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O DIREITO DE(O) BALANÇO

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O DIREITO DE(O) BALANÇO

Joaquim Fernando da Cunha Guimarães

Outubro de 2007 Revista Fiscal n.º __, de ________ Revista Electrónica INFOCONTAB n.º __ de ___________ O Jornal de Negócios (JN) de 28 de Junho de 2007 destacava na primeira e última páginas uma notícia sob o título “Saldanha Sanches Chumba Agregação” referindo-se às provas académicas para Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, realizadas em 27 de Junho de 2007.

Também a revista VISÃO n.º 748, de 5 de Julho de 2007, pp. 52-4, referia-se ao mesmo acontecimento em texto sob o título “Anatomia de um Chumbo”.

A notícia foi igualmente divulgada noutros órgãos de comunicação social, incluindo a própria televisão.

A carga negativa associada à palavra “chumbo” revela o conteúdo dessas notícias. De acordo com aquelas duas publicações, Saldanha Sanches (SS) teria apresentado o tema “O Direito de(o) Balanço”1, sendo o júri composto por dez notáveis Professores Catedráticos2.

Não sendo, por opção, docente de carreira do Ensino Superior, pois apenas tenho exercido funções como assistente-convidado em licenciaturas e, mais ultimamente, em pós-graduações e mestrados nas áreas da contabilidade, da fiscalidade e da auditoria, tenho, porém, alguns ligeiros conhecimentos sobre a evolução da carreira académica. Com efeito, não é muito vulgar a ocorrência de situações de “chumbo”, pois, para se chegar à fase da apresentação dos trabalhos, o candidato é submetido a um conjunto significativo de fases de avaliação preliminar, o que permite, desta forma, ter uma ideia da sua evolução e, assim, antever eventuais desaires. Na verdade, de acordo com a VISÃO, o último “chumbo” naquela Faculdade havia ocorrido nos anos 60 do século passado (!).

Assim, é no mínimo estranho que o caso SS tenha chegado àquele ponto, o que não deixa de constituir um vexame, agravado pela circunstância de SS ser, efectivamente, um reconhecido fiscalista, professor universitário e uma pessoa mediática, nomeadamente pelas suas constantes e corajosas intervenções públicas desmascarando alguns dos principais problemas do sistema fiscal português, como são os casos da corrupção nas suas mais diversas vertentes e o funcionamento do sistema judicial. A este facto não é alheia, com certeza, a circunstância de SS ter conhecimento próximo do

1 O JN refere “Direito de Balanço” e a VISÃO “Direito do Balanço”, i.e., a primeira publicação utiliza a

preposição “de” e a segunda “do”, o que, obviamente, suscitam sentidos diferentes.

2 Paulo Pitta e Cunha (de acordo com a revista VISÃO teria faltado), Leite de Campos, Braga de Macedo,

Menezes Cordeiro, Marcelo Rebelo de Sousa, Fausto de Quadros e Paz Pereira que terão votado contra e Jorge Miranda, Teixeira de Sousa e Paulo Otero que terão votado a favor. Ou seja, um resultado de 6 votos contra e 3 a favor.

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fenómeno, pois a sua esposa, Dr.ª Maria José Morgado, é, também, uma acérrima defensora do combate à corrupção, recentemente “especializada” no futebol através do novelesco processo do “Apito Dourado”, que, apesar do reconhecimento público das suas capacidades de trabalho, parece não ter fim à vista.

Uma análise precipitada de senso comum, poderia induzir à conclusão de que SS está a “pagar a factura” desse mediatismo, o que, diga-se em abono da verdade, não deve acolher grande número de adeptos por falta de sustentação argumentativa. Com efeito, a indiscutível categoria académica, e não só, dos membros do júri constituem de per se argumentos suficientes para refutar tal tese simplista.

É, por isso, que desconhecendo os contornos dessa situação, me parece, repito, no mínimo estranho que SS se tenha distraído e criado condições para provocar essa “nódoa” no seu percurso académico.

À parte desta reflexão académica, interessa-me muito mais destacar, em homenagem e solidariedade a SS, o seu árduo e contínuo trabalho de investigação no estabelecimento de “pontes” de entendimento entre as duas disciplinas que muito têm a ganhar com essa ligação: O Direito (especialmente o Direito Fiscal e a Fiscalidade) e a Contabilidade. Ainda de acordo com a VISÃO, um dos elementos do júri (Menezes Cordeiro) terá argumentado que o “Direito do Balanço” deve ser reservado aos comercialistas como ele e não aos fiscalistas, o que nos parece discutível, face à íntima ligação entre a contabilidade e a fiscalidade3.

Na verdade, o tema “O Direito de(o) Balanço” constitui mais um contributo de SS para a investigação naquelas duas áreas científicas.

É de recordar que, na sua tese de doutoramento4, SS abordou a problemática fiscal do que designou “balanço comercial”, clarificando as suas relações com o “balanço fiscal” da seguinte forma:

“O balanço comercial acolhido pela lei fiscal, mas passando a ser uma factispécie da lei tributária, a sua regulação integra-se na previsão normativa dos factos tributários e poderá por isso dar desvios em relação ao balanço comercial.”.

Um outro aspecto importante da acção de SS, têm sido, sem dúvida, as suas intervenções em defesa da inserção da disciplina de Contabilidade nos currículos das licenciaturas em Direito.

3 A este propósito elaborámos um artigo sob o título “O «Casamento» entre a Contabilidade e a

Fiscalidade”, Revista Fiscal n.º 2, de Fevereiro de 2007 e disponível para download no Portal INFOCONTAB nos menus “Revista Electrónica INFOCONTAB n.º 16, de Janeiro de 2007” e “Actividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 205”.

4 Sob o título A Quantificação da Obrigação Tributária – Deveres de Cooperação, Autoavaliação e

Avaliação Administrativa, publicada em livro pelo Centro de Estudos Fiscais da DGCI, Caderno de Ciência e Técnica Fiscal n.º 173, Lisboa, 1995.

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Porém, esta ligação do Direito Fiscal e da Fiscalidade à Contabilidade é, também, um dos temas que os Técnicos Oficiais de Contas (TOC), Revisores Oficiais de Contas (ROC) e Docentes do Ensino Superior de Contabilidade muito apreciam. Eu próprio abordei esta temática na minha dissertação do Mestrado em Contabilidade e Auditoria, da Universidade do Minho5, e em alguns artigos, dos quais destaco “O Direito Contabilístico”6 e “O «Casamento» entre a Contabilidade e a Fiscalidade”,este último já atrás referido7.

Como sublinhei naquele primeiro artigo, fazendo uma breve incursão pela história da contabilidade citei o nosso grande Mestre da Contabilidade do século passado, Gonçalves da Silva8, o qual sublinhou que o italiano Giuseppe Cerboni (1827-1917) foi o pioneiro da designada “teoria jurídica-personalista” ou “toscana”, a qual definia uma “azienda” (economia, unidade económica) como uma série de relações jurídicas e económicas que ligam um proprietário à sua propriedade sendo a substância administrativa (o património) o conjunto dos direitos e obrigações do ente por mandato do qual se exerce a administração económica.

Na mesma linha de pensamento, destaca-se o também italiano, Vicenso Mazi, que definiu a chamada “teoria personalista” ou “personalismo”, segundo a qual a Contabilidade tem por objectivo o estudo e a relevação das relações jurídicas que, nas unidades económicas, se estabelecem entre o proprietário e os agentes e correspondentes.

Em Portugal, os dois grandes Mestres da Contabilidade do século passado, o já citado Gonçalves da Silva9 e Lopes Amorim10, classificavam essas relações utilizado das

designações de “Escola Jurídico-Personalista” e de “Teoria Personalista ou Jurídica”, respectivamente.

As ligações jurídicas à Contabilidade aparecem também evidenciadas nas designações de “Direito Contabilístico” ou “Direito da Contabilidade”, também abordada por SS, especialmente no seu livro “Estudos de Direito Contabilístico e Fiscal”11.

5 Sob o título Caracterização do Sistema Contabilístico e Fiscal Português - Uma Análise aos Relatórios

e Contas das Empresas, a qual viria a ser publicada em livro com o mesmo título pela Vislis Editores, Lisboa, Novembro de 2000.

6 Publicado como sub-título do artigo intitulado “Temas de Contabilidade e Fiscalidade”, TOC n.º 8, de

Novembro de 2000 e Semanário Económico de 18 de Maio de 2000, sob o título (alterado pela redacção do SE) “As Histórias do Italiano Cerboni”. O artigo está disponível no meu Portal INFOCONTAB no menu “Actividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/Artigo n.º 53”.

7 Conforme rodapé n.º 3.

8 GONÇALVES DA SILVA, Fernando Vieira: Doutrinas Contabilísticas – Resumo e Crítica das

Principais, Ed. Centro Gráfico de Famalicão, Vila Nova de Famalicão, 1959, p. 71.

9 GONÇALVES DA SILVA, Fernando Vieira: ob. cit., p. 71-5.

10 LOPES AMORIM, Jaime: Digressão Através do Vetusto Mundo da Contabilidade, Ed. Livraria Avis,

Porto, 1968, pp. 238-58.

11 SALDANHA SANCHES, José Luís: Estudos de Direito Contabilístico e Fiscal, Coimbra Editora,

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O tema foi, igualmente, divulgado pelo decano (hoje com 95 anos) dos professores universitários de contabilidade em Portugal, Professor Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira, referindo12:

“... Os objectivos da Contabilidade exigem, porém, um jurídico específico, que seja o suporte legal das suas regras e princípios. E esse suporte legal será o necessário Direito Contabilístico.

Meramente a título de exemplo:

O Direito Fiscal não tem de dizer o que são custos e o que são proveitos do exercício: isto cabe ao Direito Contabilístico. O que o Direito Fiscal tem de dizer, isso sim, é o que, para efeitos fiscais, não são custos e o que não são proveitos.”.

Também Fernandes Ferreira13, tem efectuado intervenções nesse sentido, com especial

referência à Fiscalidade, nomeadamente no âmbito dos códigos fiscais e, particularmente, do Código do IRC. Atente-se, por exemplo, a seguinte reflexão extraída de um texto da sua autoria sob o título “Busca da conciliação entre direito da contabilidade e direito da fiscalidade”:

“O POC hoje é a lei contabilística, é ele que regula para fins de contabilidade; se um Código fiscal ou uma regulamentação deste aponta regras de modo diferente as mesmas não derrogarão o POC.”.

Mas, voltando ao “Balanço” (expressão etimologicamente derivada de “balança” como significando “equilíbrio”), este é o espelho da posição financeira da entidade, apresentando, do lado esquerdo, o activo (na acepção jurídica visto como um “conjunto de direitos e obrigações”) e, do lado direito, o passivo (na mesma óptica jurídica interpretado como “um conjunto de obrigações”) e o capital próprio (diferença entre as duas massas patrimoniais) 14.

Assim, sendo o “Balanço” expressão da situação patrimonial da entidade, cujas origens remontam há mais de 500 anos com o matemático Frei Luca Pacioli15, e representando,

12 CIMOURDAIN DE OLIVEIRA, Camilo: Fina(de)lidade das Contas, separata do Jornal do Técnico de

Contas e da Empresa, Lisboa, 1986, referente à comunicação apresentada nas III Jornadas de Contabilidade do Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto.

13 FERNANDES FERREIRA, Rogério: Gestão, Contabilidade e Fiscalidade, Notícias Editorial, Lisboa,

1997, p. 85.

14 Estes conceitos históricos estão a ser revistos no âmbito da aplicação das Normas Internacionais de

Contabilidade, estando já previstos no documento elaborado pela Comissão de Normalização Contabilística, em Julho de corrente ano, que aprovará o designado “Sistema de Normalização Contabilística” (SNC), o qual revogará, em princípio a partir de 1 de Janeiro de 2008, o actual normativo contabilístico, constituído pelo POC, Directrizes Contabilísticas, Interpretações Técnicas e decretos-lei ulteriores ao Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de Novembro que aprovou o POC.

15 A este propósito sublinhámos a seguinte frase de António Lopes de Sá (Luca Pacioli – Um Mestre do

Renascimento, 2.ª Edição, revisada e ampliada, Ed. Fundação Brasileira de Contabilidade, Brasília, Brasil, 2004, p. 182:

“Preocupando-se com detalhes, Paciolo recomenda que os factos que ocorreram durante a elaboração do balanço devem ser colocados à parte, no Borrador, sem registar-se no Razão, até que os novos saldos estejam já transportados.”.

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pois, um referencial e um património contabilístico histórico inquestionável, preocupam-me as mais recentes informações relacionadas com as Normas Internacionais de Contabilidade (NIC/IAS) do IASB que parecem apontar para o desaparecimento da expressão.

Com efeito, o IASB e o FASB estão a trabalhar em conjunto na revisão da NIC (IAS) n.º 1 “Apresentação de Demonstrações Financeiras”, preconizando a alteração da designação de “Balanço” para “Demonstração da posição financeira”, com o argumento de que esta reflecte melhor a sua função, pois o balanço simplesmente indica que o método da partida dobrada requer que a soma dos débitos seja igual à soma dos créditos16.

É caso para se dizer, em linguagem metafórica em relação ao título deste artigo, que se estão a colocar em causa “os direitos (históricos) do balanço”.

16 Conforme RODRIGUEZ GARCIA, Carlos José: El proyecto conjunto IASB/FASB sobre la

presentación de los estados financieiros¿: El finalidad balance y la cuenta de resultados tal y como los conocemos?, Técnica Contable n.º 692, de Dezembro de 2006, pp. 29-34.

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