• Nenhum resultado encontrado

Mana vol.8 número1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Mana vol.8 número1"

Copied!
17
0
0

Texto

(1)

A t rajet ória de Julio Cezar M elat t i é part e int egrant e da hist ória da et nologia indígena brasileira nas últ imas quat ro décadas. Prof essor hoje aposent ado pela Universidade de Brasília, f ormou-se ant ropólogo nos cursos de especialização que deram origem ao Programa de

Pós-Graduação em Ant ropologia Social do M useu Nacional, part icipando dos projet os de pesquisa pioneiros aqui desenvolvidos durant e os anos 60. Além da pesquisa et nográf ica que realizou ent re os Krahó do M aranhão e, a part ir da década de 70, ent re os M arubo do vale do Javari, M elat t i dedicou-se desde cedo a uma int ensa at ividade docent e, edit orial e de divulgação cient íf ica.

Da pesquisa junt o aos Krahó, da qual result aram os livros Índios e Criadores, O M essianismo Krahó e Rit os de uma Tribo Timbira, ao est udo com os M arubo, o t rabalho de M elat t i revela uma rara combinação ent re a at enção minuciosa ao det alhe et nográf ico e a capacidade de dist inguir nele o ant ropologicament e relevant e. Est a ent revist a f oi concedida a Aparecida Vilaça e M arcela Coelho de Souza em junho de 2001, quando est eve no M useu Nacional para prof erir a conf erência que publicamos t ambém nest e número, of erecendo assim aos leit ores de M ana um quadro vivo de um período decisivo da hist ória da ant ropologia e et nologia brasileiras, a part ir da visão de um de seus principais art íf ices.

Vilaça

Pod e m os com e ça r p e rg u n ta n d o com o n a sce u se u in te re sse p e la An trop olog ia .

M elat t i

Fu i p a ra a u n ive rsid a d e p a ra fa ze r H is-tória . Eu e ra d e Pe tróp olis, e com o n ã o tin h a m u itos re cu rsos p a ra sa ir d e lá , con se g u i u m a b olsa n a Un ive rsid a d e C a tólica . N a é p oca , n o Rio d e J a n e iro, já h a via cu rsos se p a ra d os d e H istória e d e G e og ra fia , m a s e m Pe tróp olis a in d a n ã o. Foi n e sse cu rso q u e con h e ci a An -trop olog ia . Tive com o p rofe ssora M a ria La ís M ou ra M ou sin h o (h oje G u id i), q u e tra b a lh ou n o In stitu to N a cion a l d e Es-tu d os Pe d a g óg icos (IN EP) e a g ora e stá a p ose n ta d a . Ela tin h a fe ito u m d os cu r-sos d e e sp e cia liza çã o p rom ovid os p or Da rcy Rib e iro e n tre 1955 e 1958, d os q u a is d ois fora m re a liza d os n o C e n tro Bra sile iro d e Pe sq u isa s Ed u ca cion a is (C BPE), e ou tros d ois n o M u se u d o Ín d io, p e rto d o M a ra ca n ã . Foi a tra vé s d e la q u e con h e ci a An trop olog ia . O cu rso e m Pe tróp olis tin h a q u a tro sé rie s: a ú ltim a sé rie e ra a d id á tica ; a te rce ira foca liza va o Bra sil, ta n to e m H istória e G e og ra -fia , q u a n to e m An trop olog ia . N a An tro-p olog ia , a tro-p rim e ira sé rie e ra An trotro-p olo-g ia Física e a se olo-g u n d a An trop oloolo-g ia C u ltu ra l. N a ve rd a d e , a ch o q u e o forte d o cu rso e ra G e og ra fia , q u e d isp u n h a d e m u itos re cu rsos n a q u e la é p oca : os p rofe ssore s e ra m d o C on se lh o N a cion a l d e G e og ra fia , tin h a m u m a sa la , a cole -çã o d a Re v ista Brasile ira d e G e og rafia, a cole çã o d o Bole tim G e og ráfico e tc.

EN TREVISTA

DOS KRAHÓ AOS MARUBO:

A AVEN TURA ETN OGRÁFICA

(2)

M a ria La ís, q u a n d o e u e sta va n o ú ltim o a n o, d isse h a ve r a q u i n o M u se u N a cio-n a l u m p rofe ssor q u e p rom ovia u m cu r-so m u ito in te re ssa n te , e m e in ce n tivou a vir. Está va m os n o com e ço d e 1961.

Rob e rto C a rd oso d e O live ira tin h a q u in ze va g a s, com b olsa d a UFRJ , e a p a -re ce ra m a p e n a s oito ca n d id a tos. Ach o q u e o cu rso, n o q u e se ch a m a va e n tã o Divisã o d e An trop olog ia , e ra u m p ou co in sp ira d o, n ã o n o q u e se re fe re a o con -te ú d o, m a s à org a n iza çã o, n os d e Da rcy Rib e iro, p ois C a rd oso fora a ssiste n te d e le n o M u se u d o Ín d io. C a rd oso d e u e sse cu rso a q u i trê s ve ze s, com n om e s d ife re n te s. Rob e rto Da M a tta (q u e vin h a d a H istória ), Alcid a Ra m os (q u e vin h a , a ch o, d a G e og ra fia ), Roq u e La ra ia , Ed -son Din iz, H ortê n cia C a m in h a e O n íd ia Be n ve n u ti fize ra m o p rim e iro, e m 1960. Eu , M a ria An d ré ia Loyola , o fa le cid o M a rcos M a g a lh ã e s Ru b in g e r (q u e já e ra e n tã o p rofe ssor d e An trop olog ia n a UFM G ) e a ta m b é m fa le cid a Lú cia C â -m a ra , fize -m os o se g u n d o. N o p ri-m e iro h a via a p e n a s os se is a lu n os q u e cite i, n o se g u n d o e sse s q u a tro. O s trê s a lu n os d a te rce ira tu rm a , d e 1962, fora m Silvio C oe lh o d os Sa n tos, C e cília Vie ira H e lm e Ste lla Am orim .

Coelho de Souza

Rob e rto Da M a tta , e m Re lativ iz an d o, con ta q u e e sse p rim e iro cu rso se ch a -m a va C u rso d e Te oria e Pe sq u isa e -m An trop olog ia Socia l, e com e n ta q u e e s-se n om e ca u sa va u m ce rto m a l-e sta r com a g e ra çã o a n te rior, p ois sin a liza va u m d ista n cia m e n to d a tra d içã o a m e rca n a e u m a a p roxim a çã o com a tra d i-çã o b ritâ n ica . De p ois o n om e d o cu rso m u d a , n ã o é ?

M elat t i

M u d a , p a ra C u rso d e Esp e cia liza çã o e m An trop olog ia C u ltu ra l. É, n a q u e la é p oca h a via e ssa d iscu ssã o: An trop

olo-g ia Socia l ou An trop oloolo-g ia C u ltu ra l? An trop olog ia Am e rica n a ou An trop olo-g ia Britâ n ica ? M a s isso foi p a ssa n d o.

Coelho de Souza

O q u e se e n sin a va n o cu rso?

M elat t i

A se g u n d a tu rm a te ve d ois p rofe ssore s, Rob e rto C a rd oso e n ca rre g ou -se d a O r-g a n iza çã o Socia l, e Lu iz d e C a stro Fa ria e n sin a va An trop olog ia Econ ôm ica . Do q u e lía m os com C a rd oso p osso le m b ra r p e la s a p ostila s, ou m e lh or, p e la s a n ota -çõe s q u e e le d istrib u ía e m ca d a a u la , com os m e sm os re su m os d o cu rso a n te rior – e ra m m u ltip lica d a s p e la s se cre tá ria s n a b a se d o ca rb on o. Do C a stro Fa -ria te n h o a p e n a s a s b ib liog ra fia s, p ois e le n ã o d istrib u ía re su m os. Ach o q u e o te xto b á sico tra b a lh a d o p or C a rd oso e ra m ca p ítu los d o livro d e M a rion Le vy J r., Th e S tru ctu re of S ocie ty . Era im -p re sso e m g rá fica , m a s com le tra s q u e p a re cia m d e m á q u in a d e e scre ve r. En fim , tra ta va se d e u m a u tor m u ito in flu -e n cia d o p or Pa rson s. Fa la va d -e coisa s com o, p or e xe m p lo, q u a is a s con d içõe s b á sica s p a ra u m a socie d a d e e xistir? H a -via q u a tro con d içõe s, d e q u e já n ã o m e le m b ro m a is; m a s u m a d e la s d izia q u e n ã o p od ia h a ve r a g u e rra d e tod os con -tra tod os… Le m os ta m b é m Flore sta n Fe rn a n d e s, Fu n d am e n tos Em p íricos d a

Ex p licação S ociológ ica, En saios d e S o-ciolog ia G e ral e A p licad a. Ach o q u e

n ã o ch e g a m os a le r n e n h u m livro in te i-ro, n e n h u m a m on og ra fia d e An trop olo-g ia sob re u m olo-g ru p o ou u m a socie d a d e d e te rm in a d os. O te xto u sa d o p a ra n os fa m ilia riza rm os com o voca b u lá rio a n -trop ológ ico – o q u e é u m clã , o q u e é a fa m ília , o q u e é ca sa m e n to, e xog a m ia , e n d og a m ia e tc. – e ra d e M u rd ock , S

ocial S tru ctu re . M a s n ã o le m os a se g u n

(3)

(Eu te n h o e m ca sa u m a ca ixa d e sa p a to com a s fich a s d e le itu ra .) Estu d a m os ta m b é m o clá ssico S iste m as A frican os

d e Pare n te sco e Casam e n to, d a se g u in

-te m a n e ira : tod os le m os a In trod u çã o d e Ra d cliffe -Brow n , e d e p ois ca d a u m d e n ós le u u m d os ca p ítu los.

Coelho de Souza

N a d a d e a u tore s fra n ce se s? Da M a tta fa la e m Re lativ iz an d o q u e foi n o p rim e iro cu rso d o M u se u q u e e le tom ou con ta -to com M a u ss e Lé vi-Stra u ss.

M elat t i

Lé viStra u ss le m os d e p ois d o cu rso, e n -tre n ós m e sm os. Estru tu ras Ele m e n tare s foi lid o p or m im e m voz a lta , p orq u e n e m todos liam francês. Quanto a Mauss, Cas-tro Fa ria , cu riosa m e n te , n ã o in clu iu o

Essai su r le Don e n tre os te xtos d e An

-trop olog ia Econ ôm ica e stu d a d os n o cu r-so, m a s fa la va d e le n a la n ch on e te , n a h ora d o a lm oço, e foi d e sse m od o q u e tom a m os con ta to com M a rce l M a u ss, fora d a sa la d e a u la .

Vilaça

C om o a p a re cia o d e b a te e n tre Rob e rto C a rd oso d e O live ira e Da rcy Rib e iro n o cu rso? Afin a l, n e sse m om e n to, e le s já ti-n h a m a lg u m a s d ive rg ê ti-n cia s sob re a q u e stã o d o con ta to cu ltu ra l, p ois o con -ce ito d e “ fricçã o in te ré tn ica ” d e C a rd o-so a p a re ce e m 1964, q u a n d o e le m a n ife sta d iscord â n cia s b á sica s sob re o tra -ta m e n to q u e Da rcy Rib e iro d a va a o p ro-b le m a .

M elat t i

N o cu rso, e ssa d iscord â n cia n ã o a florou . N ã o a ch o q u e e stivé sse m os p re p a -ra d os p a -ra e la . Isso a p a re ce d e p ois, já n o con te xto d o p roje to d e Fricçã o In te ré tn ica . Afin a l d e con ta s, a lg u n s d os a u tore s q u e Da rcy Rib e iro g osta va , ta m -b é m fora m u tiliza d os n o cu rso p e lo

Ro-b e rto C a rd oso, com o, p or e xe m p lo, Le s-lie Wh ite . Aliá s, se n ã o m e e n g a n o, u m a ve z, re sp on d e n d o a p e rg u n ta s ou co-m e n ta n d o a lg u co-m livro n a re vista Cu

r-re n t A n th rop olog y , Rob e rto C a rd oso

ch e g a a p rop or q u e o ca m in h o d a An tro-p olog ia e sta ria e m a lg u m lu g a r e n tre a An trop olog ia b ritâ n ica e o e volu cion is-m o d e Le slie Wh ite .

Vilaça

E o q u e você s lia m sob re socie d a d e s in -d íg e n a s e sp e cifica m e n te ?

M elat t i

C om C a stro Fa ria , le m os ca p ítu los, se m -p re re la cion a d os à e con om ia ; q u e r d i-ze r, b a sica m e n te , J u le s H e n ry sob re os Ka in g a n g (e ra a ssim q u e e le d e n om in a va os Xok le n g ), C u rt N im u e n d a jú , J u -lia n Ste w a rd , Be th M e g g e rs. Foi a ssim q u e com e ça m os.

Coelho de Souza

O cu rso tin h a ta m b é m a p re ocu p a çã o d e form a r p e sq u isa d ore s. Foi n e sse con -te xto q u e você -te ve a su a p rim e ira e xp e riê n cia d e ca m xp o, com Da M a tta , e n -tre os G a viõe s, corre to?

M elat t i

Sim . In clu sive , e m u m d os p roje tos, a ch o q u e o C a rd oso se e xp lica a ssim : d e m os o cu rso, te m os os p e sq u isa d ore s, a g ora p re cisa m os coloca r e sse s p e sq u i-sa d ore s p a ra tra b a lh a r. E com isso ju sti-fica a n e ce ssid a d e d e d e se n volvim e n to d a s p e sq u isa s p rop osta s a li.

(4)

a os Te re n a . C om e sse m a te ria l, C a rd oso e scre ve u su a te se d e d ou tora m e n to,

Urb an iz ação e TriUrb alism o. N o a n o se g u in

-te , a com p a n h e i o M a tta a os G a viõe s, Ru b in g e r a com p a n h ou Roq u e a os Su -ru í, e M a ria An d ré ia a com p a n h ou Alci-d a , q u e fa zia e n tã o p e sq u isa com p e s-ca d ore s p ortu g u e se s n a p on ta d o C a ju – e ssa é a d isse rta çã o d e m e stra d o d e Alcid a e m Wiscon sin , Pe scad ore s Portu

-g u e se s n a Pon ta d o Caju , d a q u a l, a liá s,

sou o e d itor (e m Bra sília , e u e M a rtín Ib á ñ e z-N ovion fize m os, p or volta d e 1973, u m a re vistin h a m im e og ra fa d a ch a m a d a Pe sq u isa A n trop ológ ica, e u m d os n ú m e ros é a d isse rta çã o d a Alcid a ). En fim , e n tre se te m b ro e n ove m b ro d e 1961, M a tta e ste ve p e la p rim e ira ve z n os G a viõe s, e e u o a com p a n h e i com o a u xilia r d e p e sq u isa . Visita m os u m a a l-d e ia q u e fica va p róxim a à cil-d a l-d e zin h a d e Itu p ira n g a – d ig o cid a d e p orq u e e ra se d e d e m u n icíp io, n a ve rd a d e tra ta va -se d e u m a vila a o n orte d e M a ra b á , n o m e sm o la d o (e sq u e rd o) d o rio q u e e sta ú ltim a . Do la d o d ire ito fica va m os G a -viõe s, 40 k m p a ra o in te rior. Te n d o se a p roxim a d o re ce n te m e n te , o g ru p o, d e in ício com ce rca d e n ove n ta ín d ios, tin h a sid o d izim a d o p or d oe tin ça s e m Itu -p ira n g a e d e le s re sta va m a -p e n a s 25. H a via u m ou tro g ru p o d e G a viõe s, q u e n ã o con h e ci, m a s q u e M a tta visitou m a is ta rd e , n u m p osto in d íg e n a m a is a o n orte , con h e cid o com o G a viõe s d a M on ta n h a – a ch o q u e o p osto é q u e se ch a -m a va M on ta n h a . E h a via a in d a u -m te r-ce iro g ru p o, n e ssa é p oca isola d o. En tã o, foi com a q u e le s 25 G a viõe s q u e com e ça m os a p e sq u isa . Aliá s, q u a n d o ch e g a -m os à a ld e ia , e sta va -m lá a p e n a s se is d e le s.

Coelho de Souza E isso foi u m a d e ce p çã o?

M elat t i

N ã o se i re p rod u zir o q u e se n tim os n a é p oca . Era m q u a tro ca sin h a s form a n d o u m círcu lo – b e m , n ã o se i se com q u a tro ch e g a a se form a r u m círcu lo –, m a s e ra m q u a tro ca sin h a s e a li e sta va m se is p e ssoa s. Um m ê s, m ê s e m e io d e p ois, ch e g a ra m os ou tros, som a n d o 25. O lí-d e r já e ra Kok re n u m , q u e con tin u a lá a té h oje .

Vilaça

C om o é q u e você s e n tra va m n a s á re a s? Você s tin h a m con ta to com o SPI? C om o e ra a ch e g a d a ? Você s le va ra m b rin d e s p a ra os ín d ios?

M elat t i

Ach o q u e a ob te n çã o d a a u toriza çã o foi fe ita p e lo C a rd oso ou p e lo M a tta . Fo-m os p a ra Itu p ira n g a , on d e h a via u Fo-m fu n cion á rio d o SPI, J a im e Pim e n te l, m a s n ã o u m p osto. Lá ta m b é m m ora va o p a i d e J a im e , G e n til Pim e n te l. J a im e e ra d e lá , e foi e le q u e n os le vou a os G a viõe s. Ele a té a con se lh a va com o d e vía m os n os ve stir. O M a tta e sta va d e b ota s a té a ca -n e la , e e u ta m b é m ti-n h a m e u s cotu r-n os. Ele n os a con se lh ou a u sa r tê n is, p or se r m a is le ve , m e lh or p a ra ca m in h a r. J a im e Pim e n te l foi m orto p e los C oru b o, lá n o ou tro e xtre m o d a Am a zôn ia , e iron ica -m e n te , se g u n d o con ta -m , e sta va co-m u m ou tro fu n cion á rio, q u e ca lça va b o-ta s, e n q u a n to e le e so-ta va d e tê n is. E o ou tro e n tã o p ôd e corre r, m a s e le se fe -riu n os e stre p e s d a roça e foi m orto. Q u a n to a b rin d e s, le va m os fa cõe s, fa -ca s; n ã o le m b ro se le va m os m iça n g a s, m a s a lg u m a coisa le va m os sim , ta lve z m u n içã o.

Vilaça

(5)

M elat t i

Am b os fa zía m os p e sq u isa . M a tta é q u e d irig ia os tra b a lh os, m a s con ve rsá va -m os. N a ve rd a d e , a ssi-m q u e ch e g a -m os, só h a via d ois h om e n s q u e p od ia m n os a te n d e r. Um e ra Ap rorore n u m , q u e con ve rsa va m a is com e le . E o ou tro e ra Ka u -tu -tu re , q u e con ve rsa va m a is com ig o. Ka u tu tu re é o q u e a p a re ce n a ca p a d o livro, n a p rim e ira e d içã o d e Ín d ios e

Castan h e iros. N ós p ra tica m e n te tom á

-va m os o te m p o tod o d e sse s ín d ios, p ois e ra m p ou cos a li. Eu con ve rsa va ta m b é m com u m a d a s m u lh e re s d e Ka u tu tu re , q u e tin h a u m a p e rn a re sse ca d a e m a n -ca va . De p ois ch e g a ra m ou tros. Um q u e n os d e u m u ita s in form a çõe s foi o p róp rio Kok re n u m , con h e cid o com o Ba le a -d o, p orq u e n u m a -d a s re fre g a s com o g ru p o isola d o d e G a viõe s le vou u m a fle -ch a d a . O q u e a ju d a va m a is a Da M a tta n ã o tin h a u m olh o, ch a m a va m n o Za -n oio, Za roio. Tod os ti-n h a m a lg u m a p e li-d o. O Da M a tta e sta va m u ito in te re ssa li-d o ta m b é m n a p a rte d e con ta to, e te n tá va -m os p e g a r te r-m os d e p a re n te sco, n o-m e s d e g ru p os, coisa s a ssim . Ach o q u e foi b a sta n te p rod u tivo, d a d a s a s con d içõe s.

Coelho de Souza

De q u a lq u e r m a n e ira , você sa iu d e lá e m p olg a d o p a ra con tin u a r a tra b a lh a r com os g ru p os J ê ? Por q u e os Kra h ó?

M elat t i

Um p ou co. Eu se m p re fu i p a ra o ca m p o p e n sa n d o e m volta r p a ra ca sa . Eu n ã o a p re cia va m u ito a a tivid a d e d e ca m p o n ã o, fa zia p or ob rig a çã o. Q u a n to a os Kra h ó, a d e cisã o n ã o foi m in h a , foi C a r-d oso q u e m os in clu iu n o p roje to, on r-d e coloca va os n om e s d e q u e m fa ria ca d a p e sq u isa . En tã o, fu i p a ra os Kra h ó. Eu n e m p od e ria d iscu tir isso com e le n a -q u e la a ltu ra , p ois m a l tin h a a ca b a d o d e fa ze r o cu rso. Pa ra m im , e ra u m a op or-tu n id a d e d e tra b a lh o.

Coelho de Souza

C om o e ra o se u re la cion a m e n to com os Kra h ó e com o você tra b a lh a va ?

M elat t i

In sta le i-m e n u m a a ld e ia , a m a is p róxi-m a d o p osto, q u e e ra ta róxi-m b é róxi-m a róxi-m a ior. Fica va a u m a lé g u a , 6 k m , d o p osto d o SPI. N a p rim e ira ve z, fiq u e i n a ca sa d a e scola , u m ca se b re d e p a u -a -p iq u e , o b a rro ca in d o, cob e rta d e p a lh a , on d e n u n ca h ou ve ra u m a a u la , e n tã o n ã o ti-n h a ca rte ira , ti-n ã o titi-n h a ti-n a d a . H a via u m a ja n e lin h a d e m a d e ira , m a s tod a a b e rta e m b a ixo. E a li e n tã o p e n d u re i a re d e . A ca sa fica va n o círcu lo d a a ld e ia , a o la d o d a ca sa d o ch e fe , Pe d ro Pe n on , q u e e m troca d e u m ta n to p or se m a n a m e d a va com id a : ca rn e d e ca ça , q u a n d o h a via , a rroz, e n g rola d o (u m a fa rin h a fe ita p e la m e ta d e : coloca -se a m a ssa d e m a n d io-ca n u m a p a n e la d e fe rro, e se m e xe co-m o p a ra fa ze r fa rin h a , co-m a s se rve -se a in d a ú m id a , n ã o se ca , m istu ra d a com o ca rn e e tc.). Ele ta m b é m fa zia ca fé , q u e vin h a d e fora d a á re a in d íg e n a , a o la d o d a q u a l u m fu n cion á rio d a FUN AI, q u e e ra ta m b é m m ission á rio p rote sta n te , Don a n im , tin h a u m a p la n ta çã o. En tã o, o ca fé e ra tra zid o d o Don a n im , já torra -d o. Q u a n -d o n ã o tin h a ca fé e u tom a va ca p im sa n to. O a çú ca r e ra d e ra p a d u ra , fe ita n a re g iã o. Era a ssim q u e e u m e a li-m e n ta va .

(6)

com o p é m a ch u ca d o, ou tro p or e sta r d oe n te . À ta rd e , ch e g a va m os h om e n s correndo com toras. Quando a n oite ca ía , a s m u lh e re s ia m ca n ta r n a p ra ça . O s h om e n s fica va om se n ta d os a ssistin d o, os ra -p a ze s -p u la va m d ia n te d e la s. Um ca n tor m a scu lin o com u m m a ra cá d irig ia o ca n -to d a s m u lh e re s. Isso p od ia d u ra r p ou co ou se p rolon g a r. Q u a n d o h a via b a sta n te com id a , ca rn e e m p a rticu la r, os câ n ticos d e m ora va m m a is; q u a n d o fa lta va ca rn e , d e m ora va m m e n os. Às ve ze s, se h a via fa rtu ra , a s m u lh e re s le va n ta va m -se d e m a d ru g a d a e volta va m a ca n ta r. Assim , o ca n to e sta va u m p ou co lig a d o à q u a n -tid a d e d e a lim e n to, q u e já e ra d ifícil d e ob te r n a q u e la é p oca .

Vilaça

Q u a n d o você e sta va p re se n te n e ssa s re u n iõe s e d a n ça s n a p ra ça , você p e d ia q u e a lg u é m tra d u zisse os d iscu rsos e ca n tos?

M elat t i

Sim , g e ra lm e n te p e d ia . O s ca n tos só fu i te n ta r e n te n d e r m a is ta rd e . M a s q u a n to a os d iscu rsos e u p rocu ra va p e lo m e n os sa b e r d o q u e tra ta va m , com a q u e le s q u e e sta va m a ssistin d o. N e m se m p re tin h a su ce sso, p orq u e e le s ta m b é m q u e ria m p re sta r a te n çã o. O s ca n tos e u te n -te i tra d u zir d e p ois, e m ou tra s visita s, com u m b om con h e ce d or. Tod a via , tra -d u zir p a la vra p or p a la vra n ã o con se g u i. Era d e m ora d o d e m a is, e n tã o e u m e con te n ta va g e ra lm e n te com u m a tra d u -çã o m a is ou m e n os livre . Aca b e i n ã o a p rove ita n d o m u ito e g u a rd e i o q u e a n ote i. Em Ritos d e u m a Trib o Tim b ira e u q u a se n ã o u se i e sse m a te ria l, a lé m d e u m a a lu sã o ou ou tra .

Coelho de Souza

M a s você se u tiliza b a sta n te d os m itos, n a a n á lise d os ritos. Você os re g istrou e m p ortu g u ê s?

M elat t i

Sim , e m p ortu g u ê s. O s Kra h ó e sta va m a costu m a d os a con ta r m itos p a ra H a -ra ld Sch u ltz. E os m itos e le s q u e ria m con ta r. Eu a té , n o in ício, n ã o q u e ria a n o-ta r, m a s e le s q u e ria m q u e e u a n oo-ta sse . En tã o e u a n ote i. M a s n ã o fiz n a d a m a is sofistica d o d o q u e Sch u ltz. A ú n ica d ife-rença é que registrei os textos que ch a m o d e “ C on tos d e G u e rra ” , q u e o Sch u ltz n ã o cole tou .

Coelho de Souza

An te s d e você ch e g a r a os Kra h ó, os J ê tin h a m sid o e stu d a d os p rin cip a lm e n te p or N im u e n d a jú , cu ja e tn og ra fia se rvi-ra d e b a se p a rvi-ra u m a sé rie d e con h e ci-d os a rtig os ci-d e Lé vi-Stra u ss p u b lica ci-d os n a d é ca d a d e 50, com o “ A N oçã o d e Arca ísm o e m Etn olog ia ” e “ As O rg a n iza -çõe s Du a lista s Existe m ?” O tra b a lh o so-b re a s org a n iza çõe s d u a lista s, in clu sive , fora critica d o p or M a yb u ry-Le w is e m 1960... Q u a l a su a re la çã o, n o m om e n to d a p e sq u isa , com e sse s te xtos?

M elat t i

(7)

Tê re , lon tra e p e ixe , só q u e a q u i, e m ve z d e u m a n im a l a la d o, te m os o p e ixe . M a s os a n im a is a la d os q u e a p a re ce m n o Pê m p ca h à c g e ra lm e n te sã o m a u s corre d ore s, se g u n d o os Kra h ó. Im a g in e u m g a viã o n o ch ã o: e le n ã o sa b e corre r. O p e ixe p or su a ve z n ã o te m p e rn a . En tã o, p e ixe e a ve (tra ta n d ose d e u m g a -viã o) sã o m a is ou m e n os a m e sm a coisa . E p a p a -m e l e lon tra ta m b é m sã o d ois q u a d rú p e d e s. Pod e -se p a ssa r d e u m ri-to p a ra ou tro d e ssa m a n e ira .

Tod a s e ssa s m e ta d e s d e q u e fa le i sã o d e livre e scolh a , e o p e rte n cim e n to p od e se r te m p orá rio. Ag ora , h á ou tra s m e ta d e s, com ou tros crité rios d e a filia -çã o: a s re la cion a d a s a o n om e p e ssoa l, a s q u e a b ra n g e m a s cla sse s d e id a d e s, a s d os ch a m a d os g ru p os d a p ra ça …

Coelho de Souza

Um p rob le m a p a ra Lé vi-Stra u ss e ra ju ta m e n te a d ificu ld a d e d e re la cion a r e s-se d u a lism o in stitu cion a l e o siste m a d e p a re n te sco e ca sa m e n to. Esta q u e stã o lh e in te re ssa va ? N a su a p a le stra , p or e xe m p lo, você con tou com o você e Da M a tta te n ta ra m e n con tra r e sse s g ru p os e xog â m icos n os G a viõe s.

M elat t i

N ós q u e ría m os e n con tra r a s m e ta d e s e xog â m ica s, sim . N os G a viõe s, a s p ro-cu ra m os se m su ce sso. Ach o q u e sa ím os d e lá con ve n cid os n ã o d e q u e n ã o e xistia m , m a s sim d e q u e n ã o tín h a m os con -se g u id o e n con trá -la s. M a is ta rd e , Da M a tta viu q u e os g ru p os a p in a yé d e s-critos p or N im u e n d a jú com o q u a tro cla sse s m a trim on ia is (os k iy é ) e ra m , n a ve rd a d e , a p e n a s d ois, e n ã o tin h a m n a -d a a ve r com o m a trim ôn io. N a m e sm a é p oca , e u m e d a va con ta q u e os Kra h ó ta m b é m n ã o p ossu ía m n e n h u m p a r d e m e ta d e s e xog â m ica s. E ve io ta m b é m o Bill C rock e r con firm a r q u e n os C a n e la ta m p ou co h a via ta is m e ta d e s.

Coelho de Souza

De q u a lq u e r m a n e ira , a re la çã o com a e tn og ra fia d e N im u e n d a jú p a ssa a se r fu n d a m e n ta lm e n te n e g a tiva , o q u e d e i-xa u m p ou co a se n sa çã o d e q u e ce rtos a sp e ctos, sob re tu d o a s d e scriçõe s riq u ís-sim a s d a vid a ritu a l tim b ira , p od e m te r sid o su b a p rove ita d os.

M elat t i

(8)

p e l ritu a l, m a s a se le çã o p a ra e le é d ife -re n te n a s d ive rsa s socie d a d e s. Pod e -se e n tã o a n a lisa r d e ta lh e s com o e sse .

Vilaça

É a ssim q u e você re sp on d e ria à a lu sã o a o volu m e d e in form a çõe s q u e Da M a tta fa z n a ca rta q u e você n os le u e m su a p a le stra , q u a n d o d iz, n a ve rd a d e , te r se n tid o fa lta d e u m a com p a ra çã o?

M elat t i

N ã o, n ã o e stou re sp on d e n d o a Da M a tta . Re a lm e n te , tin h a m u ita coisa n a te se , e e u p od ia te r e la b ora d o u m e stu d o com -p a ra tivo n o fin a l, -p ois a con clu sã o q u e fiz n ã o foi d a s m a is fe lize s. Pod ia te r fe i-to, m a s n ã o m e ocorre u fa ze r, ta lve z p or fa lta d e te m p o. M a s Da M a tta fe z isso n os Ap in a yé . Eu re a lm e n te n ã o e sta va m u ito volta d o p a ra a com p a ra çã o.

Coelho de Souza

A re cu sa , d a p a rte d e tod os os p e sq u i-sa d ore s d o p roje to J ê , d os con ce itos clá s-sicos d e d e sce n d ê n cia e a lia n ça , é m a is ou m e n os p a ra le la a u m m ovim e n to g e -ra l n a An trop olog ia d e e n tã o – e m 1962 te m os a crítica d e Ba rn e s à a p lica çã o d e m od e los a frica n os n a N ova G u in é , e p ou co d e p ois a crítica d o p a re n te sco co-m o ob je to a n trop ológ ico, d e u co-m la d o, p or N e e d h a m , d e ou tro, p or Sch n e id e r. Você s via m su a s con trib u içõe s com o p a rte d e sse d e b a te ?

M elat t i

Ach o q u e u n s e sta va m m a is con scie n -te s d o q u e ou tros. Eu m e se n tia m a is à m a rg e m d e sse d e b a te .

Coelho de Souza

Você e sta va con ta n d o n a con fe rê n cia d e on te m com o a id é ia d a ce n tra lid a d e d a op osiçã o n om in a d or/ g e n itor, corp o/ n om e , foi in scorp ira d a n a “ a n á lise com -p on e n cia l” d e C a rd oso e m O Ín d io e o

M u n d o d os Bran cos, e n ã o con sistia e m

u m d e b a te con scie n te com os com p o-n e o-n cia lista s. O q u e é cu rioso, p ois d e u m m od o q u a se ca su a l você a n te cip a m u ita coisa d o q u e se e stá fa ze n d o n os e stu -d os -d e p a re n te sco h oje , n a m e -d i-d a e m q u e in corp ora n a a n á lise d e te rm in olo-g ia – con tra os com p on e n cia lista s – a q u e stã o d os p rin cíp ios d e con stitu içã o d a p e ssoa .

M elat t i

Pois é , a s coisa s a con te ce m à s ve ze s a s-sim . Por e xe m p lo, u m a ve z, a ch o q u e com a p rim e ira ve rsã o d a te se fe ita , e u e sta va visita n d o o M u se u , e con ve rsa va com a C e cília H e lm n u m a d e ssa s sa la s a q u i, q u a n d o m e ocorre u q u e e ssa d is-tin çã o e n tre n om in a d ore s e g e n itore s ta m b é m a p a re cia n os ritos fu n e rá rios. H á d ois ritos fu n e rá rios n os Kra h ó, ou trê s, se con ta rm os o se p u lta m e n to. Pa s-sa d a s u m a s d u a s se m a n a s, a a lm a d o fa le cid o a p re se n ta -se a u m xa m ã , e d iz q u e e stá com fom e ; o xa m ã va i p rocu ra r a fa m ília d o m orto e os a visa , p a ra q u e p rovid e n cie m u m a ú ltim a re fe içã o p a ra e le . Dois ou trê s m e se s d e p ois, h á o rito d e fin a l d o lu to, on d e o m orto é re p re -se n ta d o p or -se u a m ig o form a l. H á p or-ta n to, d e u m la d o, o corp o, ob je to d e cu id a id o b iológ ico, e id e ou tro u m p e rson a -g e m ; a m b os a p a re ce m ta m b é m n o fim d a vid a , n os ritos fu n e rá rios. Essa id é ia m e ve io a ssim , n ã o se i b e m com o, e m o-d ifiq u e i o ca p ítu lo o-d a te se .

Coelho de Souza

M in h a p e rg u n ta é : com o você vê o fa to d e , h oje , p a re n te sco, p e ssoa e g ê n e ro te re m se torn a d o te m a s p ra tica m e n te in -se p a rá ve is – a lg o e m p a rte a n te cip a d o p or se u tra b a lh o e d e se u s cole g a s?

M elat t i

(9)

s-ta va q u e re n d o d ize r. En tã o fa lo e m p e r-son a g e m ritu a l. O q u e m e ch a m ou m a is a a te n çã o n o te xto d o M a rce l M a u ss n ã o foi su a con trib u içã o, p ois a ch o q u e e u n ã o e n te n d ia b e m . O s te xtos d e M a u ss g e ra lm e n te com e ça m com a u stra lia n os, m e la n é sios, Ín d ia , C h in a , G ré cia , e e u via n isso u m a coisa e volu cion ista , e sq u isita , sq u e m e in com od a va . Eu n ã o sa -b ia ca p ta r o p rin cip a l. En tã o, n o m e u te xto, u so a n oçã o d e “ p e ssoa ” ou “ p e r-son a lid a d e socia l” , d e Ra d cliffe -Brow n , q u e é n a re a lid a d e u m a n oçã o m e io p rosa ica , e n q u a n to M a rce l M a u ss, q u e se ria m a is im p orta n te , n ã o a p a re ce , e n ã o é p or d e scon h e cim e n to d o te xto, m a s p or n ã o sa b e r a in d a tira r tu d o d e le .

Coelho de Souza

Q u a n to à con e xã o e n tre g ê n e ro e p a -re n te sco, im a g in o q u e o fa to d e te r fe ito su a p e sq u isa e m p ortu g u ê s te n h a d ifi-cu lta d o se u a ce sso à s m u lh e re s. Vá rios a u tore s d ize m q u e n os J ê p a re n te sco e g e n e a log ia sã o a ssu n tos d e m u lh e r, e d e m u lh e r ve lh a . Estou a lu d in d o a q u i a u m p ossíve l vié s “ a n d rocê n trico” , já critica d o n os p e sq u isa d ore s d o Proje to H a rva rd -M u se u N a cion a l. Você a ch a q u e a im a g e m d a socie d a d e k ra h ó vista d e u m “ p on to d e vista fe m in in o” se ria d ife re n te ?

M elat t i

Pod e se r. Ach o q u e a s m u lh e re s re a l-m e n te con h e ce l-m l-m a is os n ol-m e s p e s-soa is. Le m b ro-m e q u e , q u a n d o e sta va a n ota n d o n om e s, g e ra lm e n te a m u lh e r q u e e sta va ou vin d o a cre sce n ta va m a is a lg u n s. E a s m u lh e re s p od e ria m ta lve z con ta r coisa s q u e os h om e n s n ã o con -ta m . M a s e u con ve rsa va com a lg u m a s m u lh e re s. Um a d e la s, a liá s, com e çou a m e a d ia n ta r a lg o sob re coisa s com o o “ se xo se ria l” , m a s n ã o foi m u ito lon g e . N o m e u ca so, e u tin h a d ificu ld a d e s com a lín g u a , m a s Te re n ce Tu rn e r e M a

y-b u ry-Le w is n ã o tin h a m e sse p roy-b le m a . Ag ora , q u a n to isso a lte ra ria a e tn og ra -fia , ou a p e n a s jog a ria lu z sob re ce rtos a sp e ctos, n ã o se i a va lia r.

Coelho de Souza

Ain d a sob re p a re n te sco: J oa n n a O ve -rin g , n u m a re se n h a d e 1981, critica e m

Diale ctical S ocie tie s u m a ce rta te n d ê n

-cia a o isola m e n to d os J ê n o p a n ora m a d a s te rra s b a ixa s, b e m com o o d e sp re zo d e ce rtos p rob le m a s tra d icion a is, com o a m otiva çã o d os tra ços crow -om a h a e a d e te rm in a çã o d os re g im e s m a trim on ia is. H á p e sq u isa s p oste riore s q u e p rocu ra m e xp lora r e ssa s d im e n sõe s, com o a te se d a M a ria Elisa La d e ira (q u e te m a tiza a re la çã o e n tre ca sa m e n to e on om á stica ) e os tra b a lh os d a Va n e ssa Le a e se u s a lu n os (q u e e stã o te n ta n d o lig a r a a m i-za d e form a l a o siste m a m a trim on ia l). C om o você vê e sse s d e se n volvim e n tos?

M elat t i

(10)

A re la çã o d e a m ig o form a l é ou tra coisa q u e rom p e com e ssa coe rê n cia . Ta lve z isso te n h a fe ito com q u e e u n ã o d e sse m u ita a te n çã o à te se d e M a ria Elisa La d e ira . Im a g in e : u m h om e m p o-d e ch a m a r, p or e xe m p lo, trê s m u lh e re s irm ã s e n tre si d e “ e sp osa ” , e con tin u a r ch a m a n d o a m ã e d e la s d e “ m ã e ” , o p a i d e la s d e “ tio m a te rn o” e tc. En tã o você p e rg u n ta : com o é q u e você ch a m a fu la n a ? E ou ve coisa s com o: “ Ah , e u ch a m a va d e irm ã , m a s ou tro d ia e la m e p e -d iu u m cig a rro, a g ora e u ch a m o -d e e s-p osa ” . Fu la n a é su a s-p a re n ta ? “ Ah é , p orq u e e la m e d e u u m p ra to d e com i-d a ” . O u e n tã o: “ Fu la n o n ã o e stá a g in i-d o d ire ito, e stá fica n d o m a lu co, e le e stá tra n sform a n d o tod a s a s su a s p a re n ta s e m e sp osa s. Aon d e é q u e e le va i e n con -tra r com id a d e p ois?” H á u m a e sp é cie d e e q u ilíb rio e n tre a lim e n to e se xo, n a s ca sa s on d e se e n con tra u m n ã o se e n -con tra o ou tro, e isso é m a is im p orta n te q u e a coe rê n cia d a te rm in olog ia .

Vilaça

O u se ja , d e p e n d e n d o d a form a com o se a g e e a tu a , d e fin e se q u e tip o d e re la -cion a m e n to d e p a re n te sco se te m . H á m u itos d a d os d e sse tip o n a s e tn og ra fia s a m e rica n ista s e m g e ra l e n os J ê .

M elat t i

N ã o se i o q u a n to isso ficou cla ro n o tra -b a lh o so-b re p a re n te sco p u -b lica d o. Ach o q u e e sse s p rob le m a s fica ra m e m se g u n -d o p la n o n o te xto q u e fiz p a ra Diale

cti-cal S ocie tie s, e n ã o os e xp lore i ta n to

q u a n to p od ia , a ssim com o n ã o e xp lore i tã o b e m a p a rte d os p re se n te s re la cio-n a d os a os ca sa m e cio-n tos.

Coelho de Souza

Ain d a fa la n d o d os J ê : su a p rim e ira p u -b lica çã o so-b re os Kra h ó foi O M ito e o

X am ã, d e 1963. O q u e n ã o d e ixa d e se r

cu rioso, n a m e d id a e m q u e o xa m a n

is-m o a ca b a se n d o u is-m te is-m a se cu n d á rio n a e tn olog ia jê .

M elat t i

(11)

Coelho de Souza

N o e stu d o sob re m e ssia n ism o, com o se coloca a q u e stã o d a con e xã o com o xa -m a n is-m o?

M elat t i

O p rofe ta e ra u m xa m ã . Ele e n tra e m con ta to com u m se r q u e , a té e n tã o, n ã o e xistia n a m itolog ia k ra h ó: C h u va . C h u -va lh e d a -va o p od e r. C h u -va te m p od e re s, va i e n via r o g a d o d o cé u , va i m a n d a r a s fe rra m e n ta s e tc. M a s o m u n d o d o a lé m n ã o fica m a is com p le xo p or ca u sa d isso.

Coelho de Souza

N o fim d e Ritos d e u m a Trib o Tim b ira, você fa la d a p u b lica çã o d a s M itológ

i-cas. O tra b a lh o d e Lé vi-Stra u ss foi u m a

in sp ira çã o p a ra fa la r d os ritos?

M elat t i

Ach o q u e p a ra m im te ve im p a cto m a ior o a rtig o “ A Estru tu ra d os M itos” . E n a s

M itológ icas, Lé vi-Stra u ss n ã o se g u ia

m a is o p rog ra m a p rop osto n e sse a rtig o. Alé m d isso, a q u e la p a ssa g e m rá p id a p or vá ria s socie d a d e s, sa lta n d o d e u m a p a ra ou tra , fa ze n d o d e ve z e m q u a n d o u m a in cu rsã o n a e tn og ra fia d e u m d e -te rm in a d o g ru p o, m e g e ra va u m p ou co d e d e scon forto. Ach o q u e só li m e sm o, d u a s ou trê s ve ze s, o p rim e iro volu m e . O s d e m a is, li a p e n a s u m a ve z. Fin a l-m e n te re solvid os a q u e le s p rob le l-m a s d o p rim e iro volu m e , n ã o se vê m u ita n ovi-d a ovi-d e n os se g u in te s.

M a s h á u m a id é ia q u e e u tire i d a li: a ssim com o n o ca so d os m itos, os ritos tê m vá ria s ve rsõe s. H á m itos q u e sã o ve rsõe s d e ou tros m itos, e , d a m e sm a m a n e ira , h á ritos q u e sã o ve rsõe s d e ou -tros ritos. Acre d ito q u e tod os e sse s ritos a p a re n te m e n te d istin tos, com a q u e la s m e ta d e s ch a m a d a s g a viã o, p a p a -m e l, a b e lh a , p e ixe e tc., sã o a n te s ve rsõe s d e u m m e sm o rito.

Vilaça

Pa ssa n d o à re la çã o e n tre o Proje to d e Fricçã o In te ré tn ica e o Proje to d e Estu d o C om p a ra tivo d a s Socie d a d e s In d íg e -n a s d o Bra sil (fu -n d id o d e p ois a o Proje to H a rva rd -Bra sil C e n tra l): se m p re q u e você p a ssa d e u m p a ra ou tro, você m u -d a o foco. Você -d iria q u e a s p e sq u isa s d ire cion a d a s p a ra o p roje to d a Fricçã o e ra m g e ra lm e n te ce n tra d a s n os e n tor-n os d a s socie d a d e s itor-n d íg e tor-n a s, com u m e n foq u e m a is e xte rn o?

M elat t i

(12)

d o M u se u e o Arq u ivo H istórico p a ra le r os re la tos d os via ja n te s, os re la tórios d os p re sid e n te s d e p rovín cia s e tc. Fu n cio-n a va m a is ou m e cio-n os a ssim : é com o se o m iolo fosse a org a n iza çã o socia l d o g ru p o in d íg e n a , e e ssa p a rte e m volta , re -fe re n te a o tra b a lh o d e Fricçã o In te ré t-n ica , e ra fe ita t-n a m e d id a e m q u e t-n os a p roxim á va m os, e d e p ois n os a fa stá va -m os, d o ca -m p o.

Vilaça

E o m iolo e ra d e ixa d o p a ra u m ou tro tip o d e tip e sq u isa , tip orq u e você tip od ia fa -ze r u m tra b a lh o d e fricçã o se m te r u m con h e cim e n to m a is p rofu n d o d a org a -n iza çã o socia l, p or e xe m p lo, p or se r u m tra b a lh o m a is p re ocu p a d o com a s re la -çõe s com o e xte rior – corre to?

M elat t i

Sim , a in d a q u e n e n h u m tra b a lh o e scri-to sob re fricçã o, n e m o d o p róp rio C a rd oso, te n h a rd e ixa rd o rd e a b orrd a r ta m b é m a lg o d a org a n iza çã o d e sse s g ru -p os. Ach o q u e a s d u a s coisa s n ã o fora m tã o d issocia d a s a ssim . O s p e sq u isa d o-re s d e H a rva rd e sta va m o-re a lm e n te m a is in te re ssa d os n a org a n iza çã o socia l. M a s M a tta , Roq u e e e u tra b a lh a m os e m a m -b os os p roje tos, e p u d e m os ve r q u e cosa s n ã o se a lte ra va m d a m e sm a m a n e ira m e sm o e m g ru p os m u ito se m e lh a n te s com o os C a n e la e os Kra h ó. Por e -xe m p lo, n os ú ltim os, q u e a ce n tu a m a n om in a çã o, a s cla sse s d e id a d e p e rd e ra m m a is im p ortâ n cia q u e e n tre os C a -n e la .

Coelho de Souza

E você d iz, e m Ín d ios e Criad ore s, q u e você tin h a m u ito m a is d a d os sob re a or-g a n iza çã o socia l in d íor-g e n a q u e sob re o con ta to in te ré tn ico, e , a in d a a ssim , o q u e p a re ce e sca p a r d e se u e stu d o, va m os d ize r, e ra a h istória ta l com o vista d e d e n tro, e m b ora , p e n sa n d o n o tra b a lh o

sob re o m e ssia n ism o e n os con tos d e g u e rra , se p ossa d ize r q u e tod os os e le -m e n tos e stive sse -m lá .

M elat t i

É, o m e ssia n ism o re forçou b a sta n te e sse tra b a lh o. M a s u m a coisa q u e e u sse n -tia fa lta e m Ín d ios e Criad ore s e ra o fa to d e com e ça r com a h istória d o con ta to (se m q u e a s fon te s con su lta d a s m e p os-sib ilita sse m re con stitu ir, n e m m e sm o e m su a s lin h a s m a is g e ra is, a org a n iza -çã o socia l d os Kra h ó n o te m p o d os p ri-m e iros con ta tos cori-m os b ra n cos). N o M u se u h a via u m e sta g iá rio, Wa g n e r N e ve s Roch a (q u e fe z p ós-g ra d u a çã o a q u i e se torn ou p rofe ssor e m N ite rói) q u e olh a va p a ra o m e u livro, via a q u e le ca p ítu lo “ O In g re sso n a H istória ” – títu -lo q u e h oje se ria u m a h e re sia –, e d izia , b rin ca n d o (e n ã o critica n d o, com o a g o-ra se fa ria ), q u e q u a n d o lia a q u e le títu lo im a g in a va u m a fila d e ín d ios Kra h ó d ia n te d e u m a b ilh e te ria com p ra n d o in -g re sso p a ra e n tra r n a h istória . De p ois d e p u b lica d o, p e rce b i a lg o q u e a té p od ia te r m e fe ito volta r p a ra os Kra h ó: e xa m in a n d o n a rra tiva s q u e e u tin h a le va n -ta d o, vi q u e a lg u m a s n ã o e ra m m itos, e ra m m a is con tos, p od e ria m a té se r h is-tória . Pod e se r q u e e la s n ã o te n h a m re a lm e n te a con te cid o, m a s sã o tra ta d a s com o h istória e n ã o com o m ito, tra ta -se d e u m g ê n e ro d ife re n te , q u e m a n ife sta u m ou tro tip o d e con sciê n cia socia l. En tã o a s re u n i, fiz u n s com e n tá rios e p u -b liq u e i n a S é rie A n trop olog ia (no8), d a

Un B. N u n ca n in g u é m d e u b ola p a ra a q u ilo, n u n ca n in g u é m com e n tou , m a s ta m b é m com o títu lo d e “ Re fle xõe s sob re a lg u m a s N a rra tiva s C ra ôs” , n in g u é m te ria lid o m e sm o. En tã o a g ora re -solvi ch a m á -lo “ C on tos d e G u e rra d os Ín d ios C ra ôs” . Essa s n a rra tiva s, a liá s, n ã o sã o u m a e sp e cia lid a d e d os Kra h ó – Bill C rock e r a n a lisa , e m u m Bole tim d o

(13)

m o tip o d os C a n e la , m a s e le n ã o tra n s-cre ve n e n h u m d e le s. De q u a lq u e r form a , n a é p oca n ã o h a via e ssa p re ocu p a -çã o d e ju n ta r e stu d os d e org a n iza -çã o socia l e d e h istória . Era m tra b a lh os se -p a ra d os.

Vilaça

Pa ssa n d o a g ora à fa se se g u in te d e su a ca rre ira com o e tn óg ra fo: com o su rg iu a id é ia d a p e sq u isa com os M a ru b o?

M elat t i

Em a lg u m m om e n to, C a rd oso d e p a rou -se com q u a tro M a ru b o h osp e d a d os n o Posto d e Um a ria çu , d os Tik u n a . N ã o se i q u a n d o e le fe z a p rim e ira via g e m a os Ti-k u n a , m a s e m 1963 visitou -os com C e cí-lia H e lm e Silvio C oe lh o, e a ch o q u e foi d e ssa ve z q u e e n con trou lá os M a ru b o. C a rd oso ficou e n ca n ta d o com os M a ru -b o. En tã o su g e riu q u e e u fize sse u m a p e sq u isa com e le s. C oisa q u e só fu i fa ze r e m 1974, p or ca u sa d a p e sq u isa com os Kra h ó, m a s se m p re m e vin h a à ca b e ça a p ossib ilid a d e , e a ca b e i in d o. Se fu i m o-vid o p or a lg u m a p e rg u n ta , a lg u m a q u e s-tã o, a ch o q u e n ã o. C om os Kra h ó, e ra p ossíve l p re ve r m a is ou m e n os o q u e e u ia e n con tra r lá , m a s com os M a ru b o a s p re visõe s e ra m m u ito m e n ore s. Eu n ã o sa b ia o q u e ia e n con tra r. A p róp ria d is-trib u içã o d os M a ru b o e ra d e scon h e cid a . N a ve rd a d e , se g u n d o os re la tórios d a

FUN AI, só h a via a li n o J a va ri d ois g ru -p os, M a ru b o e M a yoru n a , d is-p e rsos e m tod a a b a cia d e sse rio. O p osto, q u e fica -va p e rto d a re g iã o d os C oru b o, con stru í-d o lá p a ra a tra í-los, se ch a m a va Posto M a ru b o, e os C oru b o a li e ra m con h e ci-d os com o M a ru b o. Q u a n ci-d o h a via m orte d e fu n cion á rios, ch oq u e s com e le s, sa ía n os jorn a is “ M a ru b o a ta ca ” . En tã o, d e ce rta m a n e ira , fora m a m in h a p e sq u isa e a d e De lva ir [M on ta g n e r] q u e tra ça -ra m u m p rim e iro re t-ra to d a d istrib u içã o d os g ru p os n a q u e la á re a , a p e sa r d e n ã o

te rm os visita d o tod o m u n d o, só os M a -ru b o. O s re su lta d os d e sse le va n ta m e n to a p a re ce ra m n o volu m e 5 d a cole çã o

Po-v os In d íg e n as n o Brasil, d o In stitu to

So-cioa m b ie n ta l (ISA). É cu rioso com o os n om e s d e sse s g ru p os va ria va m . C a rd oso, p or e xe m p lo – q u e n ã o e n trou n o J a -va ri, m a s re fe re -se à situ a çã o lá a p a rtir d o te ste m u n h o d os Tik u n a , e a o m od o com o e ra in te rp re ta d a p e los se rin g a lis-ta s, e m d e sfa vor d os Tik u n a – n ã o fa la e m M a yoru n a , e le fa la e m “ M a yo” . E os n om e s fora m m u d a n d o: C oru b o é n m e n ovo (n o volu m e d o ISA n ã o h á C o-ru b o); o p rim e iro n om e d os M a tis q u e ou vi e ra o q u e os M a ru b o d a va m a e le s, C h in on a w a , m a ca co-p re g o; d e p ois é q u e a p a re ce u o n om e M a tis.

Vilaça

O se u p rim e iro a rtig o p u b lica d o sob re os M a ru b o é sob re p a re n te sco. Isso é in te re ssa n te p orq u e você le va a p rob le m á tica q u e lh e in te re ssou n os Kra h ó p a -ra u m a socie d a d e p a n o. M e sm o d ia n te d a riq u e za d o d iscu rso xa m â n ico a q u e você se re fe riu , se u p rim e iro in te re sse foi siste m a tiza r d a d os d e p a re n te sco.

M elat t i

(14)

Vilaça

C om o foi e ssa e xp e riê n cia d e ca m p o tota lm e n te d ife re n te , com u m a com p a -n h e ira , -n os M a ru b o?

M elat t i

A p rim e ira d ife re n ça e n tre a s d u a s e x-p e riê n cia s é q u e n os Kra h ó, m e sm o q u e você n ã o q u e ira fa ze r p e sq u isa , você fa z, p ois u m Kra h ó va i a trá s d a g e n te , con ve rsa , in siste . O s M a ru b o te n d e m a se r m a is re se rva d os. N os Kra h ó, o m a te ria l sa lta d ia n te d os se u s olh os, se m p re se e stá ve n d o a lg u m a coisa . N os M a -ru b o n ã o: sã o m a is q u ie tos, é p re ciso se r m a is in siste n te . M a s n os Kra h ó p od ia se r m a is ch a to ta m b é m , te m m u ito p d ã o. Um M a ru b o n ã o p e d e a s coisa s d i-re ta m e n te . Ta lve z isso d e corra d o p róp rio con ta to. O s M a ru b o d e ve m te r con -vivid o com se rin g a lista s, p or e xe m p lo. C h a m a m a n trop ólog o d e se n h or, e ssa s coisa s. O s Kra h ó n ã o, sã o m a is in form a is. Tra ta se n o ca so d e le s d e u form con -ta to m u ito m a is a n tig o. Alé m d isso, n os M a ru b o, o g ru p o loca l é a m a loca , é u m a ca sa . É cla ro q u e se p od e d istin g u ir lu -g a re s m a is p ú b licos, m e n os p ú b licos: te m a p orta d a fre n te , e os d ois b a n cos on d e se fa z o xa m a n ism o, on d e se re ce -b e os visita n te s, e on d e os h om e n s co-m e co-m , e n q u a n to a s co-m u lh e re s coco-m e co-m m a is p a ra d e n tro; te m os lu g a re s d e d or-m ir, n a s la te ra is. M a s p a ra se fa ze r p e s-q u isa é p re ciso e n tra r n a ca sa , o s-q u e é m a is com p lica d o. En tã o é d ife re n te . Se n te se se r n e ce ssá rio b rig a r m a is p e los d a d os n os M a ru b o d o q u e n os Kra h ó. M a s, p or ou tro la d o, os M a ru b o im p ortu n a m m e n os o p e sq u isa d or com p e -d i-d os e sta p a fú r-d ios.

Um re cu rso u sa d o n e ssa p e sq u isa com os M a ru b o, m a is p e la De lva ir, foi o d e p e d ir e com e n ta r d e se n h os. Tod a a p a rte d e re lig iã o, m a g ia , câ n ticos d e cu -ra foi m u ito e n riq u e cid a p or isso. Eu p o-d ia te r u sa o-d o os o-d e se n h os com os Kra h ó

ta m b é m , n a ve rd a d e e u ch e g u e i a u sa r. M a s tin h a sid o orie n ta d o p or H e loísa Fé n e lon , q u e e ra u m a a rtista , e a s in s-tru çõe s d e la – q u e e u p od ia te r p osto e m d ú vid a , p ois a fin a l d e con ta s n ã o sou u m a rtista – fora m d e n ã o d a r p a lp i-te s n os d e se n h os: e n tre g a r o p a p e l, o m a te ria l, e d e ixa r d e se n h a r, e ob se rva r se o d e se n h ista va i e scolh e r o ce n tro d o p a p e l, se va i e scolh e r o la d o d e cim a , se va i coloca r vá ria s fig u ra s, se va i coloca r u m a ce n a e tc. Tu d o b e m ! M a s isso é p e s-q u isa d e a rte , n ã o é ? Lá n os M a ru b o foi m e io d ife re n te : “ C om o é a ca m a d a ce -le ste Sh ok o N a i? De se n h e a ca m a d a Sh ok o N a i” . Ele s d e se n h a va m . C om o é q u e é o e sp írito ta l? E d e se n h a va m . C o-lh e m os m u itos d a d os d e ssa m a n e ira .

Coelho de Souza

Da M a tta n ã o se g u iu e sse con se lh o ou , e n tã o, n ã o ou viu , p orq u e e le tirou b a s-ta n te d os d e se n h os n os Ap in a yé .

M elat t i

(15)

Vilaça

Pa ssa n d o a u m a ou tra fa ce ta , q u e a p a re ce ce d o e m su a tra je tória , d e p re ocu -p a r-se com a d ivu lg a çã o -p a ra o -p ú b lico le ig o d os re su lta d os d a s p e sq u isa s e t-n og rá fica s, com o su rg iu e ssa id é ia d e e s-cre ve r os Ín d ios d o Brasil? Te m re la çã o com a su a e xp e riê n cia com o p rofe ssor?

M elat t i

Be m ou m a l, sou p rofe ssor d e sd e os 16 a n os. Fu i p rofe ssor d e cu rso d e a d m is-sã o a o g in á sio a os 16 a n os e m Pe tróp o-lis. De p ois tra b a lh e i e m M a rília , n a UFF, e , fin a lm e n te , n a Un B. N ã o se i re con stitu ir com o a p a re ce u e ssa id é ia d e e scre -ve r Ín d ios d o Brasil, m a s le m b ro q u e foi a q u i n o M u se u , ta lve z e m 1968. Aca b e i e m 1969 e e n tã o h ou ve tod o u m p rob le m a com a p u b lica çã o, q u e a ca b ou sa in -d o só e m 1970 p orq u e , e n tre ou tra s coi-sa s, o e d itor foi p re so. Eu n ã o se i n e m se p or m otivos p olíticos. Ele e ra e stra n g e i-ro, e ficou n a Ilh a d a s Flore s. Até m e a re p e n d o h oje , p orq u e a p róp ria u n ive r-sid a d e q u is p u b lica r o livro, m a s com o o e d itor e sta va p re so, e u n ã o q u e ria tira r o livro d e le e e sp e re i e le sa ir. M a s d e p ois e le m e d e ixou se m o p a g a m e n to d os d i-re itos a u tora is.

N a ve rd a d e , fiz vá ria s in ve stid a s n a á re a d e d ivu lg a çã o. Um a foi os Ín d ios

d o Brasil; ou tra foi Pe sq u isa A n trop oló-g ica, a re vistin h a m im e ooló-g ra fa d a q u e fiz

e m 1973. De p ois, e m 1983-84, q u a n d o a ABA e sta va e stim u la n d o a s ABAs re -g ion a is e cria m os u m a e m Bra sília (q u e h oje n ã o e xiste m a is), e u p rop u s q u e a b rísse m os n o jorn a l u m a colu n a se m a -n a l, q u e m a -n tive m os d u ra -n te u m a -n o -n o

Jorn al d e Brasília. A ca d a se m a n a e u

ti-n h a q u e coti-n ve ti-n ce r a lg u m a ti-n trop ólog o d a cid a d e a e scre ve r u m te xto d e se s-se n ta lin h a s. N orm a lm e n te , a coisa e ra e n tre g u e e m cim a d a h ora , e u fica va lá , a p e ssoa a ca b a n d o d e e scre ve r e e u com a m ã o p ron ta p a ra p u xa r e sa ir corre n

-d o p a ra o jorn a l p a ra e n tre g á -la a n te s d o fin a l d a ta rd e . Ach o q u e fiz ou tra s coi-sa s n e sse se n tid o, d a d o q u e se m p re tive ce rto in te re sse p e la d ivu lg a çã o. Ag ora , p or e xe m p lo, h á e sse cu rso d e e xte n sã o n a Un B p a ra o p ú b lico le ig o, d e ce rta m a n e ira lig a d o a Ín d ios d o Brasil. Eu q u is e scre ve r a lg o q u e su b stitu ísse Ín

-d ios -d o Brasil, u m a sé rie -d e te xtos sob re

á re a s e tn og rá fica s, m a s, p a ra m e in ce n -tiva r a e scre ve r, re solvi d a r o cu rso. N os cu rsos a p re se n to u m a a p ostila q u e con -té m o e sb oço d e sse s te xtos, m a s isso e s-tá m e io p a ra d o, e p a ra va ria r u m p ou co com e ce i a g ora u m cu rso sob re m itolog ia .

Coelho de Souza

Pre cisa ría m os som a r a o p rofe ssor su a a tivid a d e d e e d itor, e e ssa e xp e rim e n -ta çã o com n ovos m e ios d e d ivu lg a çã o. Você te m u m a p á g in a n a in te rn e t, p or e xe m p lo.

M elat t i

Pois é , o q u e e u fiz sob re a s á re a s e tn o-g rá fica s e stá lá : os m a p a s, os te xtos sb re a s á re a s, a lé m d e Ín d ios e Criad

o-re s, o M e ssian ism o Kraô, “ O s C on tos d e

G u e rra …” (h ttp :/ / w w w.g e ocitie s.com / ju liom e la tti). Só n ã o tive cora g e m d e p ôr u m con ta d or p a ra ve rifica r o n ú m e -ro d e visita s.

Vilaça

Fa la n d o d a s á re a s e tn og rá fica s, à s q u a is você ch e g ou p a rtin d o d a s á re a s cu ltu -ra is d e fin id a s p or a u tore s com o Ste w a rd e G a lvã o, e com p le xifica n d o o q u a d ro tra ça d o p or e le s p e la in trod u çã o d e ou -tra s va ria n te s, in clu sive a p osiçã o d o e t-n óg ra fo, com o você vê os re su lta d os?

M elat t i

(16)

vista p e lo ob se rva d or e xte rn o, e ou tra , se g u n d o o m od o com o é vivid a p e los ín -d ios. Q u e r -d ize r, se com p a ra m os u m a á re a d o G a lvã o, a “ Toca n tin s-Xin g u ” , p or e xe m p lo, q u e a b a rca Tim b ira , Ka -ya p ó, Ka ra já , Bororo, Xa va n te , va m os ve r q u e , e m b ora Bororo e C a n e la e ste -ja m n a m e sm a á re a , u m C a n e la n u n ca viu u m Bororo p e la fre n te , n u n ca con -ve rsou com u m Bororo, a n ã o se r e m Bra sília . N ã o sa b e o q u e u m Bororo fa z, o q u e é , e n a d a d isso. M a s o C a n e la co-n h e ce se u s vizico-n h os, os G u a ja ja ra , q u e e stã o e m ou tra á re a (“ Pin d a ré G u ru -p i” ). En tã o, e m ve z d e d e fin ir á re a s d e s-se je ito, p od e m os te n ta r p a rtir d a s a rticu la çõe s e xiste n te s, tra ça r re d e s d e re -la çõe s, ju n ta r os ín d ios q u e troca m , ou q u e lu ta m e n tre si, e in te ra g e m se ja p e -la g u e rra , p e lo in te rca sa m e n to, p e -la p rocu ra d e xa m ã s, p or visita re m a s m e s-m a s cid a d e s e tc. M a s se q u ise rs-m os to-m a r e sse ca to-m in h o, p re cisa to-m os p rito-m e iro te r m u ito m a is in form a çõe s sob re e ssa s a rticu la çõe s. M a s, p or ou tro la d o, p e r-d e m os r-d e vista q u e o q u e os e tn óg ra fos fa ze m n orm a lm e n te , q u a n d o se le cio-n a m u m g ru p o p a ra e stu d a r ou fa ze m com p a ra çõe s, é , a n te s d e tu d o, p e n sa r e m te rm os d e fa m ília s lin g ü ística s, com o Tu p i, J ê , Aru a k , Ka rib . En tã o, e u te n -to u m com p rom isso e n tre isso tu d o, m a s n a ve rd a d e a ch o q u e e u re ca í foi n a s á re a s d o G a lvã o. Eu fa ço tod o u m co-m e n tá rio in icia l, co-m a s a ú n ica coisa q u e e u fiz d ife re n te d e le foi d ivid ir á re a s q u e e ra m m u ito g ra n d e s, a cre sce n ta r á re a s q u e n ã o e stã o n o Bra sil, e p rolon g a r á re a s a lé m -fron te ira . Afora d ize r – a lg o q u e tod o m u n d o já sa b ia – q u e n o fu n -d o to-d a á re a é u m a -d ivisã o a rb itrá ria .

H á a lg u m a s q u e se im p õe m : o Xin -g u clá ssico, o Xin -g u d o su l. G a lvã o a ch a q u e a q u ilo é u m a á re a p or ca u sa d a h om og e n e id a d e cu ltu ra l, m a s p od e -se ve r d e ou tra m a n e ira : tra ta --se d e u m a á re a p orq u e e le s se a rticu la m

ritu a lm e n te , p or e xe m p lo. C om o Rio N e -g ro é a m e sm a coisa : G a lvã o p e n sa va ta m b é m e m h om og e n e id a d e , e tom a va os M a cu com o u m g ru p o q u e e sta va p ou co a p ou co se torn a n d o cu ltu ra l-m e n te se l-m e lh a n te a os ou tros d o Alto Rio N e g ro. M a s p od e -se tom a r e ssa m e s-m a á re a e con sid e rá -la cos-m o a rticu la d a , p or e xe m p lo, p e lo siste m a d e ca sa m e n -to. En tã o, h á á re a s q u e se im p õe m a o p e sq u isa d or, e tu d o o q u e e le te m a fa -ze r é con sta ta r q u e e xiste m .

Ag ora , h á ou tra s q u e é o p e sq u isa -d or q u e m cria . O Bra sil C e n tra l, p or e xe m p lo, in te re ssa a os p e sq u isa d ore s p orq u e e sse s g ru p os sã o se m e lh a n te s, coloca m -n os d ia n te d e u m a p rob le m á ti-ca com u m . O u tra coisa q u e G a lvã o fe z, e q u e e u g osta ria d e e vita r, é d issolve r os g ru p os in d íg e n a s n a á re a . Q u a n d o olh a m os p a ra a s á re a s a q u e e le ch e g a , ve m os m a is ou m e n os o se g u in te : á re a ta l, xa m a n ism o, d e sce n d ê n cia p a trili-n e a r, a rcos d e se çã o re d otrili-n d a , u so d e m a n d ioca (m e n os n o g ru p o X), u so d e ca n oa s d e ca sca (m e n os n o g ru p o Y) e a ssim p or d ia n te . É q u a se com o se b a -tê sse m os a q u e le s g ru p os é tn icos n o li-q u id ifica d or, e a p re se n tá sse m os u m a coisa q u e n ã o é n a d a . O q u e e u te n to fa ze r é n ã o d issolve r os g ru p os n a á re a , q u e r d ize r, e le s e stã o n a á re a p or a lg u m m otivo, p or se re m se m e lh a n te s, p or e s-ta re m a rticu la d os ou p or a p re se n s-ta re m u m d e te rm in a d o tip o d e p rob le m a in te -re ssa n te , m a s tra ta -se se m p -re d e u m a d e cisã o d o p e sq u isa d or.

Vilaça

E você coloca ta m b é m a q u e la s lin h a s d e flu xo, d e com u n ica çã o e n tre e le s...

M elat t i

(17)

com o os g e óg ra fos tra b a lh a com (ou tra b a -lh a va m , n ã o se i) com h ie ra rq u ia s d e ci-d a ci-d e s. Se m oro n u m a p e q u e n a vila e te n h o u m p e q u e n o corte n o d e d o, p osso p rocu ra r o a m b u la tório d a vila , m a s se te n h o a p e n d icite , te n h o q u e fa ze r a ci-ru rg ia n u m a cid a d e u m p ou q u in h o m a ior, on d e e xista u m p e q u e n o h osp i-ta l, e se p re ciso fa ze r u m tra n sp la n te , te n h o q u e ir p a ra u m a m e tróp ole – e ssa s cid a d e s e stã o p orta n to h ie ra rq u iza -d a s. Fiz u m a te n ta tiva -d e tra n sfe rir isso p a ra a s re la çõe s e n tre g ru p os in d íg e n a s. Assim , M a ru b o, M a tis, a q u e le s g ru p os d o J a va ri, se a rticu la m e m Ta b a tin -g a . En tã o, q u a se q u e se a p rision a m e s-sa s re la çõe s à p róp ria h ie ra rq u ia d e ci-d a ci-d e s ci-d os g e óg ra fos. Ag ora , p a ra sa b e r e xa ta m e n te on d e u m d e te rm in a d o g ru p o va i p rocu ra r re cu rsos m á g icos ou xa -m ã s, co-m q u e ou tros g ru p os co-m e rcia , se ca sa , fa z a g u e rra ou o q u e q u e r q u e se ja , p re cisa -se e sta r m u ito b e m in for-m a d o. En tã o foi u for-m a su g e stã o q u e e u m e sm o n ã o p u d e se g u ir.

Vilaça

É in te re ssa n te q u e você d e ce rta form a volta à su a form a çã o d e g e óg ra fo.

M elat t i

É ve rd a d e , a ch o q u e re a lm e n te é a ssim . H a via u m a p rofe ssora d e g e og ra fia q u e e ra m u ito in te re ssa d a e m n os coloca r e m con ta to com a a tivid a d e g e og rá fica , M a ria M a d a le n a Vie ira Pin to. Ela tra zia cole çõe s d e re vista s q u e n u n ca tín h a -m os visto, coloca va n a e sta n te (u -m a e s-ta n te p a re cid a com a d o b ote co d e m e u a vô), p rom ovia e xcu rsõe s. C h e g ou m e s-m o a p u b lica r u s-m tra b a lh o q u e fiz p a ra u m a d iscip lin a e m u m a re vista d e g e o-g ra fia d o Esta d o d o Rio d e J a n e iro. Eu n ã o te n h o n e m a re fe rê n cia , m a s a l-g u é m viu e m e con tou . Ach o q u e isso m e m a rcou d e a lg u m m od o.

Vilaça

Ve n d o tod o o se u p e rcu rso, a im a g e m m a is forte q u e fica é a d o e tn óg ra fo, m a is p re ocu p a d o e m p e n sa r a p a rtir d os p rob le m a s q u e se a p re se n ta va m n o ca m p o, d o q u e e m con stru ir u m a g ra n -d e te oria n o -d iá log o com a s te oria s -d is-p on íve is. Ta n to a ssim q u e se u s d a d os e tn og rá ficos tê m u m a riq u e za q u e d ife -re n cia o se u tra b a lh o, e p ossib ilita m se m p re u m a n ova le itu ra . Você g a sta tod a s a s p á g in a s, tod o o p a p e l q u e você te m , p a ra re la ta r o q u e lh e foi p ossíve l ob se rva r. Tom e -se a e tn og ra fia k ra h ó: n o m om e n to e m q u e você se n tiu q u e e sta va con clu íd a , q u e você tin h a a p re -se n ta d o os d a d os q u e p od ia cole ta r n o ca m p o, você m u d ou d e g ru p o...

M elat t i

Referências

Documentos relacionados

Foram introduzidas mudanças nas políticas relacionadas a força de trabalho, especialmente dos médicos, com novas possibilidades de composição da carga horária médica das

Curso de imersão em Ortodontia Lingual, ABOL - Associação Brasileira de Ortodontia Lingual Curso teórico-prático sobre Ortodontia Lingual - Sistema STB, Ormco, São Paulo. Curso

A um nível económico, a utilização de consumíveis Originais da HP faz mais sentido – pesquisas recentes demonstram que os tinteiros de jacto de tinta Originais da HP produzem mais

Para os sistemas de pastejo bovinos, ovinos e simultâneo, foram utilizados quatro piquetes e, no alternado, cinco, o que permitiu a rotação da pastagem com sete dias de ocupação e

José Amado Mendes Miguel Figueira de Faria Pedro

Visando atender de forma mais eficaz a demanda do mercado e deixar nossos clientes menos dependentes de um único produto para execução da imprimação, a

Sobre o cabimento, ou não, do procedimento monitório para a cobrança de despesas de condomínio, a Turma não conheceu do recurso ao concluir que é cabível o procedimento

Eesti muinasusk oli kiriku ehitamise ajal täies elujõus ning raiendiga kivi võib pärineda ka tollest ajast.. Arheoloogiadoktor Jüri Peets tellis kiriku müüre katnud