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LIVRO ÉTICA E ENFERMAGEM. Queirós, Ana Albuquerque (2001). Ética e Enfermagem. Coimbra: Quarteto

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LIVRO ÉTICA E ENFERMAGEM

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PENSAMENTO

“A ética está mais próxima da sabedoria do que da

razão, mais próxima de que coisa deve ser o bem do que da formulação de princípios correctos.”

Francisco J. Varela “Ser-se humano consiste principalmente em ter-se relações com outros seres humanos”

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DEDICATÓRIA:

Aos Estudantes de Enfermagem

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INDICE

INTRODUÇÃO...7 I PARTE

1. FUNDAMENTOS DA ÉTICA, CLARIFICAÇÃO DE

CONCEITOS ...

2. DIMENSÕES ÉTICAS DA ENFERMAGEM

CONTEMPORÂNEA...

3. DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS ÉTICO-RELACIONAIS...

4. OS VALORES EM ENFERMAGEM...

5. O QUE É UM PROBLEMA ÉTICO...

6. OS PRINCÍPIOS DE AUTONOMIA, BENEFICÊNCIA, NÃO MALEFICÊNCIA E JUSTIÇA...

7. ROTEIRO PARA O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO

ÉTICA...

8. TEORIAS ÉTICAS

II PARTE

1. ÉTICA RELACIONAL NOS CUIDADOS DE SAÚDE AO ADOLESCENTE - - uma abordagem sobre o consentimento informado

LISTA DE BIBLIOGRAFIA PARA APROFUNDAMENTO DO ESTUDO DA ÉTICA E BIOÉTICA

ANEXOS:

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§ Anexo II- Linhas orientadoras para agir perante comportamentos e/ou práticas profissionais incorrectas.

§ Anexo III- Parecer sobre aspectos éticos dos cuidados de saúde relacionados com o final da vida - 11/CNECV/95

§ Anexo IV- Declaração de Helsínquia

§ Anexo V - Carta dos direitos e deveres dos doentes § Anexo VI - Convenção de Oviedo

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INTRODUÇÃO

O trabalho que apresentamos neste livro procura reflectir sobre a dimensão ética da profissão de enfermagem e a sua contribuição para uma cada vez maior visibilidade da genuína arte e ciência que esta profissão encerra.

Como colectânea, em livro, de alguns dos temas preparados para a leccionação das disciplinas de Ética e Bioética na Escola Superior de Enfermagem Dr. Ângelo da Fonseca, os objectivos que este trabalho envolve são também os que nos orientaram para tais abordagens e que foram:

- Contribuir para a preparação dos estudantes/formandos no sentido de compreenderem a importância das competências Éticas no âmbito das Ciências de Enfermagem e da práxis profissional do(s) Enfermeiro(s);

- Contribuir para que os estudantes/formandos desenvolvam uma grande sensibilidade, uma sólida preparação teórica e uma clara compreensão do papel do profissional de enfermagem, (nas suas intervenções independentes e interdependentes), que requeiram a aplicação das suas competências éticas.

O livro consiste, numa primeira parte com vários capítulos temáticos que abordam itens relativos a aspectos de fundamentação para a reflexão ética, uma perspectiva de clarificação de conceitos, uma reflexão sobre as dimensões éticas da enfermagem contemporânea, sobre o desenvolvimento de competências ético-relacionais, uma breve abordagem sobre os valores e a enfermagem; segue-se, ainda capítulos contendo algumas reflexões sobre o que é um problema ético e os princípios éticos a ter em atenção no processo de tomada de decisão ética. Ilustra-se a abordagem para a tomada de decisão com uma reflexão sobre a questão do sigilo profissional. Aborda-se, ainda, de uma forma bem sucinta as teorias éticas mais referenciadas na literatura em enfermagem.

Numa segunda parte apresenta-se o texto específico sob o tema “Ética relacional nos cuidados de saúde ao adolescente” que constituiu o documento de base da lição proferida no âmbito do concurso para professor coordenador

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para a Escola Superior de Enfermagem de Bissaya Barreto realizado recentemente pela autora.

É fundamental que se tenha em conta que os temas tratados não foram alvo de uma exaustivo aprofundamento bibliográfico, procurando-se antes dar um certo caracter de exposição, coerente, de algum modo, com a forma como as aulas se desenrolaram.

As notas que são colocadas em pé de página remetem o leitor para as referencias citadas ao longo do texto e no final inclui-se uma extensa lista de bibliografia que se pretende seja útil para um estudo mais aprofundado.

Colam-se em anexo alguns documentos normativos, a título de exemplo, para orientar o leitor para a importância da documentação relacionada, como o Código de Ética e Deontologia dos Enfermeiros Portugueses, Linhas orientadoras para agir perante comportamentos e/ou práticas profissionais incorrectas, o Parecer do Conselho nacional de Ética para as Ciências da Vida sobre aspectos éticos dos cuidados de saúde relacionados com o final da vida - 11/CNECV/95, a Declaração de Helsínquia, a Convenção de Oviedo, a Carta dos Direitos e Deveres dos Doentes, da Direcção Geral de Saúde, a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

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I PARTE

1. FUNDAMENTOS DA ÉTICA, CLARIFICAÇÃO DE CONCEITOS

A questão ética é posta hoje com uma intensidade e uma urgência que se pode medir pelos perigos presentes na actualidade e que se multiplicam. E esta interrogação traduz-se frequentemente por uma procura e uma produção de normas.

Os poderes públicos colocam barreiras à quantidade de riscos contemporâneos (a informática face ás liberdades, a engenharia genética face aquilo que é o Homem enquanto espécie); decidem actualmente regulamentar os nascimentos assistidos tecnologicamente, os usos dos métodos de procriação artificial; confronta-se com problemas da protecção da carta genética.” 1

Os profissionais de saúde apercebem-se de questões da mesma ordem e procuram respostas a partir da sua prática. No mundo da enfermagem, multiplicam-se as reflexões, as formações, iniciais ou contínuas, as publicações sobre ética. E, apesar desta abundância, algo desordenada - mas é como a própria vida - quantas vezes os profissionais se sentem sós e impotentes face a questões difíceis. As soluções muito tempo retardadas, são muitas vezes, ainda, tomadas de urgência, sem concertação ou com pouca, o desconforto, o mau estar de muitos profissionais é evidente, e o do público é também muitas vezes visível.

É, então, necessário, que os grupos profissionais ligados aos de cuidados de saúde, se estruturem, por todos os meios à sua disposição, se apetrechem para melhor fazer face, a estas situações: - é vital para todos e para a sociedade. À criatividade que se manifesta no domínio das ciências e das técnicas de vida e da saúde, deve responder a criatividade ética dos profissionais da saúde.

Enquanto profissionais é imprescindível que procuremos enfrentar os complexos desafios que se colocam na actualidade tanto a nível pessoal, como institucional e social.

1

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A necessidade de os profissionais de enfermagem se apetrecharem para dar resposta às exigências da alta competência técnica e da elevada competência no “toque”, no cuidar humano, colocam o pensamento ético na interface entre algo a que por vezes se chama a técnica dos cuidados de enfermagem e a componente relacional dos mesmos cuidados2.

O estudo das teorias éticas, a clarificação da variedade de factores que precisam de ser analisados quando se enfrentam os dilemas éticos, o processo de tomada de decisão, são alguns dos elementos que se exige hoje que os enfermeiros aprofundem de forma a fundamentarem as suas práticas profissionais e assim aplicarem de forma exigente e criativa os princípios éticos e deontológicos, como os que estão definidos no recente documento dos Estatutos da Ordem dos Enfermeiros Portugueses3.

Na sua essência, a enfermagem é uma profissão que envolve situações que encerram aspectos ético-morais de natureza complexa. A dependência que cresce face à tecnologia, o resultado que esta produz na forma como o ser humano experiência o seu ciclo vital, os altos custos económicos inerentes aos cuidados de saúde, associados ao crescimento e desenvolvimento da autonomia das diversas profissões cria uma atmosfera que exige que as reflexões perante as situações concretas se façam segundo enquadramentos teóricos clarificados.

A enfermagem sendo considerada como uma profissão com pressupostos ético-morais importantes, tem vindo a sofrer mudanças no seu significado e na sua estrutura, principalmente desde o início do século vinte, ao acompanhar todo um conjunto de alterações no contexto do desenvolvimento das ciências médicas e das próprias mudanças sócio-demográficas e económicas. Estas mudanças que ocorrem na estrutura e nas finalidades da profissão de enfermagem resultaram em modelos de enfermagem contemporâneos que realçam o conceito de cuidar, que é o núcleo central da Enfermagem e que é desenvolvido através do suporte e da protecção da dignidade do

2

In: Queirós, Ana. (2000). Empatia e respeito. Coimbra. Quarteto Editora.

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doente/utente4. Então, o objectivo da enfermagem é principalmente o de promover a saúde e a qualidade de vida e providenciar um ambiente humano e seguro. A primeira finalidade da relação enfermeira-doente é reconhecida como sendo a de promover o bem-estar e a segurança da pessoa.

Esta perspectiva coloca o doente/utente no centro da atenção da profissão de enfermagem. Isto faz com que a enfermagem seja realizada tratando-se e cuidando-se, isto é preservando-se a integridade e auto-estima da pessoa. Os valores e os objectivos tradicionais, que privilegiavam uma enfermagem centrada no médico e numa atitude de obediência, foram ultrapassados por uma visão contemporânea que coloca o doente/utente como o alvo da atenção e que se desenvolve através de atitudes de respeito, de honestidade, de lealdade, de coragem, de verdadeira consciência e compaixão5 perante o doente.

Esta inovadora perspectiva de Enfermagem conduz a uma mudança significativa nas interacções que acontecem entre as enfermeiras e os doentes e produzem uma clarificação sobre a responsabilidade primordial que a enfermeira tem face à pessoa que é alvo dos cuidados de enfermagem. Esta compreensão acerca da enfermagem contemporânea realça a responsabilidade ética para que a enfermeira assuma a defesa6 e protecção dos direitos dos doentes.

4

Nesta obra será usada indistintamente a palavra doente ou utente querendo significar a pessoa que é assistida nas instituições de saúde hospitalares, centro de saúde, em ambiente domiciliar ou outro contexto na comunidade.

5

Compaixão é um termo que entendemos ser bastante interessante quando o distinguimos de algo que diga respeito a “caridade”, mas antes se refere ao genuíno interesse humano e profissional em ajudar a diminuir o sofrimento do outro.

6

O papel de defesa ou de advogado do doente é uma expressão que significa que o profissional de enfermagem assume uma nova competência ética que, nesta perspectiva contemporânea, é fundamental para a realização da excelência em enfermagem e que se concretiza por uma atitude de grande empenho na promoção da autonomia e autodeterminação do doente, face ao seu próprio processo de cuidados na saúde e na doença.

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SPARKES (1991)7, afirma que as definições dos dicionários, da palavra Ética, podem, trazer-nos ideias não conclusivas. Um dos significados dados é o de "estudo filosófico da conduta moral e do raciocínio" (SPARKES, 1991). Esta interpretação pode ser extensiva a questões do tipo do que são acções correctas ou incorrectas. Nesta perspectiva, qualquer pessoa pode ser considerada como estando preocupada com a Ética, num momento ou noutro, pois que todos nós nos encontramos em situações que têm uma dimensão moral.

Quando perguntamos aos nossos estudantes o que significa para eles a palavra ética, muitas vezes as suas respostas são:

- «A ética tem a ver com quilo que os meus sentimentos me dizem o que é certo e errado.»

- «A ética tem a ver com os meus valores religiosos.» - «Ser ético é agir de acordo com a lei.»

- «A ética consiste em padrões de comportamento que a sociedade aceita.»

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- «Eu não sei bem o que é que a palavra quer dizer.»

Muitas destas respostas são mesmo bastante típicas e frequentes. De facto não é assim tão simples explicar o que é que queremos dizer quando usamos a palavra ética.

Ao fazer-se apelo aos sentimentos, está-se a evidenciar uma grande convicção pessoal no pensamento ético; mas certamente que a ética não é uma questão de sentimentos. A pessoa que segue os seus sentimentos pode errar e fazer aquilo que não está certo. Muitas vezes, os sentimentos desviam-nos daquilo que é ético.

Igualmente não é apropriado associarmos a ética com a religião. A maioria das religiões, como se sabe, defendem elevados padrões éticos. No entanto, se a ética fosse restrita às religiões, aplicar-se-ia apenas a pessoas religiosas. A ética é igualmente inerente a um indivíduo que é ateu ou a alguém que é santo. Certamente que a religião promove padrões éticos importantes, e pode promover uma forte motivação para as atitudes éticas, mas contudo, não se reduz à religião nem é algo parecido com a religião.

Ser ético também não é o mesmo que seguir as leis. As leis muitas vezes incorporam normas éticas, com as quais a maioria dos cidadãos está de acordo. Mas as leis, tal como os sentimentos, podem desviar-se do que é ético. Pensemos por exemplo nas leis que defenderam escravatura ou nas leis que defendem a pena de morte e que nos parecem grotescas e desviadas do que é ético.

Finalmente, ser ético não é o mesmo que «fazer aquilo que a sociedade aceita.» Em qualquer sociedade, a maioria das pessoas aceita os padrões que são, de facto, éticos, mas os padrões de comportamento em sociedade podem desviar-se daquilo que é ético. Uma sociedade inteira pode tornar-se eticamente corrupta. É o caso da sociedade nazi, na Alemanha na época da II Guerra Mundial.

Se, ser ético fosse fazer «o que a sociedade aceita», então para saber o que é ético, a pessoa teria de procurar saber o que é que a sociedade aceita. Para decidir o que eu penso sobre o aborto, por exemplo, eu teria de fazer um inquérito a toda a sociedade e então depois ajustava o meu pensamento ao que a sociedade aceitasse. Mas ninguém pensa que quando tem de adoptar

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uma atitude ética vai precisar de fazer um inquérito na sociedade. Também a falta de consenso social, sobre muitas questões, torna impossível que se considere ético aquilo que a sociedade aceita. Algumas pessoas aceitam o aborto e outras não. Se de facto a ética fosse fazer aquilo que a sociedade aceita, então teríamos de encontrar uma concordância em temas, que na realidade, não existe.

A distinção entre os dois termos Ética e Moral é mais de ordem filosófica e podem ser dadas algumas respostas. Sabe-se que a etimologia dos dois termos é a mesma, que o termo “moral” se tem imposto e que está conotado por uma concepção “descendente”: vai-se dos princípios para as aplicações, o que não é sempre operacional e pode ficar no campo individual. Daí o retomar do uso do termo “ética”, que na reflexão filosófica e na prática contemporânea, implica quer a responsabilidade de todos os actores e a procura dos consensos. Uma reflexão clara sobre o processo ético é a que propõe o filósofo Paul Ricoeur8. Para ele, o processo ético implica no ponto de partida uma tomada de consciência do problema, um desejo de “lhe “ responder - o que ele chama de “ intenção ética” - os “valores” como fundamento, a vontade de os honrar, depois de uma procura muito concreta para tentar elaborar a melhor resposta possível. O que necessita a referência às “normas”: e é então, que na opinião deste filósofo, intervém a “moral”.

A ética significa decidir sobre “o que é mais correcto fazer?” ou decidir “ como devo eu agir?” As respostas a estas questões devem ser descobertas nas inter-relações entre os profissionais de saúde e o doente (e a sua família). Se é verdade que o “momento ético” se encontra nas relações do “eu com o outro”, então devemos considerar que precisamos ter uma cada vez maior habilidade para controlar e manipular o corpo humano no âmbito dos cuidados de saúde, pois existe um risco sério de se agredir o espírito humano.

Ética em enfermagem e ética médica, ética de cuidados de enfermagem, e ética do quotidiano, bioética e ética biomédica, ética clinica e ética hospitalar…os termos multiplicam-se, procuremos ver mais claro:

Uma situação relevante da ética, em cuidados de enfermagem, e portanto no campo da “ética em enfermagem”, pode também ser relevante na

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“ética médica”; pode também falar-se de “ética clínica”; se a situação é hospitalar, ela constitui igualmente uma situação de “ética hospitalar”. E como as situações são sempre singulares, realça-se também a “ética do quotidiano”, que se diferencia da reflexão ética de fundo. Sem nos ligarmos muito a estes nomes, parece-me que há mais interesse em falar da participação da enfermeira na ética em contexto de cuidados de saúde ou Ética clínica.

Assinalemos, ainda que o termo “bioética”, segundo o uso americano, e o vocabulário a nível de instâncias europeias deve ser usado preferivelmente ao termo “ética biomédica”, conotado sobretudo com a profissão médica.

A palavra bioética surgiu no início dos anos 70, a partir dos Estados Unidos, tendo imediatamente passado para a Europa e, em seguida, para o resto do mundo. A sua conotação inicial relacionava-se com uma questão de ética global, ou seja, com a preocupação ética de preservação futura do planeta, a partir da constatação de que algumas novas descobertas e suas aplicações, em vez de trazerem benefícios para a espécie humana e para o futuro da humanidade, originavam preocupações e até mesmo destruição da biodiversidade, podendo ocasionar danos irreparáveis no próprio ecossistema. Em pouco tempo, no entanto, a palavra “bioética” foi de certa forma apropriada pelos pesquisadores do Instituto Kennedy, dos Estados Unidos, que deram ao seu conceito uma feição mais relacionada com as situações éticas relacionadas à vida das pessoas, desde o seu nascimento, ao longo da vida, até à morte. Foi principalmente a partir daí, com esta conotação, que ela se expandiu e é hoje reconhecida nos meios académicos e ligados à saúde, internacionais.

A base da bioética é a “ética prática” ou “ética aplicada”. Actualmente, é provável que este campo da filosofia tenha sua utilização mais aperfeiçoada, mais acabada, exactamente através da bioética. Isso é até certo ponto natural, uma vez que os grandes dilemas que passaram a colocar-se às pessoas e às colectividades, na vida quotidiana e prática, principalmente dos anos 50 para cá, começaram a exigir respostas ou decisões muitas vezes imediatas e sempre concretas. Estamos a referir temas como a reprodução medicamente assistida, os transplantes de órgãos, a terapia genética e tantas outras situações que atingem, de certo modo, os limites da vida, e que dizem respeito ao mais íntimo da espécie humana.

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A Bioética não é, portanto, hoje, simplesmente uma nova versão da tradicional “ética médica”. O termo engloba, também, uma extensa lista de problemas para homens e mulheres, referentes aos direitos e obrigações dos profissionais, dos doentes e da sociedade, e que se relacionam com a saúde.

Com poucos anos de vida, a bioética evoluiu rapidamente; a partir do conceito, foi-se construindo um original paradigma, entendido esse como um conjunto de elementos culturais, de conhecimentos e códigos teóricos, técnicos e metodológicos compartilhados pelos membros de uma comunidade científica·. A ampliação teórica do paradigma bioético, introduziu a distinção entre o que se chamou de bioética quotidiana e bioética das situações limite ou de fronteira. De certa forma, a bioética veio também para reforçar o exercício humanístico da questão ética.

Em todos os temas inerentes à bioética, existe uma questão que, sem dúvida, atravessa longitudinalmente todos os problemas e conflitos a serem abordados e estudados. Trata-se do assunto ao qual o filósofo alemão Hans Jonas9 dedicou toda sua vida, ou seja, à ética da responsabilidade. Seja relacionando – se com a bioética das situações persistentes ou das situações emergentes, o princípio universal da responsabilidade não pode ser deixado de lado.

O que é então a ética?

A Ética trata de dois aspectos. Em primeiro lugar refere-se a padrões bem estabelecidos do que é certo e errado e que prescrevem aquilo que os seres humanos devem ser, geralmente em termos de direitos, obrigações, benefícios para a sociedade, lealdade ou qualidades (virtudes) específicas. Por exemplo, refere-se àqueles padrões que impõem uma obrigação razoável que nos impedem de roubar, de matar, de cometer fraudes. Nesta perspectiva a ética trata, também, dos padrões relacionados com o direito à vida, à liberdade, e o direito à privacidade. Estes padrões são considerados princípios ético-morais porque são suportados por razões consistentes e bem fundamentadas. Podemos dizer que esta é a moral que vem de fora para dentro e que cada um de nós reconhece nos princípios ou valores morais que lhe são transmitidos na

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sua vida de família e no seu ambiente sociocultural e que por vezes chamamos de a nossa consciência.

Em segundo lugar, a ética refere-se ao estudo e ao desenvolvimento dos nossos padrões éticos pessoais (que nascem de dentro de nós e se mostram

fora de nós, nas nossas acções quotidianas). Como foi mencionado antes,

sentimentos, leis, normas sociais podem desviar-se daquilo que é ético. Portanto, é necessário examinar constantemente os nossos próprios padrões para nos assegurarmos que eles são razoáveis e bem fundamentados. A ética também significa o esforço contínuo de estudar as nossas crenças morais e as nossas convicções profundas que baseiam a nossa conduta de forma a assegurarmos que nós próprios e as instituições que nós integramos vivem de acordo com elevados padrões que são razoáveis e bem sólidos.

Bergum10 (1997) afirma que existe um reconhecimento cada vez maior de que novos modelos de interacção no contexto dos cuidados de saúde são necessários, talvez menos estruturados hierarquicamente ou menos focados no que se refere ao poder e ao controle.

A mesma autora chama a atenção para os três tipos de conhecimento necessário para o julgamento ético evoluir11. Os primeiros dois, conhecimentos

da experiência subjectiva (escutar as experiências dos pacientes), e abstracção objectiva ou deliberada (pensamento tecnológico ou racionalidade) são formas

de conhecimento importantes.

O terceiro tipo de conhecimento fundamental para os cuidados de saúde é o

conhecimento compreensivo, necessário para o julgamento clínico ético, e

desenvolve-se através da participação (partilha) onde os profissionais se esforçam por compreender o que significa a experiência para o paciente. A sabedoria prática para a ética nos cuidados de saúde deve ser obtida ao longo das acções com os doentes. A Enfermeira e o médico devem “mudar-se” do raciocínio tecnológico e científico do laboratório para a beira da cama do doente, onde o tacto e compreensão podem criar um necessário conhecimento novo e enriquecedor.

10

In: BERGUN,Vangie.(1993).Participatory knowledge for ethical care. Bioethics Boletim(2),Alberta, Canadá.

11

Nota: esta abordagem sobre os tipos de conhecimento é também fundamental para se abordar a questão do desenvolvimento de competências ético-relacionais.

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As alarmantes imagens das pessoas reais sendo fragmentadas em partes abstractas podem ser apagadas através do desenvolvimento de habilidades para o desenvolvimento de interacções com doentes que colocam o foco na compreensão da experiência humana.

O tipo de conhecimento (e de modo de conhecer) necessário para um julgamento ético deve ser partilhado, no qual os profissionais e os pacientes, juntos, procuram compreender o que significam os factos objectivos que se desenrolam ao longo das experiências individuais dos doentes. Então, esta relação profissional - doente não é meramente realizada com o fim de se interpretar uma informação científica (por exemplo explicar o significado dos resultados de uma análise ao sangue), ou ainda realizada apenas com o fim de aplicar um princípio ético (por exemplo, usando o princípio da Autonomia em vez do princípio da Beneficência para justificar uma decisão), mas fornece também a ocasião para compreender o que significam os resultados de uma análise de sangue para aquele doente individual, sendo este aspecto que fornece o fundamento para um real e verdadeiro cuidar ético.

O conhecimento moral (e os padrões) para o julgamento ético deve ser entendidos como um processo em vez de algo definitivo. Sendo um processo deve sempre rejeitar o uso da força, o que inclui o uso do conhecimento que dá poder (médico, científico, filosófico), as posições que conferem os diferentes poderes (médico / enfermeira / paciente), ou até a tecnologia que traduz poder (possibilidade de poder manter a pessoa viva).

As discussões acerca da Ética muitas vezes estão centradas à volta de tópicos carregados de controvérsia moral, por exemplo os debates sobre eutanásia, o aborto, a investigação com embriões humanos e atribuições de recursos. Estes, às vezes, envolvem acaloradas discussões entre grupos ou indivíduos que aderem afincadamente a perspectivas contrastantes.

Como Enfermeiras, nós encontramos diariamente situações que podem ser descritas como problemas Éticos. Estes podem incluir um vasto leque de circunstâncias, abrangendo áreas tão diversas como colaborar ou não num aborto, como qual a melhor forma de lidar com a angústia de fazer parte de um grupo que se mostra muito resistente à mudança. Podem ser dadas opiniões sobre o mérito da Ética, ou, de uma dada situação, mas é difícil de dar um sim absoluto ou não sobre a valorização moral intrínseca a incidentes particulares.

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Este é um tema importante para se aprofundar relativamente à Ética, pois pode fornecer pistas para o pensamento reflectido mas não pode fornecer respostas universais.

Em enfermagem, nós inevitavelmente encontramos situações com uma dimensão ética e moral.

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A perspectiva que coloca o doente/utente no centro da atenção da profissão de enfermagem faz com que a enfermagem seja realizada com uma concepção de cuidados que se orienta tanto para o cuidar humano como para o cuidar técnico e científico, que em rigor são uma única entidade central na Ciência e Arte de Enfermagem.

Os valores e os objectivos tradicionais, que privilegiavam uma enfermagem centrada no médico e numa atitude de obediência, foram ultrapassados por uma visão contemporânea que coloca o doente/utente como o alvo da atenção e que se desenvolve através de atitudes de respeito, de honestidade, de lealdade, de coragem, de verdadeira consciência e compaixão perante o doente.

Esta inovadora perspectiva de Enfermagem conduz a uma mudança significativa nas interacções que acontecem entre as enfermeiras e os doentes e produzem uma clarificação sobre a responsabilidade primordial que a enfermeira tem face à pessoa que é alvo dos cuidados de enfermagem. Esta compreensão acerca da enfermagem contemporânea realça a responsabilidade ética para que a enfermeira assuma a defesa e protecção dos direitos dos doentes.

Ao mesmo tempo que evolui a prática com base numa teoria de Enfermagem, também evoluiu o papel da Enfermeira profissional como defensora do utente. Explorando os desenvolvimentos em Enfermagem, Winslow (1984, p. 32)12 afirma que a Enfermagem evolui da metáfora de “Enfermagem como um esforço lutar contra a doença (militar) ” da metáfora que caracteriza a nossa história passada, “associada a virtudes como a lealdade e normas como a “obediência aos de maior patente”, e a manutenção de confiança na autoridade - para a metáfora de defesa associada à “Enfermagem como um defensor dos direitos dos utentes, uma metáfora basicamente legal … associada a virtudes como a coragem e a normas como a defesa do doente contra a violação dos seus direitos”.

12

In: WINSLOW GR(1984) From loyalty to advocacy: A new metaphor for nursing. Hastings Report 14:32-40.

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Até certo ponto as enfermeiras agiram sempre como defensoras dos utentes. A defesa do utente ganhou maior relevância quando entrou em conflito com a defesa do médico ou a defesa de instituição empregadora.

À medida que a Enfermagem se foi assumindo como uma profissão autónoma e não um subsistema dependente da medicina, a natureza de defesa foi-se alterando.

Actualmente, a Enfermagem que tenta agir no papel de defensora do utente, aceita a obrigação de ter o utente como a prioridade máxima, em qualquer circunstância.

O desafio para uma Enfermeira que actualmente queira ser uma defensora do utente, é exactamente ter a capacidade e habilidade de o ser, sem por isso se tornar adversária de outros profissionais no Sistema de Cuidados de Saúde.

CORCORAN (1988. P. 248) sintetizou as dificuldades associadas à defesa do utente:

- “ Desempenhar o papel de defensor do utente /cliente é difícil e

por vezes mesmo ameaçador porque promove a

autodeterminação do doente e porque os direitos morais e obrigações associadas ao profissional podem não ser compatíveis como as políticas institucionais ou regulamentos legais”13.

De acordo com Leddy e Pepper (1993), a visão tradicional do papel da

Enfermeira deve ser ajustada de forma a dar credibilidade às funções

facilitadora, protectora ou de sentinela e coordenadora, bem como às actuais

funções restauradoras.

São de destacar os conhecimentos e as capacidades necessários para ajudar os utentes a aumentarem as suas competências, assumindo a responsabilidade pela sua saúde individual e pela saúde colectiva.

Num sistema assim orientado, e ainda baseando-nos em Leddy e Pepper os profissionais de enfermagem deveriam centrar o desenvolvimento da sua prática no seguinte:

13

In: CORCORAN S. (1998). Toward operationalizing an advocacy role. J Prof Nurs 4:242-248, July/August.

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- «- Desenvolvimento da compreensão das respostas e

reacções dos utentes a diferentes ameaças à saúde e desenvolvimento de estratégias que respondam eficazmente a estas reacções.

- Clarificação e posterior desenvolvimento de promoção

da saúde e das capacidades de prevenção da doença, bem como de capacidades restauradoras.

- Reconhecimento pessoal da responsabilidade de

colaboração de forma a gerir a eficácia do sistema de prestação de cuidados de saúde; bem como da responsabilidade pessoal de avaliação da eficácia das intervenções de Enfermagem na resposta às necessidades de saúde dos utentes.

- Implementação de um diálogo interdisciplinar, em que

todos os trabalhadores profissionais partilham as mesmas responsabilidades e autoridade tendo em vista a satisfação das necessidades de saúde dos utentes e garantindo que todos os membros da equipa tenham a oportunidade de avaliar a eficácia dos cuidados; evitando assim o estabelecimento de relações conflituosas.» (Adaptado de Leddy e Pepper, 1993)

Para que estas perspectivas de desenvolvimento profissional se possam ir concretizando torna-se fundamental que se promova um crescimento individual de cada profissional, baseada numa atitude reflexiva na e sobre a acção, que considere aspectos como:

- «1. A interacção com o utente de forma a permitir

explorar as suas reacções pessoais, perante a sua saúde ou ameaças à saúde; avaliar as circunstâncias ambientais em que está incluído; identificar as suas próprias forças e limitações; identificar os recursos que consideram necessários.

(23)

- 2. A definição clara das responsabilidades dos utentes e

Enfermeiras, o que assegura que o utente seja responsável pela sua saúde, assim como assegura que a Enfermeira seja responsável pelas bases informativas e interactivas necessárias.

- 3. A implementação de programas de formação e

informação necessários ao utente.

- 4. A actualização das capacidades técnicas à medida

que as novas técnicas e equipamento terapêutico são postas à disposição do sistema de saúde.

- 5. A troca de opiniões com os colegas de profissão

quanto às capacidades dos utentes; num esforço de avaliar valores próprios, quando se verificam diferentes estados de saúde de dependência ou independência.

- 6. A actualização dos planos de cuidados de

Enfermagem como um esforço de avaliar os resultados dos cuidados de saúde.

- 7. A participação na investigação de Enfermagem como

um utilizador sistemático dos seus resultados e como auxiliar na realização de estudos conduzidos dentro do sistema de cuidados de saúde.

- 8. A contribuição para a identificação de todas as

unidades do sistema de prestação de cuidados que necessitam integrar os cuidados aos utentes, num esforço para que todos os recursos sejam colocados efectivamente ao serviço dos cidadãos.

- 9.A contribuição para se avaliar a adequação dos

esforços de todos os trabalhadores envolvidos no processo de cuidar.

- 10. A resolução dos conflitos que podem surgir

associados aos esforços de defesa do utente promovendo: o respeito pela posição de todos os envolvidos; a participação no processo de resolução

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dos problemas do utente para que tome decisões com base em dados e não nos conselhos de outros.

- 11. A discussão e avaliação periódica da qualidade das

interacções da equipa de cuidados de saúde, bem como a avaliação da eficiência de cada um nas relações que estabelece com o utente e com os membros da equipa e reconhecendo e mostrando apreço pelas contribuições dos membros da equipa para o processo de cuidados.»14

A realização destes tipos de comportamento no trabalho reflecte o empenho da Enfermeiras na defesa do papel de defensora do utente como um papel legítimo.

Neste sentido podemos dizer que o papel profissional das enfermeiras, que se desenrola na possibilidade de um grande partilha de responsabilidades, conduz a que a enfermeira haja quer como coordenadora, ou gestora de cuidados, ou como facilitadora da dinâmica interactiva e interdisciplinar, ou ainda como

protectora ou sentinela, isto é alguém que pode acompanhar passo a passo os

aspectos que interferem directa ou indirectamente com o bem-estar do doente. Quando o utente vê que a Enfermeira agiu para seu bem: para assegurar os cuidados de saúde adequados, e também quando vê que a Enfermeira respeitou a sua capacidade de assumir responsabilidades pela sua própria saúde e de tomar as suas decisões; assim quando estes factos se verificam o utente sente-se competente e útil e a Enfermeira, por seu lado, ganha respeito e apego pelos seus serviços profissionais.

As Enfermeiras não deverão usar este poder que legitimamente lhes pertence para controlar os utentes, mas sim utilizarem-no para partilhar o poder e a responsabilidade com os utentes; desta forma ganharão cada vez mais autonomia bem como um melhor controlo da sua prática.

14

Adaptado :de SUSAN LEDDY; J. MAE PEPPER (1993). Conceptual Bases of Professional

(25)

3. O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS ÉTICO – RELACIONAIS

A enfermagem sendo considerada como uma profissão com pressupostos ético-morais importantes, tem vindo a sofrer mudanças no seu significado e na sua estrutura, principalmente desde o início do século vinte, ao acompanhar todo um conjunto de alterações no contexto do desenvolvimento das ciências médicas e das próprias mudanças sócio-democráficas e económicas. Estas mudanças que ocorrem na estrutura e nas finalidades da profissão de enfermagem resultaram em modelos de enfermagem contemporâneos que realçam o conceito de cuidar, que é o núcleo central da Enfermagem e que é desenvolvido através do suporte e da protecção da dignidade do doente/utente.

A emergência de uma ciência da enfermagem tem auxiliado os Profissionais de Enfermagem no desenvolvimento e utilização de modelos de enfermagem nos quais a prática se deve basear.

As enfermeiras procuram apresentar com cada vez maior clareza o que os cuidados de enfermagem são exactamente, bem como os tentam diferenciar dos cuidados estritamente biomédicos, a efectiva via do autodesenvolvimento de competências profissionais tanto no domínio colaborativo ou interdependente como no domínio autónomo ou independente, para que se progrida de: principiante, a principiante avançado, a competente e depois proficiente até ao nível de perita (expert), Benner (1984)15.

Esta articulação permite que as enfermeiras vejam com maior clareza o valor das suas próprias intervenções, ao mesmo tempo que começam também a redefinir o conceito de “cuidar”. Ao defender-se um caminho de desenvolvimento profissional coerente e consistente com valores e saberes próprios está-se cada vez mais concentrado naquilo que é decisivo para que a Profissão cumpra realmente e com maior rigor a função social que os cidadãos têm direito e exigem, pois que a verdadeira interdisciplinaridade16 é

15

Benner, Patricia (1984, 2001).From Novice to expert, excellence and power in clinical Nursing practice. New Jersey. Prentice Hall. (Commemorative edition).

16

Ver: Queirós, Ana A.(2000). A prática em colaboração interdisciplinar implica uma partilha dinâmica e flexível do estatuto de autoridade. Lisboa: Revista da Ordem dos Enfermeiros, Nº 0.

(26)

concretizada num quotidiano dos cuidados em que as Equipas profissionais, partilham a autoridade com os utentes e famílias.

O conhecimento ético e o conhecimento clínico são tradicionalmente separados nas escolas. No entanto para os profissionais da prática clínica são inseparáveis.

Os princípios éticos e as noções do que é bom (para nós e para os outros) fornecem uma orientação essencial para as decisões clínicas. Quando os estudantes de enfermagem aprendem competências tecnológicas, eles também aprendem a estar com e a cuidar dos doentes. É aqui que os princípios éticos relacionados com os direitos do doente, com a autonomia, a beneficência, precisam ser transferidos para os comportamentos éticos do dia-a-dia, para que adquira uma real compreensão desses princípios.

Benner et al17 afirmam que é através da conversação das enfermeiras umas com as outras, e através da partilha de preocupações e dos modos distintos como cuidam dos seus doentes, que se constrói o conhecimento ético clínico. As histórias, as narrativas, as experiências partilhadas no seio de uma dada comunidade de profissionais fornecem o enquadramento de base para a compreensão sobre os comportamentos éticos e para os julgamentos éticos formais.

Jaspers (1994),18 utiliza a abordagem de Walker e Avant (1988)19 para a análise do conceito de perito, a fim de explorar os atributos e de definir as características do conceito. Jaspers retém que para se ser reconhecido como perito é preciso:

- Possuir um corpo de conhecimentos e de competências especializadas.

- Ter uma vasta experiência num campo de prática específica. - Demonstrar um nível elevado de padrões de reconhecimento. - Ser reconhecido pelos outros.20

17

Benner, Patricia; Tanner, Christine A.; Chesla, Catherine A. (1996). Expertise in Nursing practise,

Caring, Clinical Judgement and Ethics. New York: Springer Publishing Company. Pág. 232.

18

Jasper, M.A. (1994). Expert: a discussion of the implications of the concept as used in nursing. Journal of Advanced Nursing. 20, 769-776.

19

Walker, L. & Avant, K. (1988). Strategies for theory construction in nursing. 2nd edn.Norwalk 20

(27)

Actualmente, em Enfermagem a dominante ética que se encontra na prática de todos os dias é ainda a que provém de uma lógica do dever21, embora se reconheça que nas escolas e mesmo nas perspectivas de muitos profissionais se verifique uma mudança que destaca o cuidar, a responsabilidade face ao outro e a adopção de modos de realizar a profissão dando ênfase à pessoa que necessita de cuidados, sejam eles de natureza preventiva, de promoção da saúde, de manutenção ou de recuperação.

Cuidar é entendido como o alívio da vulnerabilidade; a facilitação do conforto, a promoção da dignidade, a realização mútua e a preservação e extensão das possibilidades humanas da pessoa, da família e da comunidade, bem como o proporcionar uma morte serena.

De acordo com Benner22 uma ética do cuidar tem de ser aprendida experiencialmente, porque está dependente do reconhecimento dos comportamentos éticos em situações específicas, no contexto de comunidades específicas, de práticas e de hábitos. Esta experiência é entendida na acepção de Gadamer23 (1975) “ como aquilo que se faz no dia-a-dia, acrescentando

nuances, introduzindo emendas, mudanças nas noções pré-concebidas ou nas percepções das situações.”

A enfermeira demonstra perícias éticas quando se preocupa, verdadeiramente, com o se está a passar com o doente e a família. Isto significa que adquirir uma perícia ético-relacional significa ter-se o talento de se responder àquelas situações éticas às quais só os profissionais peritos respondem. Esta resposta implica que se possui a sensibilidade para se experienciar uma dada satisfação social ou um dado sentido de arrependimento com o resultado de uma dada acção.

A mestria ética é apenas umas das dimensões de perícia. Podemos dizer que, todos nós, somos peritos em diversas actividades, e os nossos mecanismos para lidar com as situações em que somos peritos, funcionam em geral de um modo tranquilo e transparente, de tal modo que ficamos livres para

21

Nota: esta é uma opinião pessoal, que provém da experiência no contacto concreto com enfermeiras, tanto nos locais de trabalho, como em contextos de formação.

22

Ib.Pág233.

23Citado por: Benner, Patricia (1984, 2001).From Novice to expert, excellence and power in clinical

(28)

nos apercebermos de outros aspectos da nossa vida em que não somos assim tão competentes.

Benner et al.24 desenvolvem uma abordagem que procura clarificar que, no que se refere às práticas de cuidar, em que o reconhecimento e o respeito pelo outro, a realização mútua, o cuidar natural e a protecção perante a vulnerabilidade, são centrais, é difícil, se não impossível, ter momentos que não envolvem tanto a perícia clínica como a perícia ética.

Dreyfus e Dreyfus e Benner25distinguem quatro diferentes contextos, nos quais as considerações éticas, surgem como particularmente importantes para uma análise fenomenológica da apreciação de perícias clínicas: o comportamento, a comunicação, a educação e a justificação,

1- O comportamento refere-se à forma como uma pessoa pode desenvolver a habilidade de responder apropriadamente às questões éticas. A experiência de que se produz aprendizagem sem que a pessoa que aprende necessite de ter uma reflexão consciente, isto é, sem que ele ou ela se relembre de alguma coisa, desde que emocionalmente envolvida, serve para modificar o futuro comportamento intuitivo.

2- A comunicação é um processo complexo de formação de uma

comunidade, que em conjunto, partilha experiências e respostas. Esta comunidade forma-se através de partilha de exemplos cujo foco são as práticas comuns, tornando-se em evidências realmente partilhadas. Os exemplos vão buscar histórias passadas do grupo, mostram aquilo com que o grupo está comprometido e, serve assim, para orientar iniciados e passar sabedoria para aqueles que têm alguma compreensão do mesmo domínio.

3- A educação reporta-se à aprendizagem de novas competências que pode

ser facilitada através do assinalar de aspectos protótipos aos profissionais

24

Benner, Patricia; Tanner, Christine A.; Chesla, Catherine A. (1996).Expertise in Nursing practise, Caring, Clinical Judgement and Ethics. New York, Springer Publishing Company.

25

Dreyfus, Hubert,L.; Dreyfus, Stuart ,E.; Benner, Patricia (1996). Implications of the phenomenology of expertise for teaching and learning everyday skilful ethical comportment.pág258-279. In : Benner, Patricia; Tanner, Christine A.; Chesla, Catherine A.(1996).Expertise in Nursing practise, Caring, Clinical Judgement and Ethics. New York: Springer Publishing Company.

(29)

iniciados - avançados e da apresentação de situações paradigmáticas àqueles que já têm experiência. Então o profissional que se está a formar pode “agarrar” os aspectos relevantes e ver a situação da mesma forma que a do grupo a que pertence.

4- A justificação significa que quando uma resposta ética é considerada de perícia e precisa ser explicada e defendida, não há nada melhor que o próprio profissional perito contar a sua história e levar os outros peritos a dar opinião sobre se a situação, tal como foi realizada, é realmente vista como sendo apropriada. Esta forma de justificação distingue-se da apreciação feita por não peritos, pois estes podem fazer apelo aos princípios, o que apenas conduzirá a uma análise de racionalização, o que não garante que se irá gerar uma resposta de perícia noutras situações.

De acordo com estes pontos de vista considera-se que, os peritos são aqueles que beneficiam de muitas experiências concretas, para avançarem e deixarem um menos abrangente nível de competência baseado em princípios formais.

A importância da fenomenologia da perícia para o ensino e a aprendizagem dos comportamentos éticos de todos os dias, reside em que a compreensão fenomenológica do comportamento ético profundo e consistente, pode contribuir para o estudo da ética aplicada, tanto nas suas dimensões normativas, como casuísticas, pois que estas têm sempre uma relação com os significados de referência anteriores, relativos aos hábitos, às capacidades e às experiências práticas.

(30)

4. OS VALORES EM ENFERMAGEM

A prática dos profissionais de enfermagem é hoje entendida, por todos, como necessitando de um suporte teórico científico, técnico e relacional importante. A “construção” desse saber teórico, numa área como a Enfermagem é rapidamente acompanhada de uma ligação teórico-prática essencial para a compreensão de ideias e conceitos, mas sobretudo para a elaboração das capacidades de acção concretas em todas as situações de “cuidados de enfermagem”.

É também a dimensão ética de Enfermagem que precisa ser ensinada e aprendida. Mas para sermos coerentes connosco próprios, quando fazemos esta afirmação, precisamos de reforçar que entre aprender e ensinar, na nossa perspectiva não pode ser “prescrito” em nenhum manual de ética, antes é um saber que verdadeiramente se enquadra num processo de desenvolvimento pessoal de cada estudante de enfermagem e ao longo da vida de todos os profissionais de Enfermagem.

De facto a base dessa aprendizagem é o referencial de valores que cada um de nós possui enquanto pessoas, entendidos estes como define Simon e col (1978)26 citado por, Kozier et al (1995)27:

“Os valores são um conjunto de crenças pessoais e atitudes sobre

a verdade, a beleza, a importância de qualquer coisa, objecto ou conduta. Estão orientados para a acção e dão orientação e significado à própria vida”.

Existem várias formas de transmissão de valores, como a modelação, o deixar-andar (laissez-faire), a “moralização”, e a escolha responsável (Kozier, et al, 1995 p. 210).

Para que cada pessoa reconheça os seus próprios valores, isto é os clarifique, numa perspectiva pessoal e profissional é necessário que desenvolva um pensamento ético, efectivamente reflexivo. É ao longo da socialização na

26

SIMON, S. B., et al .(1978). Valves clarification: a handbook of practical strategies for

teachers and students. Veer. Ed. New York: Hart Publiskingcom.cit.por: KOZIER, B., et al

(1995). Conceitos y temas en la práctica de la enfermería. 2ª ED. Madrid: Interamericana - Mcgraw-Hill, 1995.

27

(31)

profissão (enquanto estudantes e quando profissionais) que esta reflexão se deve realizar.

A clarificação de valores é um processo pelo qual os indivíduos encontram as suas próprias respostas às situações, isto é os seus valores.

No esquema seguinte mostra-se uma forma de compreender este processo de clarificação de valores:

Segundo Simon e col. (1978, p.19)28, a clarificação de valores é um processo que pode ser formulado em sete planos:

- analisar as próprias condutas. - apreciar e querer.

- afirmar publicamente as crenças e condutas quando seja adequado. 28 Ib. Socialização Profissional Crenças Hábitos Normas Princípios INTERPRETAÇÕES INDIVIDUAIS VALORES PESSOAIS Valores Sociais

(32)

- escolher as próprias crenças e condutas. - escolher segundo as consequências. - escolher livremente.

- Agir.

- agir com um padrão, repetição e constância

A clarificação de valores é essencial para o crescimento individual e é um processo que guia a acção do profissional, pois que fomenta a consciência e visão interior de cada um, permitindo assim que a pessoa construa o seu referencial ético fundamental para uma completa competência profissional, (Andrade, 1992)29.

No contexto do desenvolvimento pessoal e profissional que a Enfermagem exige, é importante que procuremos clarificar as nossas potencialidades para um pensamento reflexivo presente ao longo da nossa vida e que nos permita enquadrar a ou as formações que fazemos numa forma de aprendizagem reflexiva, que faça parte de”...um processo de análise interior e de exploração

de um tema em estudo, desencadeado por uma experiência que cria e clarifica a significação para a própria pessoa e que resulta numa mudança de perspectiva conceptual.”, BOYD e FALES (l983) citado por Lígia Catarino30

(2000). Da obra de Rosalinda Alfaro-Lefevre31 retirámos as seguintes questões, para fazermos a nós mesmos e para avaliar o nosso potencial para pensar criticamente.

EU ESTOU ABERTA(O) A NOVAS IDEIAS E APTA(O) A ENTENDER PONTOS DE VISTA DIFERENTES?

EU ESTOU SEGURA(O) DA MINHA HABILIDADE DE RACIOCINAR? EU COMUNICO EFECTIVAMENTE COM OS OUTROS?

EU USO EFECTIVAMENTE O MÉTODO DE RESOLVER PROBLEMAS?

EU ESTOU DISPOSTA(O) A “TRABALHAR” O QUE É EXIGIDO PARA PENSAR CRÍTICAMENTE?

29

ANDRADE, Júlio Vaz (1992). Os valores na formação pessoal e social. Lisboa: texto editora.

30

IN: Queirós, Ana A. ; Catarino, Lígia; Santos, Elvira (2000). Educação em enfermagem. Coimbra: Quarteto Editora.

31

ALFARO-LEFEVRE, R. (1996). Pensamento crítico em Enfermagem: um enfoque prático. Porto Alegre: Artes Médicas.

(33)

EU ESTOU CONSCIENTE DA MINHA FORMA HABITUAL DE PENSAR? EU SINTO-ME SEGURA(O) QUANDO PEÇO ESCLARECIMENTOS? EU TENHO EXAMINADO OS MEUS VALORES E CRENÇAS E TENHO IDENTIFICADO O MODO COMO ELES PODEM AFECTAR O MEU PENSAMENTO?

EU TENHO EFECTIVA HABILIDADE DE REDACÇÃO? EU TENHO EFECTIVA HABILIDADE DE LER E APRENDER?

EU ESTOU APTA(O) A IGNORAR OS MEUS DESEJOS E CRENÇAS PESSOAIS A FAVOR DO PENSAMENTO QUE MAIS INTERESSA ÀS “PESSOAS -CHAVE”?

(34)

5. O QUE É UM PROBLEMA ÉTICO32

Muitas questões chamadas “éticas” são na realidade questões de relação. O termo “ética” é actualmente tão utilizado que nos podemos questionar se é sempre usado com pertinência, e isto também entre os profissionais de saúde; não se ganha nada com a banalização. Toda a situação que coloca questões, que interroga as pessoas ou os grupos, que põe em causa os valores, é facilmente qualificada de “ética”. Ora a metodologia proposta sobre a expressão de “ processo ético” não é sempre necessária. Não se pode dizer que haja vários níveis de questões propriamente éticas relevantes no âmbito dos cuidados de enfermagem? Porque, em certo sentido, “tudo é ético” no contexto das profissões de cuidar, porque todo o acto se inscreve numa relação.

Onde começa, então, a ética?

A relação é uma situação em que intervêm diversos factores que acontecem de diversas maneiras. É assim, por exemplo, que a relação de ajuda se aprende; trata-se de um trabalho sobre o próprio, para melhor se conhecer, discernir sobre as suas atitudes espontâneas, como seja aprender a escutar, a reformular. Ora, algumas questões qualificadas como éticas são na realidade questões de relação. O que é então ética e mesmo simplesmente a deontologia, é cada um responder à exigência de se formar, ou de fazer intervir alguém com formação quando isso é necessário.

Também todas as dificuldades nascidas numa relação, não estabelecida, ou mal estabelecida (por exemplo no acolhimento ao serviço, por ocasião de informações mal dadas ou mal recebidas, nas queixas dos doentes que não são atendidas, ou nas relações entre colegas); não colocam necessariamente problemas directamente éticos: alguns revelam a necessidade de pôr em

32

BESANCENEY, Jean-Claude (1992). Qu´est-ce qu´un “problème étique” Paris, Soins (561/562), Junho/Julho, p. 5-6.

(35)

prática uma deontologia. A ética não existe para corrigir as insuficiências relacionais ou deontológicas.

Pode-se dizer o mesmo, no âmbito das dificuldades que nascem do encontro de várias culturas. Como interpretar tal pedido ou tal recusa de um “cuidado” quando as dificuldades se complicam com o problema das línguas? O que é então ético, é encontrar o meio de as resolver seja através do conhecimento pessoal da cultura maioritariamente representada no nosso sector de actividade, seja através da intervenção de pessoas competentes.

Nestes domínios, que frequentemente não põem em causa senão a relação enfermeira-doente, os progressos que se conseguiram em alguns serviços hospitalares derivam do enquadramento de acções de humanização.

Os Dilemas éticos e o processo de tomada de decisão

Um dilema ético é uma situação em que a dificuldade de escolha da opção a realizar é por diversas razões difícil. Podemos considerar, de acordo com Alfaro-LeFevre (1996)33, que o dilema ético-moral envolve uma situação em que existem duas ou mais escolhas disponíveis, mas nenhuma delas parece satisfatória, sendo necessário escolher a melhor de todas.

A identificação dos dilemas éticos, e a forma de reflectir sobre eles, muitas vezes em períodos de tempo muito limitado e em situações de interdisciplinaridade nem sempre correctamente clarificadas, torna necessário que os profissionais de enfermagem possuam os conhecimentos e a experiência para contribuírem para a correcta compreensão, análise e tomada de decisão, à luz de referências bem ponderadas.

Surgem diariamente várias situações em que existem duas ou mais alternativas razoáveis e é necessário escolher entre elas; ou quando uma opção que se pensa escolher conduz a uma consequência não desejada, ou ainda numa situação em que não se sabe o que fazer, isto é, o que é correcto fazer.

Como se procede no quotidiano dos cuidados perante estas situações? A resposta a esta pergunta podemos encontrá-la com alguma visibilidade quando se trata das chamadas situações “pesadas”, em que muitas vezes são

33

ALFARO-LEFEVRE; Rosalinda (l996). “Pensamento crítico em enfermagem. Um enfoque

(36)

chamadas as Comissões de Ética para emitir o seu parecer; mas como se responde às questões dos dilemas profissionais e dos dilemas ético-morais que se vivenciam no decurso dos cuidados de “todos os dias”? É aqui que se coloca a questão do contributo da Dimensão Ética da Enfermagem, e da necessária qualificação específica da enfermeira para analisar, reflectir e contribuir para as decisões que estão inerentes a todo o processo de cuidados. Esta competência requer que os profissionais considerem em cada situação os seus valores pessoais e profissionais, as crenças e tradições, as perspectivas multidisciplinares, o enquadramento das várias alternativas para a acção, a decisão colectiva e as implicações concretas da decisão tomada. Em resumo podemos dizer que a competência Ética exige que o profissional de enfermagem confronte os valores humanos universais face aos valores dos actores em presença.

Este acto ético em que se procura o compromisso do melhor objectivo a atingir a partir do conjunto dos dados da situação é único e não pode ser transposto para outra situação.

O processo de decisão ética consiste na aplicação das competências éticas na análise e síntese referentes à identificação da situação e dos textos legais e/ou deontológicos que se podem aplicar, bem como os desejos e reacções do doente e família face à doença e ao tratamento. Consiste, ainda, numa abordagem reflexiva sistemática em que se procura identificar os Valores pessoais e profissionais, confrontando-os uns com os outros, as Crenças e tradições, as perspectivas multidisciplinares, pretendendo-se contribuir para o estabelecimento das várias alternativas para a acção, que deverão ser consideradas colectivamente e finalmente visa a aplicação da escolha proposta e a necessária avaliação de resultados, enquadrando as implicações práticas da decisão.

O processo de tomada de decisão ética deve ser acompanhado de vários aspectos como seja:

- Assegurar-se dos aspectos técnicos - científicos. - Ter como referência os Direitos do Homem.

- Considerar os aspectos jurídicos: a Lei exprime um consenso social que a ética não pode ignorar.

(37)

- Pensar nos aspectos deontológicos: as regras profissionais constituem as normas que definem a responsabilidade.

- Analisar as cartas, as recomendações e os “avisos” especializados.

- Ter em conta os dados religiosos e respeitar as diferenças culturais.

(38)

6. OS PRINCÍPIOS DE AUTONOMIA, BENEFICÊNCIA, NÃO MALEFICÊNCIA E JUSTIÇA34

Cada um destes princípios pressupõe a exigência de respeito por determinado valor: a autonomia ou liberdade das pessoas (pacientes ou sujeitos de experimentação), o seu bem-estar, a igualdade ou a imparcialidade.

Autonomia é a capacidade de ser o seu próprio legislador, é a capacidade de se conduzir a si mesmo, é a capacidade de decidir sem se demitir: é a capacidade de se comprometer na conversação social apesar do que “se dirá” e até por isso mesmo, é a capacidade de assumir os seus próprios condicionalismos e de se apoiar neles para se tornar a pessoa que se é.

Definida deste modo a autonomia, é a base que fundamenta a responsabilidade ética. Traduz-se por uma liberdade exigente, não que protege mas que expõe a pessoa.

A aprendizagem do processo ético tem este objectivo: modificar o nosso olhar, ao incitar-nos a procurar uma informação que não será mais exclusivamente reservada a por em prática um conhecimento prático.

PRINCÍPIO DA AUTONOMIA (PA) OU PRINCÍPIO DA LIBERDADE:

Refere-se à condição de quem é autor da sua própria lei; ausência de limitações e incapacidades pessoais que impedem ou diminuem a liberdade de decisão.

Este princípio prescreve o respeito pela legítima autonomia das pessoas, pelas suas escolhas e decisões que sejam verdadeiramente autónomas e livres. Entende-se por agir autónomo aquele que implica intencionalidade, compreensão e ausência de influências que o determinem.

Na prática, o P.A. implica: promover quanto possível comportamentos autónomos por parte dos pacientes, informado-os convenientemente, assegurando a correcta compreensão da informação ministrada e livre decisão. Neste contexto, o consentimento informado (C.I.), é uma autorização autónoma (livre) dada para uma intervenção médica ou/e pesquisa e condições legais por ela implicadas.

34

(39)

Condição prévia ao consentimento informado é a noção de competência, isto é a capacidade de decidir livremente, capacidade que pode ser geral ou específica, para determinados campos. Presume-se que um adulto tem tal competência, sendo necessária a “prova” de uma negação de tal competência.

Relativamente a informação exigida pelo C.I. é necessário saber determinar qual deve ser fornecida e qual pode ser legitimamente omitida. Deve também ter-se em atenção não só à informação dada mas especialmente à compreensão da mesma, tendo em conta não só a beneficência mas também a não maleficência).

Importa também não deixar de ter em conta que existem casos de não-aceitação da informação ou de desistência de ser informado.

PRINCÍPIO DA NÃO MALEFICÊNCIA (PNM):

Este princípio está relacionado com o princípio da beneficência. Refere-se a males não morais e sobretudo a males corporais: dores, doenças, morte, etc. O princípio é em si mais vinculativo que o da beneficência.

Está ligado com o chamado princípio de duplo efeito, segundo o qual em determinadas e bem definidas circunstancias, é legítimo realizar acções das quais resulta um efeito bom (pretendido) e outro mau (tolerado).

PRINCÍPIO DA BENEFICÊNCIA (PB):

O princípio da beneficência, inclui o da não maleficência, ou pelo menos, a obrigação de, além de promover positivamente o bem, evitar e remover o mal (o que já é indiscutivelmente um bem para o interessado). Os autores indicam como pertencendo essencialmente a este princípio a ponderação dos bens e males (benefícios e danos), o que alguns denominam “princípio de utilidade” ou de “proporcionalidade”.

Este princípio implica a noção de obrigação.

Esta pode ter a conotação de moral, legal, filantrópica e poder-se-á referir a obrigações gerais e obrigações específicas.

A doação de órgãos é em geral analisada á luz do princípio da beneficência confrontando-se este com o respeito pela autonomia.

(40)

Refere-se às exigências da justiça distributiva, as quais no campo da bioética, dão origem a problemas difíceis quer a níveis de macro decisões como de micro decisões.

PARTICULARIDADES DA UTILIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DE AUTONOMIA, BENEFICÊNCIA, NÃO MALEFICÊNCIA E JUSTIÇA

Segundo vários autores, o uso destes princípios no contexto da bioética é algo restrito. Isto é, formalmente eles são úteis, mas cada situação concreta necessita ser analisada à luz de critérios objectivos de verificação e de busca de orientações que “ajudem a uma correcta ponderação dos valores em causa” e não tanto dos princípios que se prendem com as exigências do pessoal médico ou de investigação. Isto significa que em situações consideradas de conflito (de valores e não de deveres) os critérios de análise devem basear-se fundamentalmente numa concepção ética determinada, sem a qual os princípios não serão senão formalidades não operacionais.

(41)

7.ROTEIROPARAOPROCESSODETOMADADEDECISÃOÉTICA

Nas actividades de cuidados de saúde surgem frequentemente situações de possíveis dilemas éticos. A Bioética Clínica tem por objectivo a identificação, análise e resolução de problemas morais que surgem no cuidado individual de pessoas doentes ou utentes dos serviços de saúde.

O objectivo de se procurar solucionar problemas morais não é identificar um ideal moral, mas tentar achar a melhor solução disponível nas circunstâncias reais. Algumas vezes as circunstâncias podem ser alteradas, em outras não. Relembramos que a Ética é o estudo da moral, é a busca das justificações para as acções.

Algumas perguntas orientadoras podem ser utilizadas, com o objectivo de facilitar a abordagem dos diversos aspectos envolvidos na abordagem de um problema ou de um dilema ético em contexto clínico:

- Quais são os factos, qual é o problema?

- Quais são os seus deveres para com o paciente?

- Quais são os seus deveres para com as outras partes envolvidas?

- Os seus deveres são convergentes ou estão em conflito?

- Qual a maior objecção que pode ser feita na identificação da convergência dos deveres ou nos argumentos utilizados para chegar a uma dada conclusão?

- Como o conflito ético, real ou percebido, poderia ter sido prevenido ou, pelo menos, atenuado?

Segundo Michael McDonald, director do Centro de Ética Aplicada da Universidade de British Columbia, nos Estados Unidos da América, dever-se-á seguir um enquadramento para a tomada de decisão ética. Este enquadramento desenvolve-se nas seguintes etapas:

- 1.identificação do problema

- 1.1.Fique alerta: seja sensitivo para os aspectos morais

das situações. Tenha em conta os requisitos técnicos das suas funções, para que possa perceber as

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