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1 ANTECEDENTES MEDIEVAIS

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Academic year: 2021

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1 – ANTECEDENTES MEDIEVAIS

Á notícias de que, no tempo de D. Afonso Henriques, já os portu- gueses haviam combatido no mar contra os mouros. São tam-bém conhecidas incursões comerciais a Bruges e outras cidades, no Norte da Europa e no Mediterrâneo, ainda no século XII. Em 1317, D. Dinis chamou marinheiros genoveses para organizarem a marinha portuguesa e, no tempo de seu filho, D. Afonso IV, foram feitas incur-sões às Canárias.

Isto mostra que a navegação em Portugal era uma actividade prati-cada desde o início da nacionalidade. Mas é do século XIV o seu gran-de gran-desenvolvimento, proporcionado por D. Fernando, a nível fiscal e de segurança marítima, aspecto em que foi pioneiro, fomentando a construção naval e o incremento da navegação comercial, cujos riscos atenuou.

Os navios utilizados eram de muitos e diversos tipos, em geral mo-vidos a remos e eventualmente com uma vela de apoio. Algumas influências dos barcos dos povos do Norte, dinamarqueses, noruegue-ses e normandos, haviam sido introduzidas no desenho, mas a técnica de navegação era essencialmente mediterrânea. Era uma navegação principalmente à vista da costa, pelo que a bagagem de conhecimentos e o instrumental necessário ao piloto do Mediterrâneo eram bem mo-destos. Os seus conhecimentos cosmográficos e os regimentos náuti-cos de que dispunha eram rudimentares e, como instrumentos, dispu-nha apenas do relógio de areia, da agulha magnética com a rosa-dos--ventos, de compassos e régua e da carta-portulano, carta que constava dos “périplos”, nome grego dado na Antiguidade a textos com a descri-ção das orlas marítimas, para a leitura das direcções de navegadescri-ção entre dois pontos. Este vocábulo deu em italiano o nome de portulano.

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No final do século XII e no início do imediato, apareceram as pri-meiras referências à agulha magnética em autores europeus. As mais antigas, porovavelmente, encontram-se no poema satírico La Bible, de Guyot de Provins (c. 1205), mas a sua descrição e das suas proprieda-des foram feitas de forma bastante aceitável, em 1269, por Petrus Perigrinus.

As propriedades do ferro magnético eram conhecidas desde a Anti-guidade, mas crê-se ter sido no século XII que se reconheceu que a agulha magnética, colocada a flutuar sobre a àgua, tomava sempre a mesma direcção, com uma das pontas apontando para o Norte (magné-tico), que inicialmente se supôs ser a direcção da Estrela Polar. A primi-tiva forma da agulha magnética terá sido importada do Oriente, onde provavelmente era usada pelos chineses nas suas navegações, tendo sido trazida para o Ocidente pelos árabes. Mais tarde, acrescentou-se-lhe a rosa-dos-ventos e encerrou-se numa caixa, formando-se a bússola.

Tal como a invenção do relógio libertou a humanidade de medir o tempo pelo Sol, com todas as contingências da visibilidade deste, também a bússola orientou a humanidade no espaço e alargou a época e as estações de viajar pelo mar. No Mediterrâneo, em dias encobertos, até marinheiros experimentados se arriscavam a perderem-se. Por essa razão, no século XIII, o tráfego marítimo entre pontos distantes era interrompido no Inverno. Era costume os barcos permanecerem no porto durante o mau tempo, que durava de Outubro a Março. Por exemplo, a carreira de Veneza para o Levante, que abastecia esta cida-de dos produtos orientais, só podia efectuar uma viagem cida-de ida e volta por ano. Partia de Veneza na Páscoa e regressava em Setembro, antes de começar a estação dos céus encobertos. Outra, a frota de Inverno, partia de Veneza em Agosto, mas tinha de passar os meses de Inverno no seu destino, só regressando a Veneza no mês de Maio do ano se-guinte. As frotas ficavam imobilizadas durante meio ano.

No século XIV, a bússola chega ao Mediterrâneo e permite que se façam duas viagens de ida e volta cada ano, pois a orientação do navio já não dependia do tempo encoberto. Os ventos predominantes no Mediterrâneo eram de molde a dar vantagem a navegar nos meses enevoados. Nos meses de céu claro, de Maio a Outubro, os navios que regressavam a Veneza tinham de fazer um desvio por Chipre, devido

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aos ventos predominantes de Norte e Noroeste. Nos meses de mau tempo, um vento soprando na mesma direcção da rota a seguir facili-tava a travessia directa.

Quanto às cartas-portulano, a sua história é mais complexa. Eles constituem, do ponto de vista cartográfico, um estádio entre os mapas que na Antiguidade representavam a Terra e os que foram desenvolvi-dos na época desenvolvi-dos descobrimentos para uso da navegação astronómica. Os mapas da Antiguidade de nada serviram para a navegação; e os portulanos, criados para esse fim, tiveram de ser melhorados, pois davam informações erradas, quando usados no Atlântico.

Os mapas na Antiguidade eram produto de concepções de fantasia. Mas, subitamente, no século XIII, aparecem na Europa cartas de estilo e de aspecto completamente diferentes, representando com bastante aproximação as margens do Mediterrâneo, as costas europeias até ao Norte de França, as costas Sul das Ilhas Britânicas e o Mar Negro. Eram mapas para uso da navegação, constantes dos périplos. Estes descreviam as costas, para referência dos navegantes e as cartas eram a sua expressão gráfica.

O portulano mediterrâneo insere-se numa tradição que vem, pelo menos, desde o século V a.C., pois é dessa época o Périplo do Mar

Eritreo, escrito em grego, de que existem duas cópias. Outro, do sécu-

lo I, de que se conservam alguns fragmentos, tem por título Periplus do

Mar Interior, ou seja, do Mar Mediterrâneo. Desconhecidos autores

italianos melhoraram os textos clássicos, corrigiram alguns erros e acrescentaram-lhe dados importantes para a navegação, sempre numa linguagem simples e directa, como convinha a navegadores de pouca cultura, como eram os da época. Dos italianos, a tradição passou a outros povos mediterrâneos (aragoneses, franceses, castelhanos) e por-tugueses e, em seguida, a todas as marinhas europeias, já sob a desig-nação de roteiros.

A carta-portulano era um mapa complementar dos textos descriti-vos. A sua existência a bordo está provada por textos que chegaram aos nossos dias: em 1294, um navio aragonês foi capturado por corsários, tendo o príncipe de Aragão reclamado a devolução da embarcação com os seus pertences, entre os quais constava um “compassum”, o outro nome dado às cartas-portulanos; outro texto conta que, em 1270, tendo

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D. Luís, rei de França, navegado no Mediterrâneo para Tunes, depois de uma tempestade, junto à Sardenha, pediu que lhe indicassem onde estava, o que o piloto fez, mostrando-lhe um mapa. Esta é a mais antiga referência da existência de cartas a bordo de navios. Quanto à antigui-dade destas cartas, a mais antiga conhecida e que chegou até nós é a chamada carta Pisano, cuja data é objecto de suposições. Observando as povoações que nela constam, apenas se pode afirmar que é posterior a 1275 e anterior a 1291. A primeira datação indiscutível pertence à carta do genovês Petrus Vesconte, de 1311. Estas cartas eram desenhadas numa pele de carneiro ou de vitelo, cuja forma se mantém na carta finalizada. Pisa, Génova, Catalunha, Maiorca, Veneza, marcam a cro-nologia do nascimento e desenvolvimento da cartografia medieval.

Os dados para o estabelecimento destas cartas-portulanos saíam de informações de mareantes, principalmente pescadores, e da prática dos pilotos e, na sua execução, ficaram célebres as escolas mediterrâ-neas de Génova, Veneza e Maiorca. Estas cartas, apesar de geografica-mente incorrectas, adaptavam-se perfeitageografica-mente à náutica praticada, em que as referências de posição eram dadas apenas pelo recorte da costa. Algumas obras cartográficas, catalãs e itálicas, do período que precede os descobrimentos portugueses, incluem também desenhos e regras náuticas e cosmográficas relacionadas com a arte de navegar da época, mas em nenhuma, nem em qualquer outro documento, se encontra referência à latitude e longitude, aplicadas à navegação.

Com a navegação à vela nem sempre se podia seguir o rumo deseja-do, ou por a direcção em que soprava o vento o não permitir ou por qualquer ilha ou outro acidente se interpuser no rumo. Usava-se então a técnica de bolinar. O barco avançava em ziguezague, mas para determi-nar quando se havia de mudar de rumo e saber, ao fim de uns tantos bordos onde se estava, foi criado um conjunto de duas tabelas, denomi-nado “toleta ou raxon de marteloio”. A primeira tabela (suma) indica, em função do rumo alternativo tomado, quanto o navio se afasta

(alar-ga) do rumo desejado e a distância percorrida se mantivesse o rumo

inicial (avança); e a segunda (avanço de retorno), em função do rumo escolhido para regressar ao rumo inicial, indica a distância a navegar até o encontrar (retorno) e quanto o navio avançou relativamente ao rumo inicial.

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Na figura 1, mostra-se a composição geométrica do descrito e uma tabela – toleta de marteloio.

Figura 1 – Descritivo geométrico e “Toleta de Marteloio”, em A Marinharia dos Descobrimentos, de A. Fontoura da Costa,

cap. XXX, pp. 360/361.

Estas tabelas eram um complemento das cartas-portulano para efeitos de navegação, pois baseiam-se, tal como as cartas-portulano, no rumo e estima da distância percorrida. Encontravam-se transcritas em diversos portulanos. A tabela acima é reproduzida duma carta de André Bianco, de 1436.

Dispunha também de regras ou rodas de marés, marés que, sendo diminutas no Mediterrâneo, era importante conhecer em estreitos e portos do Atlântico, quando a navegação se prolongasse até eles. Era importante saber as horas de preia-mar e baixa-mar em cada porto, forçadamente necessárias para entrarem ou saírem das barras e bocas dos rios. Dada a ligação destas às fases da Lua, o cálculo da hora da maré fazia-se a partir destas.

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Duarte Pacheco Pereira expõe, no seu Esmeraldo, um processo. Considerava a rosa-dos-ventos com as suas 32 quartas (uma quarta é 1/8 do ângulo reto, distância em graus entre dois pontos cardinais seguidos) associada a um quadrante horário de 24 horas. Cada quarta representa 45 minutos, valor muito próximo do atraso da Lua relati-vamente ao Sol, na sua deslocação diária, pelo que se toma este valor como arredondamento daquele, logo, a Lua atrasa-se uma quarta cada dia, relativamente ao Sol. Com aquela associação, há uma correspon-dência entre os rumos da rosa e as 24 horas do dia, sendo que o Sul corresponde às 12 horas. O movimento diurno da Lua contava-se, assim, pelos mesmos rumos da agulha.

Estando a Lua em conjunção com o Sol, os dois astros andam pelo mesmo rumo e nesse dia é maré-cheia. Depois da conjunção, a Lua afasta-se do Sol uma quarta cada dia. Para se saber a fase da maré em qualquer dia e hora, tem de se contar a partir do rumo do Sol, corres-pondente à hora, tantas quartas quanto os dias da idade da Lua, nessa data. A idade da Lua é o número de dias após o novilúnio, o dia de Lua Nova.

Também se podia saber a hora de qualquer preiamar por cálculo, a partir do estabelecimento, sendo este o tempo a que se dava a preia-mar, a seguir ao novilúnio. Os portulanos mais antigos continham os rumos da Lua para os diferentes portos, correspondentes ao preiamar do novilúnio, Convertidos em tempo, tinha-se o estabelecimento. Adicionado este a 4/5 x a idade da Lua, achava-se a hora de qualquer preiamar.

Para calcular dias do calendário, havia um processo expedito ser-vindo-se das mãos. Estas também eram utilizadas para calcular os dias das festas religiosas e para o cálculo das marés.

São processos que vêm expostos nos livros de Marinharia, de João de Lisboa, no de André Pires e no Reportório dos Tempos, de Valentim Fernandes, que foram estudados por Pereira da Silva e estão descritos em A Marinharia dos Descobrimentos, de Fontoura da Costa. São baseados em expedientes muito antigos, como sejam o de Diniz,

O Exiguo, do século VI, e o do astrónomo grego Meton (490 a.C.).

A técnica de navegação no Mediterrâneo era produto da experiên-cia acumulada por sucessivas gerações de pilotos, transmitida familiar

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ou cooperativamente, e manteve-se inalterável por largos anos, pois, dois séculos depois de os portugueses terem criado no Atlântico novos métodos (a navegação astronómica), ainda se praticava no Mediterrâ-neo a mesma técnica, denominada de “rumo e estima”. O rumo era dado pela agulha magnética e a distância percorrida era estimada pelo piloto, ambos com a ajuda das linhas de rumo traçadas na carta--portulano. Como utensílios, além da carta e da bússola, tinham um par de compassos para “marcar o ponto” na carta e algumas regras avulsas, como as indicadas, dadas pela experiência própria e/ou alheia.

Referências

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