pelo colonialismo na sociedade contemporânea, de forma a desenvolver a pluralidade de muitos outros conhecimentos.

Neste sentido a decolonialidade refere-se ao processo que busca transcender historicamente a colonialidade e, de acordo com estes autores, supõe um projeto mais profundo e uma tarefa urgente para o nosso presente de subversão do padrão de poder colonial. Ou seja, movimento epistemológico

3 Para os nagôs dos candomblés tradicionais da Bahia, Èsù ou Exu –escrito na forma abrasileirada- é a principal entidade, não só do culto aos orixás em que ele é a força dinâmica que move o sistema mítico ancestral, como também na vida, no dia a dia.

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30 fundamental para atualização da tradição crítica do pensamento latino americano. Demarcando assim, o vocábulo “decolonial” utilizado nessa pesquisa no lugar de “descolonial” em virtude da indicação de Walter Mignolo “para diferenciar os propósitos do Grupo Modernidade/Colonialidade e da luta por descolonização do pós-guerra Fria, bem como dos estudos pós-coloniais asiáticos” (ROSEVICS, 2017, p. 191).

As Perspectivas decolonial objetiva problematizar a manutenção das condições colonizadas da epistemologia, buscando a emancipação absoluta de todos os tipos de opressão e dominação, ao articular interdisciplinarmente cultura, política e economia de maneira a construir um campo totalmente inovador de pensamento que privilegie os elementos epistêmicos locais em detrimento dos legados impostos pela situação colonial. Grosfoguel (apud ROSEVICS, 2017, p. 189) aponta que “é preciso descolonizar não apenas os estudos subalternos como também os pós-coloniais”. O pensamento decolonial reflete sobre a colonização como um grande evento prolongado e de muitas rupturas e não como uma etapa histórica já superada. Deste modo quer salientar que a intenção não é desfazer o colonial ou revertê-lo, ou seja, superar o momento colonial pelo momento pós-colonial. A intenção é provocar um posicionamento contínuo de transgredir e insurgir. “O decolonial implica, portanto, uma luta contínua” (COLAÇO, 2012, p. 08).

São sob esses princípios que a decolonialidade procura romper com a universalidade do conhecimento que o colonialismo trouxe ao mundo. Ao analisar a colonialidade presente na modernidade, os decoloniais. Expõem as marcas deixadas pelo colonialismo na sociedade contemporânea, de forma a desenvolver a pluralidade de muitos, muitos conhecimentos. É pensando nessa relação estrutural de poder que Quijano (1989) conceitua o que ele chama de colonialidade do poder muito usado pelo grupo Modernidade/Colonialidade (M/C).

A colonialidade do poder é um conceito desenvolvido originalmente por Aníbal Quijano,em 1989, e amplamente utilizado pelo grupo. Ele exprime uma constatação simples, isto é, de que as relações de colonialidade nas esferas econômica e política não findaram com a destruição do colonialismo. O conceito possui uma dupla pretensão. Por um lado, “a continuidade das formas colônias de dominação após

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o fim das administrações coloniais, produzidas pelas culturas coloniais e pelas estruturas do sistema-mundo capitalista moderno/colonial.” (GROSFOGUEL, 2008, p.126).

O conceito colonialidade do poder traz de novo é a leitura da raça e do racismo como “o principio organizador que estrutura todas múltiplas hierarquias do sistema-mundo” (GROSFOGUEL, 2008, p. 123). No entanto é importante destacar que ao pensarmos em estratégias e produção de conhecimento decoloniais para combater a colonialidade do poder, se faz necessário entender que os níveis de afetações dessa colonialidade são complexos e se abrange para outras esferas de relações que não se finda no poder. Como nos explica Mignolo (2010, p.12) ao ampliar o conceito de colonialidade para outros âmbitos de “estrutura complexa e de níveis entrelaçados”. São eles: controle da economia, controle da autoridade, controle da natureza e dos recursos naturais, controle do gênero e da sexualidade, controle da subjetividade e do conhecimento.

Ainda tomando como base os estudos de Mignolo (2003) e Quijano (2000) sobre a complexidade dos modos de operação no mundo e com especificidades na America Latina. O autor afirma que colonialidade se reproduz em uma tripla dimensão: a do poder, do saber e do ser. E mais do que isso: a colonialidade é o lado obscuro e necessário da modernidade; é a sua indissociavelmente constitutiva (MIGNOLLO, 2003, p. 30). Maldonado-Torres (2007) nos acrescenta que é possível situar o contexto de emergência da colonialidade e da colonialidade do poder: guerra, genocídio e conquista das Américas (2008, p.136) que podem ser mais bem compreendida pela lógica da diferença como tipo de classificação social demarcada pela ideologia de raça, da superioridade e pureza de uma raça e humanidade branca. Para Quijano (2000, p.342) raça, gênero e trabalho foram às três linhas principais de classificação no século XVI.

A colonialidade é um dos elementos constitutivos e específicos do padrão mundial de poder capitalista. Se funda na imposição de uma classificação racial/étnica da população do mundo como pedra angular do dito padrão de poder e opera em cada um dos planos, âmbitos e dimensões materiais e subjetivas da existência social cotidiana e da escala social. Origina-se e mundializa-se a partir da América (QUIJANO, 2000,p. 342).

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32 Pretendo fomentar provocações nesse amplo debate que é pesquisar em Dança, com um recorte específico acerca de alguns princípios da filosofia africana4 dos povos iorubás com foco na mitologia de Exu, junto ao conceito de pesquisa-ação (THIOLLENT, 1986) e a partir de Molife K. Asante (2009) que pensam a afrocentricidade como princípio educacional em diálogo com Karenga (2003), quem sugere o Nguzo Saba (sete princípios) para pensar educação na perspectiva de uma dança desobediente afrocentrada. Também apresento a relevância das articulações desses estudos com as Diretrizes Curriculares Nacionais para educação das Relações Étnico-Raciais e com as Leis 10.639/03 e 11.654/08 que obrigam o ensino de História e Cultura Afro-brasileira, Africana e Indígena nas escolas, em vigor desde 2004.

A Escola de Dança da UFBA se mostrou um ambiente de extrema complexidade como campo de pesquisa, com sua disseminação em Salvador, na Bahia e no Brasil, por meio de estudantes que se formam e dão aulas em Escolas públicas de Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior, por meio de grupos de dançarinos profissionais e amadores que são estudantes da Escola, suas professoras e professores que, em sua grande maioria, têm profícua atuação.

As relações docentes e discentes na Escola de Dança, sua estrutura curricular e política, além do fato ser um ambiente de tensões constantes, exigiu um esforço ético considerado fora do normal, levando em conta que a pauta das relações raciais, racismo nesta pesquisa foram assuntos recorrentes ao ponto de me afetar profundamente e inclusive ao ponto de tornar-me parte deste estudo por ser vítima de racismo institucional, homofobia e preconceito de classe.

4 A filosofia africana é geralmente negligenciada no estudo de Filosofia, sem que se saibam claramente as razões para isso. Alguns argumentam que o fato de ela estar estreitamente vinculada às suas tradições orais tornaria difícil compartilhar a sua extensa história com uma audiência mais ampla. Outros argumentam que a sua natureza afrocêntrica a faria menos atraente para o resto do mundo.

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33 Todas estas violências também sofridas por outros alunos da minha turma na Pós- graduação provocou vários debates e críticas a algumas posturas que para nós pareciam racistas e abuso de poder por parte de alguns professores que tratavam as pesquisas voltadas para relações raciais e ancestralidade com indiferença e imposição de suas epistemologias eurocêntricas. Mesmo que estes fatos fossem questionados pelos alunos, os diálogos com outras epistemes afrocentradas e com perspectiva decolonial, nenhuma ação ética e moral foi tomada. Estas inquietações e o ambiente segregacionista de epistemes foram muito presentes no processo de estruturação de meu projeto de pesquisa. Um caos tão desafiador me fez querer procurar metodologias, métodos e procedimentos onde eu pudesse agregar para dar conta de meu problema de pesquisa.

Assim, de olhos e ouvidos bem abertos, como um vigia, pois é espreitando –como diria Foucault -, como numa caçada ou investigação policial, buscando a melhor forma de entender a regra do jogo histórico, onde menos se espera é que talvez apareça aquilo que não é possuído pela história. (SOARES, 2016, p.17)

Ao tratar de um método de pesquisa adequado às especificidades do ambiente de dança e aos modos como se produz conhecimento sobre o corpo que dança e estabelece conexões pelo ato político/orgânico de mover-se dançando. Estes modos dos corpos que dançam e operaram no mundo ganham outras dimensões, transcendentes aos métodos tradicionais, até mesmo os métodos mais progressistas existentes nas ciências humanas não dão conta das categorias filosóficas, cognitivas, históricas e da produção de subjetividades imbricadas na Dança, assim como a forma peculiar dos corpos que dançam e produzem reconhecimentos em seu universo particular, seu “Umwelt” 5 (mundo particular).

5 O conceito de “Universo particular” ou privado foi proposto por Jakob Von Uexkull em 1992 com o termo Umwelt. (ALBURQUEQUE, 1999, p.92)

Referências

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