• Nenhum resultado encontrado

REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA E O USO DE FONTES EM SALA DE AULA. EIXO TEMÁTICO: Relatos de experiências em oficinas e salas de aula

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA E O USO DE FONTES EM SALA DE AULA. EIXO TEMÁTICO: Relatos de experiências em oficinas e salas de aula"

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE HISTÓRIA E O USO DE FONTES EM SALA DE AULA

Tiego Rocha Rebello – PIBID História UFRGS Professores Fernando Seffner; Nilton Mullet Pereira e Carla Meinerz

EIXO TEMÁTICO: Relatos de experiências em oficinas e salas de aula

Fontes Históricas – Movimento da Legalidade (1961)1

A aula de história deve ser um espaço de construção dos saberes históricos, de maneira que provoque indagações sobre o entorno do educando. Dessa forma constituindo “aprendizagens significativas para os alunos”, por meio de “conteúdos, conceitos, métodos e tradições que lhes sirvam para entender de modo mais denso o mundo em que vivem”.2

Além disso, o ensino de história deve servir para estabelecer a compreensão da realidade social, econômica, cultural e política, sempre tentando construir uma visão reflexiva transitando entre passado e o presente. Para atingir tal objetivo, a utilização de fontes pode ser muito frutífera, levantando-se a partir delas questionamentos que permitam a construção e reconstrução do conhecimento histórico, sendo este último o enfoque do meu trabalho.

Dentro dessa perspectiva didática é possível conectar historiografia com a prática docente, analisando as fontes não como uma verdade ou uma comprovação da verdade, e sim inserir na sala de aula o debate e a “crítica ao documento”3. Assim, trazendo para sala de aula os dilemas de escrever história, como Carlo Ginzburg nomeia, na Introdução de O fio e os rastros, a “contenda pela representação da realidade”. Segundo este autor, desde a Escola dos Analles se estabelece uma leitura crítica do documento, citando o seguinte trecho de Marc Bloch: “aquilo que o texto nos diz já não constitui o objeto preferido de nossa atenção”, ou seja passa-se a buscar o que há por trás da produção documental – os seus interesses, suas intenções, a mentalidade dos agentes históricos que o produziram, em um claro abandono e ataque aos preceitos positivistas. Independente da veracidade do documento ou até mesmo de textos

1 Por conta do espaço reservado aos artigos desta publicação, não poderei anexar ao meu trabalho todas as

fontes utilizadas em minha intervenção. Algum possível interessado no material completo, entre em contato pelo e-mail: tiego_eree@yahoo.com.br

2

SEFFNER, 2010, p. 213-229.

(2)

literários, Ginzburg argumenta que se podem detectar “testemunhos históricos involuntários”. Portanto dentro da interpretação das fontes, no produzir historiográfico, enfrentam-se registros onde o “fictício” tenta se passar por verdadeiro, afirmando-se como realidade4. Ao introduzir esse exercício como prática pedagógica, busca-se a leitura e o confronto de diferentes representações, dentro do jogo de forças históricas de autoconstrução de imagens de diferentes grupos em disputa. Aqui compreendendo o conceito de representação como definida por Chartier, em um triplo quadro de realidades:

primeiro, as representações coletivas interiorizadas que organizam os esquemas de percepção e apreciação, a partir dos quais os indivíduos classificam, julgam e atuam; depois, as formas de exibição do ser social ou do poder político que utilizam os signos e as atuações simbólicas [...]; finalmente, a representação por parte de representante [...] de uma identidade social ou de um poder dotado também de continuidade e de estabilidade.5

Sendo o poder político o principal eixo temático desse trabalho, devido ao assunto abordado, situando de um lado o Movimento da Legalidade, em resistência a tentativa de golpe dos ministros militares pelo impedimento de posse de João Goulart liderado e eclodido pelo então governador gaúcho Leonel Brizola, e do lado oposto, no Estado da Guanabara o governador Carlos Lacerda.

Desenvolvimento da Atividade

Nesta proposta pedagógica foram utilizadas algumas fontes da comunicação social (manchetes de jornais e revistas e fotografias oficiais do governo gaúcho6), que foi posta em prática em uma de minhas intervenções7 como bolsista do PIBID em turmas de terceiro ano do ensino médio da Escola Irmão Pedro, sobre o movimento da Legalidade.

O trabalho em sala de aula com fontes jornalísticas torna-se interessante por dois princípios: o primeiro a proximidade dos alunos com a linguagem jornalística e, em segundo lugar, pela possibilidade de demonstrar mais de uma representação sobre o mesmo episódio ao confrontar diferentes periódicos. Neste sentido, o educador estabelece o que Paulo Freire chamou de desenvolvimento da “criticidade”, o que

4

GINZBURG, 2007, p. 09-13.

5 CHARTIER, 2001, p. 121.

6 Todos os materiais utilizados são encontrados no Museu da Comunicação Social Hipólito J. C.

(Musecom). www.museudacomunicacao.rs.gov.br

7

Aula conjunta com o Professor Cláudio Heinrichs. Fica o agradecimento a disposição deste docente, que sempre acolheu de forma receptiva todas as ideias dos bolsistas PIBID.

(3)

permite ao discente uma melhor compreensão do mundo em que vive8. Conforme nos expõe Freire, a ascensão “da ingenuidade para criticidade não se dá automaticamente”, neste sentido a “criticidade” seria o desenvolvimento da “curiosidade crítica”9

, dotando indivíduos da capacidade de indagar-se diante de discursos históricos política e culturalmente concebidos, sobre as narrativas que constituem seu tempo presente, ou seja, transpondo essa capacidade ao seu entorno sócio-político-cultural.

A dinâmica desta atividade ficou dividida em dois momentos: o primeiro mesclando aula expositiva e de identificação conjunta dos elementos das fontes apresentadas. Momento de edificação, por meio das fontes jornalística e fotográfica, do cenário de iminência de guerra civil no país, construindo todos os principais episódios anteriores à renúncia de Jânio Quadros até à posse de João Goulart, vivenciando-nos pelos discursos de representações das forças-políticas em disputa. Buscou-se estabelecer uma “nova memória”10

no sentido de ultrapassar as fronteiras gaúchas, uma vez que muitas vezes a resistência à tentativa de golpe de 1961 parece ter ocorrido apenas em nosso Estado. O que não é verdade. Esse primeiro exercício fundamenta-se no princípio de fugir da simples constatação do discurso histórico proferido em aula, e sim na complexificação a partir da leitura das representações compostas pelas fontes, dotadas de interesses políticos próprios de seu tempo e da construção do conhecimento histórico11. Na perspectiva de compreender a mentalidade e a postura de polarização política ocasionada pelo contexto global de Guerra Fria. Contei com o recurso didático de um retroprojetor e todas as análises foram feitas em conjunto com os estudantes.

Em um segundo momento, de análise de matérias da revista Cruzeiro12 censurada pelo governo da Guanabara, ocorre à divisão dos educandos em grupos e entregue a eles reproduções de notícias desta revista. Como suporte aos alunos a utilização de uma linha do tempo, situando os principais episódios citados anteriomente.

8 PEREIRA; SEFFNER. Op. Cit. p. 113. 9

FREIRE, 1996, p. 15.

10 PEREIRA; SEFFNER. Op. Cit. p. 126. 11 Ibidem, p. 126-27.

12 A revista O Cruzeiro era semanal, foram entregue aos alunos matérias dos dias 26/08, 02, 09 e 16/09.

Poderíamos concluir que a edição de 26 de agosto já estava pronta quando chegou a notícia da renúncia. No entanto, essa revista ficou conhecida por sua agilidade em publicar notícias de última hora, sendo um bom exemplo o suicídio de Getúlio Vargas que a revista já estaria a caminho das bancas, quando foi produzida uma edição especial. LAURENZA, Ana Maria de Abreu. Batalhas em letra de forma: Chatô, Wainer e Lacerda. In: LUCA, Tania Regina de; MARTINS, Ana Luiza (org.). História da imprensa no

(4)

Essa etapa visava: primeiro identificar o que havia de estranho naquelas notícias13, a fim de abordar a questão da censura imposta pelo governador daquele Estado, Carlos Lacerda, aos meios de comunicação. Assim estabelecendo uma outra representação sobre o mesmo episódio, oposta a da resistência pela Legalidade, construindo com os alunos o lado golpista e a tentativa de silenciar a população carioca.

Acredito que os resultados dessa intervenção foram positivos, baseando-me na efetiva participação que esse formato de aula gerou tanto na primeira etapa, quanto na segunda. Alguns dos questionamentos erguidos pelos alunos foram: “Se ali está dito que o Jango voltaria para assumir ou morrer’, porque ele aceitou a medida parlamentarista?” (Referente ao Anexo I); “A condecoração gerou crise por causa da Guerra Fria?” (Referente ao Anexo II). Enfim, estes foram apenas alguns dos questionamentos levantados durante a intervenção. A análise de documentos, proporcionou uma clara construção histórica do Movimento da Legalidade, permitindo estabelecer conexões com outros assuntos, nos quais o jogo de criar imagens e discursos foi determinante14. A análise, o questionamento diante das fontes, possivelmente, esses educandos transporão para o seu cotidiano, pois tal atividade propiciou o desenvolvimento de uma postura mais crítica diante das informações, ao se interpretar as diferentes representações de um mesmo episódio.

Anexo I – ULTIMA HORA, Porto Alegre, 28 de agosto de 1961.

13 Nas reportagens entregue aos alunos, somente no dia 09 de setembro é noticiada a renuncia de Jânio,

sendo que João Goulart havia tomado posse do cargo em 07 de setembro de 1961. Nesta edição ainda há uma reportagem tratando Jânio como presidente e uma nota no final da reportagem: “(Este artigo estava composto quando nos chegou a notícia da renúncia do Presidente Jânio Quadros)”. CRUZEIRO, 09 de setembro de 1961.

14

Um destes assuntos foi a eleição de Fernando Collor de Mello a presidência, que a Globo editou o debate entre ele e o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, em 1989.

(5)

Anexo II – CRUZEIRO, Rio de Janeiro, 09 de setembro.

Referência Bibliográfica:

CHARTIER, Roger. Uma crise da História? A História entre narração e conhecimento. In: PESAVENTO, Sandra Jatahy. Fronteiras do Pensamento. 1ª Porto Alegre: Ed. Universidade Ufrgs, 2001.

(6)

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários a prática educativa. 25ª São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 15. Versão digital – disponível em:

http://www.bibliotecadafloresta.ac.gov.br/biblioteca/LIVROS_PAULO_FREIRE/Pedag ogiadaAutonomia-P%5B1%5D.Freire.pdf

GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros. São Paulo: Companhia Das Letras, 2007.

LAURENZA, Ana Maria de Abreu. Batalhas em letra de forma: Chatô, Wainer e Lacerda. In: LUCA, Tania Regina de; MARTINS, Ana Luiza (org.). História da imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008.

PEREIRA, Nilton Mullet; SEFFNER, Fernando. O que pode o ensino de História? Sobre o uso de fontes na sala de aula. In.: Anos 90 Revista do Programa de Pós-Graduação em história, v. 15, nº 28, dezembro de 2008.

SEFFNER, Fernando. Saberes da docência, saberes da disciplina e muitos imprevistos: atravessamentos no território do ensino de História. In: BARROSO, Véra Lucia Maciel; PEREIRA, Nilton Mullet; BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GEDOZ, Sirlei Teresinha; PADRÓS, Enrique Serra. Ensino de História: desafios contemporâneos. Porto Alegre: Est: Exaclamações: Anpuh/rs, 2010.

Referências

Documentos relacionados

Para preparar a pimenta branca, as espigas são colhidas quando os frutos apresentam a coloração amarelada ou vermelha. As espigas são colocadas em sacos de plástico trançado sem

Os resultados originaram seis categorias: caracterização dos idosos internados pós-correção de fratura de fêmur proximal por queda; demandas dos idosos com correção de fratura

(grifos nossos). b) Em observância ao princípio da impessoalidade, a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, vez que é

Frondes fasciculadas, não adpressas ao substrato, levemente dimórficas; as estéreis com 16-27 cm de comprimento e 9,0-12 cm de largura; pecíolo com 6,0-10,0 cm de

Se você vai para o mundo da fantasia e não está consciente de que está lá, você está se alienando da realidade (fugindo da realidade), você não está no aqui e

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá

Promovido pelo Sindifisco Nacio- nal em parceria com o Mosap (Mo- vimento Nacional de Aposentados e Pensionistas), o Encontro ocorreu no dia 20 de março, data em que também

Este dado diz respeito ao número total de contentores do sistema de resíduos urbanos indiferenciados, não sendo considerados os contentores de recolha