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DINÂMICA DO MERCADO INTERNO NA AMÉRICA PORTUGUESA Magali Alves de Andrade

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DINÂMICA

DO

MERCADO

INTERNO

NA

AMÉRICA

PORTUGUESA

Magali Alves de Andrade

Resumo

Na historiografia tradicional a economia colonial da América Portuguesa se restringe ao grande comércio, a economia da colônia era definida pelos ciclos econômicos, entretanto, esta visão generalista da economia da América Portuguesa é errônea. A historiografia recente defende a existência de uma dinâmica interna própria, dissociada da economia externa. Dessa forma, o objetivo desse trabalho é apresentar a dinâmica do mercado interno no Brasil colônia. De que forma surge e evolui a economia local da América Portuguesa, sua dependência da demanda internacional, assim como sua autonomia enquanto colônia.

Palavras-Chaves: América Portuguesa; Mercado Interno; Abertura dos Portos.

ABSTRACT

In traditional historiography of the Portuguese colonial economy America is restricted to the big trade, the economy of the colony was defined by economic cycles, however, this general view of the Portuguese American economy is erroneous. Recent historiography defends the existence of a dissociated from the external economy own internal dynamics. Thus, the aim of this paper is to present the dynamics of the internal market in Brazil colony. How it emerges and evolves the local economy of Portuguese America, its dependence on international demand, as well as their

autonomy while colony.

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I. Introdução

Na historiografia tradicional a economia colonial da América Portuguesa1 se restringe ao

grande comércio, voltado para a exportação. A economia da colônia era definida pelos ciclos econômicos, sempre voltados para a exportação dos seus produtos: Ciclo da exploração do Pau Brasil, Ciclo da Cana de Açúcar e ciclo do ouro.

Entretanto, esta visão generalista da economia da América Portuguesa é errônea. A historiografia recente defende a existência de uma dinâmica interna própria, dissociada da economia externa europeia. Fragoso (1992) em seu livro Homens de Grossa Aventura é um dos que defendem essa tese. Para ele durante o período colonial havia, na América Portuguesa, diversas formas de produção que não respondia diretamente as demandas do mercado internacional.

Entretanto, Mariutti e outros (2001) faz alguns contrapontos acerca dessa independência do mercado interno colonial da América Portuguesa. Levantando a hipótese de que a economia interna respondia, mesmo que indiretamente, a demanda internacional. Não havendo uma independência, por possuir elevados índices de correlação entre os produtos de consumo interno e os exportados.

Dessa forma, o objetivo desse trabalho é apresentar a dinâmica do mercado interno no Brasil colônia. De que forma surge e evolui a economia local da América Portuguesa, sua dependência da demanda internacional, assim como sua autonomia enquanto colônia.

Além dessa introdução o trabalho divide-se em mais quatro partes. Para atingir o objetivo, inicialmente será apresentado o mercado interno desenvolvido na América Colonial, tanto no âmbito agrícola, pecuário e industrial. Mostrando como cada um se caracterizava e se desenvolvia na colônia. Logo após será avaliada a importância da abertura dos portos para que esse comércio crescesse e se consolidasse. Em seguida, será apresentado o debate acerca da importância desse mercado interno e a influência do comércio exportador na dinâmica do mercado interno. Por fim, serão apresentadas algumas considerações finais sobre o debate levantado.

II. Dinâmica do mercado interno na América Portuguesa

A historiografia tradicional não considera importante o mercado interno desenvolvido na colônia, dessa forma era visto como possuidor de extrema dependência das relações econômicas com a metrópole. Entretanto não se pode resumir a economia da colônia à dinâmica exportadora, presente, mas não a única forma de organização econômica desenvolvida na América Portuguesa.

Na historiografia brasileira sempre foi enfatizado a monocultura, como é dito por Linhares (1996), o que, em sua opinião, omite estudos sistêmicos sobre a produção agrícola do período colonial. No Estado da Bahia, por exemplo, a produção agrícola de subsistência chegou a entrar em colapso, devido às epidemias que surgiram no período de 1560-1563, culminando na morte de

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diversos índios, que eram os principais produtores agrícolas. Na Paraíba argumentava-se que o mal que as culturas indígenas traziam eram maiores que, quaisquer, benefícios que esta poderia ofertar para a colônia. Esse pensamento perdurou nos primeiros anos da colonização brasileira, onde o que predominava era o ideal das grandes plantações.

No início o mercado doméstico da América Portuguesa apresentava uma divisão social do trabalho frágil e um índice de circulação de mercadorias precário. Até a distribuição regional do abastecimento interno era frágil, as principais regiões de abastecimento por via marítima, como Cabo Frio, Santa Catarina e o Sul da Bahia, apresentavam a mesma pauta de produtos agrícolas, farinha, milho e feijão. Já por via terrestre, com tropas saídas de São Paulo e Minas Gerais, os principais produtos comercializados eram rezes e mulas (FRAGOSO, 1992).

 Agricultura

Ferline (2009) afirma que o modo de produção existente na América Portuguesa foi o grande responsável por se ter um pequeno mercado interno.

A grande exploração monocultora e escravista açucareira impediu o desenvolvimento de uma camada de pequenos e médios proprietários, e eles, quando existiam, dependiam do grande proprietário para processar o açúcar ou comprar sua produção de subsistência. (p. 245)

Na busca pelo abastecimento da metrópole, a agricultura desenvolvida na colônia se concentrava no modelo de plantation, ou seja, das grandes propriedades e produções, em geral, suprindo a demanda da metrópole. Entretanto, para a manutenção interna da economia da colônia foi necessário o desenvolvimento da agricultura de subsistência, responsável por suprir a demanda alimentar dos engenhos e dos aglomerados urbanos da colônia.

Nessa linha, na opinião de Linhares (1996), vários foram os papéis da agricultura de subsistência na colônia portuguesa que se implantava, com destaque para a ocupação da terra e a organização do trabalho familiar. O autor chama atenção para a existência da cultura da mandioca, do milho e da batata doce. A Bahia, por exemplo, manteve, durante muito tempo, uma área representativa de terra dedicada ao cultivo da mandioca2. O consumo deste produto na região

industrial de Salvador girava em torno de 44 quilos/ano per capita. No sertão sergipano a média fica em 189 quilos/ano per capita.

Na primeira metade dos setecentos a produção agrícola do Rio de Janeiro concentrava-se na produção de açúcar e mandioca, permanecendo assim até 1750 quando foi inserido o conjunto de

2 Para maiores informações consultar Brickman, B. J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e

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incentivos da Coroa Portuguesa, buscando a diversificação da pauta exportadora do Rio de Janeiro, por conseguinte do Brasil. As culturas que passaram a fazer parte da produção brasileira foi cânhamo, amoreira, anil, tabaco e o arroz. Essa diversificação da produção colonial foi incentivada, em partes pela Coroa Portuguesa. Entre os incentivos da Coroa Portuguesa estava o envio de sementes ou plantas, garantias de preços e de compra do produto, apoio técnico e isenção de impostos e taxas (PESAVENTO e MONTEIRO, 2006).

Havia na América Portuguesa um mercado interno de boa medida, que sofreu modificações com as alterações institucionais voltadas para a dinamização da agricultura no atendimento do mercado internacional. Os autores afirmam que no Rio de Janeiro havia uma diversificação da produção, como o anil, arroz, cochonilha3, linho cânhamo, amoreira (bicho da seda) e o café. No

inicio da década de 1760 o anil e o arroz apresentavam-se como culturas importantes no Rio de Janeiro, se propagando por diversas fazendas e chácaras, porém o arroz, mesmo não contando com muitos incentivos da Coroa para o seu desenvolvimento. Os dois produtos chegaram a atingir o terceiro lugar entre os produtos mais exportados do Brasil. O anil apresentou crescimento apenas no curto prazo. Entretanto, as demais culturas, mesmo recebendo incentivos não obtiveram êxito. Ou seja, os incentivos fornecidos pela Coroa não foram tão eficientes em gerar os resultados esperados (PESAVENTO e MONTEIRO, 2006).

Ferline (2009) afirma que mesmo o açúcar sendo o produto mais exportado do Brasil, no século XVIII, a concorrência internacional da Holanda, agindo como outro incentivador, fez com que a produção interna se diversificasse. Nesse mesmo período, com o surgimento da exploração do ouro nas Gerais possibilitou a acumulação de riqueza para o financiamento da industrialização na metrópole, o que retroalimentava os estímulos, da Coroa para com a colônia, focados na produção agrícola, que seriam reexportado por Portugal.

Outra atividade desenvolvida internamente na colônia era a pecuária. Com a elevação da criação de gados na região nordeste o povoamento do interior do país e a consolidação das regiões foram possíveis.

O gado aparece nos primeiros anos da colônia para o transporte das mercadorias aos portos e estava vinculado à fertilização do solo, assim também como conviviam com o cultivo do tabaco e da mandioca. Entretanto no final do século XVII houve a utilização da pecuária extensiva e sua marcha para os sertões, estima-se que em Pernambuco havia aproximadamente e 800 mil cabeças de gado e 500 mil no sertão baiano (LINHARES, 1996). Em conjunto com a expansão pecuarista avança também a produção do algodão estabelecendo alguns laços comerciais com os centros portuários.

3 Cochonilha refere-se tanto ao corante cor carmim utilizado em tintas, cosmético e como aditivo alimentar

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O norte fluminense, por exemplo, era agroexportador. Santa Catarina era responsável pelo abastecimento interno e de escravos vindos da Angola. Tal desenho do abastecimento marítimo também ocorria com a participação de pequenos e médios mercadores, já que alguns comerciantes aparecem com apenas uma carga por ano, podendo ser indícios de mercadores eventuais. Além da especialização por mercadorias, esses mercadores se limitavam a algumas macrorregiões como Rio de janeiro, Rio Grande, Santa Catarina e Sul da Bahia (FRAGOSO, 1992).

Em suma, grande parte da agricultura desenvolvida na colônia tinha a finalidade de abastecer a metrópole portuguesa. Entretanto, a demanda interna apesar de incipiente já se apresentava com uma importância interna representativa. Fazendo surgir uma produção agrícola da subsistência da colônia. O gado, entra na produção agrícola com importante papel de adubar o solo e fazer o transporte da produção, e vai se distribuindo por regiões continentais, permitindo uma comunicação terrestre entre as zonas rurais e portuárias. Dessa forma, apesar de pequena a produção agropecuarista foi importante para o abastecimento da colônia.

 Comércio

Silveira (2009) chama a atenção para o papel desenvolvido pela mineração na articulação do comércio entre as regiões, fazendo interagir os sertões e o litoral. Sendo importante para a criação das novas redes de abastecimento do mercado interno da América Portuguesa. Ferline (2009) acrescenta que com a mineração o comércio interno ganhou uma dinâmica diferente. A Coroa portuguesa passa a investir na criação de espaços de comércio, ou seja, as companhias de comércio. As criações das companhias de comércio deram base para o crescimento das relações comerciais e consequentemente da interação das redes de comunicação, marítimas e terrestres, entre as capitanias da colônia portuguesa. Fragoso (1992) afirma que as características gerais das capitanias brasileiras, no âmbito econômico, diziam respeito ao autoconsumo familiar dos camponeses. Por possuir tantos estabelecimentos de abastecimento local, deixando o mercado doméstico incipiente.

Durante o período Pombalino 1750-1577 há uma mudança na diretriz do Estado Português, dentre as medidas econômicas estavam a criação da companhia de comércio (Grão-Pará e Maranhão, Paraíba e Pernambuco), buscando o desenvolvimento do cultivo de novos produtos agrícolas; criação da Mesa de Inspeção, buscando melhorar a qualidade dos produtos e controlar o contrabando (PESAVENTO e MONTEIRO, 2006).

A economia da colônia era limitada. O comércio era a atividade econômica permitida aos colonos vassalos, tendo desde o inicio da colonização a figura dos comerciantes miúdos, “retalhistas”, ou “homens de vara” como eram conhecidos os pequenos comerciantes coloniais.

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Suas oficinas funcionavam nos andares terreis de sobrados ou em edificações térreas de com um único pavimento. Esses comerciantes chegavam a um número em torno de 130 pessoas, em geral advinham da região norte de Portugal (CAVALCANTE, 2004).

Na visão de Fragoso (1992) a base do mercado interno colonial prevalecia o mercado não-especialista , ou seja, um especulador ou um traficante eventual, com um elevado volume de pequenos empreendimentos, o pequeno tropeiro e etc. Inferindo que o mercado colonial era composto de uma multidão de pequenos comerciantes. O mercado internacional estava concentrado nas mãos de poucos comerciantes, além desses comerciantes também serem traficantes de escravos, como em 1812, por exemplo, dos 30 negociantes exportadores 15 eram mercadores de almas. Estes eram os principais comerciantes de longos trechos.

Havia também os negociantes de grosso trato que atuavam em diversas regiões, emprestando dinheiro a juros aos pequenos comerciantes locais. Um dos exemplos é o negociante Brás Carneiro Leão, oriundo do Porto, era o maior comerciante, administrava diversos negócios, possuía engenhos, navios e imóveis urbanos. Mantinha relações comerciais com Lisboa e Porto, além de Angola e Benguela na África, já na colônia seus negócios se distribuíam entre Salvador, Rio de Janeiro, Recife, Vila Rica, Sabará e Serro do Frio (CAVALCANTE, 2004).

Os homens de negócios, em Lisboa e no Porto, formavam uma rede de abastecimento sólida, o que permitia estabelecer os preços das mercadorias no Rio de Janeiro, por tanto, seriam os price

makers (definidor de preços). Enquanto os pequenos e médios comerciantes não conseguiam

romper as barreiras impostas por esses comerciantes de grosso trato, estes seriam os price takers (tomadores de preços).

A demanda da Corte por gêneros de abastecimentos colaborou expressivamente para a integração do comercio no eixo Rio-Minas-São Paulo, comercio de extrema importância para o estabelecimento de uma elite mercantil (MARIUTTI et al, 2001).

Em 6 de dezembro de 1755 foi estabelecido o alvará, que proibia a comercialização realizada pelos “comissários volantes” isto é, por pessoas que não possuíam estabelecimentos comerciais fixos. O grande objetivo desta normatização era a proteção do comercio Português na Colônia. Em 17 de janeiro de 1757, outro alvará estabelecia a redução dos juros anuais, caindo de 6,4% para 5%, alterando a estrutura do mercado, reduzindo o mercado especulativo financeiro e aumentando o mercado produtivo (CAVALCANTE, 2004).

O Porto do Rio de Janeiro, por exemplo, durante o século XVIII, consolidou-se como principal porto exportador-importador na colônia portuguesa. Entre 1796 e 1811 o porto foi responsável por 38% das exportações e 34% das importações. O segundo Porto mais movimentado era o de Salvador, com 27% e 26%, exportação e importação, respectivamente (SILVEIRA, 2009).

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Em suma, o crescimento do comércio não foi apenas uma resposta ao crescimento populacional, mas também o resultante de uma série de alterações institucionais, como a criação de companhias de comércio. Neste contexto se desenvolveram dois tipos de comerciantes os retalhistas e os de grosso trato, alimentados pelo crescimento da população e a sua demanda cada vez mais elevada e exigente.

 Indústria

Durante o período colonial não havia no Brasil oficinas de grande porte, entretanto Portugal passava por um processo de industrialização, iniciado na Inglaterra com a Revolução Industrial. Assim, Ferline (2009) afirma que com a industrialização da metrópole, a relação entre colônia e metrópole vai se alterando. A colônia passa a ser consumidora dos produtos industrializados produzidos pela metrópole.

A colônia era utilizada como fornecedoras de produtos agrícolas e demandante de produtos industrializados produzidos na metrópole. Eram permitidas fabricas que produziam açúcar e aguardente, fábricas para descascar arroz, descaroçar algodão e produzir anil. Algumas fábricas eram restritas a cidade, como curtume, fábrica de cordas e pequenas oficinas que produziam utensílios básicos, como pentes e guarda-sóis (CAVALCANTE, 2004).

Em 1756 foi instalada a primeira fábrica de descascar arroz do Brasil, localizada no Andaray Pequeno no Rio de Janeiro recebeu isenções de taxas de exportações por 10 anos, é um dos exemplos de incentivos coordenados pela Coroa Portuguesa no Brasil no período de setecentos (PESAVENTO e MONTEIRO, 2006).

A primeira fábrica de ferro foi criada em 1811, na cidade de Congonhas do Campo em Minas Gerais. Com o passar dos anos foram sendo erguidos moinhos de trigo, fábricas de barcos, pólvora, corda e tecidos. Um dos fatores que contribuíram para esse avanço da indústria e do crescimento do volume de negócios foi autorização da abertura de novas estradas, assinada por D. João ainda em Salvador em 1808 (GOMES, 2011).

Segundo Cavalcante (2004) a barreira industrial imposta por Portugal só começou a ser rompida após a chegada da Corte em 1808 ao Brasil, com a promulgação do alvará 1º de abril de 1808, onde afirmava que as manufaturas e a indústria eram peças fundamentais para o crescimento da riqueza colonial, retirando, desta forma, o estigma de que na colônia só seria necessário o desenvolvimento da agricultura.

Em resumo, apesar de ter um mercado agrícola e um mercado interno movimentado, o processo de industrialização da América Portuguesa se dá em passos lentos. Principalmente pelo interesse da metrópole, que buscava desenvolver a indústria de Portugal.

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III. A abertura dos Portos (1808)

O contexto colonial no período anterior à vinda da família real, 1807 e 1808, era bastante conturbado. Com a pressão da Inglaterra em acabar com o tráfico de escravos no Atlântico, as guerras Platinas, que absorvia a mão de obra outrora empregada na lavoura do Rio Grande, e a variação dos preços internacionais (FRAGOSO, 1992).

Na opinião de Silveira (2009, p. 4) a vinda da Família Real, em 1808, pode ser considerada um fator conjuntural, que em conjunto com fatores estruturantes, alterando a dinâmica, estrutura e organização espacial da economia colonial. Fragoso (1992) chama a atenção para o controle sobre o comercio exterior que a Inglaterra passou a ter com a abertura comercial em 1808. Ou seja, apesar de possuir grandes comerciantes exportadores, o maior volume das exportações para a Europa não portuguesa era relativamente pequeno. Gomes (2011) acrescenta que as vantagens auferidas pela Inglaterra eram tão positivas que, a partir de 1810, nem os produtos portugueses, que pagavam 16% de impostos, conseguiam concorrer com os produtos ingleses, que pagavam apenas15%.

A instalação da Corte portuguesa no Brasil trouxe diversas mudanças na organização social e econômica da colônia. Com a transferência da sede da monarquia, além das modificações sociais e urbanísticas no curto espaço de tempo houve um aumento representativo de movimentação no porto do Rio de Janeiro, após a instalação da corte nesta cidade (CAVALCANTE, 2004).

A transferência da Corte Portuguesa para a colônia alterou o sistema colonial. A vinda da Família Real gerou uma explosão na demanda interna, não podendo ser reduzida ao aumento populacional, pois esta Corte possuía costumes esbanjadores, padrão elevado de consumo que, ainda, não eram supridos pelo comercio interno.

Nesse contexto, na opinião de Mariutti e outros (2001), a abertura dos Portos não foi apenas uma concessão ao governo da Inglaterra, mas uma forma de garantir o abastecimento da Corte. Uma resposta comum a este aumento da demanda interna e à abertura dos Portos foi a elevação da produção voltada para o mercado interno.

Gomes (2010) apresenta alguns dados sobre as importações brasileiras, inicialmente 90% do que era consumido na colônia advinha da metrópole portuguesa, entretanto a estrutura do mercado internacional foi se modificando na colônia. O Brasil representava uma demanda 25% maior que toda a demanda do continente asiático, e metade do que era exportado para os Estados Unidos. Tal mudança alterou, também, os produtos comercializados, com elevada participação das manufaturas inglesas. Alguns produtos que desembarcavam no porto do Rio de Janeiros, chamam a atenção por suas peculiaridades, como o patins para gelo, caixão mortuário, cobertores de lã e fogões de calefação de cobre para aquecer a cama.

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Desta forma, é possível perceber que a abertura comercial da América Portuguesa não foi um ato de benevolência de D. João XVI, foi o cumprimento do trato com a Inglaterra, que se beneficiou em grande escala no decorrer dos anos com o aumento do seu comércio e das vantagens comerciais adquiridas, além de atender uma necessidade da Corte portuguesa agora residente da colônia. Por fim, a instalação da Corte na Colônia Portuguesa na América fez com que o mercado interno da colônia se desenvolvesse.

IV. Debate sobre a Importância do Mercado Interno

MARIUTTI e outros (2001) levanta o questionamento sobre o peso desempenhado pelo mercado interno na colônia. O autor faz algumas críticas sobre a importância atribuída ao mercado interno pelo Fragoso (1992) no livro Homens de grossa aventura e ao de Fragoso e Manolo Florentino (1993) no livro Arcaísmo como projeto.

O objeto de análise é a Praça do Rio de Janeiro e seu mercado, assim como as formas de produção nelas desenvolvidas, entre os anos de 1792 e 1850. Na visão de Fragoso entre os anos de 1815 e 1850, fase B da colônia, o mercado interno cresce dissociado do mercado internacional.

Os dois produtos com maior representatividade nas exportações eram o açúcar e o café, durante a economia colonial. Neste ponto Fragoso (1992, p. 22 e 23) traz algumas variações percentuais dos preços, volume e receita. Mariutti e outros (2001) descordam da análise feita por Fragoso (1992), inicialmente a crítica diz respeito a descontinuidade da taxas de queda, tendo várias inversões de tendência, 1824 a 1829 e 1804 a 1805, são exemplos que não houve apenas queda no período de 1799 até 1811.

Mariutti e outros (2001) defendem a tese de que a economia brasileira no período colonial não apresentava um ritmo independente da economia internacional, sendo baseada nas exportações. Apresentado, para isso, uma matriz de correlação entre os produtos transacionados no porto do Rio de Janeiro entre 1799 e 1822. A matriz é confeccionada relaciona a receita do açúcar com outros produtos da economia local e apresenta-se da seguinte forma:

Tabela 01 – Matriz de correlação dos produtos

Açúcar Trigo Farinha Charque Escravos Açúcar 1

Trigo 0,1850 1

Farinha 0,3303 0,6535 1

Charque 0,6142 0,2099 0,6693 1

Escravos 0,2142 0,2344 0,4977 0,6729 1 Fonte: MARIUTTI e outros (2001, p. 379)

De acordo com a análise dos autores, a receita do açúcar relaciona-se de maneira profunda coma receita do charque devido à necessidade dos produtores do primeiro bem necessitar o

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abastecimento interno do segundo. Devido ao maior nível de correlação entre estes produtos, quando havia uma elevação da demanda por açúcar deveria haver um aumento da demanda por charque. A baixa correlação do Trigo e dos Escravos poderiam ser explicadas pelo consumo de farinha de trigo ser incipiente, direcionada a alguns portugueses na colônia. Já os escravos eram de forma crescentes absorvidos pelo setor minerado das Gerais. Já a Farinha pode apresentar um movimento de autonomia da sua demanda, já que era um produto tipicamente de consumo interno. (MARIUTTI et al, 2001)

Com relação a variação dos preços internacionais e os portos da cidade de Pernambuco, da Bahia e do Rio de Janeiro, não é possível perceber um deslocamento entre os preços internacionais e dos portos, exceto o porto do Rio de Janeiro, objeto de estudo do Fragoso e Florentino, que apresentou menor correlação entre os preços internacionais, representando um princípio de autonomia da economia local. (MARIUTTI et al, 2001)

A crítica que Mariutti e outros (2001) faz é a atribuição de médias constantes à variáveis cujos comportamento não condiz. Outro grande problema está nas generalizações da historiografia clássica, desta forma não se poderia analisar como um período (1790 – 1830) único e contínuo, pois diversos foram os acontecimentos que o fizeram variar, como a vinda da Família Real de Portugal (1808) e a Independência (1822).

É preciso reconhecer que Fragoso (1992) faz observações importantes sobre a continuidade do modo de produção colonial, de base escravista, ao longo do século XIX pela existência da utilização desta mão de obra até 1888. (MARIUTTI et al, 2001)

Entretanto é preciso destacar que a crítica feita por Mariutti et al (2001) diz respeito a generalizações feitas, já que os resultados dos estudos realizados sobre a dinâmica do Porto do Rio de Janeiro foram generalizados para a dinâmica de toda a colônia. Deste modo, a perspectiva de uma economia interna com ritmo autônomo com relação a economia Europeia, entre 1970 e 1830, são falhas face a um estudo estatístico robusto.

Desta forma, são necessárias maiores investigações sobre a importância da dinâmica do mercado interno colonial. O debate é importante para o estabelecimento das relações econômicas que se iniciam durante o período colonial e que se espalha pelo período Imperial, além de ter influências no desenvolvimento atual da economia Brasileira.

V. Considerações Finais

A agricultura desenvolvida na colônia tinha como objetivo o abastecimento da metrópole portuguesa. A demanda interna era incipiente, mas começa a apresenta-se como importante internamente. Fazendo surgir uma produção agrícola da subsistência da colônia. Assim como a agricultura, a agropecuária faz parte do cenário interno do mercado da América Portuguesa. A

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criação de gado vai se distribuindo por regiões continentais, permitindo uma comunicação terrestre entre as zonas rurais e portuárias, importante para o abastecimento interno da colônia.

Já o comércio não foi apenas uma resposta ao crescimento populacional, mas correspondeu a uma série de alterações institucionais. A criação de companhias de comércio foi extremamente importante para o crescimento do mercado interno colonial. Por ter um mercado agrícola e um mercado interno movimentado, o processo de industrialização da América Portuguesa se dá a passos lentos. Condicionado ao interesse da metrópole, que buscava desenvolver a indústria de Portugal.

A abertura comercial da América Portuguesa foi um marco no desenvolvimento do mercado interno, este ato não foi uma benevolência de D. João XVI, ao sair de Portugal o Rei havia selado um trado com a Inglaterra, que ajudaria no transporte da corte para a colônia, em contrapartida os portos seriam abertos. Essa abertura foi, além do cumprimento do trato com a Inglaterra, que se beneficiou em grande escala no decorrer dos anos com o aumento do seu comércio e das vantagens comerciais adquiridas. Buscava atender uma necessidade da Corte portuguesa agora residente da colônia. Por fim, a instalação da Corte na América Portuguesa na América fez com que o mercado interno da colônia se diversificasse.

A dinâmica do mercado interno é vasta e bastante rica, porém são necessários maiores análises sobre o seu real papel no desenvolvimento da economia do período colonial brasileiro. Quais as suas heranças para o império e para os dias atuais. Desta forma, esse trabalho não tem como objetivo findar o debate sobre o mercado interno desenvolvido no período colonial, mas apenas fazer uma reflexão sobre a sua dinâmica e importância para a formação econômica do Brasil.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FRAGOSO, João L. R. Homens de Grossa Aventura: Acumulação e hierarquia na Praça Mercantil do Rio de Janeiro (1790-1830). 2º ED. rev. - Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992.

FRAGOSO, J.; FLORENTINO, M. O arcaísmo como projeto — mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil no Rio de Janeiro, c. 1790-1840. Rio de Janeiro, Diadorim, 1993

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