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XIII Congresso Brasileiro de Sociologia 29 de maio a 1 de junho de 2007, UFPE, Recife (PE)

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XIII Congresso Brasileiro de Sociologia

29 de maio a 1 de junho de 2007, UFPE, Recife (PE)

GT5 - Cultura, Política, Memória e Subjetividade

“Baianos” e “paraíbas”: notas sobre a discriminação contra migrantes nordesti-nos

Ricardo Nóbrega – IUPERJ/UFF rnobrega@iuperj.br

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A discriminação por origem regional é um tema ainda pouco estudado nas ciências sociais brasileiras. Embora a migração nordestina tenha sido sociologicamen-te investigada em diversas ocasiões, a maioria dos trabalhos relaciona-se à urbaniza-ção, à integração ao mercado de trabalho e à participação política. A discriminação pela qual passam os migrantes nordestinos nas grandes metrópoles do sudeste brasi-leiro, bem como suas conseqüências sociais e psicológicas, por outro lado, não tem recebido grande atenção dos pesquisadores.

É certo que outros grupos sofrem discriminação, como negros, ciganos, ju-deus e homossexuais. No entanto, enquanto atitudes discriminatórias dirigidas a esses grupos têm sido cada vez mais percebidas como depreciativas e nocivas e, por isso, são progressivamente combatidas, as referentes aos nordestinos nem sempre são percebidas como tais. A primeira forma como esse preconceito se manifesta ocorre pela inclusão indistinta de todos os nordestinos sob as categorias “baiano” e “paraíba" (nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente).

A estereotipagem traduzida por essas categorias não respeita as peculiari-dades culturais dos cidadãos provenientes dos nove estados que compõem o Nordes-te brasileiro, região de grande exNordes-tensão Nordes-territorial e heNordes-terogeneidade cultural. Além disso, de modo análogo ao que ocorre com outros grupos subalternizados, os compor-tamentos e pré-julgamentos depreciativos geralmente atribuem aos migrantes nordes-tinos a pecha de culturalmente atrasados e dotados de baixa capacidade de intelec-ção, naturalizando as diferenças ao associá-los a situações e ocupações de baixo prestígio social.

Uma forma comum de manifestação dessas idéias se dá por meio do debo-che e de piadas depreciativas. Inserida no contexto mais amplo da discriminação por origem regional, a modalidade exercida por meio da pilhéria alcança os efeitos de de-preciação da identidade e da cultura do migrante por meios mais brandos e eufemiza-dos, mais dificilmente perceptíveis e combatíveis e, por isso mesmo, mais facilmente compartilháveis.

O preconceito e a discriminação tornam-se especialmente graves quando disseminados por meios de comunicação de massa. O crescimento de redes televisi-vas e radiofônicas de alcance nacional sediadas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, onde a maior parte da programação é produzida, amplia seu alcance e os naturalizam.

Apesar de esse preconceito estar difundido em grande parte da programa-ção, na declaradamente humorística ele se revela com mais vigor. Por meio de repre-sentações estereotipadas da figura do nordestino, esse preconceito manifesta-se atra-vés de insinuações de baixa inteligência, pela ridicularização de seu modo de falar e

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de sua penúria material, pela vinculação de sua imagem a ocupações de baixo prestí-gio social, por alusões a um comportamento pouco civilizado etc. Esses símbolos são então transmitidos e assimilados por vários segmentos da população, incluídos aí os próprios discriminados, que são diretamente expostos a um escárnio que em boa parte das ocasiões não era realizado quando estavam fisicamente presentes. Paradoxal-mente, por meio de transmissões nacionais via satélite, a pilhéria feita em torno do estereótipo do migrante nordestino alcança os grupos discriminados até mesmo em suas regiões de origem, sem que geralmente haja maiores prejuízos para a audiência ou reações de repúdio mais veementes.1

A generalização dessas idéias, associadas às dificuldades da vida nos grandes centros urbanos brasileiros, como as decorrentes da escassez de empregos, limitadas possibilidades de ascensão social e uma deterioração da qualidade de vida pelo crescimento urbano desordenado, favorece o desenvolvimento de uma exacerba-ção do valor de uma natividade (associada ao progresso e riqueza materiais, bem mo a elementos culturais de origem européia, em oposição ao atraso nordestino) co-mo algo que confere a seus membros superioridade numa situação de disputa por hegemonia entre grupos. Nesse contexto, os migrantes nordestinos passam a ser vis-tos como elemenvis-tos anômicos, aos quais se atribui o aumento da criminalidade, a de-terioração da qualidade de vida na cidade e uma suposta degeneração cultural e racial da sociedade como um todo. São considerados “feios”, “ridículos”, de “mau-gosto”, “preguiçosos” ou mesmo “sujos”; enfim, são caracterizados como representantes do que há de mais indesejável para essa sociedade. Várias expressões depreciativas incorporadas aos vocabulários locais e muitas vezes assimiladas acriticamente até mesmo pelos próprios discriminados ilustram essa visão, tais como “gelo baiano” e “feira de paraíba”, sem mencionar as que remetem a uma condição física, como “gabi-ru” e “cabeça-chata”.

Essa idéia de superioridade dos grupos nativos pode eventualmente evoluir para uma postura mais agressiva em relação aos migrantes, com um discurso que os responsabiliza diretamente pelos problemas da vida urbana. Nesse contexto, desen-volvem-se as condições para o surgimento de grupos intolerantes de extrema-direita, que expressam esse sentimento xenófobo por meio de pichações, páginas de internet de conteúdo racista ou mesmo ataques físicos a membros dessa minoria.

1 Segundo Canclini, a manifestação desse preconceito sob a forma do humor “não só circula entre os setores médios e altos das grandes cidades”, mas também “faz parte de muitos pro-gramas de rádio e televisão, ou seja, da política cultural dos comunicadores. Citando Monsi-váis, prossegue: “o sarcasmo em relação aos subalternos não é um simples efeito dos setores privilegiados: os meios de comunicação de massa difundem-no com êxito enquanto o público desses mesmos meios o festeja”. (CANCLINI, 1999, p.132).

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A discriminação, no entanto, não alcança indistintamente todos os migran-tes: o pertencimento a uma classe social mais elevada ameniza os efeitos da discrimi-nação, mas não a elimina. Os membros das classes dominantes nordestinas, embora sejam ocasionalmente vistos com certa reserva e considerados uma elite de segunda classe, são mais facilmente assimilados por sua condição de riqueza econômica. En-tretanto, embora não lhes seja imputada a imagem de migrante “paraíba" ou “baiano”, são freqüentemente associados à figura de um “coronel” rude e truculento, tempestuo-so e arrogante, que possui valores culturais semelhantes aos dos migrantes típicos (os retirantes).

Os trabalhos acadêmicos mais representativos que indicam a existência de preconceitos nas duas cidades seguem dois padrões distintos: enquanto os trabalhos sobre a cidade do Rio de Janeiro focalizam as interações entre cariocas e nordestinos na Feira de São Cristóvão, as pesquisas realizadas na capital paulista enfatizam as relações entre grupos locais (especialmente descendentes de imigrantes europeus) e migrantes nordestinos em espaços que deixaram de ser étnico e culturalmente homo-gêneos. Em comum, os estudos têm a abordagem a partir de relações de identidade e alteridade entre os grupos, em que a construção de estereótipos é um aspecto mar-cante.

Em seu artigo “Os limites da sociabilidade: “cariocas” e “nordestinos” na Feira de São Cristóvão, Rezende (2001) estudou as interações entre nordestinos de baixa renda e jovens cariocas de classe média em bailes de forró realizados nesse espaço urbano. Segundo a autora, mesmo em espaços de confraternização, as dife-rentes identidades afirmam-se de forma “relacional e contrastiva, trazendo em si um aspecto de negação do outro”, num processo no qual o elemento poder se faz presen-te e representado por disputas de “status, prestígio, posições de superioridade ou infe-rioridade” (REZENDE, 2001, p.2).

Rezende identificou entre os freqüentadores cariocas a presença das cate-gorias “mauricinhos” e “forrozeiros”, que justificavam sua presença na feira como uma busca da autêntica cultura nacional representada pelo “forró de raiz”. Apesar do inte-resse cultural, segundo a autora não havia integração entre cariocas e nordestinos: os pares de dança eram formados dentro do mesmo grupo e frequentemente nas falas dos “forrozeiros” cariocas se verificava “o termo acusatório ‘paraíba’ que agrega ao migrante pobre as características de ‘atrasado’ e ‘ignorante’” (REZENDE, 2001, p.8). Nesse contexto, os homens nordestinos seriam vistos como “esquentados” e beber-rões, enquanto as mulheres nordestinas seriam “coroas”, “brabas” e “barrigudas”. Ao longo do texto, há ainda referência ao termo “sujo”, que teria um aspecto positivo de distinção visual entre forrozeiros cariocas e mauricinhos (representado pelo uso de

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barba, vestuário e corpos franzinos) e depreciativo quando aplicado em relação aos nordestinos.

Morales (1993) considerou a Feira de São Cristóvão local de construção de uma identidade regional nordestina, em que a luta pela permanência dos feirantes nesse espaço de compras e encontros entre os migrantes possibilitou essa constru-ção. Nessa etnografia, afirma que a primeira categoria de identificação utilizada pelos cariocas para denominar os migrantes nordestinos foi a de “pau-de-arara”, que remetia ao caminhão no qual os migrantes eram precariamente trazidos. Com a alteração do modo de transporte dos migrantes, a categoria adotada passou a ser “paraíba”, em função do estado de origem de grande parte dos migrantes e relacionada ao trabalho na construção civil e outros trabalhos braçais, considerados inferiores e servis. De forma contrastiva, os migrantes utilizariam a idéia de força física e disposição para o trabalho como uma virtude em relação ao carioca, visto por eles como “folgado”, “es-perto” e “aproveitador” (MORALES, 1993).

Em relação à cidade de São Paulo, destacam-se os trabalhos de Pierucci (1994) e Caldeira (2000). A pesquisa realizada por Pierucci, que originalmente busca-va identificar as razões da derrota de Fernando Henrique Cardoso na campanha à prefeitura de São Paulo em 1985, identificou entre o eleitorado conservador de classe média-baixa a manifestação inequívoca de tendências antinordestinas. No artigo pu-blicado, surpreende-se com a naturalidade com que esses nativos, quase brancos ou brancos, muitas vezes de origem européia, de baixo nível educacional e aversão pelo raciocínio abstrato que considera as pessoas como iguais, expressavam seu precon-ceito contra os “baianos”. Os grupos nativos responsabilizavam os migrantes por uma alegada degradação da qualidade de vida na metrópole e degeneração racial e cultu-ral do povo local, nutrindo “não só e apenas ressentimento, mas sentimento de perda” (PIERUCCI, 1994, p.141).

Caldeira (2000), em estudo sobre a fala do crime em São Paulo, identificou entre os entrevistados um sentimento de perda e decadência social, atribuídos em diversas ocasiões à chegada de migrantes nordestinos. Para vários informantes, os criminosos eram identificados especialmente como nordestinos, não-brancos, favela-dos ou moradores de cortiços, em relação aos quais se desenvolviam estratégias sim-bólicas e materiais de segregação e evitação, como a construção de muros, instalação de grades e mudança para outras áreas da cidade como forma de evitar a sensação de impureza contida nas interações heterogêneas.

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O preconceito contra os migrantes nordestinos é manifesto sob três dimen-sões essenciais: racial, de classe e cultural.

A dimensão racial da discriminação desenvolve-se em torno da controverti-da categoria “raça”. Embora não possa ser comprovacontroverti-da a partir critérios genéticos, a idéia de raça existe como categoria discursiva e é frequentemente identificada nas narrativas (HALL, 2002). Nessa modalidade, a discriminação representaria uma natu-ralização de uma diferença visualmente identificável e faria referência explícita ao cor-po do indivíduo (PIERUCCI, 1994, p.145). Os preconceitos dessa natureza são em grande medida decorrentes da vulgarização de teorias raciais deterministas em voga nas primeiras décadas do século XX, segundo as quais miscigenação implicava dege-neração e a presença de determinados caracteres físicos explicariam capacidades diferenciadas entre os indivíduos. Segundo classificações baseadas em índices cefáli-cos, os dolicocéfalos ou de cabeça comprida – em suma, o tipo ariano – constituiriam uma raça superior e mais evoluída, enquanto os braquicéfalos - ou de cabeça achata-da – seriam pertencentes a raças inferiores (SEYFERTH, 1995). Embora essas teorias pseudo-científicas tenham soçobrado no curso da história, os preconceitos constituí-dos a partir delas se reproduziram e se naturalizaram, constituindo critérios para o estabelecimento de hierarquias e papéis sociais.

Outra importante vertente da discriminação diz respeito a uma condição de classe do grupo subalternizado. O migrante contra o qual as atitudes discriminatórias são dirigidas geralmente é o de condição social menos favorecida. A ligação da idéia de nordestino a ocupações de baixo status social, bem como a situações de penúria material e a uma imagem ligada à fome é um estereótipo que, ao invés de gerar soli-dariedade, muitas vezes torna-se motivo de deboche, como na referência que Canclini faz ao surgimento de piadas macabras em relação às mortes de aproximadamente 500 “nacos”2 em uma tragédia causada por uma explosão de um reservatório de gás.

Entretanto, não se deve confundir os domínios econômico e cultural. Se por um lado, o nordestino de condição social mais elevada eventualmente é alvo de atitu-des discriminatórias, mais freqüentemente se observa discriminação ao noratitu-destino de condição sócio-econômica menos favorável a partir de pessoas que pertencem a sua classe social e que compartilham condições materiais equivalentes, como no estudo de Pierucci anteriormente mencionado. Inclusive, nesses ambientes a discriminação parece se fazer mais forte: há aí uma disputa entre grupos por hegemonia cultural e

2 Segundo Canclini, “denominação usada no México para se referir depreciativamente a indí-genas e grupos populares, principalmente urbanos” (CANCLINI, 1999, p.141).

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material num cenário de escassez, em que o status social se revela o elemento distin-tivo entre esses grupos.

Migrantes nordestinos e padrões civilizatórios na modernização brasileira

A percepção negativa de regiões consideradas atrasadas e de seus habi-tantes é um fenômeno que se confunde com a própria história da modernidade. O pro-cesso de modernização apresenta-se necessariamente como uma ruptura com o anti-go, o tradicional, o irrefletido, afirmando-se como a imagem da razão e do progresso social e econômico. Nesse período ocorre a constituição da maioria dos estados na-cionais e, com eles, a construção de identidade, cidadania e cultura nana-cionais unifica-dores.

Hall (2002) considera a nação “não apenas uma entidade política, mas um sistema de representação cultural e, enquanto tal, comunidade simbólica produtora de sentidos (HALL, 2002, p.49), caracterizado por um discurso de unificação. Segundo o autor, “(...) não importa quão diferentes seus membros possam ser em termos de clas-se, gênero ou raça, uma cultura nacional busca unificá-los numa identidade cultural, para representá-los todos como pertencendo à mesma e grande família nacional (HALL, 2002, p.59).

Como ressalta Hall, apesar do discurso unificador, as diferenças de fato persistem e a homogeneização narrativa em torno da cultura nacional constitui uma “estrutura de poder cultural” (Hall, 2002, p.59), em que divisões e diferenças internas são “unificadas apenas através do exercício de diferentes formas de poder cultural”. (HALL, 2002, p.62)

Embora seja localmente referenciada, a discriminação contra os nordesti-nos nordesti-nos grandes centros urbanordesti-nos do sudeste brasileiro insere-se nesse contexto mais amplo representado pela modernidade, que trouxe um aumento da heterogeneidade social (causada especialmente pelas migrações), a partir da qual ocorre acirramento de disputas por hegemonia entre classes sociais e etnias. Torna-se comum nas regi-ões mais desenvolvidas economicamente a presença de visregi-ões depreciativas em rela-ção às menos desenvolvidas, em que o “atraso” a elas relacionado é estendida a seus habitantes. Além disso, verifica-se a emergência de nacionalismos como reação à pre-sença de grupos culturalmente distintos, justificados por argumentos raciais e de ori-gem.

Em O Risorgimento, Gramsci menciona sentimentos negativos das massas populares do Norte em relação ao Mezzogiorno, que não compreendiam que o pro-cesso de unificação italiano ocorreu sob hegemonia do Norte, “numa versão territorial

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da relação cidade-campo” (GRAMSCI, 2002, v.5, p.73) e que o “seu desenvolvimento econômico-industrial estava em relação direta com o empobrecimento da economia e da agricultura meridional” (GRAMSCI, 2002, v.5, p.73).

Ao contrário, o homem do povo da Itália do Norte pensava que, se o Mezzogiorno não progredia depois de ser libertado dos entraves que o regime dos Bourbons opunha ao desenvolvimento moderno, isto significava que as causas da miséria não eram externas, a serem buscadas nas condições econômico-políticas objetivas, mas inter-nas, inatas na população meridional, tanto mais que estava enraiza-da a convicção enraiza-da grande riqueza natural enraiza-da terra: e só restava uma explicação, a incapacidade orgânica dos homens, sua barbárie, sua inferioridade biológica [...]. Permaneceu no Norte a crença de que o Mezzogiorno fosse um “peso morto” para a Itália, a convicção de que a civilização industrial da Itália do Norte faria maiores progressos sem esse “peso morto”, etc. (GRAMSCI, 2002, v.5, pp.73-74).

Canclini (1999) ressalta que fenômenos análogos ocorrem em outras me-trópoles latino-americanas. Este autor compara o “racismo antinordestino” em São Paulo à discriminação que ocorre em Buenos Aires (portenhos em relação a

provinci-anos) e na Cidade do México (chilangos contra nacos). Canclini afirma, ainda, que no

mundo contemporâneo, observa-se uma dissolução das monoidentidades. Nas metró-poles, num contexto de atomização e degradação das grandes cidades, haveria a for-mação de bandos, o que levaria “à exasperação os conflitos multiculturais, a árdua convivência entre nativos e imigrantes, entre imigrantes de origens diversas, as dispu-tas pelo território e pelo controle sociopolítico” (CANCLINI, 1999, pp.130-132).

Considerações finais

Mais que um mero regionalismo, o preconceito contra migrantes nordesti-nos possui dimensões raciais, sociais e culturais, a partir das quais o Nordeste e os nordestinos aparecem representados como o avesso de um projeto modernizador, branqueador e europeizante, dotado de uma pretensão civilizatória absoluta, que qua-lifica como barbárie e atraso o que dele difere.

Sob a aparência de uma razão universal, impõem-se valores diametralmen-te opostos à realidade e estabelecem-se as bases para a desqualificação do subaldiametralmen-ter- subalter-no: sua aparência é considerada feia; sua cultura, primária; suas crenças, superstições e misticismos. Mesmo seu trabalho, do qual deriva a riqueza acumulada, é percebido como insuficiente e desqualificado.

Além da importância da discussão em si, o estudo da discriminação contra os migrantes nordestinos é um campo bastante fértil: implica, necessariamente, uma rediscussão do nacional e das bases nas quais ele se funda, além de um reexame das

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relações interétnicas e das hierarquias sociais. Contribui para a elaboração de um pro-jeto nacional mais igualitário, baseado não na exclusão ou numa inclusão subalterni-zante e despersonalisubalterni-zante, mas no autêntico reconhecimento da dignidade e dos valo-res de segmentos não-hegemônicos como meio para a construção de uma sociedade mais justa e solidária.

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