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CLARA DE ASSIS: REFLEXÕES SOBRE O DEBATE HISTORIOGRÁFICO E A DINÂMICA DA SUA NORMATIVA

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CLARA DE ASSIS: REFLEXÕES SOBRE O DEBATE

HISTORIOGRÁFICO E A DINÂMICA DA SUA NORMATIVA

AGUIAR, Veronica Aparecida Silveira (UNIR/USP)

O interesse historiográfico pela normativa de Clara de Assis (1194-1253) é relativamente recente. Inicialmente, os historiadores deram grande importância para a história das mulheres; em parte como consequência dos movimentos e afirmações da emancipação feminina nos países Ocidentais na segunda metade do século XX. Esta nova historiografia levantou questões preliminares para a Idade Média, por exemplo, o papel e a posição das mulheres em relação ao monopólio do sagrado masculino. Além disso, houve uma importante valorização pela historiografia das fontes produzidas por mulheres daquele período. As mulheres passaram a ser objeto dos mais variados estudos da história das mentalidades e dos mais variados postulados a partir dos papeis sociais que ocupavam: prostitutas, poetisas, místicas, santas, guerreiras, etc; todas ganhavam cada vez mais destaque nos estudos de gênero; abriu-se uma seara de temas e isso contribuiu para a discussão teórico-metodológica das fontes.

Desta forma, o silêncio das mulheres foi rompido por meio do estudo de fontes quase que exclusivamente produzidas por homens. Assim, temos poucos vestígios de escritos produzidos por mulheres que sobreviveram ao longo dos tempos, uma dessas mulheres é Clara de Assis que desempenhou um papel fundamental no movimento religioso feminino do século XIII que vai além da sua santidade e da imagem de fiel seguidora de Francisco de Assis. Por isso, o objetivo deste trabalho é tecer algumas reflexões sobre o debate historiográfico mais recente acerca da Regra de Clara e do seu papel dentro do movimento Franciscano.

Para Marco Bartoli1, o crescimento das comunidades femininas no início do século XIII deu-se na forma de “efervescência religiosa” nos seguintes lugares da Europa, a saber, Flandres, Brabante, Renânia, Itália central e setentrional. Depois do IV Concílio de Latrão de 1215, as novas comunidades femininas deveriam adotar as Regras religiosas já existentes, pois o Concílio presidido por Inocêncio III (1198-1216) proibiu

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a criação de novos modelos de regras monásticas. Devido aos problemas com movimentos heréticos, a Igreja dava uma grande atenção aos movimentos religiosos, sobretudo, os femininos. Em geral, as comunidades femininas eram enquadradas em alguma Regra, beneditina ou agostiniana, apesar de alguma autonomia do mosteiro, geralmente uma Ordem masculina ficava responsável pela cura animarum.

Para Jacques Le Goff, o século XIII foi o século do ressurgimento das cidades na Europa medieval. Nesse período, a sociedade era permeada por grandes tensões sociais como a difusão das heresias, a Reforma Pontifícia, a falta de adaptação de uma sociedade em que a circulação do dinheiro se acentuava, a riqueza se tornava um valor, e a cultura monástica tradicional já não atendia mais às exigências dos laicos. O IV Concílio de Latrão de 1215 foi uma tentativa de refrear o surgimento de novas manifestações, sobretudo, com a proibição de formulação de novas regras religiosas2. Dentro desse contexto, apareceu a Ordem dos Frades menores e os Dominicanos que puseram em causa as formas de pregação e prática litúrgica vigentes. Os mendicantes forneceram as justificações religiosas de que a sociedade urbana necessitava naquele momento e absorveram os movimentos religiosos femininos no seu interior.

A Segunda Ordem Franciscana, tendo a figura de Clara como a primeira abadessa, se estabeleceu sob o prisma contemplativo da vida evangélica Franciscana com base na pobreza integral3 e na caridade em comunhão fraterna. A nossa fonte principal deste projeto de doutorado é a Regulae Sancta Clarae ou Forma vitae de 1253 que estabeleceu uma nova concepção do conceito de pobreza na Ordem franciscana, adaptado ao convento feminino de São Damião. Com o binômio fraternidade e “Altissíma Pobreza”, Clara resignificou a ideia de renúncia a toda forma de propriedade e o “viver segundo o Santo Evangelho” através da Imitatio Christi, pressupostos que foram sintetizados na Regra Apostólica de 1223 e serviram de base para a construção da normativa clariana.

Clara de Favarone nasceu, em Assis, em 1194, era de família nobre. Foi no ano de 1212 que deixou clandestinamente a casa dos pais junto com a prima Pacífica de

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LE GOFF, Jacques. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: vozes, 2007, pp. 198 e 199. 3

“Non si può – parlando degli ideali, e dei modelli, di santità tra XII e XIII secolo – ignorare il problema della scelta di povertà, e soprattutto non si può farlo nel contesto di un volume su Chiara di Assisi. [...] Pare però utile sottolineare che non esiste uma sola interpretazione della povertà che possa riassumere in sé la spiritualità del tempo.”. BARONE, Giulia. “Ideali di santità fra XII e XIII secolo”. In: Chiara di Assisi. Atti del XX Convegno internazionale. Assisi: Centro Italiano di Studi Sull’Alto Medioevo, 1993, pp. 41.

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Guelfuccio para seguir Francisco de Assis e prometendo obediência à Igreja. Imediatamente, elas foram conduzidas ao mosteiro das beneditinas de São Paulo e depois ao mosteiro de Sant’Angelo dos Paços na encosta do monte Subásio. A irmã menor de Clara juntou-se a elas. Logo, elas foram transferidas para a Igreja de São Damião por Francisco em 1213. A fraternidade feminina cresceu rapidamente. Os primeiros tempos foram duros e vivenciavam a pobreza evangélica na prática através dos trabalhos manuais, prestavam serviços em hospitais, seguiam a experiência dos Irmãos menores e as orientações de Francisco. Não se dedicavam ao caminho itinerante como os homens, porque despertava uma desconfiança das autoridades eclesiásticas devido ao problema das heresias que muitas vezes acolhiam as mulheres dando espaço de participação, inclusive no ministério da pregação. Como resposta a demanda por participação na Igreja, a Santa Sé buscou agregá-las nas Ordens religiosas já existentes ou nas recentes Ordens Mendicantes, a adoção de uma normativa fazia-se necessária para manter-se o controle. Desta forma, as mulheres conseguiam uma participação bastante intensa nos movimentos religiosos dos séculos XI-XIII. Dos meios populares aos mais nobres, todas eram convidadas ao despertar evangélico dentro das normas canônicas.

Nesta comunicação destacamos Clara de Assis, uma das poucas mulheres a deixar um número considerável de escritos. O seu texto jurídico mais importante, a

Forma vitae, representou um marco porque foi a primeira Regra escrita por uma mulher

para sua própria comunidade no Ocidente medieval, aprovada pelo papa Inocêncio IV (1243-1254) mediante a bula Solet annuere de 9 de agosto de 1253. Essa forma de vida havia sido aprovada pelo cardeal protetor Reinaldo em 16 de setembro de 1252. A Regra de 1253 mostra que Clara soube usar a regra de São Francisco, a regra de São Bento, a regra Hugoliniana, a regra Inocenciana e ainda enriqueceu o conjunto com seu conhecimento da Bíblia, dos autores sacros do seu tempo e revelou uma experiência original. Porém, devido ao fato dos mosteiros serem independentes entre si e a exigência de Clara pela pobreza ser irredutível, sua Regra foi aprovada somente para São Damião; mais tarde, foi aderida por outros mosteiros e depois sofreu uma adaptação de Urbano IV (1261-1264) dando origem à regra Segunda que veio substituir a regra de Clara (Primeira regra) nos mosteiros, excetuando o convento de São Damião. O texto jurídico de 1253 é corrido e sem subtítulos, os doze capítulos foram acrescentados

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posteriormente. Os estudos dessas normativas acima mencionadas adquiriram um impulso significativo após o Concílio do Vaticano II.

No século XIX, os escritos de Clara iniciaram-se com a publicação de várias traduções dos seus manuscritos reunidos no “Seraphicae Legislationis textus

originales”, de Quaracchi, de 1897. Ao fazer a proposta de que as Ordens religiosas

voltassem seus postulados para suas origens e carisma dos seus fundadores, o Concílio do Vaticano II da década de sessenta ajudou a estimular os estudos das fontes clarianas. Sendo assim, importantes traduções foram feitas com comentários mais críticos como o texto de Omaechevarria, “Escritos de Santa Clara”, edição da BAC de Madrid de 1970 e a edição italiana de “Fonti Francescane” de 1977, sob a coordenação de Chiara Augusta Lainati. Já a edição francesa dos anos oitenta “Claire d’Assise: Écrits”, de M. F. Becker, J. F. Godet, T. Matura, pela Les Editions du Cerf, de 1985 destacou-se pelos comentários das traduções anteriores e códices dos editores dos séculos XIV e XV, incluindo várias bulas e o Testamento que teve a sua autenticidade questionada pelo alemão Werner Maleczek em 1995, publicado pela “Sources Chrétiennes”. Porém, o Testamento foi considerado autêntico quando Attilio Bartoli Langeli provou que a letra do manuscrito era de Frei Leão num estudo minucioso de paleografia em 2000 na obra “Gli autografi di frate Francesco”, a hipótese de Maleczek foi abandonada pelos especialistas. Hoje, a principal tradução comentada e utilizada pela historiografia é a edição italiana de “Fonti Francescane” de 2004. Mas, o que podemos observar a partir das traduções acima mencionadas?

A primeira observação é o crescimento da historiografia italiana dos últimos vinte anos que tem valorizado mais os escritos de Clara e o seu papel no movimento Franciscano, antes da década de sessenta era reduzido à seguidora de Frei Francisco e exemplo de santidade. A partir dos anos setenta, a historiografia mostra Clara sob um outro ângulo, ela foi mais importante do que se imaginava e teve uma maior autonomia em relação às demais mulheres da época, porque sabia ler, tinha acesso às Sagradas Escrituras e aos textos jurídicos. A segunda observação é a contribuição de Clara ao movimento Franciscano, Clara possuía uma independência relativa frente ao papa Gregório IX (1227-1241). Apesar da imposição da clausura e outras mudanças alheias a tradição franciscana, Clara resistiu as interferências externas, mantendo fidelidade a

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pobreza total, mesmo com a imposição de regras que nada tinha a ver com a forma de vida escolhida.

Para entender a forma de vida escolhida pelas “Irmãs pobres”, torna-se importante compreender a realidade histórica da autora bem como a sua trajetória e o seu projeto de vida que estava identificado nas propostas de Francisco de Assis. Para isso, dois aspectos serão destacados nesta análise. O primeiro refere-se ao conceito de pobreza que se espelhou na Ordem dos Menores, mas sofreu uma transformação com mudanças de maneira diplomática e sutil na Regra de 1253. À segunda diz respeito à inserção do movimento religioso feminino de Clara no movimento Franciscano. Por fim, entender o atual debate historiográfico sobre a normativa jurídica clariana ajuda-nos a apreender a dinâmica da participação feminina ajuda-nos movimentos religiosos dos séculos XII-XIII, além de resgatar a memória e as ideias de Clara que possuía uma rara autonomia para o período.

Em relação à pobreza, o cardeal Hugolino de Óstia durante o pontificado de Honório III (1216-1227) procurou orientar as comunidades femininas no sentido tradicional monástico da interpretação da pobreza. Segundo ele, as religiosas poderiam ser individualmente pobres, mas os mosteiros deveriam ser tutelados pela “cura

animarum” dos mendicantes. Além disso, Hugolino empenhou-se em conseguir

propriedades e bens rentáveis para os conventos femininos, gerando conflitos com os de seguimento franciscano. O conceito de pobreza da Regra de 1223 da Ordem dos Frades menores era bem patente na defesa da ausência de propriedade como condição para a entrada nesta Ordem religiosa. Não ter nada nem em comum e nem individualmente, problema resolvido pela bula Quo elongati de 1230 de Gregório IX (o ex-cardeal Hugolino de Óstia) que assumiu os bens da Ordem, assim a Igreja seria a única proprietária, aos frades só caberiam o uso, mas eles não possuíam nada.

A pobreza é a base do movimento Damianita. A ideia de viver com as próprias mãos e na renúncia a toda propriedade mantinha-se como o eixo de identidade de Clara e Francisco. O “Privilégio da Pobreza” foi uma garantia de que o convento de São Damião não possuiria bens, mesmo com a Regra de São Bento imposta pelo papa, mais adiante, Gregório IX redigiu uma bula intitulada “Sicut manifestum est” de 1229 na qual desenvolveu a ideia do Privilegium Paupertatis para renovar o que o papa anterior havia prometido. A primeira bula referida à Ordem franciscana seria a bula de Honório III do

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dia 27 de agosto de 1218 e não a bula “Sicut manifestum est” de Inocêncio III que ainda é fruto de discussão sobre a sua data, o fato é que a resposta destas Cartas pontifícias refere-se à pobreza franciscana. Ou seja, Clara e as companheiras do convento de São Damião não aceitariam propriedades em nenhuma hipótese e tanto a comunidade quanto a abadessa estavam obrigadas a zelar para que esse aspecto fosse rigorosamente cumprido conforme prometido a Francisco e segundo o capítulo sexto da Regra de 1253.

Et sicut ego semper sollicita fui una cum sororibus meis sanctam paupertatem quam domino Deo et beato Francisco promisimus custodire, sic teneantur abbatissae quae in officio mihi succedent et omnes sorores usque in finem inviolabiliter observare, videlicet in non recipiendo vel habendo possessionem vel proprietatem per se neque per interpositam personam, seu etiam aliqui quod rationabiliter proprietas dici possit, nisi quantum terrae pro honestate et remotione monasterii necessitas requirit; et illa terra non laboretur, nisi pro horto ad necessitatem ipsarum. (Regulae sancta Clarae, 6, 6-15)

No capítulo sete fica evidente a ligação com a Regra franciscana na definição da pobreza a ser seguida, um conceito com uma mudança sutil por Clara a partir da Regra bulada, mas a discussão do seu sentindo semiológico é que nos interessa pleitear.

Sorores nihil sibi approprient nec domum nec locum nec aliquam rem; et tanquam peregrinae et advenae (cfr. Ps 38,13; 1Pet 2,11) in hoc seculo, in paupertate et humilitate Domino famulantes, mittant pro eleemosyna confidenter, nec oportet eas verecundari, quia Dominus pro nobis se fecit (cfr. 2Cor 8,9) pauperem in hoc mundo. Haec est illa celsitudo altissimae paupertatis (cfr. 2Cor 8,2), quae vos, carissimas sorores meas, heredes et reginas regni caelorum instituit, pauperes (cfr. Iac 2,5) rebus fecit, virtutibus sublimavit. (Regulae sancta Clarae, 7, 1-4).

Como vimos no fragmento acima do capítulo sete, uma alusão de forma mais direta à Regra Apostólica “As irmãs não se apropriem de nada, nem casa, nem lugar nem coisa alguma”, sirvam na pobreza e na humildade, peçam esmolas porque o Senhor se fez pobre por nós e a “Altíssima pobreza” consistiria no viver sem nada de próprio. A interdição de propriedades criou um impasse jurídico aos conventos femininos Franciscanos, visto que diferentemente da Ordem Primeira, a Ordem Segunda Franciscana era formada por mulheres que viviam em clausura, o que acarretava um

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maior problema jurídico, sobretudo, porque havia uma heterogeneidade e independência dos conventos. O problema posto seria de quem ficaria o ônus da propriedade dos conventos, já que a pobreza clariana derivada da franciscana não aceitava a propriedade em comum, diferentemente do monaquismo tradicional, os franciscanos nesta época não admitiam a propriedade coletiva. Com a bula Quo elongati de 1230, Gregório IX colocou a Igreja Católica como a única proprietária dos bens móveis e imóveis dos Frades menores, o que resolveu em parte os problemas dos franciscanos, tendo em certa medida que a Regra de 1223 estabelecia o não ter nada nem individual nem coletivo como um ponto de partida para a imitação da vida de Cristo que não teria tido propriedades, bem como os seus apóstolos também não haviam tido. O Papa Urbano IV na tentativa de resolver o impasse do princípio da não propriedade reescreveu a Regra de Clara introduzindo mudanças significativas. Desta forma, podemos procurar onde houve a “resistência” por parte de Clara em relação ao enquadramento e as mudanças feitas pela Santa Sé através da Segunda Regra? Quais mosteiros adotaram a Regra de 1263? A Regra de Clara calcada na proposta franciscana poderia representar um espaço de autonomia demasiado em relação às outras Ordens monásticas?

Em suma, Clara e companheiras participaram ativamente da gestação do movimento Franciscano, porque a relação entre Clara e Francisco fazia parte de um mesmo projeto. A Regra de Clara representou não apenas um marco por ter sido redigido por ela, mas também pelo fato de ser difícil compor um texto jurídico no século XIII, a normativa foi o resultado de um longo trabalho da vida da abadessa de São Damião. Ela fez uma leitura das demais regras impostas ao seu convento, tomando somente as palavras que lhe pareciam úteis à sua comunidade. Uma boa regra religiosa é geralmente escrita por quem vivenciou aquilo que prescreveu como uma síntese para os outros. Contudo, os escritos de Clara não são suficientes para compreendermos a sua história, faz-se necessário usar outras fontes como as legendas, o processo de canonização, as bulas, entre outros.

Conforme já mencionamos, a historiografia mais recente tem valorizado os escritos de Clara, por exemplo, o VIII Centenário de Nascimento de Clara de Assis (1993-94) deram as pesquisas um novo fôlego, foi muito significativo o debate promovido pelos principais especialistas no assunto. Desde então, na Itália, tem acontecido de forma contínua Congressos, Semanas, Seminários, Estudos, Conferências

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sobre o franciscanismo feminino. Segundo Enrico Menestò, no campo da historiografia, tem surgido novas pesquisas sobre Clara, entre estes, Mario Marti (1995), Emore Paoli (1995), Andrea Boni (1995), Emanuela Prinzivalli (1997), Marco Bartoli (1994-1996), Maria Pia Alberzoni que trabalha com a relação Clara e Papado (1995- 1997), e Jacques Dalarun, que retoma o problema da relação entre Clara e Francisco, (1994-1998)4. Para além das pesquisas italianas, há os textos de Anais do Colóquio de Montrèal - Claire

d’Assise. Féminité et spiritualitè de 1996. Aliás, fundamental são os postulados de

Marco Bartoli, ele fez a primeira biografia de Clara em 1989, a obra intitulada “Chiara

d’Assisi”, o autor enfatizou a importância em se estudar as fontes clarianas, sobretudo a

Regra de 1253.

As ideias expostas nas Formas de vida e Regra de 1253 revelam uma preocupação com um projeto de vida idealizado por Francisco. Esse projeto ia ao encontro dos anseios da população urbana que vivia de medos e inconstâncias e tanto desejava participação na vida religiosa. Ao mesmo tempo, mostra a simplicidade, a pobreza e a imitação da vida de Cristo como base do pensamento das “Irmãs menores” numa versão feminina do movimento Franciscano. A Regra de São Damião foi escrito por Clara um pouco antes de sua morte, tendo aprovação papal no dia 9 de agosto de 1253 com a bula “Solet annuere” de Inocêncio IV, um dia após o recebimento da bula no seu leito, Clara faleceu.

Enfim, da polêmica da redação feminina de uma Regra aprovada, nunca acontecido antes no Ocidente Medieval, é que surgiu o conflito institucional das “Irmãs menores” com o papado romano que não digeriu muito bem no século XIII a “novitas

clariana”, tentando sempre minimizar o alcance jurídico da Regra de 1253, por isso a

imposição de novas Regras em 1259 e em 1263 a determinados Conventos Damianitas, com intuito de impedir a propagação da Regra de Clara.

Enfim, o debate mais recente da historiografia sobre os escritos de Clara tem procurado levantar o papel desempenhado por ela no movimento Franciscano e o “lugar de memória” de São Damião. As mulheres têm sido muitas vezes excluídas da história e da sua memória porque as fontes são quase exclusivamente produzidas por homens. Clara foi umas das poucas mulheres do medievo que deixou muitos escritos e isso

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Para a indicação completa dos artigos e obras dos autores relacionados, ver MENESTÒ, Enrico. Lo stato attuale degli studi su Chiara d’Assisi. In: Clara Claris praeclara. Atti del Convegno Internazionale Clara Claris Praeclara. Assisi 20-22 novembre 2003. Assisi: Porziuncola, 2004, pp. 9-17.

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representa uma “voz” que não pode ser esquecida, cabe à historiografia fazer uma nova leitura de Clara de Assis, um resgate da importância histórica da abadessa de São Damião que redigiu a primeira Regra aprovada por um papa no Ocidente medieval.

REFERÊNCIAS

Fontes

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