UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
FACULDADE DE DIREITO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
YURI LENNON MOURÃO LOBO MELO
ANÁLISE DA RECEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA REDUÇÃO DE EMOLUMENTOS
DO ART. 290, DA LEI N º 6.015/73, PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
FORTALEZA
YURI LENNON MOURÃO LOBO MELO
ANÁLISE DA RECEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA REDUÇÃO DE EMOLUMENTOS
DO ART. 290, DA LEI N º 6.015/73, PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Tributário.
Orientador: Prof. MSc. William Paiva Marques Júnior.
FORTALEZA
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará
Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito
M528a Melo, Yuri Lennon Mourão Lobo.
Análise da recepção do benefício da redução de emolumentos do art. 290, da lei nº 6.015/73, pela Constituição Federal de 1988 / Yuri Lennon Mourão Lobo Melo. – 2014.
57 f. : enc. ; 30 cm.
Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2014.
Área de Concentração: Direito Tributário.
Orientação: Prof. Me. William Paiva Marques Júnior.
1. Isenção tributária. 2. Registros públicos - Brasil. 3. Taxas (Direito). I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.
YURI LENNON MOURÃO LOBO MELO
ANÁLISE DA RECEPÇÃO DO BENEFÍCIO DA REDUÇÃO DE EMOLUMENTOS
DO ART. 290, DA LEI N º 6.015/73, PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Tributário.
Aprovada em: 04/11/2014.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________
Prof. MSc. William Paiva Marques Júnior. (Orientador)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
_________________________________________
Mestranda Julianne Melo dos Santos
Universidade Federal do Ceará (UFC)
_________________________________________
Doutorando Álisson José Maia Melo
A Deus, razão maior do meu viver.
AGRADECIMENTO
A Deus, por toda graça que tem me proporcionado, estando ao meu lado em todos
os momentos.
Aos meus pais, José Dorismar Melo e Ana Lourdes Mourão Lobo Melo, por todo
o empenho, cuidado e amor que me dedicaram, sendo peças fundamentais na concretização de
todos os meus sonhos. Muito obrigado por tudo que são e representam para mim.
Às minhas irmãs, Francisca Ingrid Mourão Lobo Melo e Ívina Mourão Lobo
Melo, e ao meu cunhado, Davi Bezerra de Oliveira, pelo valioso apoio que sempre me
demonstraram. Vocês tiveram importante papel nessa caminhada.
À minha namorada, Mariana Tomaz da Cunha, companheira fundamental nessa
trajetória e na minha vida. Pelo seu esforço impecável em sempre me tranquilizar e incutir
confiança, quando as adversidades aparentavam ser maiores que as minhas esperanças.
Ao meu orientador, Prof. MSc. William Paiva Marques Júnior, pelo privilégio que
me proporcionou ao aceitar meu convite. Sou grato por toda atenção, profissionalismo e
compreensão que me foram devotados.
Aos membros participantes da banca examinadora, Mestranda Julianne Melo dos
Santos e Doutorando Álisson José Maia Melo, pela colaboração na construção deste trabalho,
ao acatarem meu convite.
Aos meus amigos e demais familiares, pela convivência agradável, que me serviu
sempre de fonte revigorante nas batalhas de cada dia.
“A finalidade social do art. 290 é evidente, apesar da redação confusa e da ofensa à CF.
Consiste em facilitar a aquisição da casa
própria.”
RESUMO
Analisa-se o instituto dos emolumentos extrajudiciais, a partir de sua natureza jurídica de
taxas. Empós, passa-se ao examine da figura jurídica das taxas, destacando o benefício de
isenção de tributária. Aprofundando, segue-se à investigação da isenção heterônoma,
discorrendo-se sobre a sua aplicação dentro do ordenamento jurídico brasileiro face a
Constituição Federal de 1988. Então, passa-se ao estudo do benefício de redução de
emolumentos extrajudiciais previsto no art. 290, da Lei nº 6.015/73, desenvolvendo uma
análise crítica sobre essa hipótese de isenção parcial de emolumentos. Por fim, avalia-se a
recepção pela Constituição Federal de 1988 do dispositivo aduzido, em razão de eventual
configuração de isenção heterônoma.
Palavras-chave: Emolumentos extrajudiciais. Serviços públicos notariais e registrais. Taxas.
ABSTRACT
The present essay aims to study the extrajudicial fees paid to registries for providing notary
public services (called as "emoluments"). First of all, the legal nature of this institute is
appreciated, under the classification established by Brazilian tax laws. Further, the research
deepens over the benefit of tax exemption, focusing on the species of heteronomous
exemption. Then the essay discusses the possibility of reducing these extrajudicial fees
according to article 290 of Law number 6015/73, developing a critical analysis about this
hypothesis of partial exemption, which means a concession given by one political entity on
another entity's taxes. Finally, it is evaluated if that benefit is still valid in compliance with
Brazilian Constitution, due to the possible configuration of a heteronomous exemption.
Keywords: Extrajudicial fees. Notary public and registry services. Heteronomous
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ... 11
2 NOTAS SOBRE A ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO, E SOBRE OS EMOLUMENTOS EXTRAJUDICIAIS... 13
2.1 A atividade notarial e de registro …... 13
2.1.1 A função da atividade notarial e registral ... 14
2.1.2 O exercício da atividade notarial e de registro ... 15
2.2 Os emolumentos extrajudiciais: delimitação conceitual, natureza jurídica e caracteres fundamentais …... 16
2.2.1 A competência de fixação dos emolumentos …... 18
2.2.2 A cobrança dos emolumentos …... 19
2.2.3 A natureza jurídica dos emolumentos…... 19
2.3 Considerações sobre as taxas …... 21
2.3.1 As taxas de serviços públicos …... 22
2.3.1.1 A base de cálculo das taxas …...…..……….………….….…. 23
2.3.2 As implicações aos emolumentos extrajudiciais em razão do regime jurídico das taxas …... 24
3 ISENÇÃO TRIBUTÁRIA: DELIMITAÇÃO, CONCEITUAÇÃO E CARACTERÍSTICAS GERAIS ………...………. 26
3.1 Conceito de isenção …... 28
3.1.1 Outras modalidades de desonerações tributárias ... 30
3.1.1.1 Não Incidência …...…..……….………….….…. 30
3.1.1.2 Imunidade …...…..……….………….….…. 30
3.1.1.3 Alíquota Zero …...…..……….………….….…. 31
3.1.1.4 Diferimento de incidência …...…..……….………….….…. 32
3.2 Características gerais das isenções …... 32
3.2.1 Classificações das isenções …...... 35
3.3 Análise da isenção heterônoma na ordem jurídico-constitucional de 1988. 36 3.3.1 Exceções à vedação da isenção heterônoma …... 37
3.3.2 A isenção heterônoma em custas forenses …...... 39
4.1 O benefício do art. 290, da Lei nº 6.015/73 …... 41
4.1.1 Análise da redação do art. 290, da Lei nº 6.015/73 …... 42
4.1.2 Análise crítica do art. 290, da Lei nº 6.015/73... 45
4.2 A isenção heterônoma do art. 290, da Lei nº 6.015/73, ante o sistema estabelecido na Constituição Federal de 1988 …... 47
4.2.1 Análise das decisões sobre o tema …...... 49
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 55
1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 6.015/73, que disciplina os Registros Públicos no Brasil, trouxe em seu
art. 290 uma hipótese de redução de emolumentos extrajudiciais cobrados na aquisição de
imóveis com fins de moradia. O benefício é interessante ao ser analisado sob a ótica da
desburocratização e do fomento ao acesso da população à moradia.
No entanto, embora o fim social seja louvável, a norma em apreço deve obedecer
a ordem jurídica vigente. Não podendo se opor às determinação previstas, principalmente, na
Constituição Federal de 1988.
Os emolumentos extrajudiciais, como contraprestação das atividades
desempenhadas pelos notários e tabeliães das serventias extrajudiciais, assumem um caráter
de tributo, em especial na modalidade de taxa por prestação de serviço público. É esse o
pensamento sustentado pelo Supremo Tribunal Federal e pela doutrina, como será melhor
apresentado no curso deste trabalho.
A Constituição Federal de 1988 é objetiva ao vedar, em seu art. 151, III, a
possibilidade de concessão de isenção por ente político diverso daquele responsável por
instituir o tributo a ser alvo da medida isentiva, em um fenômeno conhecido por isenção
heterônoma dos tributos.
Nesse contexto, tendo-se que os emolumentos extrajudiciais possuem a natureza
jurídica de taxas, que a Constituição Federal veda a isenção heterônoma e que o art. 290, da
Lei nº 6.015/73, disciplina uma forma de isenção dos emolumentos, uma dúvida surge: o
benefício previsto no art. 290 da Lei de Registros Públicos é plenamente compatível com a
Constituição Federal de 1988?
Assim, o presente estudo, através de uma pesquisa bibliográfica – qualitativa, descritiva e exploratória – por meio de consultas aos livros especializados e às produções acadêmicas sobre o assunto, debruçar-se-á sobre essa questão, no intuito de buscar subsídios
que auxiliem no entendimento do caso e na construção de eventual resposta.
Para tanto, no Capítulo 2, faz-se uma abordagem sobre a atividade notarial e
registral. São exploradas as características essenciais deste serviço, até ser atingindo a figura
dos emolumentos extrajudiciais. Nesse momento, o estudo se volta a tal instituto, a fim de se
obter a natureza jurídica a eles atinente. Em posse de tal conhecimento, passa-se ao estudo da
No Capítulo 3, traça-se uma análise aprofundada do fenômeno jurídico da
isenção. São apresentas as características basilares dessa figura jurídica, fazendo-se uma
importante diferenciação com outros institutos semelhantes. Por fim, traz-se as disposições
constitucionais sobre o tema, em especial as referentes à isenção heterônoma.
Procede-se, no Capítulo 4, ao estudo do art. 290, da Lei nº 6.015/73. Nessa
oportunidade, são tecidos comentários sobre o dispositivo em apreço, relacionando-o com os
institutos abordados nos capítulos precedentes. Faz-se, também, uma análise da norma com o
ordenamento jurídico então vigente e, com as decisões judiciais e administrativas sobre o
2 NOTAS SOBRE A ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO, E SOBRE OS
EMOLUMENTOS EXTRAJUDICIAIS
O estudo aprofundado do presente tema exige o conhecimento de certo institutos
referentes à atividade notarial e de registro. No corpo do presente capítulo, discorre-se sobre
atividade notarial e de registro, seu conceito, sua natureza jurídica e suas peculiaridades.
Empós, são tecidos comentários sobre os emolumentos extrajudiciais, apresentando sua
natureza jurídica, sua concepção doutrinária, sua disposição legal, entre outras
particularidades. Por fim, em decorrência do entendimento dado à natureza jurídica dos
emolumentos, é realizada uma explanação sobre o instituto das taxas.
2.1 A atividade notarial e de registro
A atividade notarial e de registro exerce importante função na sociedade, tendo
disciplina legal, inclusive, na Constituição Federal de 1988. A finalidade dessas atividades
vem disposta no art. 1º da Lei n.º 8.935/94, que versa sobre os serviços notariais e de registro,
do seguinte modo: “Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos
jurídicos”.
Em razão dessa definição legal pode-se observar o impacto relevante que os
serviços notariais e registrais vêm desempenhando em nosso meio. Ao serem responsáveis
por dar publicidade, autenticidade, segurança e eficácia a certos atos jurídicos, tais atividades
passam a ser preservadoras da ordem social, uma vez que reverbera o poder interventor do
Estado nos negócios jurídicos particulares, conhecido na doutrina por administração pública
de interesses privados1.
De igual modo, pode-se afirmar que tais atividades exercem importante apoio ao
Poder Judiciário, subtraindo parte da demanda, ao desempenhar atividades antes privativas
1 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
deste, a exemplo do inventário, da partilha e do divórcio consensual, os quais, atualmente,
podem ser realizados pela via administrativa, nas serventias extrajudiciais2.
Antes de se adentrar no estudo da atividade notarial e, em especial, a de registro
desempenhada pelas serventias extrajudiciais, ressalte-se que o termo “cartório”, embora a Constituição de 1988 e os diplomas regulamentadores do serviço notarial e registral
subsequentes tenham subtraído tal expressão, ainda é bastante utilizado na práxis e no
linguajar cotidiano para designar as serventias extrajudiciais, bem como os assuntos a estas
relacionados.
Contudo, em respeito ao tratamento devotado pela lei e ao entendimento da
doutrina3, as serventias extrajudiciais, bem como a atividades a elas relacionadas, serão, no presente estudo, tratadas pelos termos técnicos pertinentes.
2.1.1 A função da atividade notarial e registral
O serviço notarial consiste no aconselhamento técnico de parte(s) interessada(s)
em formar determinado negócio jurídico, com a transposição da(s) vontade(s) exarada(s) em
documento notarial hábil, que garanta a forma imprescindível ao ato, dando-lhe certeza
jurídica.4 Trata-se, pois, de reflexo prático da administração pública sobre dos interesses privados, aqui já apresentado.
Por sua vez, a atividade registral está fundada na necessidade de garantir
segurança jurídica à declaração ou à constituição de determinado direito real, com a inscrição
do título respectivo. O título, portanto, tem o objetivo de gerar publicidade registral erga
omnes, da situação fática do imóvel. Nessa esteira, também entende Balbino Filho5, ao analisar a funcionalidade do serviço registral em reproduzir a realidade fática do direito
imobiliário.
2 As serventias extrajudiciais são repartições públicas (meras divisões administrativas), onde os notários e
registradores desempenham suas funções. Não gozam, portanto, de personalidade jurídica consoante leciona a doutrina e vem decidindo os tribunais pátrios. “Nesse sentido, a CGJ/SP editou parecer no sentido de que não há falar em sucessão, até porque o ‘cartório’ ou unidade de serviço notarial e de registro não possui personalidade jurídica distinta daquela da pessoa física do delegado ou da pessoa provisoriamente designada para responder pelo expediente vago (Processo CG 855/2003).” (gifou-se) – LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: teoria e prática. 5ª ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Forense; São Paulo: Editora Método, 2014, p. 09. Vide: STJ, RE 911.151/DF — 2006/0275747-0 — T3, Rel. Min. Massami Uyeda, julgamento 17.06.2010.
3CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada (lei n. 8.935/94). 6ª ed. rev. e atual.
São Paulo: Editora Saraiva, 2008, p. 21.
4 BRANDELLI, Leonardo. Teoria Geral do Direito Notarial – de acordo com a Lei n. 11.441/2007. São
Paulo: Editora Saraiva, 2007, p.119-121.
Frise-se que as funções da atividade notarial e registral decorrem, essencialmente,
da finalidade que lhes são dadas pelo art. 1º, da Lei nº 8.935/94. Desse modo, tais serviços
desempenham seu mister sob a necessidade de se garantir aos atos jurídicos a publicidade, a
autenticidade, a segurança e a eficácia que lhes sejam imprescindíveis.
2.1.2 O exercício da atividade notarial e de registro
A Constituição Federal, em seu art. 236, definiu que os serviços notariais e de
registro devem ser exercidos em caráter privado, através de delegação do Poder Público.
Como meio de dar efetividade à norma constitucional, foi publicada a Lei nº 8.935/94, a qual
tratou dos agentes responsáveis pelo exercício da atividade notarial e de registro das
serventias extrajudiciais, do seguinte modo: “Art. 3º. Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado
o exercício da atividade notarial e de registro.”
Depreende-se, das normas apresentadas, que os notários e os registradores são
profissionais jurídicos, os quais exercem suas atividades em razão de delegação de serviço do
Poder Público. Assim, vislumbra-se a essência de caráter de serviço público6 que reveste a atividade notarial e de registro. Tal fato é corroborado pela jurisprudência pátria7, a qual se inclina no sentido de admitir, também, a qualidade de serviço público presente na atividade
notarial e de registro.
Em razão de não ser exercido diretamente pelo Poder Público, e nem o poderia
por se tratar de serviço público de delegação obrigatória8 – conforme dicção do art. 236, da Constituição Federal –, a prestação do serviço público notarial e de registro é transferida a
6 A definição de serviço público exige a presença de três importantes requisitos: o substrato material, que se trata
da comodidade ou utilidade usufruída pela sociedade de forma contínua; o trato formal, o qual reporta que a prestação se define sobre o regime de direito público; e o elemento subjetivo, que é a prestação do serviço pelo Estado, diretamente ou indiretamente. Como se apresenta nos dizeres de MELLO: “Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído pelo Estado em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo”. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 600.
7RE 209.354-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 2-3-1999, Segunda Turma, DJ de 16-4-1999; RE
551.156-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 10-3-2009, Segunda Turma, DJE de 3-4-2009; ADI 3.089, Rel. p/ o ac. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 13-2-2008, Plenário, DJE de 1º-8-2008; RE 557.643-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 10-2-2009, Segunda Turma, DJE de 13-3-2009.
particulares9, que passam a desempenhar tais atividades. Trata-se, pois, de descentralização do serviço público, fenômeno que, no presente caso, a doutrina10 pende a denominar de descentralização por colaboração.
Cabe ressaltar que, conforme apresenta Ceneviva11, incumbe ao Poder Executivo a delegação da atividade notarial e registral, confiando ao Judiciário, tão somente, a
fiscalização da atividade delegada, em consonância com o § 1º, do art. 236 da Constituição
Federal e com as razões do veto do art. 2º, da Lei nº 8.935/94.
Os notários e registradores, portanto, inserem-se no gênero agente público e,
estritamente, na espécie de particulares em colaboração por delegação, em consonância com o
entendimento dos tribunais12 e da doutrina13, haja vista desempenho de atividade de serviço público na qualidade de delegado.
Outras peculiaridades que cercam tais agentes também reforçam o presente
entendimento, como: a necessidade de concurso público para ingresso no cargo, a fiscalização
pelo Poder Judiciário (patente manifestação do poder disciplinar), o atributo de fé pública de
que gozam estes agentes delegados, entre outros.
A Constituição Federal expressamente definiu que os agentes notariais e
registradores exercerem suas atividades em caráter privado, o que reforça a condição de
particulares em colaboração por delegação. Nesse diapasão, não incumbe ao Poder Público a
contraprestação de tais agentes em razão de seus serviços prestados. Como forma de
remunerar14 tais atividades, portanto, a lei determinou o pagamento de emolumentos extrajudiciais pelos particulares usuários do serviço.
2.2 Os emolumentos extrajudiciais: delimitação conceitual, natureza jurídica e
caracteres fundamentais
9 É em razão da expressa redação da Constituição Federal, em delegar a prestação dos serviços notariais e de
registros aos particulares, que se afasta qualquer entendimento no sentido de conferir a esses agentes o caráter de servidores públicos stricto sensu (agentes administrativos). Portanto, por não possuírem cargos públicos efetivos, não se submetem às exigências do Regime Jurídico Único, tais como a aposentadoria compulsória aos 70 anos de idade. Vide: STF – ADI 2.602/MG.
10 VICENTE, Paulo; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado – 19ª ed. rev. e
ampl. São Paulo: Editora Método, 2011, p. 675.
11CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada (lei n. 8.935/94). 6ª ed. rev. e atual.
São Paulo: Editora Saraiva, 2008, p. 29.
12RE 234.935/SP, Rel. Min. Celso de Mello.Julgado em 24/06/99.
13 DA CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Administrativo – 5ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador:
Editora Juspodivm, 2007, p. 215.
14 O termo remuneração é empregado pela lei, vide art. 14, da Lei nº 6.015/73, malgrado críticas de alguns
O art. 14 da Lei nº 6.015/73 – Lei de Registros Públicos – prescreve que os notários e tabeliães, em decorrência dos atos praticados em suas serventias extrajudiciais,
farão jus, a título de remuneração, aos emolumentos – a serem fixados nos Regimentos de Custas do Distrito Federal, dos Estados e dos Territórios – os quais deverão ser pagos pelo usuário do serviço, no ato de requerimento ou no da apresentação do título. Extrai-se do
diploma normativo que os emolumentos se revestem de um caráter de contraprestação do
serviço.
Conceituando o termo, Acquaviva15 é enfático ao tratar dos emolumentos como
remuneração das atividades desempenhadas pelos notariais e registradores. Define o jurista
que o epigrafado vocábulo tem por significado a remuneração devida aos serventuários
extrajudiciais. Para sustentar tal posição, socorre-se, inclusive, da origem etimológica da
acepção, conforme se vê a seguir:
Do verbo latimo [sic] molere (moer), menção ao ganho do moleiro em seu trabalho de moer trigo. Na religião dos antigos romanos, i/molar era o ato de salpicar com grãos de trigo o animal a ser sacrificado
Em sentido genérico, a contraprestação por um serviço prestado. [...] Denomina, também, a remuneração devida aos escrivães e oficiais de cartórios. Nesse sentido, a remuneração devida aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.
A seu turno, Ceneviva16 tece críticas sobre a impropriedade técnica do termo empregado pelo Legislador, afirmando que o conceito de remuneração é distinto do instituto
dos emolumentos. Este último instituto constituiria, a seu ver, um suporte
econômico-financeiro dos notários e registradores para a realização de suas atividades. Seu pensamento
assim se apresenta:
A expressão a título de remuneração afronta a realidade cartorária brasileira, quanto aos ofícios privados. A reposição de custas não remunera o oficial. Remuneração tem definição legal conhecida, integrada: além do salário pago pelo empregador, como contraprestação de serviço, pelas gorjetas que o empregado receber. Em direito administrativo designa retribuição que o funcionário recebe pelo efetivo exercício de seu cargo, compreendendo uma parte fixa e uma variável. Isto é, o núcleo de seu significado se relaciona com a contraprestação proporcional ao valor do serviço prestado.
A natureza das custas cobradas à parte, porém, é outra. Não remuneram o oficial, mas lhe dão o necessário suporte econômico-financeiro para o exercício de suas funções e para a cobertura de todas as despesas, abatidas previamente as parcelas que a lei atribui ao Estado ou às instituições, como associações de magistrados, e mesmo à Ordem dos Advogados do Brasil e a associações de magistrados, em unidades da Federação, embora se trate de acréscimo inconstitucional.
15 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 3ª Ed. Atual. Ampl. São Paulo: Rideel,
2009, p. 339
16 CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada – Atualizada conforme as Lei n. 11.802,
O entendimento esposado por Ceneviva se mostra bastante adequado à realidade
do instituto, uma vez que os emolumentos se caracterizam como suporte
econômico-financeiro de todas as despesas efetuadas para a prestação do serviço, inclusive a remuneração
do agente. Esta posição se encontra em consonância com a redação do art. 1º, parágrafo único,
da Lei nº 10.169/2000.17
Assim, o adequado tratamento dispensado aos emolumentos consiste em
compreendê-los como contraprestações do serviço prestado pelo notarial e registrador, a qual
se reverterá em suporte econômico-financeiro, aqui incluído a remuneração do serventuário
extrajudicial, para o desempenho da atividade. Superada essa parte inicial de conceituação dos
emolumentos, passe-se ao estudo da competência para sua fixação, da forma de cobrança e da
sua natureza jurídica.
2.2.1 A competência de fixação dos emolumentos
A Carta Política brasileira definiu, em seu art. 236, § 2º, que “lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos
serviços notariais e de registro”.
Ressalte-se que o presente regramento seria irrelevante para estabelecer a
competência da União em legislar sobre regras gerais dos emolumentos extrajudiciais, uma
vez que a própria Constituição já havia definido a competência concorrente entre a União, os
Estados e o Distrito Federal para legislar sobre as custas dos serviços forenses, segundo
preceitua o art. 24, IV c/c § 1º, do mesmo artigo18.
No intuito de dar eficácia ao art. 236, § 2º, da Constituição Federal, foi criada a
Lei nº 10.169/00, que, em seu art. 1º, caput,19 veio reforçar a atribuição dos Estados e do Distrito Federal para fixarem os valores dos emolumentos das atividades notariais e de
registros, observando o que estiver disposto nessa lei.
17“Art.1º [...] Parágrafo único. O valor fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à
adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados.”
18“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) IV – custas
dos serviços forenses; (…) § 1º – No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.”
19“Art. 1º. Os Estados e o Distrito Federal fixarão o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos
2.2.2 A cobrança dos emolumentos
Os diplomas normativos definem algumas obrigações que os serventuários
deverão observar quanto aos emolumentos, tais como: o dever de dar recibo pelos
emolumentos cobrados20, a necessidade de fixação da tabela de emolumentos em local
visível21 e a cobrança dos emolumentos devido pelos atos praticados22, não podendo o notarial
ou registrador se omitir da cobrança ou, diminuir ou exceder a quantia fixada.
Quanto à cobrança dos emolumentos, em si, a legislação pátria preleciona que
serão percebidos de forma integral23 pelos serviços praticados na serventia, no ato de requerimento do usuário ou no ato da apresentação do título a este24.
2.2.3 A natureza jurídica dos emolumentos
Conforme foi dito, os emolumentos extrajudiciais se apresentam afetados ao
custeio do serviço público que o originou. Interessante entendimento exsurge quando se
analisam as taxas, aqui referente à espécie de tributo. As taxas são tributos essencialmente
vinculados à contraprestação de determinado serviço público específico e divisível, prestado
ou posto à disposição do usuário, ou, ainda, devidos pelo regular exercício do poder de
polícia25.
Comparando os dois institutos, taxas e emolumentos extrajudiciais, percebe-se
que estes se revestem da natureza jurídica daquelas, haja vista que as atividades notariais e de
registros são serviços públicos, conforme já apresentado, específicos e divisíveis, prestado a
determinado usuário, o qual efetua a contraprestação, no ato do serviço. Nessa toada, a
doutrina pátria26 vem também atribuindo aos emolumentos extrajudiciais a natureza jurídica das taxas27.
20 Art. 30, IX, da Lei n.º 8.935/94, c/c art. 14, parágrafo único da Lei n.º 6.015/73. 21 Art. 30, VII, da Lei n.º 8.935/94.
22 Art. 30, VIII, da Lei n.º 8.935/94, c/c art. 3º, III, da Lei n.º 10.169/00. 23 Art. 28, da Lei n.º 8.935/94.
24 Art. 14, caput, da Lei n.º 6.015/73.
25 Art. 77, caput, do Código Tributário Nacional.
26 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: teoria e prática. 5ª ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Editora Forense; São Paulo: Editora Método, 2014, p. 14-15.
27 CENEVIVA descarta, inclusive, a possibilidade de se atribuir aos emolumentos a condição de preço do
Esse é o entendimento que vem apresentando o Supremo Tribunal Federal em sua
jurisprudência, podendo ser assim tratada diante das reiteradas28 decisões e posicionamentos firmados nesse sentido. Como modo ilustrativo, traz-se à baila trechos da decisão exarada na
Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.378-5/600 – ES, na qual a Suprema Corte reforça seu juízo sobre o assunto:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – CUSTAS JUDICIAIS E EMOLUMENTOS EXTRAJUDICIAIS – NATUREZA TRIBUTÁRIA (TAXA) – DESTINAÇÃO PARCIAL DOS RECURSOS ORIUNDOS DA ARRECADAÇÃO DESSES VALORES A INSTITUIÇÕES PRIVADAS – INADMISSIBILIDADE – VINCULAÇÃO DESSES MESMOS RECURSOS AO CUSTEIO DE ATIVIDADES DIVERSAS DAQUELAS CUJO EXERCÍCIO JUSTIFICOU A INSTITUIÇÃO DAS ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS EM REFERÊNCIA – DESCARACTERIZAÇÃO DA FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA TAXA – RELEVÂNCIA JURÍDICA DO PEDIDO – MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. NATUREZA JURÍDICA DAS CUSTAS JUDICIAIS E DOS EMOLUMENTOS EXTRAJUDICIAIS.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que as custas judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços notariais e registrais possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços públicos, sujeitando-se, em conseqüência, quer no que concerne à sua instituição e majoração, quer no que se refere à sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam, dentre outras, as garantias essenciais (a) da reserva de competência impositiva, (b) da legalidade, (c) da isonomia e (d) da anterioridade. Precedentes. Doutrina.
SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS.
- A atividade notarial e registral, ainda que executada no âmbito de serventias extrajudiciais não oficializadas, constitui, em decorrência de sua própria natureza, função revestida de estatalidade, sujeitando-se, por isso mesmo, a um regime estrito de direito público.
A possibilidade constitucional de a execução dos serviços notariais e de registro ser efetivada "em caráter privado, por delegação do poder público" (CF, art. 236), não descaracteriza a natureza essencialmente estatal dessas atividades de índole administrativa.
- As serventias extrajudiciais, instituídas pelo Poder Público para o desempenho de funções técnico-administrativas destinadas "a garantir a publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos" (Lei n. 8.935/94, art. 1º), constituem órgãos públicos titularizados por agentes que se qualificam, na perspectiva das relações que mantêm com o Estado, como típicos servidores públicos. Doutrina e Jurisprudência.
- DESTINAÇÃO DE CUSTAS E EMOLUMENTOS A FINALIDADES INCOMPATÍVEIS COM A SUA NATUREZA TRIBUTÁRIA.
operações de livre mercado.” CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada – Atualizada conforme as Lei n. 11.802, 11.952, 11.965, 11.971, 11.977, 12.010 e 12.100/2009. 20ª ed. atual. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 209.
28 Rp nº 997-GO, de 1981; Rp nº 1.094-SP, de 1984; Rp nº 1.295-RS; de 1987; Rp nº 1.234-PR, de 1987; RE nº
- Qualificando-se as custas judiciais e os emolumentos extrajudiciais como taxas (RTJ 141/430), nada pode justificar seja o produto de sua arrecadação afetado ao custeio de serviços públicos diversos daqueles a cuja remuneração tais valores se destinam especificamente (pois, nessa hipótese, a função constitucional da taxa - que é tributo vinculado – restaria descaracterizada) ou, então, à satisfação das necessidades financeiras ou à realização dos objetivos sociais de entidades meramente privadas. É que, em tal situação, subverter-se-ia a própria finalidade institucional do tributo, sem se mencionar o fato de que esse privilegiado (e inaceitável) tratamento dispensado a simples instituições particulares (Associação de Magistrados e Caixa de Assistência dos Advogados) importaria em evidente transgressão estatal ao postulado constitucional da igualdade. Precedentes.
(STF – ADI-MC: 1378 ES, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 30/11/1995, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 30-05-1997) (grifou-se)
A principal consequência desse entendimento, em atribuir aos emolumentos
extrajudiciais a natureza de taxas, situa-se no fato de que aos emolumentos serão, no que
couber, aplicadas as disposições e o regime jurídico atinentes aos tributos e às próprias taxas.
Assim, dever-se-á analisar os emolumentos cobrados pelas serventias extrajudiciais sob a
ótica do Direito Tributário, inclusive com as peculiaridades desse ramo do direito.
2.3 Considerações sobre as taxas
O regramento Constitucional das taxas está presente no art. 145, II, o qual se
apresenta como mera reprodução do art. 77 do Código Tributário Nacional, uma vez que é
diploma subsequente. As normas mencionadas conceituam as taxas, prevendo e conceituando
que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir as taxas, em
razão do exercício regular do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de
serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua
disposição.
É oportuno destacar que as taxas são uma espécie de tributo29 cujo fato gerador30 está vinculado a uma atividade estatal específica, ao contrário dos impostos, cuja cobrança
não guarda qualquer vinculação a uma atividade específica a ser desempenhada pelo Estado
em favor do contribuinte.
29I) “Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir,
que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” – Código Tributário Nacional. II) “Art. 5º Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”– Código Tributário Nacional.
De igual modo, embora possa decorrer também de certo tipo serviço público, não
se devem confundir as taxas com os preços públicos31, haja vista: (I) o regime jurídico aplicável – nesta direito privado, naquela de direito público; (II) a vinculação obrigacional – nesta decorrente de natureza contratual, naquela de natureza tributária; e (III) quanto a
manifestação de vontade do usuário/contribuinte – nesta a manifestação é obrigatória por ser o serviço facultativo, naquela a manifestação é irrelevante por ser o serviço compulsório32.
Conforme apresentado no início do tópico, é possível perceber a existência de
dois tipos de taxas, uma referente ao exercício do poder de polícia, e outra relacionada à
prestação de serviço público divisível e específico pelo Estado. No curso do presente trabalho,
tratar-se-á, de modo especial, das taxas atinentes à prestação de serviço público. Ressalte-se,
todavia, que a única distinção essencial entre os dois tipos de taxa repousa sobre suas
respectivas hipóteses de incidência. As demais características são, rigorosamente, iguais entre
ambas.
2.3.1 As taxas de serviços públicos
As taxas de serviço público, consoante exposto, decorrem da contraprestação de
serviço público específico e divisível prestado, ou posto à disposição do contribuinte, pelo
Estado ou por quem faça sua vez. O próprio Código Tributário Nacional, em seu art. 79,
tratou de conceituar os termos substanciais da definição de taxas de serviços públicos, do
seguinte modo:
Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se: I - utilizados pelo contribuinte:
a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;
b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;
II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas;
III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.
31“Nem todo serviço público, porém, seria atividade especificamente estatal. O preço público, assim, seria a
remuneração correspondente a um serviço público não especificamente estatal, vale dizer, uma atividade de natureza comercial ou industrial.”. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Malheiros, 2011, p. 442.
32STF Súmula nº 545 – Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente
Vê-se que a essência dos serviços, a que se reporta o art. 77, do Código Tributário
Nacional, baseia-se na noção de especificidade e divisibilidade do serviço. Na prática, a
especificidade está presente quando “o contribuinte sabe por qual serviço está pagando”33, e a divisibilidade quando “é possível ao Estado identificar os usuários do serviço”34. Na máxima
do Direito Tributário, a relação do Estado e o do Contribuinte estariam resumidos na frase:
“Eu te vejo e tu me vês”35.
Assim, a exação ora em comento incide sobre os serviços públicos que a doutrina
denomina de serviços públicos uti singuli, ou seja, “aqueles que têm por finalidade a
satisfação individual e direta das necessidades dos cidadãos”36. São serviços individuais e mensuráveis, por isso estão intrinsicamente relacionados às ideias de especificidade e de
divisibilidade.
Ademais, a Lei dispôs que as taxas de serviço serão cobradas pelo uso ou pelo
fato de o serviço ser posto à disposição. Congruente ao apresentado, os serviços postos à
disposição, sobre os quais também incidem as taxas, são aqueles de natureza compulsória, ou
seja, independe da vontade do usuário; assim, torna-se fácil vislumbrar a possibilidade de sua
cobrança, mesmo quando o contribuinte efetivamente não faça uso dele37.
2.3.1.1 A base de cálculo das taxas
Em seu art. 145, § 2º, a Carta Política brasileira estatuiu que as taxas não poderão
ter base de cálculo próprias de impostos. Essa redação torna a vedação mais ampla e
tecnicamente mais apropriada que a apresentada pelo Código Tributário Nacional, no art. 77,
parágrafo único, a qual proíbe as taxas de terem base de cálculo idênticas a dos impostos.
Tal assertiva, independente de disposição legal, já seria um consectário lógico do
fato de que os impostos são distintos das taxas, uma vez que aqueles não têm vinculação com
33 ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado – 6ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 27.
34 ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado – 6ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 27.
35 ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado – 6ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 28.
36 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo – 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 117.
37“Percebe-se, portanto, que a famosa frase segundo a qual ‘as taxas de serviço podem ser cobradas mesmo que
atividade específica, tendo por base de cálculo uma grandeza econômica discricionariamente
estipulada pelo Estado.38
O valor da taxa, por sua vez, deve ter uma correlação razoável com o serviço
público a ela vinculado, constituindo, portanto, uma mensuração – ainda que aproximada – do efetivo valor do serviço público prestado ou posto à disposição. Ressalte-se, pois, que
qualquer taxa desvinculada ao valor da prestação do serviço devido poderá importar em
enriquecimento ilícito do Estado, caso esse exceda na sua cobrança o valor do serviço.
O Supremo Tribunal Federal vem admitindo como constitucional39, para a fixação
do valor da taxa, a adoção de elementos da base de cálculo própria de determinado imposto,
desde que não haja integral identidade entre uma base e outra. Em razão disso, vem decidindo
favoravelmente, também, à possibilidade de fixação de intervalos de grandezas econômicas
para a estipulação dos valores das taxas, com julgados referentes, inclusive, aos
emolumentos40.
2.3.2 As implicações aos emolumentos extrajudiciais em razão do regime jurídico das taxas
Em razão da sua natureza jurídica de tributo, os emolumentos extrajudiciais só
podem ser instituídos por lei41 que, conforme já apresentado, será de iniciativa dos Estados-Membros, Distrito Federal e Territórios. A eles, ainda, aplicam-se os princípios da
anterioridade e da noventena (ou anterioridade nonagesimal).
Por anterioridade tem-se a proibição de se criar ou aumentar tributo, no caso
emolumentos42 (taxa), no mesmo exercício financeiro de publicação da lei43. O princípio da
38 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
Malheiros, 2011, p. 440.
39 STF – Súmula Vinculante 29.
40 STF - ADI: 3887 SP, Relator: Min. MENEZES DIREITO, Data de Julgamento: 14/10/2008, Data de
Publicação: DJe-198 DIVULG 17/10/2008 PUBLIC 20/10/2008.
41 Trata-se do princípio da legalidade estrita do direito tributário que, conforme leciona Carvalho, assim se
apresenta: “Para o direito tributário, contudo, aquele imperativo ganha feição de maior severidade, como se nota da redação do art. 150, I: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I — exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. Em outras palavras, qualquer das pessoas políticas de direito constitucional interno somente poderá instituir tributos, isto é, descrever a regra-matriz de incidência, ou aumentar os existentes, majorando a base de cálculo ou a alíquota, mediante a expedição de lei.” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 188. Assim, conforme vem decidindo o Supremo Tribunal Federal, os emolumentos deverão ser fixado por lei, e não por atos normativos infralegais, veja-se: ADI 1444, Relator: Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 12/02/2003, DJ 11-04-2003.
42 Reforçando a noção da natureza jurídica de taxas, a Lei nº 10.169/2000 impôs, expressamente em seu artigo
noventena, por seu turno, reporta ao fato de que não haverá cobrança da exação sem que tenha
transcorrido o lapso temporal de noventa dias44. Tais princípios são proteções ao contribuinte e limitações ao poder de tributar do Estado. No caso dos emolumentos, subsistem esses
interesses, uma vez que é mantida a relação tributária devido a sua natureza.
Consoante visto, existe a possibilidade de fixação de intervalos de valores para a
definição da base de cálculo das taxas, em razão de grandezas econômicas. Esse pensamento,
corroborado pelo art. 2º, da Lei nº 10.169/00, enquadra-se perfeitamente na estipulação dos
valores a serem cobrados a título de emolumentos extrajudiciais, desde que não haja integral
identidade com a base de cálculo dos impostos45.
Por fim, aplicam-se, também, aos emolumentos extrajudiciais o instituto da
isenção tributária, evidentemente quando for expressamente prevista em lei. Traça-se estudo
mais detalhado sobre o instituto das isenções no capítulo subsequente.
43 I) Art. 150, III, b, da Constituição Federal. II) Para Carvalho: “Segundo o princípio da anterioridade, a
vigência da lei que institui ou aumenta tributo deve ficar protraída para o ano seguinte ao de sua publicação, momento em que o ato se insere no contexto comunicacional do direito.” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 189.
44 I) Art. 150, III, c, da Constituição Federal. II) Nos dizeres de Carvalho: “A anterioridade, sobre a qual
acabamos de discorrer, objetiva implementar o sobreprincípio da segurança jurídica, de modo que o contribuinte não seja surpreendido com exigência tributária inesperada. A experiência brasileira, entretanto, demonstrou a incapacidade de esse princípio, sozinho, resguardar os administrados contra as providências fiscais tomadas ao final do exercício financeiro. Essa a razão pela qual o constituinte derivado, por meio da Emenda Constitucional n. 42, de 19 de dezembro de 2003, acrescentou a alínea c ao inciso III do art. 150 da Constituição” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 189.
45 Loureiro ensina que o Legislador Estadual ou Distrital deverá distinguir os atos notariais e de registros com e
3 ISENÇÃO TRIBUTÁRIA: DELIMITAÇÃO, CONCEITUAÇÃO E
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Preliminarmente, torna-se imprescindível o entendimento de certas figuras
tributárias essenciais à compreensão do instituto da isenção, como: a hipótese de incidência, o
fato gerador, a obrigação tributária e o crédito tributário.
A hipótese de incidência tributária, ou hipótese tributária46, retrata o momento
anterior ao fato tributável, seria a perspectiva geral e abstrata da norma. Nos dizeres de
Cassone47 significa a “descrição que a lei faz de um fato tributário que, quando ocorrer, fará nascer a obrigação tributária (obrigação de o sujeito passivo ter de pagar ao sujeito ativo o
tributo correspondente)”.
No que tange ao fato gerador, ou fato jurídico tributável48, tem-se que este se refere à concretização da hipótese tributária; ou seja, seria a projeção da norma ao fato, pela
subsunção deste àquela. Desse modo, é possível vislumbrar de forma clara a distinção
existente entre os institutos, em razão do momento de atuação de ambos. Resume Sabbag49 da seguinte maneira:
‘hipótese de incidência’ é a situação descrita em lei, recortada pelo legislador entre inúmeros fatos do mundo fenomênico, a qual, uma vez concretizada no fato gerador, enseja o surgimento da obrigação principal. A substancial diferença reside em que, enquanto aquela é a ‘descrição legal de um fato [...] a descrição da hipótese em que o tributo é devido’, esta se materializa com a efetiva ocorrência do fato legalmente previsto.
Por sua vez, obrigação tributária, segundo Machado50, seria uma relação jurídica
na qual “o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização
dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito”.
A obrigação, no direito tributário, não goza, por si só, de liquidez e de certeza, é
necessário que se constitua na forma de crédito tributário para se tornar exigível51. O crédito
46 Nomenclatura empregada por Carvalho. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed.
São Paulo: Saraiva, 2012, p. 289-290.
47 CASSONE, Vittorio. Direito tributário. São Paulo: Atlas, 2000, p. 143.
48 Como também trata Carvalho. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012, p. 290.
49SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário – 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 685.
50 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
Malheiros, 2011, p. 122.
51 Machado ensina que, no Direito Tributário, a relação obrigação e crédito é distinta do que se vê no direito
tributário, portanto, é o momento em que obrigação tributária passa a ser exigível em razão do
seu lançamento52. Machado53 assim define o crédito tributário: “é o vínculo, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do particular, o
contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou da penalidade
pecuniária (objeto da relação obrigacional)”.
Desse modo, a relação dos institutos apresentados dá-se da seguinte forma: I) a
norma descreve a hipótese de incidência do tributo (hipótese de incidência); II) o fato jurídico
tributável se amolda à descrição normativa (fato gerador); III) surge, dessa subsunção do fato
à norma, uma relação obrigacional tributária entre o Estado e o Contribuinte, (obrigação
tributária); IV) por fim, o Estado torna exigível a obrigação existente, através do lançamento
do tributo (crédito tributário).
O Código Tributário Nacional, em seu art. 175, definiu expressamente54 a isenção e a anistia como hipóteses para a exclusão do crédito tributário55. A exclusão do crédito tributário é o impedimento de que este se forme. Trata-se, portanto, da interrupção da
constituição da obrigação tributária em crédito, permanecendo a relação tributária na esfera da
inexigibilidade.
Quanto às hipóteses de exclusão do crédito tributário tem-se que a anistia é a
forma de exclusão do crédito referente à multa, ao passo que e a isenção está relacionada à
exclusão do crédito do próprio tributo.
mesma relação. Não é assim, porém, no direito tributário brasileiro. O Código Tributário Nacional distinguiu a obrigação (art. 113) do crédito (art. 139). A obrigação é um primeiro momento na relação tributária. Seu conteúdo ainda não foi determinado e seu sujeito passivo ainda não está formalmente identificado. Por isto mesmo a prestação respectiva ainda não é exigível. Já, o crédito tributário é um segundo momento na relação de tributação. No dizer do Código Tributário Nacional, ele decorre da obrigação principal e tem natureza desta (art. 139). Surge do lançamento, que confere à relação tributária liquidez e certeza.” (grifos do original). MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Malheiros, 2011, p. 122.
52 O Código Tributário Nacional define lançamento assim: “Art. 142. Compete privativamente à autoridade
administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.” (grifou-se)
53 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
Malheiros, 2011, p. 172-173.
54 O próprio Código Tributário Nacional dispôs, em seu art. 97, VI, que somente cabe a lei estabelecer as
hipóteses de exclusão do crédito tributário. Posição reverberada pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 150, §6º.
55 Para Machado, a decadência estaria melhor alocada no artigo que predispõe sobre as hipóteses de exclusão de
3.1 Conceito de isenção
O conceito de isenção é enfrentado por muitos tributaristas, no entanto não paira
consenso entre os estudiosos, sendo diversos os conceitos adotados pelos doutrinadores.
Apesar de toda a polêmica envolvendo a conceituação do instituto, seu intuito e sua condição
de exclusão do crédito tributário mantêm-se conservados.
Para a doutrina mais tradicional56, a isenção seria uma dispensa da lei ao
pagamento do tributo devido. Tratar-se-ia, portanto, de benesse oferecida pelo Legislador ao
Contribuinte, sob a alegação de proteção aos imperativos sociais, éticos, econômicos,
políticos, financeiros, entre outros. Segundo essa corrente, ainda, há a ocorrência do fato
gerador e o estabelecimento do vínculo obrigacional tributário, contudo a lei desonera o
Contribuinte, obstando o curso natural da constituição do crédito tributário.
Outra corrente doutrinária entende que a isenção seria uma hipótese de não
incidência com status legal. O objetivo da norma isentiva seria, pois, afastar a incidência da
norma tributária. Sabbag57 transcreve citação de Borges, principal expoente dessa corrente:
A incidência da norma isentante tem como necessária contrapartida a não incidência da norma tributária. Nesse sentido, pode-se dizer que a isenção atua como qualquer outra regra excepcional, em face do princípio da generalidade da tributação. Posto a doutrina nem sempre tenha apreendido, com a necessária clareza, essa característica, não tem outro sentido a proposição da Ciência do Direito Tributário de que a regra jurídica de isenção configura hipótese de não incidência legalmente qualificada. A não incidência, aí, é da regra jurídica de tributação, porque a regra jurídica de isenção incide sobre o fato isento e seria absurdo supor-se a existência da regra jurídica que produzisse efeito sem prévia incidência.
Machado58, por sua vez, entende que a isenção é uma forma de dispensa do
tributo, que não vem a existir no plano da “concreção jurídica”, em razão de subtração de
parte da hipótese de incidência59. Haveria, por conseguinte, uma exclusão do fato gerador. Assim leciona o aduzido doutrinador:
56 Sabbag cita nomes como: FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 6. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2002, p. 66; SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Rio de Janeiro: Financeiras S.A., s/d, pp. 7576; entre outros. SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário – 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 900.
57 BORGES, José Souto Maior. Subvenção financeira, isenção e deduções tributárias. Recife, jan./dez., 1976,
Separata, p. 72, Apud SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário – 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 900.
58MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
Malheiros, 2011, p. 229.
59 A rigor (pois conserva detalhes de distinção quanto ao concepção de fato gerador e hipótese de incidência),
Embora tributaristas de renome sustentem que a isenção é a dispensa legal de tributo devido, pressupondo, assim, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, na verdade ela exclui o próprio fato gerador. A lei isentiva retira uma parcela da hipótese de incidência da lei de tributação. Isenção, portanto, não é propriamente dispensa de tributo devido. [...] A isenção seria, assim, a dispensa de tributo que não chega a existir no plano da concreção jurídica
O Supremo Tribunal Federal, desde antes da Constituição Federal de 1988, tratava
expressamente a isenção como dispensa legal de tributo60. Atualmente, ainda persiste essa
adoção da corrente clássica de definição da isenção, reforçada pela noção de “exceção da
regra jurídica tributária”61.
Embora se entenda62, no corrente estudo, assistir razão ao conceito sustentado, a rigor, por Machado e por Carvalho, os quais definem a isenção como forma de dispensa de
tributo em razão da retirada de parte da hipótese de incidência; adota-se, se necessário, a
definição empregada pelo Supremo Tribunal Federal, por ser argumento de autoridade.
Por fim, ressalte-se que a adoção de uma dessas definições não influe
significativamente no curso do presente trabalho, haja vista que o tema foi tratado para trazer
elucidações ao instituto das isenções.
normativa, a regra de isenção investe contra um ou mais dos critérios da norma-padrão de incidência, mutilando-os, parcialmente. É óbvio que não pode haver supressão total do critério, porquanto equivaleria a destruir a regra-matriz, inutilizando-a como norma válida no sistema. O que o preceito de isenção faz é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do antecedente ou do consequente. Vejamos um modelo: estão isentos do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza os rendimentos do trabalho assalariado dos servidores diplomáticos de governos estrangeiros. É fácil notar que a norma jurídica de isenção do IR (pessoa física) vai de encontro à regra-matriz de incidência daquele imposto, alcançando-lhe o critério pessoal do consequente, no ponto exato do sujeito passivo. Mas não o exclui totalmente, subtraindo, apenas, no domínio dos possíveis sujeitos passivos, o subdomínio dos servidores diplomáticos de governos estrangeiros, e mesmo assim quanto aos rendimentos do trabalho assalariado. Houve uma diminuição do universo dos sujeitos passivos, que ficou desfalcado de uma pequena subclasse.” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 526.
60 RE 97455, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Segunda Turma, julgado em 10/12/1982, DJ 06-05-1983
PP-06050 EMENT VOL-01293-03 PP-00665; RE 113711, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 26/06/1987, DJ 09-10-1987 PP-21782 EMENT VOL-01477-03 PP-00631 RTJ VOL-00123-02 PP-00810.
61 ADI 286, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2002, DJ 30-08-2002
PP-00060 EMENT VOL-02080-01 PP-00001.
62 Registre-se, ainda críticas às outras correntes: I) Quanto à corrente tradicionalista. A principal falha se
3.1.1 Outras modalidades de desonerações tributárias
Existem algumas formas de desoneração da tributação que se assemelham às
isenções. Essas semelhanças decorrem, principalmente, do benefício final que atingem tais
institutos, qual seja o de não pagamento do tributo. Como forma de dirimir eventuais dúvidas,
apresentar-se-ão as principais espécies de desonerações tributária que guardam similitude com
as isenções e que não devem ser com essa confundidas.
3.1.1.1 Não Incidência
A não incidência é resultado da aplicação da hipótese de incidência da norma
tributária. Não se trata de disposição expressa da lei, na verdade, consubstancia-se no fato
situado à margem do regramento tratado na hipótese de incidência. Figura, portanto, na
ocorrência não albergada pela norma tributária, o qual impossibilita a incidência do fato
gerador. É um fenômeno decorrente da exclusão da hipótese de incidência
Frise-se que, segundo relata a doutrina63, o legislador cuida legalmente da não incidência em dois casos. O primeiro acontece quando há impropriedade técnica, ou seja, o
legislador se refere a outros casos de desoneração como hipóteses de não incidência. Por sua
vez, o segundo caso ocorre quando o legislador, ao tentar dirimir qualquer dúvida sobre a não
incidência um tributo em determinada situação, passa a defini-la expressamente como
hipótese de não incidência da exação. Nesse último caso, tem-se uma hipótese de não
incidência juridicamente qualificada.
3.1.1.2 Imunidade
Quando o impedimento à tributação vem de norma de natureza constitucional,
está-se diante de hipótese de imunidade tributária. Portanto, a imunidade tributária é, assim
como a norma isentiva, um impedimento feito por lei, nesse caso em nível hierárquico
superior (Constituição Federal), à incidência de um tributo em determinado caso. Vê-se,
63MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
assim, similitude destes institutos, concentrando a distinção existente entre ambos, tão
somente, no nível hierárquico das normas que os dispõem64.
Ressalte-se, por fim, que toda vez que o legislador se reportar às isenções, em
normas constitucionais, e às imunidades, em normas infraconstitucionais, ter-se-á uma
impropriedade técnica na utilização dos institutos. Assim, quando o legislador se referir à
isenção, em sede de norma constitucional, está-se diante de imunidade tributária; bem como
se o legislador dispuser sobre imunidade em norma infraconstitucional, depara-se com
hipótese de isenção.
3.1.1.3 Alíquota Zero
No Direito Tributário, a alíquota é o percentual aplicado sobre a base de cálculo65 do tributo. Dessa operação matemática tem-se o valor final da tributação. Ocorre que a
autoridade administrativa tributária brasileira, quando vê a necessidade de desonerar
determinado tributo, atribui-lhe alíquota zero, a fim de que o produto resultante da alíquota
com a base de cálculo da exação seja zero.
A intenção é de que não haja tributação no caso de incidência de alíquota zero.
Tal fenômeno especialmente sobrevém nos tributos que possuem caráter extrafiscal66, como: o imposto sobre importação (II), o imposto sobre exportação (IE), imposto sobre produtos
industrializados (IPI), entre outros.
É, portanto, uma forma encontrada pela autoridade administrativa tributária
brasileira em dar celeridade a desoneração pretendida, através de um mecanismo que burla o
princípio da legalidade atinente às normas isentivas67.
64Carvalho apresenta a distinção entre imunidade e isenção do seguinte modo: “O preceito de imunidade exerce
a função de colaborar, de uma forma especial, no desenho das competências impositivas. São normas constitucionais. Não cuidam da problemática da incidência, atuando em instante que antecede, na lógica do sistema, ao momento da percussão tributária. Já a isenção se dá no plano da legislação ordinária. Sua dinâmica pressupõe um encontro normativo, em que ela, regra de isenção, opera como expediente redutor do campo de abrangência os critérios da hipótese ou da consequência da regra-matriz do tributo” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário – 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 219-220.
65“Base de cálculo é a expressão da grandeza econômica do fato gerador do tributo”. MACHADO, Hugo de
Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Malheiros, 2011, p. 135.
66 Ensina Alexandre, quanto à extrafiscalidade, que: “O tributo possui finalidade extrafiscal quando objetiva
fundamentalmente intervir numa situação social ou econômica. São os casos, entre outros, dos impostos de importação e exportação, que, antes de arrecadar, objetivam o controle do comércio internacional brasileiro, podendo, às vezes, servir de barreira protetiva da economia nacional e outras de estímulo à importação ou exportação de determinada espécie de bem”. ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado – 6ª ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 68.
67 Os art. 97, VI, do Código Tributário Nacional e art. 150, §6º, da Constituição Federal, disciplinam que